inundacoes Maurício desprevenido diante da mudança climática
As inundações devastaram a capital de Maurício no dia 30 de março. Foto: Naseem Ackbarally/IPS

Port-Louis, Maurício, 18/4/2013 – Maurício pode ser um dos países melhor preparados para os furacões, mas as últimas chuvas e inundações reiteradas e acentuadas pela mudança climática colocaram em dúvida essa capacidade de enfrentar desastres com prontidão. O ecologista Keshwar Beeharry-Panray disse à IPS que não é de estranhar que a ilha seja afetada por mais inundações, deslizamentos de terra e furacões nos próximos anos, por culpa da mudança climática.
Beeharry-Panray, diretor da não governamental Organização para a Proteção e a Conservação do Meio Ambiente, disse que a população ainda não compreende os efeitos disto sobre o país, e que mesmo o governo ainda não começou a se preparar para precipitações mais intensas nesta ilha do Oceano Índico. “Se não estivermos preparados, não teremos tempo suficiente para correr em busca de segurança”, afirmou.
As inundações devastaram, no dia 30 de março, a capital, Port-Louis. Houve 11 mortos, cem feridos e milhares de dólares em prejuízos por danos em edifícios, estradas, veículos, comércios e residências. Os serviços de emergência estão sobrecarregados e são incapazes de dar uma resposta efetiva aos desastres.
O engenheiro ambiental Vassen Kauppaymuthoo, assessor privado para questões ambientais, concorda com Beeharry-Panray. “As pessoas sabem o que fazer, quais precauções tomar, quando um furacão se aproxima da ilha. O tempo fica ruim e são dados alertas meteorológicos. Mas Maurício carece da mesma preparação para as inundações e outras calamidades naturais”, explicou o engenheiro à IPS.
Segundo o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, a ilha é vulnerável a “consideráveis perdas econômicas, tensões humanitárias e degradação ambiental devido aos impactos da mudança climática e que, entre os impactos diretos deste fenômeno, que provavelmente afetará Maurício de modo diverso, figuram aumento na frequência de chuvas intensas, elevação do nível do mar entre 18 e 59 centímetros até 2100 e aumento na intensidade dos furacões tropicais”.
Durante as inundações de 30 de março, em menos de duas horas caíram 156 milímetros de chuva na capital, enquanto em outras partes da ilha foram registradas apenas precipitações isoladas. Torrentes de água baixaram das montanhas que rodeiam Port-Louis e fluíram pelo centro da cidade, arrasando tudo em sua passagem.
Feroz Banjal, de 61 anos, voltava para casa quando o ônibus em que viajava foi levado pela correnteza. Do veículo viu algumas pessoas sendo arrastadas. Saiu para tentar ajudá-las, mas a água também o levou, por cerca de 500 metros até ser salvo por um taxista. “Em 30 anos, nunca vi tanta água nas ruas”, contou à IPS.
A mudança climática é uma realidade para Maurício. Um funcionário dos Serviços Meteorológicos disse que, devido a esse fenômeno, o padrão de chuvas da ilha mudou nos últimos tempos. “Durante os dois últimos anos, a ilha sofreu uma grave seca, até o início de 2013, quando começou a chover um pouco. Em fevereiro e março, choveu muito”, informou à IPS, pedindo para não ter seu nome revelado.
Para Nathalie Pompom, que vive perto de Canal Dayot, um rio que transporta a água das chuvas da montanha para o mar, as fortes precipitações foram um verdadeiro tumulto. “Há 18 anos que vivo aqui e nunca vi tanta água entrar na minha casa. Perdemos tudo. Temos medo pelo nosso futuro”, afirmou à IPS. Kauppaymuthoo afirmou que as inundações de 13 de fevereiro também devastaram a ilha, e que é inaceitável que, menos de dois meses depois, os habitantes de Maurício não estivessem preparados para as inundações de 30 de março.
“Alertaram-nos que haveria mais, mas este alerta não foi considerado. Maurício precisa de um plano de manejo para as calamidades naturais. Deveria ser criada uma unidade que esteja alerta 24 horas por dia, e que possa tomar decisões rapidamente para salvar vidas e prevenir danos materiais. Com o passar do tempo, as catástrofes naturais vão aumentando devido à mudança climática”, observou Kauppaymuthoo.
Enquanto estradas de concreto e asfalto florescem por todo lado para aliviar o congestionado tráfego, e na medida em que progride a construção, os espaços verdes diminuem em grande velocidade. Na capital há poucas árvores e menos de 2% da cobertura florestal da ilha para mitigar os efeitos das chuvas torrenciais, detalhou Kauppaymuthoo.
A ilha também não possui drenagens bem mantidas que levem a água da chuva para o mar, porque estão bloqueadas por restos da construção. Além disso, a construção de uma estrada circundando as ladeiras de uma montanha diante de Port-Louis também pode ser parte do problema. “Alterar o curso natural da água, modificar a estrutura das drenagens naturais que existiram durante milhares de anos, para traçar estradas nelas, representa uma ameaça real ao meio ambiente”, advertiu Kauppaymuthoo.
Mas o ministro de Infraestrutura Pública, Anil Bachoo, pressionado pela população e pelos meios de comunicação, que o acusaram de irresponsabilidade pela construção viária, disse que as inundações foram imprevistas. “O que aconteceu em Port-Louis esteve totalmente fora do controle humano. Naturalmente, estamos tristes porque esta catástrofe natural causou tantos danos à nossa ilha. Jamais sonhamos em receber 150 milímetros de chuva de uma só vez em uma região pequena como a da capital”, declarou Bachoo à imprensa.
No entanto, Karim Jaufeerally, do Instituto de Estudos Ambientais e Legais, acredita que a perda de vidas nas últimas inundações se deve à negligência do governo e das autoridades locais. “Embora Maurício estivesse preparada para as calamidades naturais, teria ocorrido o mesmo problema na capital, porque as drenagens não funcionaram adequadamente. A magnitude das inundações teria sido menor se as drenagens estivessem livres”, pontuou Jaufeerally à IPS. E acrescentou: “É fácil falar em estar preparado para a próxima vez, mas o que houve da última vez?”, questionou. Envolverde/IPS
(IPS)