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sexta-feira, 30 de setembro de 2011

Novo Código Florestal pode deixar 25% da Amazônia sem proteção legal

Um quarto da Amazônia sem proteção legal. Entrevista especial com Ennio Candotti e José Antonio de Aleixo da Silva

A mudança em uma expressão no projeto do novo Código Florestal pode deixar 25% da Amazônia sem proteção legal. O alerta é da equipe coordenada pelo Museu da Amazônia – Musa e de pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia – Inpa. Os cientistas solicitam que as áreas sujeitas a inundações da Amazônia e do Pantanal sejam tratadas por uma legislação específica. Em agosto, o grupo entregou um pedido de emenda no Projeto de Lei 30/2011, que trata da revisão do Código Florestal.

“A mudança no termo ‘margem média dos rios’, contida no artigo 4º da nova lei, pode deixar até 400 mil km² de floresta sem proteção”, diz Ennio Candotti à IHU On-Line em entrevista concedida por e-mail. Segundo ele, caso as áreas de florestas alagáveis não sejam incluídas nos dispositivos legais que protegem as florestas, “os ecossistemas ficarão fragilizados com graves consequências para as funções biológicas e climáticas das florestas”.

José Antonio de Aleixo da Silva, membro da diretoria da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC, também concedeu entrevista à IHU On-Line sobre as mudanças propostas pelo novo texto do Código Florestal. Para ele, “as dificuldades encontradas nessa discussão são decorrentes da disputa entre agronegócio e ambientalismo. Mesmo com apresentações de nossos resultados realizadas no Congresso (Câmara e Senado), têm prevalecido interesses setoriais que tentam desqualificar nosso trabalho, principalmente com argumentos de que chegamos tarde”.

Ennio Candotti é físico formado pela Universidade de São Paulo – USP e atualmente é professor da Universidade Federal do Espírito Santo e atual presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC.

José Antonio de Aleixo da Silva é graduado em Agronomia pela Universidade Federal Rural de Pernambuco – UFRPE, mestre em Ciência Florestal pela Universidade Federal de Viçosa – UFV-MG e Ph.D em Biometria e Manejo Florestal pela University of Georgia. Atualmente é professor do Departamento de Ciência Florestal da UFRPE.

Confira a entrevista.

IHU On-Line – A mudança no termo “margem média dos rios”, contida no artigo 4º da nova lei, pode deixar até 400 mil km² de floresta sem proteção. Quais prejuízos para a fauna e flora da Amazônia isso pode acarretar?

Ennio Candotti – O Código Florestal em vigor faz referência às margens altas para definir o leito dos rios. O projeto em tramitação desloca essa margem (art 3º inciso IV) para as margens do leito “regular” não definindo o que seria regular. A Secretaria do Patrimônio da União utiliza a margem alta como referência. Isso significa que o deslocamento dessa margem e redução da extensão das propriedades (e responsabilidades) da União (o leito dos rios pertence à União segundo a Constituição Art. 20) reduzirá o Patrimônio da União em muitos bilhões de reais, fragilizará a proteção e a responsabilidade da União sobre essas áreas e, além disso, propiciará movimentos de ocupação e posse de terras que não mais pertenceriam à União.

Na Amazônia, a extensão dessas terras é da ordem de 300 000 km². Trata-se de uma área de floresta alagada de 400 000 km² (que corresponde às áreas entre as margens altas) menos a área entre as margens “regulares”, que se estima ser de 100 000 km²). Nem todas as áreas alagadas correspondem a áreas de floresta como, por exemplo, no Pantanal, que são áreas de cerrados. No Rio Grande do Sul há os dois casos: áreas alagadas de floresta e outras correspondentes a biomas diferentes.

IHU On-Line – Quais resguardos essa área, que equivale ao dobro do tamanho do estado de São Paulo, teria caso fosse garantida a proteção legal?

Ennio Candotti – A proteção ambiental no caso das áreas do Patrimônio da União estaria garantida pela própria propriedade da área de floresta alagável. A essa área deve-se acrescentar uma pequena faixa de 15 metros às margens dos rios, que também é da União. As Áreas de Preservação Permanente deveriam ser medidas a partir dessa faixa marginal aos rios. Não resta dúvida de que o leito do rio deve ser medido entre as margens altas, uma vez que não podemos ter duas linhas de demarcação para o Patrimônio da União: uma para a cheia outra para a vazante. Novamente enfatizo: a questão é muito importante na Amazônia porque a diferença de nível dos rios entre a cheia e a vazante chega a ser de mais de 10 metros na vertical. Em outras partes, essa diferença não chega a ser tão significativa e a margem alta e a “regular” podem estar próximas.

IHU On-Line – Para quando espera a aprovação da emenda no Projeto de Lei 30/2011 encaminhada em agosto? Que embargos políticos o senhor acredita que podem comprometer essa aprovação e por quê?

Ennio Candotti – Não tenho sinal que a emenda tenha sido considerada pela Comissão de Justiça, onde deveria receber a devida atenção por envolver questões de caráter constitucional. Se isso acontecer, temos ainda a possibilidade de submetê-la à Comissão de Ciência e Tecnologia, uma vez que o termo “margem regular” carece do rigor que se exige em uma linha de referência dessa importância. Por outro lado, consultas técnicas poderão confirmar que boa parte da floresta Amazônica se encontra em áreas alagadas periodicamente. Deve-se lembrar que as árvores, quanto têm suas raízes submersas, pausam a respiração, isto é, deixam de absorver e emitir CO². Por essa razão se acredita que, na Amazônia, as emissões e sequestros de CO² estão em equilíbrio.

IHU On-Line – O senhor destaca a importância de um tratamento diferenciado para as áreas úmidas do Brasil. Nesse contexto, partindo do princípio de que o Código Florestal é uma instância federal, como restringir o uso dessas áreas às comunidades tradicionais?

Ennio Candotti – A sua atuação deveria ser regulamentada através de Portarias elaboradas pelos organismos competentes, de acordo com o conhecimento científico à disposição. Em todo caso, deve-se garantir às comunidades tradicionais e aos pequenos agricultores que seja permitido o plantio e a colheita nessas áreas. Elas têm sido dadas em concessão a estas comunidades, preservando à União a propriedade.

IHU On-Line – Caso as áreas de florestas alagáveis não sejam incluídas nos dispositivos legais que protegem as florestas, que reflexos ecológicos, biológicos e econômicos isso pode acarretar?

Ennio Candotti – Creio que os ecossistemas ficarão fragilizados com graves consequências para as funções biológicas e climáticas das florestas. A precipitação é a principal fonte de água na bacia amazônica; cerca de 50% dessa precipitação depende da evaporação e da transpiração da cobertura vegetal. Por outro lado, cerca da metade da precipitação incidindo na bacia é transformada em descarga, indo primeiramente para os pequenos riachos, os igarapés. A trama de pequenos igarapés da bacia amazônica alimenta os grandes rios com seu fluxo de água de diferentes propriedades químicas. Por sua vez, esses igarapés são margeados por florestas que alimentam os organismos aquáticos, mostrando a íntima relação e mútua dependência entre água, floresta e organismos na Amazônia. Devido a diferenças ao longo do ano no volume da precipitação, o nível dos grandes rios flutua sazonalmente com uma amplitude da ordem de 10 metros na Amazônia Central, podendo chegar a quase 15 metros em outras áreas, implicando uma expansão da cheia de quilômetros nas planícies alagáveis marginais e suas florestas.

No pico da fase de águas baixas, as áreas alagáveis podem ser reduzidas a apenas 20% da área total inundada durante o pico das cheias. Contudo, elas contribuem com 30% do balanço total de água do canal principal do rio, pois a capacidade de estocagem das áreas alagáveis, desde que mantidas com suas florestas associadas, é bem superior à do canal principal. Em nenhum outro lugar do planeta são encontradas florestas que toleram períodos de inundação tão longos, de até 270 dias ao ano, como aquelas encontradas nas áreas alagáveis ao longo dos grandes rios amazônicos. Todos os anos, durante as cheias, quando a água invade as margens laterais, as árvores passam a fazer parte dos corpos de água por vários meses, tendo suas raízes, troncos ou mesmo as copas inteiramente recobertas pela água dos rios associados. Essa vegetação é adaptada a tal situação de inundação, compondo florestas únicas no mundo, com a maior biodiversidade registrada para esses ambientes (mais de 1000 espécies).

A vegetação das florestas alagáveis é também de capital importância para o desenvolvimento e manutenção da biodiversidade amazônica, oferecendo alimento e habitat para vários animais, como peixes, macacos e pássaros. Além disso, um número muito grande de invertebrados terrestres vive permanentemente nas copas das árvores da floresta ou migra para elas no intuito de escapar às inundações. As áreas de florestas alagáveis devem ser incluídas nos dispositivos legais que protegem as florestas, uma vez que a sua devastação ou sua retirada massiva trarão reflexos negativos imediatos à estrutura física e integridade dos processos ecológicos dos ambientes alagáveis, como também à diversidade biológica de toda a região amazônica. As implicações de alterações dessa natureza irão se refletir diretamente nos ciclos climáticos e na redução dos múltiplos recursos naturais explorados pelas populações humanas locais, com reflexos negativos na economia e no abastecimento dos maiores centros urbanos na Amazônia.

IHU On-Line – Qual o papel político da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência – SBPC e da Academia Brasileira de Ciências – ABC em relação ao Código Florestal?

José Antonio de Aleixo da Silva – O papel político da SBPC e da ABC nessa discussão do Código Florestal é, fundamentalmente, mostrar ao Congresso Nacional que a ciência e tecnologia disponíveis na atualidade devem ser consideradas na elaboração de um instrumento legal eficiente, pois um código que trata das relações entre economia, meio ambiente e sociedade não pode ser tendencioso. Isto é, se não houver equilíbrio entre as partes consideradas, o grande perdedor será o país, pois poderá ser um grande produtor de alimentos causando sérios danos ambientais, ou um país relativamente protegido ambientalmente, mas com falta de alimentos para a população. O equilíbrio é fundamental e a ciência e a tecnologia mostram onde é possível encontrar esse equilíbrio, mantendo-se o elevado nível de produtividade agrícola com sustentabilidade ambiental e social.

IHU On-Line – A comunidade científica se omitiu em relação à discussão atual do Código Florestal? Quais dificuldades encontradas nessa discussão, uma vez que ela abrange diversos setores da sociedade e do governo?

José Antonio de Aleixo da Silva – Desde o primeiro Código Florestal, promulgado pelo decreto 23.793, de 23 de janeiro de 1934 e, posteriormente, a lei 4.771 de 15 de setembro de 1965, houve participação da comunidade científica, que usou o que se tinha disponível nas épocas em termos de ciência e tecnologia. O país cresceu, a ciência e tecnologia avançaram muito e a reformulação do Código Florestal se faz necessária, para se ajustar às condições atuais.

No processo de discussão da reformulação do Código Florestal, as entidades científicas SBPC e ABC não foram consultadas. A organização de um grupo de trabalho foi uma demanda da própria comunidade científica, e como resultado houve a formação de tal grupo em junho de 2010. Após estudos profundos, foi publicado o livro O Código Florestal e a ciência. Contribuição para o diálogo”, lançado em Brasília e entregue a todos os congressistas.

As dificuldades encontradas nessa discussão são decorrentes da disputa entre agronegócio e ambientalismo. Mesmo com apresentações de nossos resultados realizadas no Congresso (Câmara e Senado), têm prevalecido interesses setoriais que tentam desqualificar nosso trabalho, principalmente com argumentos de que chegamos tarde. O fato é que não fomos convidados. Não estamos defendendo o ambientalismo nem o agronegócio, como algumas pessoas afirmam. Achamos que, para se construir um instrumento legal que possa ser Código Florestal, ambiental ou da biodiversidade como muitos defendem, há necessidade de mais tempo para incluir toda a ciência e tecnologia no documento. Infelizmente são poucos representantes no Congresso que concordam com essa posição. A disputa é mais forte do que a racionalidade e isto é muito ruim para o país.

IHU On-Line – Quais são os pontos do Código Florestal que mais geram divergências para aprovação da mudança?

José Antonio de Aleixo da Silva – Na realidade, os pontos que mais geram disputas são de caráter jurídico no que diz respeito à ilegalidade de muitos produtores agrícolas ou da utilização de áreas com produção agrícola em Áreas de Preservação Permanente. Também a possibilidade dos estados terem legislações próprias tem gerado muita controvérsia. Anistia a quem desmatou ilegalmente também é muito criticada pelos movimentos ambientalistas, embora o setor do agronegócio fale que tal anistia não existe. O que realmente falta é bom senso para um acordo entre as partes. Se ambas cederem nos limites possíveis, o Brasil vai construir um instrumento legal equilibrado. Se o acordo não ocorrer, todos sairão perdendo.

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FONTE : (Ecodebate, 30/09/2011) publicado pela IHU On-line, parceiro estratégico do EcoDebate na socialização da informação. [IHU On-line é publicada pelo Instituto Humanitas Unisinos - IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]

Menos de 20% dos municípios brasileiros fazem coleta seletiva

Na apresentação do painel Política Nacional de Resíduos Sólidos e Sustentabilidade, o presidente da Associação Técnica Brasileira das Indústrias Automáticas de Vidro, Lucien Bemonte, afirmou que a maior parte das cidades brasileiras não tem nenhuma iniciativa para coleta seletiva de lixo.

Segundo ele, menos de 20% dos municípios fazem coleta seletiva. Ele citou como exemplo a cidade de São Paulo, que gera 14 mil toneladas de resíduos por dia, e apenas 0,2% de todo esse material é triado para reciclagem de forma organizada. “Isso é dramático. É a cidade que tem um dos primeiros contratos de concessão de lixo e que tem acompanhamento da prefeitura. Em 2011 a previsão é que a prefeitura da capital paulista gaste mais de R$ 1 bilhão só em coleta, transbordo e varrição”.

Belmonte lembrou que a atual legislação determina que a partir de setembro de 2014 será proibido transportar resíduos para aterros ou lixões. “A Europa trata no máximo 60% de seu resíduo, e demorou mais de 20 anos para se chegar nesse resultado. É preciso cuidar da educação, e esse papel cabe ao estado”, disse.

O painel foi apresentado no Congresso Brasileiro de Desenvolvimento Humano, promovido pela Comissão de Meio Ambiente da Câmara e pela Academia Brasileira de Filosofia.

Sacolas plásticas
Ainda durante o evento, o vice-presidente do conselho da Agência de Promoção Eco Sustentável (Apecos), Edivaldo Bronzeri, falou da experiência de Jundiaí, no interior de São Paulo, que foi a primeira cidade a extinguir as sacolas plásticas dos supermercados, sem a necessidade de lei. “Se queremos mudança comportamental, tem que ser pela educação, e isso leva tempo. Quando você compartilha, o custo é menor para cada um. Se queremos um País melhor para nossos filhos e netos, a decisão tem que ser tomada com sabedoria”.

Coco em carvão
Ele disse que a Apecos investe muito em pesquisa. Foram os estudos que permitiram a transformação da casca de coco em carvão. Com 40 toneladas de casca é possível gerar até 10 toneladas de carvão, que pode ser o energético ou aquele que se usa para fazer churrasco, por exemplo. Uma vantagem desse produto é que ele não produz fumaça. “Você consegue gerar renda para quem tirou o coco e para quem vai vender o carvão. Foram cinco anos de pesquisa até chegar a esse resultado. Hoje são dez fábricas no Brasil”, disse

Atualmente, o País consome por ano 801 mil toneladas de carvão para churrasco. Para produzir essa quantidade são derrubadas 570 mil árvores, segundo dados do Ministério do Meio Ambiente.

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FONTE : matéria da Agência Câmara de Notícias, publicada pelo EcoDebate, 30/09/2011
Reportagem – Jaciene Alves
Edição – Regina Céli Assumpção

Hidrelétricas Binacionais na Bacia do Rio Uruguai: fábricas para gerar energia e lucro para as grandes empresas, artigo de Neudicléia de Oliveira

Um projeto que já dura mais de trinta anos pelo grande interesse das grandes empresas do setor elétrico, volta a “assombrar” a população que vive ribeirinha no trecho binacional (Brasil/Argentina) da bacia do rio Uruguai: a construção das barragens de Garabi e Panambi. O Governo Brasileiro (MME/ELETROBRÁS) e Argentino (EBISA) prevêem iniciar as obras em 2012, a um custo de oito bilhões de reais. Quando concluídas podem gerar uma potência de 2.200 MW, alagando uma área de 96.960 ha. A estimativa é de que 12.600 pessoas sejam atingidas pelas obras. Pela proposta atual (2010), a região mais afetada no território argentino, seria a Província de Misiones. No Brasil, as principais cidades atingidas seriam Garruchos, São Nicolau, Porto Xavier, Pirapó, Roque Gonzáles, Tucunduva, Tuparandi, Novo Machado, Doutor Mauricio Cardoso, Criciumal, Tiradentes do Sul, Esperança do Sul, Derrubadas, Alecrim e Porto Mauá no estado do Rio Grande do Sul.

Em 1972, o Brasil e a Argentina assinaram convênio para a realização de estudos conjuntos do trecho compartido do rio Uruguai e seu afluente Peperì-Guazú para exploração do potencial energético do rio Uruguai. A partir destes estudos foi elaborado o projeto que previa a construção de duas represas: Garabi (cota 94, potência de 1800MW) e Roncador (cota 164, potência de 2800MW). Depois de inúmeras paralisações, de um processo de privatização das obras, da inclusão do projeto Garabi na Iniciativa de Integração da Infra-estrutura Regional Sul-americana (IIRSA). Em 2008 a assinatura da Declaração da Casa Rosada em Buenos Aires decide ratificar a decisão de construir as usinas hidrelétricas de Garabi e Panambi, determinando que a ELETROBRAS e EBISA avancem na realização dos estudos técnicos e ambientais. Em março de 2010, o governo brasileiro incluiu o projeto hidrelétrico Garabi (fronteira do Brasil com Argentina) na segunda etapa do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC 2).

Hidrelétricas na Bacia do Rio Uruguai – Para quê? Para quem?

A bacia do rio Uruguai (BRU) tem grande capacidade e potencial de geração hídrica, sendo considerada estratégica na geração de eletricidade. Por isso se tornou um dos territórios brasileiros em disputa, que o capital internacional quer controlar.

Do potencial da região que é de 12.816 MW ( 5,1% do potencial nacional), 5.182 MW já estão sendo aproveitados, 6.482 MW estão inventariados e 1.152 MW estimados. A hidroeletricidade tem se tornado o principal foco de interesse das empresas privadas porque é a tecnologia mais eficiente, com 92% de rendimento, enquanto as demais tecnologias giram em torno dos 30% de eficiência. Nesta região já foram construídas sete grandes hidrelétricas que estão nas mãos de quatro transnacionais – Alcoa (EUA), GDF Suez Tractebel (França), Votorantim, Camargo Correa (brasileiras): Usina Hidrelétrica (UHE) de Passo Fundo, UHE Ita, UHE Machadinho, UHE Barra Grande, UHE Campos Novos, UHE Monjolinho e UHE Foz do Chapecó.

As hidrelétricas juntas (5.357 MW de potência) geram por ano 3,2 bilhões de reais. Durante 30 anos vão gerar aos seus ‘donos’ nada menos que 95 bilhões de reais.

Os demais 7.459 MW que ainda não foram explorados, poderão gerar mais 4,57 bilhões de reais por ano ou 137 bilhões de reais em 30 anos, somente com o negócio da geração.

Portanto, as empresas estão buscando se apropriar de um recurso estratégico que possui uma capacidade de gerar um valor em torno de R$ 7,5 bilhões de faturamento por ano ou 230 bilhões de reais nos próximos 30 anos. Além do negócio da geração de energia seria necessário analisar o faturamento da distribuição e de transmissão, em que as sete usinas conseguem mais outros 2,75 bilhões de reais por ano.

As sete hidrelétricas custaram algo em torno de R$ 8 bilhões para serem construídas, sendo que 5,5 bilhões vieram do BNDES – Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social, valores que chegam a 75% do total de cada investimento.

Qual interesse em Garabi e Panambi?

Analisando a história destas outras barragens fica muito claro o interesse das grandes empresas em construir as barragens de Garabi e Panambi: O LUCRO A SER GERADO. Analisando atualmente os contratos de comercialização de energia constatamos que a energia elétrica esta sendo vendida a preços que variam entre 130,00 reais a 140,00 por MWh. Portanto se as duas barragens juntas produzirem em média 1.100 MWh (50%) de energia firme terão uma receita de 1,23 bilhões por ano. Nos trinta anos a receita será de 36,9 bilhões de reais. Ainda terão os lucros das empreiteiras, a apropriação privada do dinheiro Público através do financiamento do BNDES, a apropriação de 96,96 mil hectares de terras, o controle da água na região e a expulsão de 12.600 pessoas de suas terras, do seu trabalho e de seu sustento. Soma-se a isto a destruição da natureza.

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FONTE : colaboração do MAB Sul para o EcoDebate, 30/09/2011.

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

EMOCIONANTE ! UMA BALEIA É SALVA !

Uma baleia na Baixa Califórnia, Mar de Cortez, estava em vias de morrer toda enroscada em redes de nylon, quando é salva pela tripulação de um pequeno barco. Veja a alegria e a festa que ela faz para a tripulação, quando é libertada depois de mais de uma hora de esforço, para cortar os fios da rede...
Aprecie o vídeo!

terça-feira, 27 de setembro de 2011

TERRAMÉRICA – “É preciso sair do capitalismo”

Por que se introduz a ideia de economia verde em lugar de manter a de desenvolvimento sustentável, que tem a vantagem de seu cunho social?, questiona nesta entrevista o escritor francês Hervé Kempf.

Buenos Aires, Argentina, 26 de setembro de 2011 (Terramérica).- Para salvar o planeta da mudança climática e da perda de biodiversidade, devemos sair do capitalismo e buscar um sistema menos consumista e socialmente mais justo, afirma o jornalista e ecologista Hervé Kempf. Esta questão atravessa toda a obra de Kempf, colunista do jornal Le Monde e autor de “Para salvar o planeta, sair do capitalismo” e de “Como os ricos destroem o planeta”, entre outros livros. Na França, acaba de publicar “L’oligarchie ça sufit, vive la démocratie” (Basta de oligarquia, viva a democracia).

Expoente do debate sobre o decrescimento, que se contrapõe ao crescimento do produto interno bruto como indicador dominante do êxito de um país ou de uma sociedade, Kempf questiona a viabilidade de uma sociedade guiada pelo consumo e pela avidez de lucro. Os líderes políticos “continuam defendendo o sistema capitalista ao qual chamo de oligárquico”. Contudo, “precisam mudar, bem como o sistema”, disse Kempf em entrevista ao Terramérica durante sua visita à Argentina.

TERRAMÉRICA: É possível reverter o aumento de gases-estufa que causam a mudança climática?

HERVÉ KEMPF: Sim. Porém, no momento, não parece estarmos voltados para isso. A Europa mudou sua trajetória e conseguiu reduzi-los levemente, enquanto os Estados Unidos estabeleceram um teto, mas globalmente as emissões crescem em países do Sul. É preciso continuar pressionando o Norte, e os grandes países do Sul, em particular a China, que exerce um papel de líder, devem modificar sua conduta. Eles querem conseguir crescimento máximo, mas estão conscientes da crise ecológica e essa consciência penetrará cada vez mais nos países do Sul.

TERRAMÉRICA: Está otimista sobre a cúpula de mudança climática que começara no final de novembro na África do Sul?

HK: Não, infelizmente. Os preparativos mostram que a situação está bastante bloqueada

TERRAMÉRICA: A direção política está à altura?

HK: Não. Muitos dirigentes continuam defendendo o sistema capitalista, que chamo de oligárquico, e defendem interesses contrários à demanda que a crise ecológica impõe. Os líderes políticos têm de mudar também o sistema.

TERRAMÉRICA: Entretanto, há países, como a Venezuela, que têm um discurso contrário ao capitalismo e, no entanto, não mostram maior consciência ambiental.

HK: Meu trabalho se orienta mais aos países do Norte, que têm a responsabilidade de mudar o modelo econômico. A América Latina, há 15 ou 20 anos, teve que se independizar dos Estados Unidos, adotar maneiras mais democráticas e uma política social a favor dos pobres. Venezuela, Brasil, Bolívia, Equador, Argentina seguem essa tendência. No entanto, é certo, eles também têm de assumir a crise ambiental.

TERRAMÉRICA: Acredita que a Rio+20, a conferência das Nações Unidas que acontecerá em 2012, reavivará o espírito de esperança da Cúpula da Terra de 1992?

HK: No momento, não se apresenta muito bem. A Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) acaba de divulgar um comunicado sobre a Rio+20 que parece muito orientado a dizer: “desenvolvimento, desenvolvimento, e depois vemos o meio ambiente”. Me parece um mau indício.

TERRAMÉRICA: Mas, esse é um pronunciamento para a região.

HK: Sim, mas o que vejo na Europa e nos Estados Unidos é ainda pior. Há uma falta de interesse político e também da mídia pela Rio+20. A atenção está na crise financeira.

TERRAMÉRICA: O que pensa do conceito “economia verde”?

HK: É muito vago. Parece a continuação do capitalismo mais voltado à ecologia. Contudo, sem mudar o poder das corporações, sem reduzir o consumo de energia nem questionar a desigualdade social, é uma nova forma de capitalismo. Além disso, porque este novo conceito, em lugar de continuar com o de desenvolvimento sustentável que tem a vantagem de seu cunho social?

TERRAMÉRICA: Acredita que se trata de um retrocesso?

HK: É um sinal de que o que se apresenta como prioridade é a economia, quando para a ecologia a economia não é prioridade. A prioridade é garantir uma vida harmoniosa entre as pessoas e com o meio ambiente. A economia não é tudo.

TERRAMÉRICA: O senhor investigou o impacto do acidente nuclear de Chernobyl (1986). Acredita que o ocorrido em 11 de março deste ano na central japonesa de Fukushima pode ajudar no retrocesso desse tipo de energia?

HK: Fukushima mostrou que a energia nuclear é algo muito perigoso mesmo em um país campeão em tecnologia como o Japão.

TERRAMÉRICA: Em seu livro é descrita a contribuição da energia eólica…

HK: O faço pensando no Norte. Ali a energia eólica parece um pretexto para evitar a economia. Nos Estados Unidos, na Europa, no Canadá e no Japão deve-se reduzir o consumo de energia e depois ver como produzi-la.

TERRAMÉRICA: O que sugere para viver em um planeta sustentável?

HK: Colocar a questão da justiça social como prioridade. Em um mundo extremamente rico do ponto de vista material, isto é crucial.

TERRAMÉRICA: E a respeito do consumo?

HK: Deixe de ver televisão.

TERRAMÉRICA: Pode-se promover estas ideias em países onde ainda há população sem acesso ao consumo básico?

HK: Insisto. Falo como europeu, mas creio que nos países do Sul o desafio pode ser reduzir a desigualdade.

TERRAMÉRICA: O que diz aos céticos que acreditam que isso é voltar à Idade da Pedra?

HK: Que se continuarmos nesta economia destruidora dos laços sociais, da justiça e da ecologia voltaremos à Idade da Pedra, porque a destruição social e ecológica nos exporá a muita violência.

TERRAMÉRICA: O senhor diz em seu livro que não temos de inventar nada novo, que as alternativas já existem.

HK: Em todos os setores as comunidades criam formas por fora do capitalismo. Cooperativas de produção, agricultura ecológica, moedas alternativas, energias renováveis. Há milhares de experiências que podem se ligar em uma rede.

TERRAMÉRICA: Ou seja, não imagina uma transformação violenta.

HK: Por definição, a ecologia política imagina um mundo não violento. Os ecologistas não querem violência, querem outras regras de jogo. Não se pode usar meios contrários ao objetivo que se busca.

* A autora é corresponde da IPS.

LINKS

Decréscimo ou desconstrução da economia – Parte I

Do decrescimento à desconstrução da economia – Parte II

Ativistas europeus contra a expansão mercantil

O capitalismo pode ser verde?

Mudança climática: a esperança das vuvuzelas

Uma aposta no negócio limpo

Diálogos – As entrevistas do Terramérica

Em busca do adiado desenvolvimento sustentável

Clima: Cada vez mais quente – Cobertura especial da IPS, em espanhol

Livros de Hervé Kempf editados pela editorial Capital Intelectual, em espanhol

Primeiras 20 páginas do último livro do autor, em francês

17 Conferência das Partes da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática, em inglês

Río+20: Conferência das Nações Unidas sobre desenvolvimento sustentável, em inglês

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FONTE : Artigo produzido para o Terramérica, projeto de comunicação dos Programas das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e para o Desenvolvimento (Pnud), realizado pela Inter Press Service (IPS) e distribuído pela Agência Envolverde.
(Terramérica).

Em Outubro a Terra terá 7 bilhões de pessoas

Já está circulando a revista ECO 21 de setembro de 2011. Uma das principais publicações sobre meio ambiente e sustentabilidade no Brasil, a ECO 21 deste mês traz excelentes textos. Veja abaixo do editorial o índice da edição.

Editorial

No final do próximo mês de Outubro, o nosso Planeta albergará 7 bilhões de pessoas. Foi em 1804 que a humanidade atingiu um bilhão. 123 anos depois, chegamos aos 2 bilhões; 45 anos após, éramos 5 bilhões e agora; passados mais 24 anos, receberemos o 7 bilionésimo cidadão da Terra. O ritmo atual de crescimento populacional adiciona em média quase 80 milhões de pessoas por ano, o que significa o número de habitantes somados do Canadá, Austrália, Grécia e Portugal. Esse ritmo de crescimento registra que 97 de cada 100 crianças que nascem no mundo se localizam nos países em desenvolvimento. Esse fator fez com que a população mundial que sofre de fome absoluta aumentará para 925 milhões neste mês.

Uma enorme quantidade de famílias gasta mais da metade dos seus salários somente em alimentação; desde Junho de 2010, mais de 44 milhões de pessoas vivem abaixo da linha de pobreza com quase dois reais por dia devido ao aumento no preço dos alimentos. As mulheres realizam aproximadamente dois terços do trabalho e produzem metade da comida, mas recebem somente 10% dos ingressos mundiais e possuem apenas 1% das propriedades. Mais de 350 mil mulheres (uma a cada 90 segundos) morrem devido a complicações no parto; 99% delas acontecem nos países em desenvolvimento.

Hoje a mão de obra soma, no mundo todo, 620 milhões de jovens; 15% deles estavam desempregados em 2010, o pior número na história. O maior desafio que os governos encontram hoje é o de satisfazer as necessidades dos 7 bilhões de pessoas que habitam a Terra e pensar em soluções para os milhões que virão, protegendo ao mesmo tempo o complexo equilíbrio da natureza, que é a base da vida. A demanda de água, comida e combustíveis aumentará à medida que cresça a população mundial. O homem já alterou o clima do Planeta e a falta de água e terras férteis transformou-se num problema; ao mesmo tempo, a perda de espécies da fauna e flora continua ameaçando o equilíbrio biológico. Nosso futuro coletivo depende da redução dos Gases de Efeito Estufa, da redução do consumo excessivo e de uma maior justiça social. Se não forem tomadas essas medidas, estaremos tão ameaçados de extinção quanto os morcegos que celebram, sem festa, neste 2011, o seu ano internacional de salvação.

Índice

4 Liszt Vieira – O que esperar da RIO+20

6 Cândido Grzybowski – RIO+20: não deixemos passar a hora!

8 João Peres – Ignacy Sachs defende ação dos emergentes na RIO+20

9 José Eli da Veiga – A RIO+20 conseguirá obter bons resultados?

10 José Domingo Guariglia – Entrevista com Michael Renner

12 Marina Grossi – Visão Tropical

14 Jaime Gesisky – Empresas agregam a biodiversidade aos produtos

16 Margi Moss – O projeto Rios Voadores voa de balão na Amazônia

18 Gérard Moss – Flutuando sobre a floresta

20 Marcelo Basso – Pesquisadores estudam CO2 dos rios da Amazônia

21 Valiya Hamza – Descoberto rio subterrâneo sob o Rio Amazonas

22 Felício Pontes – Belo Monte: o Pará colônia

24 Luis Morango – Evo Morales X Amazônia

28 Jorge Eduardo D. de Oliveira – Nova espécie de macaco é encontrada

30 Mercia Ribeiro – Sistema avaliará efeito de mudanças climáticas no mar

32 José Goldemberg – Código Florestal: o que a ciência tem a dizer

34 Fritz Vorholz – A energia do futuro

36 Júlio Ottoboni – O escurecimento global poderá mascarar o aquecimento

39 Daniel Jordano – Frutas da Amazônia podem auxiliar na redução de peso

40 Murilo Gitel – Entrevista com Silvério da Costa

42 Laerte Scanavaca Júnior – O valor da arborização urbana

44 Felipe Sodré – A Revolução Geoespacial e a conservação ambiental

46 Nanci Benigni Giugno – Saneamento para todos é possível

48 Ana Huara – O som sustentável do Rock in Rio 2011

50 Leonardo Boff – A Terra ao se defender faz diminuir o crescimento

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FONTE : Revista ECO 21

Pesquisa indica que respirar a fumaça expelida por carros e outros veículos pode levar a um ataque cardíaco

Fumaça de carro pode levar a ataque cardíaco, diz estudo – O risco de um ataque do coração é maior no período de cerca de seis horas depois que a pessoa é exposta à fumaça, para em seguida diminuir, segundo os cientistas. Reportagem de Michelle Roberts, da BBC News.

“Este estudo em larga escala mostra de forma conclusiva que o risco de se ter um ataque do coração aumenta temporariamente, (sendo) em níveis mais altos (de risco) cerca de seis horas depois de se respirar a fumaça de veículos”, afirmou o professor Jeremy Pearson, diretor-médico da British Heart Foundation, que ajudou a financiar o estudo que teve participação da Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres.

“Sabemos que a poluição pode causar problemas para a saúde do coração, possivelmente porque ‘engrossa’ o sangue e aumenta a possibilidade de coágulos.”

O estudo, publicado na revista especializada British Medical Journal, afirma que a poluição provavelmente acelera o ataque cardíaco ao invés de causar diretamente o ataque.

Mas, segundo os pesquisadores, a exposição repetida à poluição faz mal à saúde, diminuindo de forma significativa a expectativa de vida.

“Nosso conselho aos pacientes ainda é o mesmo, se você foi diagnosticado com problemas cardíacos, tente evitar passar períodos mais longos em áreas onde há maior possibilidade de níveis altos de poluição ou perto de ruas movimentadas”, acrescentou Pearson.

Pacientes

A pesquisa britânica examinou os registros médicos de quase 80 mil pacientes que tinham sofrido ataques cardíacos na Inglaterra e País de Gales. Os cientistas então cruzaram estes dados com as informações sobre poluição do ar.

Isto permitiu que os pesquisadores comparassem os níveis de poluição do ar com os sintomas de ataque do coração para tentar encontrar alguma ligação.

Os dados comparados indicavam que os níveis mais altos de poluição do ar estavam relacionados com o início de um ataque cardíaco seis horas depois da exposição à fumaça. Depois deste prazo, o risco caiu novamente.

Krishnan Bhaskaran, da Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres, que liderou a pesquisa, afirmou que as descobertas sugerem que a poluição não é um dos fatores que mais contribuem para a ocorrência de ataques cardíacos.

O pesquisador cita como exemplo o fato de que ser exposto a níveis médios de poluição, ao invés de níveis baixos, aumenta o risco de um ataque cardíaco em 5%, de acordo com seus cálculos.

“Estes eventos cardíacos teriam acontecido de qualquer jeito”, afirmou.

No entanto, Bhaskaran afirmou que as descobertas não mudam o fato de que a exposição crônica à poluição do ar é prejudicial à saúde.

“Dietas pesadas, fumo etc, representam um risco muito maior para ataques cardíacos, mas a poluição vinda dos carros é a cobertura do bolo”, disse Jeremy Pearson, da British Heart Foundation

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FONTE : EcoDebate, 27/09/2011

Arte urbana, caminhada e visão social - Ellen Augusta Valer de Freitas

No dia do rádio, 25 de setembro, participamos da Primeira Caminhada com Visão Social, realizada pelo Instituto Visão Social, que tem um programa de mesmo nome na Rádio da Ufrgs. Estávamos junto com tantos grupos que assim como nós, lutam por mais justiça neste mundo.
Éramos o único grupo representando os direitos animais, mas fizemos nossa presença valer a pena e lembramos a todos que a exploração animal está intimamente ligada a problemas como exploração infantil, exploração do trabalhador, divisão de lucros, outras formas de violência e muito mais. Gostaria de ter visto outros grupos como os de proteção animal, por exemplo, engajados nesta caminhada e em eventos semelhantes, para que o movimento tenha maior visibilidade.
Recentemente saiu na Revista IHU da Unisinos uma matéria sobre as terríveis condições de trabalho nos frigoríficos, revelando que a exploração pode atingir níveis absurdos em nome do lucro e da gula.
Nosso grupo foi representando também o grupo Chicote Nunca Mais, que faz um trabalho nobre e árduo salvando e aposentando cavalos de carroça. Estes que vivem o inferno aqui na Terra. O grupo, liderado pela Fair Soares, recolhe e encaminha cavalos para adoção e acompanha ativamente a implantação da Lei que proíbe carroças em Porto Alegre.
Levamos um banner com a foto de um cavalo que foi vítima de violência e a frase “gaúcho, gaúcho! Companheiro, amigo, onde estás que não ouves meus pedidos de socorro?!?”.

E por falar em gaúcho, a caminhada ocorreu ao lado do que sobrou do ‘Acampamento Farroupilha’, um monte de lixo, muita lama, restos de materiais, e fogo. Curiosamente havia uma campanha a favor da preservação do ambiente, no mesmo local onde se colocava fogo.
Bem próximo está a vila Chocolatão, onde vivem em situação de miséria muitas pessoas, que usam cavalos e carroça para transportar o lixo. Eu visitei a vila com uma amiga para fazer doações, há alguns anos atrás. Entrei na casa de uma senhora que apanhava do marido e tinha problemas físicos em decorrência disso. Lembro que fiquei com medo, mas nos receberam com humildade. Muitos não tem onde cozinhar, nem o que cozinhar. E que na casa do líder comunitário havia uma TV de plasma ou algo do tipo. Foram minhas impressões da época.
Enquanto o meu e o seu dinheiro, o dinheiro público, é utilizado para uma festa regada a cerveja, capeta, matança de animais, violência, (com direito até a ‘educação’ para as crianças sobre os direitos animais, através de uma ‘fazendinha’ lá dentro no meio da matança para o churrasco) a situação da vila continua a mesma, e a Lei que proíbe as carroças caminha a passos lentos para ser efetivamente implantada. A Lei prevê que estas pessoas tenham uma atividade melhor, sem trabalho infantil, sem jornadas longas e sem as infrações no trânsito cometidas por carroças, que colocam em risco a vida de todos. A Lei também prevê a aposentadoria dos cavalos. O que a Fair desde já está realizando, com minha admiração plena!
Adeli Sell escreveu “Só entra no Acampamento quem se dobrar à ditadura dos dirigentes(…) Hoje, o que manda no acampamento é o dinheiro, aqueles que pagam e que se submetem.”
Eu não pertenço a esta ‘tradição’ inventada, mas tenho que sustentar a festa que começa bem antes, na Expointer.
A caminhada nos deu um pouco mais de esperança, mais do que já temos, pois quem é ativista de verdade, tem esperança de ver a cada dia algo acontecer em favor dos animais.
Mesmo uma pequena conquista esperamos todos os dias, pois é tolice acreditar que a libertação animal vai acontecer já, como muitos se iludem e anulam sua atitude pensando assim.
Junto ao Gasômetro, onde foi realizada a caminhada, haviam exposições da Bienal do Mercosul e iniciei minhas visitas às obras de arte que tanto me encantam. O tema desta bienal é ‘Ensaios de Geopoética’. Mostrando visões da cidade esquecidas, a cidade não vista, como estava escrito em uma das obras.
Os ambientes urbanos são palco para obras de arte, tímidas e belas que insisto em fotografar todas as vezes que faço minhas caminhadas pela cidade. Uma das obras era a visão do aeromóvel, criação nossa, mas que nunca saiu daquele pequeno espaço. Nunca foi usado pelo povo. Pessoas do mundo inteiro vem aqui para comprar a idéia e usá-las em seus países. Aqui ele fica esquecido. Assim como os cavalos que nós ativistas vemos todos os dias no asfalto quente, com problemas estruturais, dores e outras mil mazelas que para a maioria passa despercebida. Será que a bienal irá mostrar o lado esquecido dos animais abandonados, do lixo, dos cavalos de carroça e tantas outras facetas urbanas? Claro que da arte podemos esperar tudo, ou nada. Mas minhas próximas visitas mostrarão lados esquecidos da cidade, e eu insisto em lembrar sempre dos cavalos esquecidos por grande parte da população, não por alguns, que sofrem em imagens impossíveis de se ver.

Para ajudar a Chicote Nunca Mais entre no site http://chicotenuncamais.org/

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FONTE : Ellen Augusta Valer de Freitas é licenciada em Biologia pela Unisinos, RS. Foi bolsista de Iniciação Científica pelo CNPq no Instituto Anchietano de Pesquisas, tem experiência na área de Ecologia com ênfase em Zooarqueologia. Trabalha para uma ONG nacional em pesquisa de produtos, é articulista da Agência de Notícias dos Direitos Animais, fundadora do grupo ativista Vanguarda Abolicionista. Atualmente é professora de ecologia ministrando uma cadeira de meio ambiente. Tem 30 anos, é vegana e ativista pelos direitos animais, casada com um jornalista também vegano e ativista. Este artigo também foi publicado na ANDA – Agência de notícias de direitos animais http://www.anda.jor.br.

segunda-feira, 26 de setembro de 2011

OMS alerta para o que chama de ‘a globalização de um estilo de vida não saudável’

Milhões de vidas podem ser salvas por ano. É o que a ONU diz que poderia ser alcançado se os governos se comprometessem a adotar simples iniciativas preventivas de doenças não transmissíveis, como as doenças cardiovasculares e respiratórias, o diabetes ou o câncer. Elas causam, entre todas, 63% dos 58 milhões de mortes que ocorrem por ano no mundo, segundo dados apresentados pela Organização Mundial de Saúde (OMS) na cúpula temática que a ONU realiza desde quarta-feira (21), coincidindo com a presença dos chefes de Estado e de governo que participam da Assembleia Geral. Nos EUA e na Espanha essa proporção é de nove em cada dez. Reportagem de Sandro Pozzi, em El País.

Só o câncer mata 7,6 milhões de pessoas por ano. Como indica a ONU, é mais que a Aids, a malária e a tuberculose juntos. A estas somam-se 17 milhões que morrem de infartos ou outras doenças cardíacas, e 1,3 milhão por causa do diabetes. Outro dado: 9 milhões de pessoas morrem por uma doença não contagiosa antes de chegar aos 60 anos.

Mas como indicam nesse organismo, são as doenças infecciosas, muito menos frequentes, as que recebem atenção. A princesa jordaniana Dina Mired, que interveio em nome da sociedade civil, salientou que ao falar das doenças crônicas se comete uma “injustiça de rotulagem”. “Não afetam só as sociedades ricas”, por isso ela crê que devem ser reconhecidas como “epidemia, e não um desafio”.

A reunião de alto nível pretende de fato servir para evidenciar um problema crescente nos países em desenvolvimento devido ao consumo de tabaco, o sedentarismo e a obesidade. “É uma situação de emergência em câmera lenta”, advertiu o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, em seu apelo à colaboração, incluindo a indústria farmacêutica.

Como disse Ban, desta vez não se trata de combater um vírus ou uma bactéria, mas de atacar os “maus hábitos” das sociedades modernas que podem ser enfrentados com medidas não muito caras e de forma preventiva. As estatísticas, ele indicou, “são alarmantes”. E referiu-se aos 17% de aumento de mortes previstos para a próxima década.

Margaret Chan, diretora-geral da OMS, reiterou que essa primeira reunião “deve ser um chamado de atenção” para os governos. “Sabemos o que se aproxima”, disse. “A ignorância e a inércia devem ser relevadas por ações concretas sem demora”, para combater o que qualificou como “a globalização de um estilo de vida não saudável”. “A obesidade mostra que algo vai mal.”

Uma simples mudança de estilo de vida, acrescentam os especialistas, é suficiente para reduzir significativamente o risco. Segundo a OMS, é possível salvar 30 milhões de vidas em uma década apenas reduzindo o consumo de tabaco e de sal, ou com tratamentos preventivos. Mas é no acesso aos medicamentos que o debate se torna intenso.

“Felizmente pude viajar para salvar meu filho com leucemia”, disse a princesa diante do plenário. “A grande maioria não pode”, ressaltou, dizendo ao fórum que “a disparidade de tratamento é inaceitável. Não é só uma questão de escolha ou preferência de estilo de vida. Trata-se de fornecer medicamentos essenciais aos que necessitam já.”

Os tratamentos, reiterou Ban, devem ser acessíveis. Por isso fez um apelo à indústria para que se envolva mais. Um setor em que as farmacêuticas chinesas e indianas começam a entrar no comércio global, com cópias genéricas mais baratas que podem travar a batalha com as farmacêuticas ocidentais e os dirigentes dos países ricos.

O governo de Barack Obama, segundo revela “The New York Times”, tenta frear os esforços dos países pobres para alcançar um acordo internacional que lhes permita importar esses medicamentos sem restrições. O argumento de Washington é que não são tão urgentes quanto a epidemia de Aids e devem-se principalmente a um estilo de vida.

A declaração política pactuada na ONU, de fato, não faz referência a essa questão. E, embora tente galvanizar a ação dos governos nos próximos anos, evita estabelecer objetivos e não cria um fundo para financiar iniciativas, como se fez para combater a Aids ou a malária. Também não está claro como o setor privado poderá se envolver, diante do clima econômico adverso.

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FONTE : (Tradução: Luiz Roberto Mendes Gonçalves). (Reportagem de El País, no UOL Notícias). (EcoDebate, 26/09/2011).

EUA dizem adeus às suas represas: ‘São caras e nocivas ao ambiente’

Símbolo obsoleto do século XX: só resistirão as eficientes. Foram destruídas 925 represas, muitas nos últimos anos. Ressuscita o negócio da pesca e do turismo.

A reportagem é de Federico Rampini, publicada no jornal La Repubblica, 18-09-2011. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

A tribo Klallam está em festa há uma semana por causa da “vingança do salmão selvagem, animal sagrado”. O ponto culminante das celebrações foi a grande explosão de dinamite que pulverizou ontem, em uma nuvem de detritos, a barragem de Lower Elwha, um rio no Estado de Washington. “A retomada do curso natural – declarou o ministro do Interior, Ken Salazar – assinala o início de uma nova era nas relações entre os nossos rios e as comunidades que vivem em suas margens”.

A barragem de Lower Elwha, uma muralha de 35 metros de altura, é apenas a última a cair sob os golpes de uma nova tendência, que está apagando da paisagem norte-americana uma das marcas distintivas do século XX.

A demolição das barragens tem sido invocada há muito tempo pelos ambientalistas, que as consideram um estupro da paisagem. O aliado natural nessa campanha são os índios dos EUA, descendentes de tribos indígenas que preservaram tradições ancestrais de respeito pela natureza. Mais recentemente, os cientistas especialistas em climatologia, geografia e geologia se uniram a uma tese “revisionista”: longe de regular os rios, as barragens, muitas vezes acentuam as enchentes e as inundações, enquanto um retorno ao fluxo natural permite que se reduzam as calamidades. Até mesmo a direita acabou inclinando, por uma razão prosaica: manter as represas custa caro, em uma fase de altos déficits públicos, enquanto destruí-las significa ressuscitar o negócio da pesca e do turismo.

Resultado: os EUA demoliram 925 barragens, a maior parte delas nos últimos quatro anos. Um número já enorme, mas que tende a aumentar rapidamente, porque o total das barragens dos EUA gira em torno das 80 mil. A maioria delas foi construída há mais de meio século e estão se aproximando da sua “data de validade” de acordo com as normas de segurança.

A inversão de tendência é impressionante, porque as barragens eram um símbolo da “conquista do território” por parte dos colonos brancos, e, no século XX, um motor de modernização: das fábricas têxteis às fábricas de papel no início do século XX, muitas áreas da Costa Leste e do Centro-Oeste viram florescer o seu primeiro boom industrial justamente ao longo dos rios e perto das represas que geravam a eletricidade. Até a Segunda Guerra Mundial, as centrais hidrelétricas alimentadas por barragens forneceram 40% de toda a energia dos EUA.

O impulso mais vigoroso à construção das represas ocorreu na Grande Depressão, precisamente aquele período histórico que hoje os norte-americanos “redescobrem” para o seu próprio prejuízo, por causa das analogias com a crise atual. Para arrastar a economia dos EUA para fora da Depressão, nos anos 1930, o presidente Franklin Delano Roosevelt lançou com o New Deal um imponente programa de obras públicas. As barragens estavam em primeiro lugar entre as infraestruturas construídas nesse período e algumas delas entraram para a história.

Esse é o caso da Hoover Dam (foto), no Black Canyon do rio Colorado, 40 quilômetros ao sul de Las Vegas: foi inaugurada no dia 30 de setembro de 1935 por Roosevelt, que teve a elegância de dedicá-la ao seu infeliz antecessor (porque os fundos haviam sido alocados quando o presidente era Herbert Hoover, o do crack da bolsa de 1929). Na paisagem espetacular ao longo da estrada US-93, a Hoover Dam havia sido uma atração turística até hoje.

Ainda mais importante foi a experiência da Tennessee Valley Authority, instituída em 1933 para ajudar uma das áreas mais atingidas pela Depressão: essa entidade pública construiu 50 barragens e 12 centrais hidrelétricas, tornou-se um modelo de planejamento estatal do território, copiado depois da Segunda Guerra Mundial em muitos países emergentes.

Pode surpreender a marcha a ré de hoje justamente quando a energia hidrelétrica permite reduzir as emissões de dióxido de carbono. Na verdade, a National Hyrdopower Association aumentará em 66% a produção de energia nos próximos 15 anos, concentrando-a nas grandes barragens mais novas e mais eficientes. Já agora, grande parte da hidroenergia vem de 3% das barragens. Quanto às outras, elas podem seguir o destino de Elhwa Dam e restituir a água aos seus proprietários. “Antigamente, nos chamavam de povo salmão”, diz Robert Elofson, da tribo Klallam, “porque para nós o peixe tinha uma mesma dignidade que a espécie humana. Neste rio, os salmões caíram de 400 mil para 3 mil. Agora, eles podem reconquistá-lo”.

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FONTE : (Ecodebate, 26/09/2011) publicado pela IHU On-line, parceiro estratégico do EcoDebate na socialização da informação. [IHU On-line é publicada pelo Instituto Humanitas Unisinos - IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.

Diálogo com um surdo no meio da floresta, artigo de Washington Novaes

Há questões muito relevantes no Brasil em que, na aparência, ocorre um diálogo entre governo e sociedade; na prática, entretanto, os governantes parecem absolutamente surdos ao que dizem cientistas e cidadãos; só ouvem os que estão do lado oposto. E esse é – entre outros – o caso da gestão “sustentável” de florestas públicas por empreendimentos privados.

Ainda há poucos dias, o jornal Folha de S.Paulo (4/9) divulgou estudo da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) mostrando que o manejo de florestas nativas é, ao menos do ponto de vista econômico, “insustentável”, pois não permite a regeneração das árvores mais valiosas e tende à perda da rentabilidade após o primeiro corte para comercialização. Imagine-se, então, o que acontece em termos de sustentação da biodiversidade e da manutenção da floresta. Uma questão tão grave que, segundo o estudo, “pode fazer fracassar a política federal de concessão de florestas”. O caso estudado é em Paragominas (PA), região onde o autor destas linhas esteve há uma década acompanhando um desses projetos e concluiu que de sustentável nada tinha; algum tempo depois ele foi embargado pelo Ibama porque retirava sete vezes mais madeira do que lhe era permitido.

Pois exatamente poucos dias depois de divulgado esse estudo da Esalq o Ministério do Meio Ambiente (MMA) anunciava (9/9) que “dez florestas nacionais integram a lista de florestas públicas que poderão ser concedidas em 2012, segundo o Plano Anual de Outorga Florestal”. Ao todo, 4,4 milhões de hectares – ou 44 mil quilômetros quadrados no Pará, em Rondônia e no Acre, equivalentes a mais de dois Estados de Sergipe. E 2,8 milhões de hectares se destinarão à “produção sustentável”. Da qual se espera retirar 1,8 milhão de metros cúbicos de madeira.

É uma política que vem desde a gestão Marina Silva no ministério, contestada por uma legião de conceituados cientistas – mas sem que merecesse discussão alguma. Foi aprovada por proposta do governo ao Congresso em 2006, por escassa maioria – 221 votos a 199. E dava direito a conceder até 50 milhões de hectares, por 40 anos. Imediatamente vieram críticas contundentes, muitas delas já mencionadas em artigos neste espaço. A começar pelas do respeitado professor Aziz Ab’Saber, da USP, para quem se trata de “um crime histórico, uma ameaça de catástrofe”. A seu ver, mais de 40% das terras são públicas e permitiriam “um programa exemplar”. A concessão, no entanto, como seria feita pela proposta aprovada, levaria à exploração intensiva à margem de rodovias e à perda da biodiversidade. Mais ainda: as florestas jamais voltarão ao domínio público após 40 anos. Todos os países que entraram por esse caminho ficaram sem elas.

O professor Rogério Griebel, do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), e o almirante Ibsen Gusmão Câmara argumentaram na mesma direção: é um sistema que dará início a um processo de evolução às avessas, partindo dos exemplares mais fracos (os que restarem após o corte dos melhores). Outro cientista do Inpa, Niso Higuchi, e o escritor Thiago de Mello perguntaram como seria possível falar em manejo sustentável se num único hectare de floresta podem ser encontradas árvores com tempo de maturação de 50 anos, ao lado de outras cujo tempo chega a ser de 1.400 anos. Como selecionar para o corte? Os professores Enéas Salati e Antônia M. Ferreira lembraram que existem muitas Amazônias diferentes, é preciso conhecer todas minuciosamente antes de qualquer decisão. E os professores Deborah Lima (UFMG) e Jorge Pozzobon (Museu Goeldi) acentuaram que os melhores exemplos de sustentabilidade não estão nesses projetos, e sim em áreas indígenas; o manejo “sustentável”, ao contrário, está entre os piores. O agrônomo Ciro F. Siqueira trouxe argumento muito forte: não se deterá o desmatamento enquanto explorar ilegalmente um hectare invadido ou grilado custar menos da metade do que se gasta com um hectare em que se paguem todos os custos. Principalmente porque, como argumentou o ex-ministro José Goldemberg, no Brasil temos um fiscal para cada 100 mil hectares, 27 vezes menos que a média mundial.

Da mesma forma, poderia ser dito que o MMA continua tendo pouco mais de 0,5% do Orçamento federal. Como fará para cuidar de milhões de quilômetros quadrados da Amazônia? “Não temos para onde correr”, limitou-se a dizer na época o diretor do Serviço Florestal Brasileiro (quem quiser conhecer, em toda a sua extensão, os pareceres dos cientistas pode recorrer aos números 53 e 54 da revista do Instituto de Estudos Avançados da USP).

Nesta mesma hora em que se vai avançar pelos mesmos caminhos – com os cientistas dizendo que todos os países que seguiram essa rota perderam suas florestas -, uma notícia deste jornal informa que 60% da madeira amazônica é desperdiçada por ineficiência no beneficiamento – quando o País consome 17 milhões de metros cúbicos anuais, segundo algumas fontes; ou 25 milhões, segundo outras (Envolverde, 20/10/2010). 46% do desmatamento corre por conta da agricultura (Greenpeace, 31/8). E poderão ser muito problemáticos os caminhos oficiais que permitem regularizar terras pagando até R$ 2,99 por hectare, com prazo de 20 anos.

E enquanto a Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência se esgoela inutilmente pedindo um programa de desmatamento zero e forte investimento em ciência na região – para formar cientistas e investir em pesquisas da biodiversidade -, este jornal traz a advertência do Imazon (15/7): o desmatamento vai aumentar até julho de 2012, com 10,5% mais que no período 2009-2010.

Com que cara nos vamos apresentar à Rio+20 no ano que vem, quando a perda de florestas será um dos temas centrais? Como vamos dizer que temos cumprido e cumpriremos metas para a área do clima? Vamos seguir nessa interminável tentativa de diálogo com um surdo?

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FONTE : Washington Novaes é jornalista. Artigo originalmente publicado em O Estado de S.Paulo. EcoDebate, 26/09/2011.

domingo, 25 de setembro de 2011

O futuro da população mundial: a diferença que meio filho faz! artigo de José Eustáquio Diniz Alves

A divisão de população das Nações Unidas (ONU) apresenta 3 cenários para a população mundial em 2100. No cenário mais provável, de fecundidade média, a população chegaria a 10,1 bilhões de habitantes em 2100, no cenário de fecundidade alta a população chegaria a 15,8 bilhões e na hipótese de fecundidade baixa, chegaria a 6,2 bilhões.

Portanto, a população mundial pode variar de 6,2 bilhões a 15,8 bilhões de habitantes no final do século XXI, dependendo do número médio de filhos por mulher. Pode parecer que esta grande diferença populacional ocorra devido a enormes variações nas taxas de fecundidade. Mas a diferença média nas taxas de fecundidade projetadas, nos 3 cenários, é de apenas 0,5 (meio filho) por mulher, acima e abaixo da taxa média.

No quinquênio 2005-10 a taxa de fecundidade total, na média mundial, era de 2,52 filhos por mulher. Se ela continuar em torno deste nível, a população mundial chegaria a 15,8 bilhões de habitantes em 2100. Se a Taxa de Fecundidade Total (TFT) cair gradualmente em apenas meio filho por mulher (para uma TFT de cerca de 2,05 filhos em 2100) então a população chegaria a 10,1 bilhões de habitantes em 2100 ( a taxa de reposição é de 2,1 filhos por mulher). Se a fecundidade cair mais meio filho abaixo da projeção média (para 1,55 filhos por mulher) então a população mundial ficaria em 6,2 bilhões de habitantes, aproximadamente a mesma população do ano 2000. Nesta hipótese, de fecundidade mais baixa, o crescimento populacional seria zero no século XXI.

Estes três cenários mostram que o montante da população mundial em 2100 pode ficar entre um leque de 6,2 bilhões e 15,8 bilhões de habitantes. Tudo vai depender do comportamento das taxas de fecundidade. Uma pequena variação de meio filho por mulher pode fazer o montante da população mundial no final do século XXI ficar abaixo dos atuais 7 bilhões de habitantes de 2011, ou mais do dobro deste número.

Os dados acima sugerem que não existe nenhum determinismo populacional e nem a “demografia é destino”. As taxas de fecundidade no mundo estavam em torno de 5 filhos por mulher, em 1960 e caíram pela metade em 2010, ou seja, de 5 para 2,5 filhos. Basta reduzir mais meio filho (0,5) para que a população mundial se estabilize em torno de 10 bilhões de habitantes em 2100.

Atualmente já existem muitos países com fecundidade em torno de 1,5 filhos por mulher, tais como China, Cuba, Grécia, Rússia, Suíça, Tailândia, etc. Também existem diversos países com fecundidade abaixo de 1,5 filhos por mulher, tais como Cingapura, Coréia do Sul, Espanha, Itália, Japão, Portugal, Taiwan, etc. Todos estes exemplos comprovam que uma grande parte da população mundial já vivencia uma fecundidade bem abaixo do nível de reposição.

Porém, no extremo oposto existem diversos países que possuem taxas de fecundidade acima de 5 filhos por mulher, tais como: Afeganistão, Angola, Congo, Etiópia, Moçambique, Nigéria, Somália, Tanzânia, etc. Se a fecundidade dos países que estão atrasados na transição demográfica cair para algo em torno de 2 ou 2,5 filhos por mulher, provavelmente a fecundidade média mundial vai ficar abaixo do nível de reposição. Se isto se confirmar nas próximas décadas, então a população mundial ficará abaixo de 10 bilhões de habitantes em 2100.

Desta forma, o futuro da população mundial depende fundamentalmente do comportamento da fecundidade de um conjunto de cerca de 30 países que possuem altos níveis de fecundidade atualmente. A literatura demográfica mostra que a fecundidade muito alta prevalece naquelas nações em que a população não têm acesso aos direitos de cidadania e os serviços de saúde sexual e reprodutiva estão longe de serem universais. Neste sub-conjunto de países é alto o percentual de gravidez indesejada. Por isto, políticas que possam ajudar a reduzir o número médio de filhos por família, em geral, contribuem para a redução da pobreza e para criar uma janela de oportunidade no sentido de aumentar o bem-estar da população.

Em termos agregados, o continente europeu já possui fecundidade bem abaixo do nível de reposição e deve ter a sua população diminuindo nas próximas décadas. A Ásia, as Américas e a Oceania possuem atualmente fecundidade em torno de 2,1 filhos por mulher e caminham para uma fecundidade abaixo do nível de reposição nas próximas décadas.

Já o continente africano, no conjunto, possuia fecundidade em torno de 4 filhos por mulher em 2010, sendo que o norte da África e a África do Sul já possuem fecundidade abaixo de 3 filhos por mulher. As altas taxas estão concentradas na África ao sul do Saara com fecundidade acima de 5 filhos por mulher.

Alguém poderia pensar que uma queda da fecundidade na África poderia despovar o continente, o que não é verdade. De acordo com a divisão de população da ONU, o continente africano possuia, em 2010, uma população em torno de 1 (um) bilhão de habitantes. Se a fecundidade ficar em torno de 5 filhos por mulher, a África, sozinha, chegaria a 15 bilhões de habitantes em 2100. Se a fecundidade cair para algo em torno de 2,5 filhos até o final do século, a população da África chegaria a 3,5 bilhões de habitantes em 2100. E mesmo se a fecundidade da África cair para menos de 2 filhos por mulher até o final do século, a população africana chegaria a 2,4 bilhões de habitantes em 2100.

Portanto, o maior crescimento populacional no século XXI vai acontecer na África. Mas este crescimento pode ser de “apenas” 1,5 bilhão de habitantes se o número médio de mulheres for caindo progressivamente até algo em torno de 2 filhos por mulher. Como também pode ser muito maior se a fecundidade não cair rapidamente.

Assim, quando se pensa na estabilização da população mundial, apenas uma variação de meio filho (abaixo ou acima da média) na taxa de fecundidade total pode fazer uma grande diferença na população global, em 2100. Nas projeções da ONU, a população pode ficar entre 6,2 bilhões e 15,8 bilhões de habitantes, no final do século XXI. Tudo vai depender do comportamento das taxas de fecundidade e das opções reprodutivas que as famílias fizerem (e forem capazes de fazer), nas próximas décadas.

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FONTE : José Eustáquio Diniz Alves, colunista do EcoDebate, é Doutor em demografia e professor titular do mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE. EcoDebate, 21/09/2011.

Saneamento em loteamentos, artigo de Roberto Naime

Dentre as características da crise do mundo globalizado estão a degradação ambiental, o risco de colapso ecológico e o avanço da desigualdade e da pobreza.

A ausência de sustentabilidade é uma falha fundamental na história da humanidade. A sustentabilidade é um conceito do nosso tempo, do final do sécula XX e da passagem para o terceiro milênio, da transição da modernidade truncada e inacabada para uma pós-modernidade incerta, marcada pela diferença, pela diversidade, pela democracia e pela autonomia (LEFF, 2001).

A crise ambiental tem muitas causas relacionadas, tais como a emissão de gases causadores do efeito estufa, a agro-pecuária extensiva com a diminuição da biodiversidade, os desmatamentos e as queimadas de florestas, a mortandade de animais silvestres e a contaminação de corpos hídricos superficiais e subterrâneos. Estes fenômenos são caracterizados em decorrência do aumento demográfico desordenado acentuado e geram uma diminuição drástica da qualidade ambiental na vida das populações.

A necessidade de morar é um direito individual ganhando uma dimensão jurídica em função do abrigo constitucional que é dado a este princípio. É uma necessidade básica para a sobrevivência humana, principalmente nas regiões frias do sul do país, onde a habitação é sua proteção física contra os efeitos climáticos acentuados. Podemos dizer que é também o refúgio do ser humano e de sua família, onde busca o conforto e a introspecção afetiva, necessidade básica para uma vida sadia e digna.

O uso e ocupação irregular dos terrenos é problema típico de cidades que conheceram um crescimento súbito da população motivado pela industrialização, pelo êxodo rural, pela migração e pela explosão demográfica. A demanda por moradias nunca foi atendida por uma oferta proporcional. O rápido crescimento da população urbana agravou o quadro de déficit habitacional.

Considerando apenas os 51 anos entre 1940 a 1991, a população urbana do Brasil cresceu de 12.880.182 para 110.875.826 de habitantes. As cidades brasileiras não estavam preparadas para receber subitamente tamanho acréscimo populacional. Não houve e podemos afirmar que de certa forma continua inexistindo planejamento ou política habitacional sistematizada e permanente em nossas cidades. Somente este mecanismo poderia suprir a imensa demanda verificada, onde o rápido processo de urbanização tem como contraponto um meio urbano incompleto e imperfeito, pouco favorável à vida humana, sendo mesmo o criador de graves dificuldades para uma elevada percentagem da população.

As favelas, mocambos e cortiços são áreas de densidades demográficas muito elevadas, com a utilização anárquica do meio físico, insuficiência dos serviços urbanos (redes de água, esgoto, luz e telefone), insuficiência nos transportes, dificuldades no setor da instrução, ausência de centros comunitários e de lazer, deficiência nos serviços sociais e de assistência sanitária.

Ainda se agregam a este quadro serviços comerciais e de abastecimento excessivamente caros e ineficazes, caracterizando completa deterioração do meio urbano e se caracterizando como a conseqüência mais visível do processo de crescimento rápido e desordenado que sofreram a maioria das cidades brasileiras (JUNIOR, 2006).

Muitas vezes e feita a distinção entre loteamentos “irregulares” e loteamentos “clandestinos”. Os primeiros seriam aqueles que iniciaram algum processo administrativo de regularização ou licenciamento e por algum motivo não foram executados completamente ou foram executados fora dos critérios aprovados. Na prática ambos são ocupações desordenadas.

Nos dois casos os moradores não são proprietários de seus terrenos, mesmo quando o loteador é o proprietário da gleba original. Isso ocorre porque a regularidade urbanística do empreendimento é sempre uma condição para seu registro em cartório, momento em que são individualizados os lotes, mediante abertura das respectivas matrículas. Antes do registro, os lotes ainda não existem juridicamente e, portanto não constituem objeto suscetível de ser alienado.

A desarticulação do sistema viário dificulta o acesso de ônibus, ambulâncias, viaturas policiais e caminhões de coleta de lixo. Os bairros são formados mesmo estando sujeitos a ocorrências de erosão e alagamentos. Com frequência ocorre assoreamento dos rios, lagos e mares e ausência de espaços públicos para implantação de equipamentos de saúde, educação, lazer e segurança.

A energia elétrica é comprometida, resultando em riscos de acidentes e incêndios. Ocorre ainda expansão horizontal excessiva da malha urbana, ocasionando elevados ônus para o orçamento público (PINTO, 2006).

A falta de desta infra-estrutura básica resulta na falta de saneamento básico que hoje é um dos mais importantes aspectos da saúde pública mundial. Estima-se que 80% das doenças e mais de 1/3 da taxa de mortalidade em todo o mundo decorram da má qualidade da água utilizada pela população ou falta de esgotamento sanitário adequado. E isto ocorre de forma relevante nas ocupações desordenadas que constituem realidade expressiva e relevante no pais.

Ocorrem patologias como hepatite A, dengue, cólera, diarréia, leptospirose, febre tifóide e paratifóide, esquistossomose, infecções intestinais, entre outras, que afetam particularmente crianças de até 5 (cinco) anos. São conhecidas no meio médico, cruelmente, como “doenças de pobre” ou “doenças do subdesenvolvimento”. No Brasil, estima-se que quase 24% da população não têm acesso à água tratada, isto sem contar as áreas rurais da região norte (BARROSO, 2002).

Segundo Moraes e Jordão (2002) a cada 14 segundos morre uma criança no mundo vítima de doenças derivadas de veiculação hídrica, indicando os esgotos e excrementos humanos como a causa principal, devido a contaminação de águas de poços superficiais. Outras causas seriam as contaminações por excrementos bovinos e suínos e efluentes agrícolas e industriais. Um dos fatores principais para tais ocorrências é que a água é um meio de sobrevivência para diversos agentes biológicos que causam infecções que, assim, se disseminam a longas distâncias.

Não existe infra-estrutura como abastecimento de água potável e tratamento com disposição adequada de esgotos sanitários domiciliares. O suprimento de água com frequência é feito por poços rasos que acabam também contaminados e constituem importante fonte de disseminação de doenças e redução de qualidade de vida das populações.

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FONTE : Dr. Roberto Naime, colunista do EcoDebate, é Doutor em Geologia Ambiental. Integrante do corpo Docente do Mestrado e Doutorado em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale. EcoDebate, 19/09/2011

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sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Entidades se unem para tentar limpar o Rio Sapucaí, em Itajubá,sul de Minas Gerais

OBS - O escoteiro entrevistado na reportagem é meu neto mineiro, TIAGO PIZARRO BONANNI, que auxiliou na limpeza do rio Sapucai. (James Pizarro).
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Imazon: Desmatamento na Amazônia quase triplicou em agosto

Imazon registra aumento de 15% no desmatamento na Amazônia em agosto – Satélites mostram que o avanço da destruição das florestas na Amazônia atingiu, em agosto, uma área quase três vezes maior que a área desmatada em julho. No mês passado, a região perdeu 240 quilômetros quadrados de vegetação nativa. Metade dos novos desmatamentos ocorreu no Pará

O Instituto do Homem e do Meio Ambiente na Amazônia (Imazon) registrou avanço do desmatamento na Amazônia em agosto. Em um mês, os satélites usados pelo instituto para fazer a avaliação identificaram 240 quilômetros quadrados (km²) de novos desmates. A área desmatada no mês passado é 158% maior que a registrada pelo Imazon em julho, quando a floresta perdeu 93 km². Em relação a agosto de 2010, o índice de aumento ficou em 15%.

As novas derrubadas estão concentradas no Pará, responsável por 49% de todo o desmatamento do bioma em agosto, com 119 km² de florestas a menos. Rondônia desmatou 46 km² no período. Mato Grosso foi responsável por 35 km² de área desmatada e o Amazonas, por 23 km². No Acre, foram derrubados 10 km² de floresta e Roraima e o Tocantins foram responsáveis por 6 km² e 1 km² de novos desmates, respectivamente.

Além do corte raso (desmatamento total), o levantamento do Imazon mede a degradação florestal, que considera florestas intensamente exploradas por atividade madeireira ou atingidas por queimadas. Em agosto, a degradação avançou sobre 131 km² de áreas de floresta. Em relação a agosto de 2010, quando a degradação atingiu 1,5 mil km², houve redução de 92%, principalmente no Pará, em Mato Grosso e em Rondônia.

O Imazon estima que os 240 km² desmatados em agosto provocaram a emissão de 13,6 milhões de toneladas de dióxido de carbono equivalente – medida que considera todos os gases de efeito estufa.

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FONTE : reportagem de Luana Lourenço, da Agência Brasil, publicada pelo EcoDebate, 23/09/2011.

quinta-feira, 22 de setembro de 2011

‘A política ambiental não passa de retórica para enganar incautos’. Entrevista com Ivo Poletto

Ao relatar o drama dos atingidos por mudanças climáticas, o assessor Ivo Poletto descreve o seguinte cenário: “as dificuldades aumentam com o passar dos dias. No início, mesmo mal acomodadas, as pessoas se sentem confortadas pela solidariedade. Depois, contudo, quando procuram recuperar o que perderam, buscar lugar mais seguro e reconstruir suas casas, praticamente só contam com alguns apoios vindos de igrejas. Com muita luta, que exige organização, quando conseguem que o Estado assuma sua responsabilidade, as ações são lentas, os recursos anunciados não aparecem, as obras de construção de casas são entregues a empresas sem diálogo com os atingidos”.

Na entrevista que concedeu por e-mail à IHU On-Line, Ivo cita outra grande dificuldade a ser enfrentada por essas famílias, que é “a tendência do setor público de endividar os atingidos, que, em sua quase totalidade, ficaram sem nada”. Ele traz a informação de que “se os estudos e os cenários de futuro forem confirmados, a Amazônia e a Caatinga serão regiões em que, junto com e como consequência da significativa elevação da temperatura, enfrentarão períodos de estiagem e seca mais intensos e prolongados, às vezes seguidas de períodos de enchentes”. E conclui: “o problema é que o que existe de defesa civil está montado exclusivamente para agir depois dos desastres e, ainda assim, com uma visão e metodologias militarizadas”.

Ivo Poletto é assessor de pastorais e movimentos sociais. Trabalhou durante os dois primeiros anos do governo Lula como assessor do Programa Fome Zero e foi o primeiro secretário-executivo da Comissão Pastoral da Terra – CPT. Autor, entre outros, do livro Brasil, oportunidades perdidas: Meus dois anos no governo Lula (Rio de Janeiro: Garamond, 2005), é cientista social e educador popular. Seu site pessoal é www.ivopoletto.blogspot.com.

Confira a entrevista.

IHU On-Line – Que balanço faz do Seminário Nacional de Atingidos por Eventos Climáticos Extremos? Quais foram as principais reivindicações e propostas das famílias atingidas pelas mudanças climáticas?

Ivo Poletto – Comecemos pelo mais importante: as mulheres e os homens que vieram representar suas comunidades atingidas por eventos climáticos extremos surpreenderam em todos os sentidos. Apresentaram com clareza a situação em que se encontram. Revelaram consciência crítica, especialmente em relação às práticas dos representantes das instituições públicas. Elaboram com clareza os desafios presentes em suas vidas. Apresentaram com firmeza propostas de ações imediatas e de criação de políticas públicas adequadas ao tempo atual, em que infelizmente se sabe que eventos climáticos extremos se multiplicarão e serão mais violentos.

Vale a pena tomar conhecimento da Carta do Seminário e do Documento às Autoridades, elaborados, aprovados e assumidos pelos 50 participantes; podem ser acessados no sítio eletrônico. Neles, está claro que exigem atendimento imediato aos seus direitos de habitação e de recuperação das condições de vida; em relação ao futuro, apresentam propostas de políticas públicas, assumidas pelos três níveis de governo, que, em absoluta prioridade, promovam levantamento das áreas de risco em todo o país, implementem ações que evitem a existência de vítimas dos desastres socioambientais, e que, para isso, sejam criadas as mediações organizativas necessárias, assumidas por pessoas capacitadas e que contam com recursos para suas responsabilidades. Estas Comissões e Núcleos Locais de Defesa Civil devem ter autonomia em relação às instâncias de governo e contar sempre com participação da sociedade civil, única forma de garantir a mobilização das comunidades e a transparência no uso dos recursos destinados às ações preventivas e/ou de socorro imediato e de reconstrução das condições de vida das pessoas, famílias e comunidades atingidas.

IHU On-Line – Quais são as maiores dificuldades enfrentadas pelos atingidos por mudanças climáticas?

Ivo Poletto – Os depoimentos deixam mais do que claras três coisas:

1) a solidariedade que ajuda realmente a enfrentar os dramas vividos é aquela praticada pelas pessoas da própria comunidade, reforçada pela prática das pastorais sociais e da Cáritas, que se fazem presentes desde o início dos desastres;

2) a solidariedade que vem de outras regiões do país e do exterior é mais forte no início, mas diminui com a queda de interesse da mídia, que deixa de dar notícias, quase sempre de tipo fantástico;

3) as instituições públicas, com raras exceções, são omissas, só se fazem presentes na base da pressão e tendem a não assumir responsabilidades em relação à reconstrução das condições de vida.

Por isso, as dificuldades aumentam com o passar dos dias. No início, mesmo mal acomodadas, as pessoas se sentem confortadas pela solidariedade. Depois, contudo, quando procuram recuperar o que perderam, buscar lugar mais seguro e reconstruir suas casas, praticamente só contam com alguns apoios vindos de igrejas. Com muita luta, que exige organização, quando conseguem que o Estado assuma sua responsabilidade, as ações são lentas, os recursos anunciados não aparecem, as obras de construção de casas são entregues a empresas sem diálogo com os atingidos. Dando um exemplo: há comunidades de Santa Catarina que, depois de quase três anos, ainda estão sem suas casas; em Alagoas e Pernambuco, as enchentes ocorreram em junho de 2010, e o governo federal, junto com o estadual, está anunciando que entregarão as casas em 2012!

Outra grande dificuldade é a tendência do setor público de endividar os atingidos, que, em sua quase totalidade, ficaram sem nada. Por exemplo, propõem que as casas sejam as do programa Minha Casa, Minha Vida, que, além de minúsculas e em terrenos exíguos, abrem uma dívida para os próximos 20 anos. Em suas reivindicações e propostas, os atingidos deixaram claro que a reconstrução deve ser baseada no direito humano à vida e à dignidade – isto é, uma casa e um terreno que respeitem e garantam a dignidade das pessoas, sem distinções – e não pode implicar em dívidas.

IHU On-Line – Em que regiões do país é possível vislumbrar eventos climáticos extremos? É possível antecipar quais estados serão mais afetados pelas mudanças do clima?

Ivo Poletto – Se os estudos e os cenários de futuro forem confirmados, a Amazônia e a Caatinga serão regiões em que, junto com e como consequência da significativa elevação da temperatura, enfrentarão períodos de estiagem e seca mais intensos e prolongados, às vezes seguidas de períodos de enchentes. Como exemplo, as comunidades ribeirinhas da Amazônia – que estavam representadas no Seminário – sofreram com uma seca surpreendente em 2005, voltaram a sofrer com outra seca ainda mais intensa em 2010, e neste ano, 2011, há localidades em que se anuncia novo período de estiagem. Por outro lado, nada garante que períodos de seca e de enchentes não continuem e até se agravem na região sul, como já é experimentado pelas comunidades rurais e urbanas. Mesmo desejando o contrário, tudo leva a crer que haverá precipitações intensas de chuvas também no Sudeste, e que os problemas da população que vive nas encostas se agravem, especialmente porque, por exemplo, praticamente nada foi feito para recuperar os estragos ecológicos e sociais provocados pela enchente de janeiro de 2011 na região serrana do Rio de Janeiro, e pouco ou nada está sendo feito para adequar as cidades ao ritmo das chuvas do tempo atual. Uma das propostas apresentadas aos governantes insiste que cabe ao setor público utilizar as melhores mediações para prever com antecedência, na medida do possível, que regiões e localidades serão atingidas por um ou outro evento extremo, sempre agindo na prevenção, de preferência, ou criando avisos adequados para evitar perdas, especialmente de vidas humanas.

IHU On-Line – Como o Brasil deve se preparar para lidar com as mudanças climáticas? Há no país algum projeto ou política de enfrentamento das situações de desastre socioambiental?

Ivo Poletto – Foi realizada em 2010 a 1ª Conferência Nacional de Defesa Civil, tendo como objetivos analisar a realidade e elaborar propostas de políticas públicas para o setor. O problema é que o que existe de defesa civil está montado exclusivamente para agir depois dos desastres e, ainda assim, com uma visão e metodologias militarizadas. Isso torna difícil a abertura para acolher propostas de mudanças.

As enchentes da região serrana do Rio de Janeiro foram tão significativas, provocando perda, entre mortos contabilizados e desaparecidos, de mais de 1500 pessoas, que levaram a presidente Dilma a criar, logo depois da visita à região, uma comissão de alto nível para propor linhas de ação e medidas necessárias para uma efetiva e eficaz defesa civil. Esse evento provocou igualmente a criação de uma Comissão na Câmara Federal com o mesmo objetivo. Tudo somado, contudo, não se chegou ainda a uma mudança de rota da prática da defesa civil.

De qualquer maneira, os estados e os municípios que desejarem avançar na direção de uma nova política pública podem criar comissões estaduais e municipais, bem como núcleos locais de defesa civil e dar a eles uma configuração mais cidadã, garantindo participação e mobilização da cidadania na implementação do que seja necessário para prevenir-se e/ou para enfrentar os desastres socioambientais.

Outra proposta dos atingidos reforça uma das conclusões da Conferência Nacional: a criação, em todos os níveis de governo, de um Fundo de Emergências que garanta rapidamente os recursos necessários para ações preventivas e de enfrentamento dos desastres. Isso ainda não existe, e será necessária grande pressão cidadã para que essa urgência venha a ser reconhecida e tornada prioridade entre os múltiplos destinos dos recursos orçamentários.

IHU On-Line – Que políticas públicas são necessárias para dar assistência às populações atingidas?

Ivo Poletto – As pessoas e comunidades atingidas por eventos extremos têm sua vida transtornada: perdem casa, bens, documentos, e, muitas vezes, familiares, parentes, vizinhos e amigos. Por isso a assistência não pode limitar-se ao comer, vestir, dormir, mesmo se isso é necessidade absoluta. Os atingidos precisam, e às vezes em grau mais desafiador, de apoio psicológico. Como insistiram os participantes do Seminário, há pessoas que perdem o rumo da vida, a vontade de viver, a coragem de recomeçar.

A prática tem revelado que o Estado age mal e precariamente em relação ao que se pode definir como necessidade material, e que é praticamente ausente em relação às necessidades psicológicas. E isso em relação a efeitos de eventos climáticos que não foram provocados pelos atingidos, nem mesmo quando estavam com residência em locais de risco, porque isso teve como causa ou a falta de uma política pública de habitação, ou a extrema pobreza, ou, e não em último caso, a falta de fiscalização pública ou a conivência de autoridades que permitiram a construção de residências e outros prédios em locais inadequados e que deviam ser preservados.

IHU On-Line – A política ambiental do governo federal contribui de alguma maneira para enfrentar os eventos climáticos extremos? Ou, pelo contrário, reforça ações que contribuem para agravar o aquecimento global?

Ivo Poletto – Qual é, na realidade, a política ambiental do governo federal? É verdade que foi aprovada, por exemplo, a Lei de Mudanças Climáticas e que está em implantação um Plano Nacional, mas é preciso examinar o que isso significa no conjunto das políticas nacionais. Enquanto a orientação de fundo e determinante de tudo se expressa na aceleração do crescimento de um tipo de economia que exige mais espaços físicos, mais áreas destruídas para construir hidrelétricas, mais extração de minérios para exportação, mais espaços para produzir commodities agropecuárias; enquanto se promove uma economia de livre mercado que concentra, e na velocidade de avião, a riqueza e a renda em poucas mãos, e mantém milhões na pobreza e na miséria, que só melhoram suas condições de vida na velocidade de lesma; enquanto não se percebe que é inadequado e eticamente inaceitável manter esse crescimento em expansão através de maior extração de petróleo e gás do pré-sal, por ser fonte fóssil de energia, contaminadora da atmosfera, provocadora de mais aquecimento… Enquanto este é o caráter do desenvolvimento brasileiro, de que adiantará aprovar leis e elaborar planos para enfrentar as mudanças climáticas?

Deve ser por isso que uma das características das políticas ambientais tem sido a ausência quase total de recursos para implementá-las, e, quando em execução, sua orientação se limita a minimizar os efeitos das atividades que são consideradas geradoras de crescimento econômico. Em outras palavras, até o momento, as políticas ambientais não são em nada prioritárias e, pior, o cuidado com o ambiente geral da vida não se faz presente, de forma transversal, em todas as atividades de produção, transporte, consumo, exportação, mineração… A política ambiental não passa de retórica para enganar incautos.

IHU On-Line – Como vê os casos de corrupção em relação ao desvio de verbas destinadas a ajudar os atingidos pelas mudanças climáticas, como aconteceu recentemente no Rio de Janeiro?

Ivo Poletto – Trata-se de um crime de lesa-humanidade. Atesta que há seres humanos desumanizados em grau máximo. Creio que deve ter sido esse tipo de crime contra a vida que levou os atingidos participantes do Seminário a falar em direito à indignação, e em exigir esse direito sem repressão. Como pode o agente do Estado ter coragem de reprimir quem se vê roubado do mínimo destinado à sua sobrevivência e reage com indignação? Ainda mais se ele não coloca seu cargo a prêmio na denúncia de colegas capazes de desviar recursos públicos destinados à sobrevida de quem perdeu tudo! Deveria, isso sim, responder por conivência com crime da corrupção.

IHU On-Line – Como vê a adesão da sociedade brasileira ao discurso da Justiça Climática? Ele foi incorporado?

Ivo Poletto – Não tenho como avaliar se a Justiça Climática foi ou não incorporada como valor na vida da cidadania brasileira porque não se deu, até o momento, oportunidade para que ela se manifeste. Até agora tudo que se refere à dívida pública e às mudanças climáticas está sendo decidido pelo Congresso e pelo governo sem consultar a cidadania. Pelo que nos revelou levantamento de opinião feito pelo Datafolha, mais de 80% são contrários a qualquer mudança de lei que aumente o desmatamento e afete o meio ambiente. Deve-se a isso, provavelmente, que deputados, senadores e governantes temam e evitem consultar a cidadania através de plebiscito ou referendo para decidir se a soberania popular deseja ou não mudar o Código Florestal segundo a proposta do agronegócio e seus apoiadores, se ela prefere construir a hidrelétrica de Belo Monte e tantas outras ou gerar energia a partir do sol, dos ventos e dos movimentos das águas, que o Brasil possui em abundância.

Estão cada vez mais evidentes os motivos do temor destes brasileiros e brasileiras privilegiados à soberania popular. Mas nós não precisamos aceitar e subordinar-nos à sua vontade covarde e antidemocrática. Podemos, ao contrário, trabalhar pela conquista do direito de autoconvocação da cidadania para exigir referendos e plebiscitos, até mesmo para confirmar ou revogar o poder concedido a cidadãos ou cidadãs que se afastam ou renegam os compromissos que levaram pessoas a confiar a eles e a elas poderes legislativos, executivos ou judiciários. Não estranhem, quando incluo também o Judiciário. Ele deve ou não continuar um poder aparentemente acima da soberania popular, mas constituído através do jogo político partidário? Meu voto é favorável à proposta de que também os juízes sejam eleitos pela cidadania, e que haja algum tipo de comissão, majoritariamente constituída por representantes da sociedade civil, com poder de controle do exercício também deste poder; sem isso, a sociedade continuará perigosamente não democrática.

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FONTE : (Ecodebate, 22/09/2011) publicado pela IHU On-line, parceiro estratégico do EcoDebate na socialização da informação. [IHU On-line é publicada pelo Instituto Humanitas Unisinos - IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]

Uma tal salvação que também não veio dos eucaliptos, artigo de Cíntia Barenho

Já se vão uns sete anos desde que, o grande projeto para superar as décadas de estagnação econômica da Metade Sul – a plantação de monoculturas de eucaliptos – surgiu para tomar “conta do Pampa. Projeto esse que não era somente voltado à produção de eucaliptos, mas também à produção de celulose (derivado do mesmo).

Eram três grandes projetos – da Aracruz, da Stora Enzo (Finlândia) e da Votorantim Celulose e Papel (VCP) – que pretendiam investir cerca de US$ 3,5 bilhões de dólares em sete anos, de forma socialmente responsável e ecológica (até áreas degradadas pretendiam recuperar).

Nos jornais gaúchos imperava a (des)informação comemorando os investimentos, nos quais as manchetes destacavam: “A origem do Outro Verde”, “O futuro à sombra das florestas”, “A metade sul depois das florestas”, “A polêmica Verde”. Num destes, considerado de maior circulação no RS, uma parágrafo fazia a seguinte menção:

“em tempos idos entre 2003 e 2006 nas discussões sobre o futuro da humanidade no Café Aquário, em Pelotas, ou à boca pequena entre as autoridades do Palácio Piratini, se tornou corriqueiro dizer que a metade sul iria virar floresta. Sabia-se que se tratava de uma metáfora, mas ainda havia dúvida sobre seu tamanho. O quanto os investimentos das gigantes da celulose Aracruz, Stora Enso e Votorantim seriam capazes de transformar em investimento ondulante e ralo do pampa gaúcho?Pois agora se sabe: é 4,5%” (ZH,2008)

Já se passaram esses sete anos, os jornais emudeceram, juntamente com os políticos locais, mas nós, ecologistas, questionamos os porquês de tal silêncio. Onde está o progresso trazido pelo deserto verde? Onde está o desenvolvimento, os empregos, as mudanças sociais, a recuperação das áreas degradadas, a preservação e conservação da pampa em unidades de conservação?

De 2009 até os atuais dias, uma tal crise do capitalismo, confirmou o pensamento de Karl Marx, no qual afirmava “…tudo o que é sólido desmancha no ar…” . Sendo assim, a toda poderosa Aracruz foi a incorporada pela VCP, na qual transformou-se em Fibria. Logo após a Borregaard, que virou Riocel, que virou Aracruz, que virou Fibria, foi vendida pra um grupo chileno e tornou-se a Celulose Riograndense da Compañía Manufacturera de Papeles y Cartones (CMPC). Na Metade Sul a Fibria anunciou que pode vender Projeto Losango para reduzir dívida, como afirma a notícia “

A Fibria está estudando a venda de dois ativos considerados não-estratégicos…estamos tentando verificar se (o projeto) Losango tem atratividade para outros usos, como energia e cavaco para exportação”. A faixa de fronteira até agora não foi mudada, inclusive teve PEC arquivada, para tristeza da empresa finlandesa que buscava cumprir a lei, desde que essa mudasse a seu favor.

Assim, nesse dia 21 de setembro – de Luta contra as Monoculturas de Árvores Exóticas- a luta ecológica segue, pois esses investimentos predatórios saíram do Pampa, e encontraram condições favoráveis no Mato Grosso do Sul, Maranhão, na Bahia. O Sul da Bahia segue sendo devastado pelo empresa Veracel Celulose no qual já é detentora de vastas áreas sobre comunidades quilombolas e indígenas. Inclusive as entidades locais estão com abaixo-assinado pedindo a anulação do processo de licenciamento da ampliação da Fábrica e da base florestal daquela empresa. E em outras áreas do mundo, povos e comunidades seguem também mobilizados e denunciando a degradação ecológica advindo da expansão das monoculturas de árvores, como o caso de Moçambique

Enfim, lutar contra essas monoculturas de árvores, no Ano Internacional das Florestas pela Organização das Nações Unidas (ONU), significa lutar pela biodiversidade dos ecossistemas, nos quais as florestas são entendidas como um sistema complexo, na qual as árvores são um dos elementos. Infelizmente a definição de “floresta” usada pela Food and Agriculture Organization (FAO) e o debate acerca do Código Florestal, agora no Senado Federal, nos mobilizados lutando contra um monofuturo.

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FONTE : Cíntia Barenho Mestre em Educação Ambiental, Bióloga e integrante da coordenação do Centro de Estudos Ambientais (CEA-Pelotas/RioGrande RS). EcoDebate, 22/09/2011.

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Desmatamento reduz precipitação nas florestas, diz estudo

O desmatamento é um fenômeno prejudicial não apenas à área em que ocorre, mas também às regiões adjacentes à derrubada de árvores. Pelo menos é o que indica a nova pesquisa de Luis Garcia-Carreras e Doug Parker, da Universidade de Leeds, no Reino Unido. Eles descobriram que áreas florestais convertidas em lavouras no oeste africano causavam uma redução na precipitação dos bosques vizinhos remanescentes.

O estudo, publicado no jornal científico Geophysical Research Letters, se baseou em um modelo de computador usado para simular a precipitação em diferentes condições do uso da terra. A pesquisa sugere que o desmatamento causa uma diferença na temperatura da região, o que por sua vez leva a uma mudança na precipitação.

“A diferença na precipitação é causada pela mudança de temperatura entre a área de cultivo e a floresta, o que produz ventos que convergem sobre a área de cultivo e formam nuvens”, explicou em um release a União de Geofísica dos EUA (AGU), que publica o Geophysical Research Letters.

Por isso, a quantidade de chuvas nas áreas de cultivo acaba aumentando, enquanto as florestas adjacentes ao desmatamento têm sua precipitação reduzida. “A precipitação foi quatro a seis vezes maior em áreas quentes (lavoura) do que em áreas em que nenhum desmatamento ocorreu, enquanto a precipitação nas florestas remanescentes foi de metade ou menos”, declarou a AGU.

Outras análises anteriores já indicavam esta relação entre o desmatamento e a precipitação, mas o experimento de Garcia-Carreras e Parker mostrou as causas desse fenômeno. “Já sabemos pelas observações de satélite que mudanças no uso da terra podem ter um grande impacto nos padrões de tempo locais. Aqui fomos capazes de mostrar por que isso acontece”, afirmou Garcia-Carreras.

O estudo também apontou que diferentes formas de desmatamento têm diferentes impactos sobre a precipitação florestal. “Nossas descobertas sugerem que não é apenas o número de árvores movidas que ameaça a estabilidade das florestas tropicais do mundo. O padrão de desmatamento também é importante”, esclareceu Garcia-Carreras.

O desmatamento em padrão ‘espinha de peixe’, por exemplo, tende a ser menos prejudicial do que ‘corte raso’, porque permite que a floresta acelere seu processo de recuperação, possibilitando a troca de sementes e de algumas espécies de animais entre as áreas florestais remanescentes. O ‘corte raso’, pelo contrário, por devastar grandes superfícies sem deixar áreas remanescentes entre elas, não permite tais trocas.

Apesar de ter sido executado no oeste africano, os cientistas garantiram que os resultados da pesquisa podem ser observados em outras regiões. “Embora nosso estudo tenha se focado apenas em uma pequena região da África, é razoável sugerir que esse mecanismo pode ser comum em outras florestas globais baseado em observações similares de precipitação na Amazônia”, afirmou Parker.

Eles lembraram também que o estudo poderá ajudar a desenvolver formas de desmatamento menos prejudiciais, ou reduzir os impactos do desmatamento. “Isso tem implicações para planejadores em termos de como o desmatamento é conduzido. Se a floresta deve ser removida para criar áreas de cultivo, precisamos pensar quais são as formas e distribuições do desmatamento que serão menos prejudiciais às florestas adjacentes e parques nacionais”.

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FONTE : publicado originalmente no site CarbonoBrasil.