a2 300x225 TERRAMÉRICA   Bônus de carbono para fogões melhorados
Uma mulher prepara tortilha de milho no fogão à lenha eficiente. Cortesia Ecoders
Uma das muitas iniciativas para fogão à lenha com combustão eficiente e baixa emissão de gases pretende ser a segunda do mundo a ser financiada com créditos de carbono.
Cidade do México, México, 22 de abril de 2013 (Terramérica).- Organizações ecologistas do México querem que a implantação de fogões à lenha eficientes, que reduzem a contaminação climática, seja financiada com a venda de bônus de carbono nos mercados voluntários. Para consumir menos madeira e reduzir os problemas respiratórios causados pela fumaça dos fogões tradicionais, duas organizações não governamentais desenvolveram fogões à lenha eficientes no município de Felipe Carrillo Puerto, no Estado de Quinta Roo.
“Na região, a maior parte das famílias rurais usa lenha. Começamos com uma série de painéis para saber que tipos de fogões existem no país”, disse ao Terramérica a coordenadora de ecoturismo e ecotécnicas Dulce Magaña, da U’yo’olché (retorno de árvore, em língua maia), responsável pela iniciativa junto ao Fundo Mexicano para a Conservação da Natureza (FMCN).
A U’yo’olché, fundada em 1999, dedica-se ao manejo florestal comunitário, ao ecoturismo e ao monitoramento da biodiversidade em Quintana Roo e nos Estados vizinhos de Yucatán e Campeche. O esforço começou em 2006, com a entrega de fogões Patsari, um dos modelos mais comuns no México, feito de argila e cuja fabricação conta com subsídios federais e estaduais.
Mas a argila é escassa na região. Então a organização fez uma adaptação técnica para elaborar o modelo Túumben K’óoben (fogão novo), lançando mão de materiais locais: terra branca, suco de cacto, cal e casca de milho. O desenho básico é uma estrutura oca de tijolo e cimento, uma câmara de combustão onde se coloca a lenha, duas ou três bocas metálicas de fogão e uma chaminé. Já foram entregues mais de dois mil fogões melhorados, metade deles com o novo modelo. E o pacote inclui uma panela solar.
Dos quase 117 milhões de habitantes deste país, 13% usam lenha para cozinhar. Estima-se que o consumo dessa biomassa seja de 2,5 quilos diários por pessoa. E a cada ano ocorrem quatro mil mortos por doenças relacionadas com a fumaça dentro de casa, segundo a Aliança Global para Fogões Limpos, uma rede de governos, universidades, empresas e organizações não governamentais.
Com “a entrega, e capacitação no uso, de panelas solares e fogões que economizam, conseguiu-se reduzir o consumo de lenha em comunidades rurais do país”, informou ao Terramérica o diretor-geral do FMCN, Lorenzo de Rosenzweig. Consome-se menos madeira e se elimina a fumaça, as mulheres têm mais tempo para outras atividades, como educação e trabalho, e tudo isso repercute no fortalecimento dos direitos femininos e na elevação da qualidade de vida.
Além disso, um fogão tradicional emite 7,14 toneladas de dióxido de carbono (CO2) por ano, enquanto uma panela solar e um ecofogão poupam até quatro toneladas no mesmo período, segundo o FMCN. “Os projetos de fogões podem ter sucesso. Alguns conseguiram um desenvolvimento estável. Os componentes cruciais são o modelo, que se adapte às necessidades dos usuários, a qualidade dos materiais e o acompanhamento após a adoção da tecnologia”, disse ao Terramérica o gerente-regional para as Américas da fundação The Gold Standard, Iván Hernández, com sede em Genebra.
Essa organização certifica projetos de energia renovável, eficiência energética e manejo de resíduos e de florestas. Na América Latina, avaliou 63 iniciativas, das quais 9% emitiram créditos equivalentes a 150 mil e 200 mil toneladas de CO2, destacou Hernández. O México não conta com mais de quatro desses projetos. Estes créditos são emitidos para uma atividade que demonstra uma redução concreta e mensurável de CO2. Os papéis são comercializados no mercado. O comprador, ao mesmo tempo em que financia o projeto limpo que lhe deu origem, demonstra com os bônus que contribui para a redução global de gases que esquentam a atmosfera.
O esquema Utsil Naj (casa saudável para todos), programa que ajuda diversos atores da América Latina a terem acesso ao mercado de carbono, para difundir tecnologias apropriadas, aceita atividades como fogões eficientes e aquecedores solares, painéis fotovoltaicos e estufas e também inclui Guatemala, El Salvador, Honduras e Peru. Para os empreendimentos mexicanos, os mercados voluntários de carbono de Brasil, Estados Unidos, Chile, Austrália ou Japão podem ser melhores alternativas do que os obrigatórios previstos no Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) do Protocolo de Kyoto.
Esse acordo, vigente desde 2005 e prolongado até 2020, permite que as nações industrializadas, que estão obrigadas a reduzir sua contaminação climática, invistam em projetos para reduzir emissões de gases-estufa nos países em desenvolvimento para compensar as que não conseguem reduzir em seu próprio território.
A partir deste ano, o México só pode comercializar bônus na Europa de projetos registrados junto ao MDL até 2012. Assim, os esquemas voluntários podem ser uma boa opção. “Com os bônus podemos obter fundos para dar manutenção ou realizar ações com mulheres, como ter acesso a outras técnicas, e dar seguimento e monitoramento dos fogões”, explicou Magaña.
A U’yo’olché está para medir a adoção desta técnica entre suas usuárias. Cada aparelho custa US$ 162. Mediante um microcrédito sem juros, a compradora paga cerca de US$ 8 por semana ou pode optar por pagar uma parte e que uma organização financie o restante, segundo Magaña. O projeto seria o segundo de fogões eficientes no mundo com o selo The Gold Standard, que negocia bônus no mercado internacional, depois do peruano Qori Q’oncha, também apresentado pela Utsil Naj e que emite créditos por cerca de cem mil toneladas de CO2.
“Os recursos serão reinvestidos para ampliar a cobertura e capacitar líderes comunitários. Uma vez em marcha e com resultados, será replicado com sócios em outras regiões do México”, disse Rosenzweig. Hernández acredita que “muitas regiões e muitos países tomaram iniciativas individuais ou bilaterais para um possível intercâmbio de redução de emissões”, e acrescentou que “a combinação com mercados voluntários será a chave no desenvolvimento destes novos mecanismos”.
* O autor é correspondente da IPS.