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quinta-feira, 23 de fevereiro de 2023

Yanomami: o que aconteceu com esse povo indígena? | Me Explica

Povo indígena Yanomami recebe médicos para mutirão de tratamentos em saúde

Garimpeiros começam a deixar terra do povo yanomami | CNN PRIME TIME

STF ordena investigação de autoridades do governo Bolsonaro por crise Yanomami

Por ClimaInfo – O ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou na última 2ª feira (30/1) que a Procuradoria-Geral da União e a Superintendência da Polícia Federal em Roraima apurem a possível participação de autoridades do governo do ex-presidente Jair Bolsonaro na crise Yanomami. Entre os crimes que podem ter sido praticados estão genocídio, desobediência, quebra de segredo de Justiça e de delitos ambientais relacionados à vida, à saúde e à segurança de diversas comunidades indígenas. De acordo com Barroso, documentos levantados pela Corte “sugerem um quadro de absoluta insegurança dos Povos Indígenas envolvidos, bem como a ocorrência de ação ou omissão, parcial ou total, por parte de autoridades federais”. Os documentos citados indicam que operações de fiscalização socioambiental que deveriam se manter sigilosas foram divulgadas abertamente pelo governo Bolsonaro, inclusive com publicação no Diário Oficial. Um caso específico foi o de uma operação da Aeronáutica em Jacareacanga (PA), onde houve alterações de última hora no planejamento que resultaram em alerta aos garimpeiros. “Tais fatos e os demais noticiados nos autos ilustram quadro gravíssimo e preocupante, sugestivo de absoluta anomia no trato da matéria, bem como da prática de múltiplos ilícitos, com a participação de altas autoridades federais”, assinalou Barroso. Outra decisão de Barroso aconteceu no âmbito da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 709, na qual ordenou a retirada de todos os garimpos ilegais das Terras Yanomami, Karipuna, Uru-Eu-Wau-Wau, Kayapó, Arariboia, Munduruku e Trincheira Bacajá. Da mesma forma, o ministro do STF também determinou que a PGR apure eventual crime de desobediência em virtude de descumprimento de decisões anteriores da Corte por parte do antigo governo, principalmente no caso Yanomami. Estadão, Folha, JOTA, Metrópoles, O Globo e UOL, entre outros, deram mais informações. Em tempo: O Ministério Público Federal (MPF) instaurou um procedimento para apurar a responsabilidade do Estado brasileiro na crise Yanomami. Os procuradores querem analisar também como as ações e omissões de gestores e políticos podem ter contribuído para a situação atual. De acordo com o MPF, já existe um “vasto acervo de evidências” para a responsabilização imediata do Estado brasileiro. “Tal acervo revela um panorama claro de generalizada desassistência à saúde, sistemático descumprimento de ordens judiciais para repressão a invasores do território indígena e reiteradas ações de agentes estatais aptas a estimular violações à vida e à saúde do povo Yanomami”, descreveu o documento. A notícia é da Folha. #Envolverde

Chacina e resistência: relembre fatos históricos da realidade yanomami

Por Agência Brasil – Impacto do garimpo nas comunidades é denunciado há décadas Na Terra Indígena (TI) Yanomami, de 9,6 milhões de hectares, a forma como o garimpo impacta as comunidades é denunciada há décadas, tanto por lideranças quanto por veículos do jornalismo independente e local. Os yanomami são um povo que constantemente rememora um dos eventos mais marcantes e extremos de violação de direitos, conhecido como Massacre de Haximu. Esse foi o primeiro caso reconhecido pela Justiça brasileira como um crime de genocídio. A chacina ocorreu em agosto de 1993. O conflito começou quando garimpeiros ilegais do Alto Orinoco descumpriram um acordo feito com os yanomami que viviam em uma região montanhosa de fronteira entre o Brasil e a Venezuela. No dia 15 de junho, sete garimpeiros convidaram seis indígenas para caçar e executaram quatro deles durante o percurso. Em retaliação, os yanomami assassinaram um dos garimpeiros. Pouco mais de um mês se passou e, no dia 23 de julho, um grupo de garimpeiros invadiu a aldeia, onde estavam alguns yanomami – a maioria, mulheres e crianças –, e mataram a tiros e golpes de facão 12 yanomami. As vítimas foram um homem, uma mulher, três adolescentes, duas idosas, quatro crianças e um bebê. Em 2022, completaram-se 30 anos da homologação da TI, em meio a problemas ainda sem solução definitiva. Segundo o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), no mês de junho, a comunidade de Xihopi fazia uma celebração para marcar a data, mas também aproveitava a ocasião para compartilhar relatos de episódios de violência causados, ainda hoje, por garimpeiros. Ao todo, estima-se que haja, atualmente, cerca de 20 mil garimpeiros na TI. Oito meses antes, em 13 de outubro de 2021, lideranças da comunidade Macuxi Yano, região do Rio Parima comunicavam à Hutukara Associação Yanomami (HAY) o desaparecimento de duas crianças, de 5 e 7 anos de idade, enquanto brincavam na água, próximo a uma balsa de garimpo. Uma equipe do Corpo de Bombeiros iniciou as buscas imediatamente e, no mesmo dia, encontrou o corpo do menino mais novo. No dia seguinte, a corporação localizou a segunda criança, também sem vida. Em abril de 2022, outra tragédia arrasava o povo yanomami. O luto agora se instalava pela perda de uma menina de 12 anos, estuprada e morta por garimpeiros, na comunidade de Aracaçá, que fica na região Waiakás, estado de Roraima. A região é uma das mais impactadas pelo garimpo. Malária e insegurança alimentar No local, concorrem com a fome, a malária e a contaminação pelo mercúrio. Como resposta, o Ministério da Saúde declarou Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (Espin) e instalou o Centro de Operações de Emergências em Saúde Pública (COE – Yanomami). As ameaças à segurança alimentar, especificamente, já estiveram, inclusive, em outubro de 2019, no radar do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), que alertou para a fome de crianças yanomami. Na época, calculava-se que, entre a parcela aldeada, oito em cada dez crianças menores de 5 anos padeciam de desnutrição crônica, condição que pode comprometer, de modo irreversível, o desenvolvimento mental, motor e cognitivo ou mesmo levar a óbito. Desde que vieram à tona imagens de yanomami desnutridos, debates também foram suscitados, abordando, inclusive, a necessidade de se seguir certo protocolo de divulgação, para se respeitar a memória das vítimas da crise socioambiental que esfacela o território. *Crédito da imagem destacada: Divulgação/Força Aérea Brasileira #Envolverde

Fevereiro Roxo: Médico elenca avanços e desafios para pacientes com a Doença de Alzheimer

Novas formas de diagnóstico e desenvolvimento de medicamentos podem mudar a forma de controle desta doença neurodegenerativa? A Doença de Alzheimer acomete mais de 1 milhão de pessoas no Brasil, segundo o Ministério da Saúde. Neurodegenerativa, a enfermidade é o tipo mais comum de demência, um termo genérico usado pela medicina para identificar doenças cognitivas que acontecem principalmente na terceira idade. “O Alzheimer é cada vez mais incidente na população em razão da maior expectativa de vida, mas envolve estigmas e falta de conhecimento, por isso a importância de desmistificar conceitos”, alerta o Dr. Marcelo Valadares, neurocirurgião funcional do Hospital Israelita Albert Einstein (SP) e médico chefe da área de Neurocirurgia Funcional da Disciplina de Neurocirurgia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Um dos desafios do Alzheimer é entender o que exatamente acontece no cérebro dos pacientes. Acredita-se que ocorra um acúmulo das proteínas Beta-amiloide e da Tau, responsáveis pela inflamação, desorganização e destruição das células do cérebro, principalmente em regiões como o hipocampo e demais áreas do córtex. O que a ciência tem certeza é de que enfermidade se manifesta principalmente a partir dos 65 anos de idade, e leva à perda de funções cognitivas (memória, orientação, atenção e linguagem), mudanças de comportamento e até alterações psiquiátricas, como a depressão e quadros de alucinações. A Doença de Alzheimer progride de forma faseada. Inicialmente, o paciente apresenta sintomas leves que são confundidos contra outras condições, o que leva muitas vezes ao diagnóstico tardio. Num segundo momento, as falhas de memória ficam evidentes. Já, no avançar da enfermidade, há comprometimento importante de inúmeras funções fisiológicas, como a dificuldade de controlar a urina, de deglutir os alimentos além de outras restrições”, esclarece o especialista. Para ajudar a sociedade a compreender a doença, o Dr. Marcelo Valadares elencou fatos sobre o Alzheimer que são essenciais para quem convive com algum conhecido com a enfermidade. Nem toda demência é Alzheimer Segundo o médico, essa é a maior dúvida entre as pessoas: associa-se a demência exclusivamente ao Alzheimer. “Não existe uma doença chamada ‘demência’: quando dizem que alguém tem uma demência, na verdade, ainda não existe um diagnóstico correto”, reitera. A demência é o nome dado ao conjunto de alterações e perdas de memória, inteligência, cognição, raciocínio, capacidade de se comunicar e se relacionar, personalidade e habilidades.”, explica. Como diagnosticar o Alzheimer? Além de análise clínica minuciosa de um neurologista que inclui entrevista com o paciente e cuidador, além de testes cognitivos, existem exames que identificam biomarcadores e os de imagem para o diagnóstico da doença, como a ressonância e a cintilografia de perfusão cerebral. “Um exame cognitivo pode mostrar perdas na habilidade, mas não é determinante para diagnóstico. Para a identificação desta doença, é preciso que exames de imagem sejam solicitados corretamente”, alerta o neurocirurgião. Por que o diagnóstico precoce é importante? Com a identificação precoce do Alzheimer, o médico pode iniciar o tratamento o mais breve possível e empregar recursos para ajudar a estimular a área do cérebro acometida. Embora ainda não seja possível impedir a progressão da enfermidade, o tratamento precoce significa melhorias na qualidade de vida e bem-estar do paciente. E, para tanto, também é essencial o papel do familiar ou das pessoas que convivem com o paciente. Afinal, é o outro que irá identificar as mudanças de comportamento nos idosos. A lista de manifestações desta doença inclui sintomas como perda de memória, mudanças comportamentos e disfunção da linguagem. Algum medicamento cura o Alzheimer? Hoje a doença ainda não tem cura, mas há uma corrida acelerada da indústria em busca de tratamento eficaz. Pesquisas clínicas na área trazem medicamentos que atuam principalmente nas proteínas vistas como causadoras do Alzheimer, mas ainda há um caminho de estudos árduo pela frente. Algumas pesquisas até indicaram redução de perda cognitiva em pacientes analisados, mas também trouxeram efeitos colaterais indesejados e às vezes graves. Mas hoje existem opções que auxiliam no melhor controle desta enfermidade e tratamento multidisciplinar com diferentes profissionais de saúde. O importante é procurar ajuda médica. Site: Dr. Marcelo Valadares Instagram: @drmarcelovaladares Facebook #Envolverde

“Parece um filme de terror que vemos todo ano”, diz climatólogo

Por Observatório do Clima – Tragédia no Litoral Norte paulista expõe atraso em adaptação climática no país; só 7 de 27 capitais têm planos para o setor, e até lei da grilagem já foi computada como medida de adaptação No dia 18 de fevereiro, sábado, o Cemaden (Centro de Monitoramento e Alertas de Desastres Naturais) emitiu um alerta de risco “muito alto” de grandes volumes de chuva para parte do Sudeste, em especial na Baixada Santista e Litoral Norte do estado de São Paulo. “Caso a previsão se concretize, podem ocorrer deslizamentos generalizados nas áreas de risco nos morros litorâneos e na Serra do Mar, taludes de rodovias e mesmo deslizamentos em encostas naturais de alta declividade”, afirmava o boletim. Naquele mesmo dia, a chuva mais intensa já vista no Brasil desde o início da série histórica despencou sobre a região, deixando ao menos 40 mortos. Choveu em poucas horas o equivalente ao dobro da média de fevereiro. Entre Bertioga e São Sebastião, destino preferencial de veraneio dos grã-finos de São Paulo, choveu mais de 600 milímetros, o dobro da média de todo o mês de fevereiro e o triplo do verificado na trágica enchente de 2021 na Alemanha. Além da intensidade, chamou atenção dos climatologistas o fato de que a frente fria que causou a tempestade foi seguida de uma massa de ar frio, algo incomum no verão da América do Sul. Em Buenos Aires, conhecida pelos verões infernais, as temperaturas no fim de semana caíram a invernais 5oC. Os cientistas ainda estão caracterizando o fenômeno. É difícil, sem um estudo de atribuição, responsabilizar o aquecimento global diretamente pelo aguaceiro, mas também é impossível ignorar que ele ocorre num planeta 1,1oC mais quente do que antes da Revolução Industrial. Há décadas os modelos climáticos literalmente desenham para os tomadores de decisão que quiserem ver uma fórmula muito simples: mais gases de efeito estufa na atmosfera equivalem a mais calor, mais evaporação dos oceanos e mais tempestades fortes concentradas em poucos dias. O clima é condição necessária para a tragédia, mas não suficiente. Para uma tempestade incomum virar um desastre humano, as condições meteorológicas anormais precisam se encontrar com ocupações humanas em zonas de risco, como margens de rios e encostas. No caso dos verões brasileiros, desgraçadamente, isso também é previsível. “Parece um filme de terror que vemos todos os anos”, diz o climatologista José Marengo, do Cemaden. Para ficar apenas nos eventos mais recentes: 13 mortos em Belo Horizonte no janeiro mais chuvoso da história da capital mineira, em 2020; 455 mil afetados pela maior cheia da história de Manaus, em 2021; 26 mortos no sul da Bahia e norte de Minas e 255 mortos em Petrópolis no verão de 2021/2022; e mais de 130 mortos em Recife em maio do mesmo ano. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva esteve em São Sebastião na segunda-feira acompanhado do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, e prometeu se empenhar na ajuda aos atingidos (no fim de 2021, com a Bahia submersa, o antecessor de Lula, aliado e mentor de Tarcísio, curtia passeios de jet ski no litoral catarinense). A ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, propôs criar uma linha de crédito para adaptação à mudança do clima. Para efeito prático, o Brasil não tem um plano de adaptação climática. Em 2016, o governo federal chegou a promulgar um Plano Nacional de Adaptação, que previa uma série de ações em vários ministérios. O plano chegou a ser mencionado na primeira Contribuição Nacionalmente Determinada, a meta brasileira do Acordo de Paris. Mas nunca deixou de ser um saco de gatos onde políticas já existentes – e frequentemente contrárias ao objetivo do plano – eram computadas pelos ministérios. No governo Temer, por exemplo, a Medida Provisória 759 (depois convertida da Lei 13.465) foi listada como ação de adaptação. O que a MP faz é aumentar o prazo para anistiar a grilagem de terras, rurais ou urbanas, frequentemente consolidando ocupações ilegais em áreas de risco. A MP foi questionada no Supremo pela Procuradoria-Geral da República. No governo Bolsonaro, o PNA foi simplesmente deletado da atualização da NDC brasileira e, na prática, descontinuado em favor de uma série de “programas” de uma suposta “agenda ambiental urbana” que nunca passaram de um PDF pendurado no site do Ministério do Meio Ambiente. A dificuldade adicional é que o governo federal pode até planejar, mas adaptação é algo que precisa ser feito por estados e municípios. O governo federal pode baixar uma regra regulando eficiência de motores e pode substituir termelétricas fósseis. Mas tirar gente de áreas de risco, replantar um manguezal para reduzir o impacto de ressacas ou melhorar os sistemas urbanos de drenagem são medidas para prefeitos adotarem. Elas custam caro, disputam espaço com uma série de outras prioridades e raramente são olhadas sob o viés da mudança do clima: segundo o ICLEI, apenas sete das 27 capitais brasileiras têm planos municipais de adaptação concluídos – e poucos levam em conta cenários futuros de mudança do clima. (CLAUDIO ANGELO) Créditos da imagem destacada: Desmoronamento no Litoral Norte de São Paulo em 2023 (Foto: Defesa Civil de São Paulo) #Envolverde

Comércio do ouro Yanomami explodiu sob Bolsonaro

Por Amazônia Real – O comércio do ouro prosperou tanto em Roraima que foram abertas sete novas fábricas de joalheria e ourivesaria para cada 100 mil habitantes nos últimos quatro anos. Foram 44 novas fábricas criadas no estado desde 2019. Em São Paulo, o estado mais populoso do Brasil e de renda per capita 75% maior, foi aberta uma única empresa do gênero para cada 300 mil paulistas no mesmo período. A população de Roraima é de 643.805, segundo prévia do Censo do IBGE de 2022. A atividade de compra e venda de joias também explodiu. Em 2019, foram abertas 200 lojas, grande parte na capital Boa Vista. Em 2020, foram 297; em 2021, 398; e em 2022, 376. Ou seja, nos últimos quatro anos, foram criados 1.315 novos negócios (incluindo fábricas e comércio varejista), a maioria esquentando ouro extraído ilegalmente das terras indígenas. Já não há mais uma “rua do Ouro” em Boa Vista, mas várias delas. Nos últimos anos, elas se espalharam para outros pontos comerciais além da região do entorno do monumento aos garimpeiros na Praça do Centro Cívico. A venda do metal precioso se expande velozmente para a zona oeste. Na avenida do comércio para os bairros periféricos, curiosamente chamada de General Ataíde Teive, há dezenas de joalherias. Em alguns pontos, desta que é a maior via de Boa Vista (11,29 quilômetros de extensão), as lojas ficam coladas umas nas outras. No centro, são 38 comércios do ouro. Os dados foram obtidos pela Amazônia Real em consulta à Junta Comercial do Estado de Roraima. Eles mostram que o número de empresas voltadas para o comércio do ouro nos últimos quatro anos, período em que Jair Bolsonaro (PL) era presidente do Brasil e Antonio Denarium (PP), seu fiel escudeiro como governador em primeiro mandato, expandiu. Foi nesse período que o garimpeiro Francisco Oliveira, de 43 anos, decidiu montar a própria joalheria e ourivesaria na avenida Ataíde Teive, no bairro Alvorada, zona oeste de Boa Vista. De fora, a loja tem uma estrutura que chama a atenção pela ostentação. Na fachada, é exibida a foto de uma modelo que tampa a boca com os dedos cheios de joias. Nos textos da Joalheria Imperial, são informados os tipos de peças fabricadas e que se compra e vende ouro. A porta da Joalheria Imperial fica sempre fechada na chave. Para entrar é necessário apertar a campainha. Um jovem, que faz o papel de segurança, abre o local e pede para esperar em um sofá. Por dentro, o cheiro de produtos químicos incomoda. Na vitrine ao lado, ficam expostas joias, algumas sem preço, contendo apenas um número de referência. O rapaz que abriu as portas, discreto e sem uniforme, entra para o escritório onde acompanha o patrão enquanto ele negocia com outros homens que já estavam no local. Na sala de Francisco Oliveira, é possível observar tudo que acontece dentro e fora da loja por meio de câmeras de segurança. A três passos da mesa onde ele normalmente despacha com os garimpeiros, há uma fornalha com materiais, equipamentos e produtos para desmanche e fabricação de joias. Para o nordestino do Maranhão, não há ilegalidade na sua atividade comercial. Oliveira culpa o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e demonstra preocupação com o negócio. Devido às operações da Polícia Federal (PF), afirma que o movimento caiu cerca de 20%. A Joalheria Imperial movimenta cerca de 50 mil reais brutos por mês. “Agora que começou né [as operações]. Aí eu acho que vai começar mesmo a crise daqui uns 15 dias, talvez”, disse o comerciante, complementando que vai faltar ouro e o produto, ficar mais caro. “Tem que reunir todo mundo e buscar uma saída”, concluiu. Francisco Oliveira não demonstrou preocupação com os Yanomami. Para ele, o atual “governo faz só politicagem” com a situação indígena. Ouro do sangue Yanomami Lanchas tipo voadeiras usadas por garimpeiros sendo transportadas na Rua do Ouro em Boa Vista (Foto: Felipe Medeiros/Amazônia Real) Nas outras ruas e avenidas do ouro, aumenta a sensação de carência do minério a cada dia que passa desde que foi deflagrada a operação federal na TIY. Na quarta-feira (15), um homem estacionou o carro em frente às joelheiras e ourives localizadas no Centro de Boa Vista. Foi difícil achar uma vaga para o veículo que guinchava uma embarcação maior que o veículo, com motor de potência 25 HPs. A reportagem acompanhou esse homem que desceu do veículo e foi a uma das lojas. Ele tentava vender uma pepita de ouro e agiu de forma discreta. Segurava a pedra sem deixar que outros clientes e funcionários pudessem ver o que tinha em suas mãos, mostrava aos donos e rapidamente a escondia com os dedos. Os empresários do ouro de sangue Yanomami, como já denunciado na série publicada pela Amazônia Real em parceria com a Repórter Brasil, transitam livremente entre as lojas fechando negócios com outros homens e mulheres. Nas portas, ficam funcionários convidando potenciais vendedores de ouro in natura. “Quer vender ouro? Eu compro ouro. Tem pra vender aí?”, perguntou um deles. O momento atual parece ser o de evitar o prejuízo, e a ação mais visível nos últimos dias tem sido a dos donos de joalherias. São eles que praticamente fixam o preço do ouro no comércio local. Na última quarta-feira (15), o grama do metal precioso custava cerca de 310 reais, mas nas ruas do ouro do Centro ofereciam a 175 reais para os vendedores. O valor do ouro, 310 reais o grama, atrai diversas camadas da sociedade de Roraima. São empresários, políticos, fazendeiros, traficantes e servidores públicos que mantêm uma mão de obra de trabalhadores explorados, os garimpeiros. Existem lojas e ruas do ouro em abundância em Boa Vista, porque eles são apenas uma das pontas de uma cadeia que envolve um esquema onde quem mais lucra são empresas com faturamentos milionários e sede em bairros nobres da capital paulista. Para que tudo funcione corretamente, o bilionário negócio do ouro no Brasil inclui as chamadas DTVMs (Distribuidora de Títulos e Valores Mobiliários), empresas do sistema financeiro autorizadas a comprar o metal no Brasil e são pouco fiscalizadas. Esse é um dos motivos que fazem com que, entre 2019 e 2020, mais de 4 toneladas de ouro ilegal de várias terras indígenas da Amazônia, segundo o Ministério Público Federal (MPF). Comércio escancarado Comércio ligado ao garimpo na Avenida Ataíde Teive, zona oeste de Boa Vista (Foto: Felipe Medeiros/Amazônia Real) O comércio do ouro extraído ilegalmente da Terra Indígena Yanomami (TIY) ocorre de forma escancarada em Roraima. Em Boa Vista, é visível a expansão de empresas que vendem os chamados “carotes”. Os objetos são utilizados para transporte de combustíveis, oficinas de embarcações, manutenção e venda de motores de barcos, distribuidoras de bebidas e alimentos, lojas de materiais de construção com itens usados no garimpo expostos nas calçadas, além das joalherias e ourivesarias. “Existe um discurso que naturaliza a atividade do garimpo, criada desde a época da ocupação e desenvolvimento da região Norte com os governos militares. Na verdade, a atividade de garimpo em Roraima se inicia na década de 1930. E esse discurso de que o garimpo é a cultura local, porque tem monumentos que simbolizam garimpo, é [vista] como uma coisa natural”, explicou o antropólogo Lauro Prestes, especializado em educação indígena e que já esteve à frente de formação de agentes de saúde que atuam na Terra Indígena Yanomami. Mas ele alerta: nunca foi natural, mas uma construção intencional para forjar uma nova realidade. “Um discurso como esse não se mantém por muito tempo se ele não for rentável, se ele não beneficiar um grupo. E no caso do problema do garimpo em Roraima está muito ligado a questões políticas.” Em Boa Vista, impera a lei do silêncio. Até mesmo a PF jamais prendeu um político ou empresário do estado. Esta semana a Justiça Federal negou pela sexta vez, a prisão do empresário Rodrigo Martins de Mello, vulgo Rodrigo Cataratas, de 46 anos. Ele é investigado por dar apoio à exploração ilegal de ouro na TIY. Na tentativa de abrir ainda mais as portas do garimpo ilegal, ele se candidatou ao cargo de deputado federal nas últimas eleições e, segundo fontes ouvidas pela reportagem, ele tem uma relação próxima com Disney Mesquita, ex-secretário da Casa Civil no primeiro mandato de Denarium, de quem também ele é amigo. Políticos pró-garimpo Antônio Denarium chega à Basse Aérea de Boa Vista para reunião com os representantes garimpeiros e da FAB (Foto: Felipe Medeiros/Amazônia Real) “Essa cultura garimpeira e essa valorização da cultura do Eldorado estão muito ligadas à forma como a classe política roraimense se utiliza do garimpo para perpetuar os seus privilégios. A grande questão é quando se vai fazer uma análise do garimpo, porque outras atividades rentáveis que preservam o meio ambiente, como o turismo, não estão no discurso político. Quando se fala de desenvolvimento do estado, o que se levanta é a bandeira do garimpo”, criticou Prestes. Horas antes da operação da PF que mirava na irmã do governador e o sobrinho dele, ambos investigados, Denarium se reuniu às escondidas com garimpeiros. Foi na sexta-feira (10), e a Amazônia Real foi a única equipe jornalística que soube do encontro e divulgou com exclusividade. Denarium nunca negou sua relação com a classe de garimpeiros e mineradores. Na sexta-feira (17), a Hutukara Associação Yanomami (HAY) e a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) vieram a público condenar a escolha do senador Chico Rodrigues (PSB) como presidente da Comissão Temporária externa criada para acompanhar a situação na TIY. Não se sabe se por provocação, conivência, espírito de corpo ou ignorância, o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD), aceitou a indicação de Chico Rodrigues, e ainda incluiu os colegas Hiran Gonçalves (PP) e o senador Mecias de Jesus (Republicanos). Eles e Denarium formam a tropa de choque pró-garimpo. Chico Rodrigues era o dono do avião que circulava no garimpo ilegal da TIY e em 2020 foi flagrado pela PF com 33 mil reais na cueca. Na visão dele, em entrevista à Globonews, o povo Yanomami é “a “última etnia do planeta no século 21 que ainda é primitiva, totalmente primitiva”. Já Mecias de Jesus se tornou peça-chave do bolsonarismo em Roraima: partiu dele as indicações para a coordenador do Distrito Sanitário Especial Indígena, que deveria cuidar da saúde dos Yanomami e Ye’kuana. O garimpo é tão comum para a população roraimense que, faltando apenas um dia para o início da megaoperação para começar a pôr fim à exploração ilegal, o comércio do ouro não parou em Boa Vista. Estiveram na cidade no dia 8 de fevereiro, o ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, e os três comandantes das Forças Armadas: general Tomás de Paiva (Exército); brigadeiro Marcelo Damasceno (Aeronáutica); e o almirante Marcos Sampaio Olsen (Marinha). As “ruas do ouro” funcionaram normalmente durante toda a estadia da comitiva interministerial em Roraima. “Vão fechar o garimpo?” Nos últimos dias, a Amazônia Real tem visitado joalherias em Boa Vista. Elas possuem um forte esquema de proteção, com um, ou até dois, homens disfarçados e sistema de monitoramento por câmeras. Em uma das lojas, uma atendente informou que eles recebem muitas encomendas diariamente e algumas vezes ficam sem o ouro. Quando isso acontece, precisam aguardar que os garimpeiros tragam a matéria-prima para a fabricação das jóias, o que, segundo ela, não demora mais que cinco dias para ser restabelecido o comércio do ouro. Um empresário do ramo de bebidas, na zona oeste de Boa Vista, diz estar preocupado com o fim do garimpo, que girava a economia local. “Será que vão fechar o garimpo? Eu vendo muito aqui para os garimpeiros, tem semanas que eu vendo 200, 300 mil”, disse. O antropólogo Lauro Prestes propõe uma autoanálise: “Até que ponto “nós [sociedade que vive em Roraima] estamos com as mãos sujas do sangue Yanomami? Dizer que o indígena é um entrave da sociedade roraimense, que o indígena atrapalha o desenvolvimento do estado, é um discurso que possibilita e evidencia essa situação que vivenciamos com a crise humanitária dos Yanomami”, analisou. As lideranças indígenas já haviam se manifestado antes mesmo da visita do presidente Lula (PT) a Roraima. O que houve segundo a HAY foi uma estratégia do governo Bolsonaro para enfraquecer a saúde dos indígenas, desmantelando a rede de saúde pública e a fiscalização, facilitando e estimulando o ingresso de não-indígenas nos territórios, levando mais doenças para dentro das aldeias. “O governo passado [do Bolsonaro] sequer nos atendeu em Brasília. Então, essa é uma situação que está acontecendo e nós já avisamos há muito tempo. Nós fizemos o nosso trabalho de documentar, fizemos relatório, as mortes estavam crescendo em 2019”, disse Dário Kopenawa, vice-presidente da HAY, que estava presente com seu pai Davi Kopenawa, em uma entrevista exclusiva para Amazônia Real em janeiro. Nos diálogos travados com os responsáveis pelos atendimentos e os próprios donos das lojas do comércio do ouro, o repórter da Amazônia Real, que nem sempre se identificou como jornalista, não ouviu em momento algum uma frase de solidariedade ao drama enfrentado pelos Yanomami. Dário Yanomami, vice-presidente da Associação Hutukara (Foto: Felipe Medeiros/Amazônia Real) Crédito da imagem destacada: Nos últimos quatro anos, Roraima registrou a abertura de 44 fábricas de artefatos de joalheria e ourivesarias e acumulou mais de 1.200 negócios de compra e venda do metal precioso, boa parte extraído da TI Yanomami (Foto: Pixabay). #Envolverde

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2023

Genocídio do Povo Yanomami, artigo de Juacy da Silva

Onde estavam os Podres da República, os governos e as autoridades federais, estaduais e municipais que se omitiram e silenciaram diante de uma tragédia anunciada? Apesar dos “avanços” ocorridos com a promulgação da Constituição de 1988, em relação aos direitos dos povos indígenas, como destaca o professor de direito Gustavo Proença, parece que na prática a realidade é bem outra, muito diferente do que consta no texto constitucional. Vejamos esta reflexão, sob a ótica da Jornalista Cristiane de Oliveira – Repórter da Agência Brasil, Rio de Janeiro, em artigo publicado em 19/04/2017, por ocasião do DIA DO ÍNDIO/ DOS INDÍGENAS: “A Constituição de 1988 pode ser considerada um marco na conquista e garantia de direitos pelos indígenas no Brasil. A afirmação é do professor de direito Gustavo Proença, pesquisador da área de direitos humanos. Para ele, a Carta Magna modificou um paradigma e estabeleceu novos marcos para as relações entre o Estado, a sociedade brasileira e os povos indígenas. Enquanto o Estatuto do Índio (Lei 6.001), promulgado em 1973, previa prioritariamente que as populações deveriam ser “integradas” ao restante da sociedade, a Constituição passou a garantir o respeito e a proteção à cultura das populações originárias. “O constituinte de 1988 entende que a população indígena deve ser protegida e ter reconhecidos sua cultura, seu modo de vida, de produção, de reprodução da vida social e sua maneira de ver o mundo”, destaca Proença”. A Constituição Federal de 1988 traz em seu bojo diversos dispositivos que se aplicam, diretamente aos povos indígenas e outros dispositivos gerais, principalmente garantias individuais e coletivas que, de forma indireta, também se aplicam a esses povos tradicionais, garantindo, inclusive, suas ancestralidades. Vale a pena destacar nesta reflexão alguns desses dispositivos constitucionais: “Art. 20. São bens da União: XI – as terras tradicionalmente ocupadas pelos índios. Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre: XIV – populações indígenas; Art. 49. É da competência exclusiva do Congresso Nacional: XVI – autorizar, em terras indígenas, a exploração e o aproveitamento de recursos hídricos e a pesquisa e lavra de riquezas minerais; Art. 109. Aos juízes federais compete processar e julgar: XI – a disputa sobre direitos indígenas. Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público: V – defender judicialmente os direitos e interesses das populações indígenas; Art. 176. As jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais e os potenciais de energia hidráulica constituem propriedade distinta da do solo, para efeito de exploração ou aproveitamento, e pertencem à União, garantida ao concessionário a propriedade do produto da lavra. § 1.º A pesquisa e a lavra de recursos minerais e o aproveitamento dos potenciais a que se refere o caput deste artigo somente poderão ser efetuados mediante autorização ou concessão da União, no interesse nacional, por brasileiros ou empresa brasileira de capital nacional, na forma da lei, que estabelecerá as condições específicas quando essas atividades se desenvolverem em faixa de fronteira ou terras indígenas. Art. 210. Serão fixados conteúdos mínimos para o ensino fundamental, de maneira a assegurar formação básica comum e respeito aos valores culturais e artísticos, nacionais e regionais. § 2.º O ensino fundamental regular será ministrado em língua portuguesa, assegurada às comunidades indígenas também a utilização de suas línguas maternas e processos próprios de aprendizagem. Art. 215. O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais. § 1.º O Estado protegerá as manifestações das culturas populares, indígenas e afro-brasileiras, e das de outros grupos participantes do processo civilizatório nacional. CAPÍTULO VIII Dos Índios Art. 231. São reconhecidos aos índios sua organização social, costumes, línguas, crenças e tradições, e os direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam, competindo à União demarcá-las, proteger e fazer respeitar todos os seus bens. § 1.º São terras tradicionalmente ocupadas pelos índios as por eles habitadas em caráter permanente, as utilizadas para suas atividades produtivas, as imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e as necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições. § 2.º As terras tradicionalmente ocupadas pelos índios destinam-se a sua posse permanente, cabendo-lhes o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes. § 3.º O aproveitamento dos recursos hídricos, incluídos os potenciais energéticos, a pesquisa e a lavra das riquezas minerais em terras indígenas só podem ser efetivados com autorização do Congresso Nacional, ouvidas as comunidades afetadas, ficando-lhes assegurada participação nos resultados da lavra, na forma da lei. § 4.º As terras de que trata este artigo são inalienáveis e indisponíveis, e os direitos sobre elas, imprescritíveis. § 5.º É vedada a remoção dos grupos indígenas de suas terras, salvo, ad referendum do Congresso Nacional, em caso de catástrofe ou epidemia que ponha em risco sua população, ou no interesse da soberania do País, após deliberação do Congresso Nacional, garantido, em qualquer hipótese, o retorno imediato logo que cesse o risco. § 6.º São nulos e extintos, não produzindo efeitos jurídicos, os atos que tenham por objeto a ocupação, o domínio e a posse das terras a que se refere este artigo, ou a exploração das riquezas naturais do solo, dos rios e dos lagos nelas existentes, ressalvado relevante interesse público da União, segundo o que dispuser lei complementar, não gerando a nulidade e a extinção direito a indenização ou a ações contra a União, salvo, na forma da lei, quanto às benfeitorias derivadas da ocupação de boa-fé. § 7.º Não se aplica às terras indígenas o disposto no art. 174, §§ 3.º e 4.º. Art. 232. Os índios, suas comunidades e organizações são partes legítimas para ingressar em juízo em defesa de seus direitos e interesses, intervindo o Ministério Público em todos os atos do processo. Art. 67. A União concluirá a demarcação das terras indígenas no prazo de cinco anos a partir da promulgação da Constituição”. (ou seja, esta determinação constitucional que deveria ter sido executada ate 1993, praticamente foi ignorada, principalmente no último período governamental, em que nenhuma demarcação de território indígena foi realizada). Apesar deste artigo constar explicitamente na Constituição nem mesmo o STF, que é considerado o “Guardião” da Constituição parece ignorar este dispositivo. No entanto, apesar desses marcos legais/constitucionais, vejam que absurdo, parece que estão colocando a raposa para tomar conta do galinheiro ou o vampiro para administrar o banco de sangue. Reflitam sobre o que já aconteceu, o que está acontecendo e o que ainda pode acontecer em relação a esta tragédia anunciada e perpetrada ao longo de séculos, décadas, mas, principalmente, nos últimos quatro, sete ou dez anos em relação aos diferentes povos indígenas no Brasil, uma verdadeira calamidade, uma tragédia humanitária, uma vergonha nacional e mundial. Acabo de receber em meu correio eletrônico (Email) uma notícia, se não estarrecedora, pelo menos inusitada. Trata-se de uma Comissão constituída no âmbito do Senado Federal para “Acompanhar e fiscalizar” as providências que estão sendo tomadas, principalmente pelo Governo Federal e também outros organismos públicos, para enfrentar a chamada crise do povo indígena Yanomami, que na verdade é um genocídio contra este e tantos outros povos indígenas que, ao longo de séculos foram e continuam sendo dizimados, literalmente. Transcrevo aqui parte do teor do email contendo a notícia a que me refiro, cuja fonte é o Site Climainfo (https://www.climainfo.org.br 17/02/2023) “O Senado Federal instalou, nesta 4ª feira (15/2), uma comissão temporária para acompanhar a situação dos Yanomami, que vivem uma grave crise humanitária e sanitária decorrente da presença ilegal de garimpeiros em seu território, e observar os esforços do governo federal em retirar os invasores. Para a presidência da comissão, uma escolha insólita, se não imprópria: o senador Chico Rodrigues (PSB-RR),aliado do governo Bolsonaro, de quem foi vice-líder no Congresso Nacional, tem laços públicos e notórios com atividades de garimpo em Roraima e defensor de garimpeiros, a quem chegou a elogiar essas atividades criminosas como um ‘rabalho fabuloso’ “. Ao ser escolhido para Presidir a referida Comissão, o Senador fez uma declaração claramente preconceituosa. Em entrevista `a Globonews, o mesmo disse que os garimpeiros são “vítimas” da situação e classificou os Yanomami como “a última etnia do planeta no século XXI que ainda é primitiva, totalmente primitiva”. Voltando `a minha reflexão, gostaria de enfatizar que a crise humanitária, a fome que já matou centenas de crianças e também adultos do povo Yanomami é apenas a parte visível deste que pode ser considerado como um “iceberg”, que a sociedade brasileira e o resto do mundo tem tomado conhecimento apenas agora, pois o genocídio e tantas outras formas de violência, inclusive assassinatos de inúmeras lideranças indígenas já vem ocorrendo no Brasil há décadas, sem que providências concretas tenham sido ou estejam sendo tomadas para garantir, como a Constituição Federal estabelece, não apenas os territórios desses povos, mas também sua cultura, suas tradições, enfim, suas formas de viver, integrados com a natureza/meio ambiente. Integração e aculturação forçadas representam um verdadeiro atentado contra todos os povos tradicionais, os quais têm o direito vivem conforme os costumes, tradições e crenças culturais e não as normas e formas culturais impostas de forma autoritária pelos “donos do poder” e seus agentes. Inúmeros estudos, pesquisas tem demonstrado que os povos indígenas, ao longo dos tempos, de décadas e séculos foram e continuam sendo os verdadeiros guardiões das florestas, da biodiversidade, dos biomas, das águas, enfim, da biodiversidade tão ameaçadas e ameaçados nos últimos tempos, que tem causado preocupação e indignação ao redor do Planeta. Portanto, garantir os direitos dos povos indígenas, como constam não apenas em nossa Constituição, mas também em inúmeros tratados articulados e aprovados pela ONU, dos quais o Brasil tem sido signatário é obrigação, dever legal dos organismos públicos nacionais e fundamentos para o estabelecimento de políticas públicas que garantam a vida, incluindo a saúde, o bem-estar e as culturas dos povos indígenas. Mas isto praticamente não tem ocorrido, a não ser quando verdadeiras calamidades são reveladas publicamente, como está sendo este genocídio do povo Yanomami. Diante disso, podemos nos perguntar: onde estavam os Podres da República, os governos e as autoridades federais, estaduais e municipais que se omitiram e silenciaram diante de uma tragédia anunciada? Onde estavam os MPs (Ministérios Públicos) Federal e Estaduais, principalmente os localizados em Roraima e na Amazônia ou de outros estados onde povos indígenas têm sido vítimas de muita violência, desrespeito e exploração? Onde estavam a Câmara Federal, o Senado da República, principalmente os senadores e deputados federais dos estados da Amazônia Legal que nada fizeram,? Onde estavam as Forças Armadas, o Conselho da Amazônia, a Funai, o IBAMA e outros órgãos públicos que deveriam cuidar do Meio ambiente? No Congresso Nacional existem as Frentes Parlamentares ou as bancadas da Bala, do Boi, da Bíblia, dos Evangélicos, das mulheres, da Educação, da saúde e tantas outras, indagamos, porque não uma bancada, uma frente parlamentar em defesa dos povos indígenas, dos quilombolas, remanescentes da escravidão, enfim, grupos étnicos e raciais tão vilipendiados e excluídos dos “frutos” do crescimento econômico e do “desenvolvimento nacional”? Onde estavam os veículos de comunicação que se calaram? Onde estavam o “deus mercado”, os “defensores” da liberdade, que se omitiram ante a negação do direito que é o mais importante para um ser humano que é a própria vida? Da mesma forma que os Yanomamis, também os demais povos indígenas no Brasil inteiro estão sendo vítimas de violência, dizimados, suas terras invadidas, suas culturas destruídas. Os povos indígenas no Brasil há décadas estão se transformando em verdadeiros párias de nossa sociedade e com o avanço das fronteiras agropecuárias, mineração legal e ilegal, a grilagem consentida, a ação ilegal e criminosa de madeireiros, o desmatamento, a construção de grandes barragens, este processo está, na verdade sendo financiado grandes grupos econômicos nacionais e internacionais, mas também pelos Governo Federal e Estaduais através de crédito subsidiado, renúncia fiscal, sonegação consentida, “incentivos fiscais”, enfim, este genocídio faz parte de políticas públicas, custeadas com o suado dinheiro dos contribuintes. O caso dos Yanomamis é imediato, ou como se diz, “a bola da vez”, onde a luz, os holofotes dos meios de comunicação produzem um efeito momentâneo; precisamos refletir, discutir a questão indígena brasileira por inteira, analisar a situação de todos os povos, como, por exemplo, os guarani-kaiowá, os ticunas, os terena, os xavantes, os bororos, os pataxós, os caetés, os caiapós, os nhabiquaras, os macuxis,, os caigangue e tantos outros que também estão sofrendo ameaças de toda sorte, inclusive de extinção enquanto grupos demográficos com identidade própria. Este é o foco da discussão e não apenas medidas emergenciais e assistencialismo, que, cessada a “onda” da publicidade tudo volta `a mesma situação e o genocídio continua! Em boa hora o Governo Lula criou o Ministério dos povos indígenas. Oxalá tanto este Ministério quanto todos os organismos a ele vinculados como a FUNAI e também o Ministério do Meio Ambiente e do Clima, tenham recursos orçamentários suficientes para não apenas definirem mas de fato implementarem políticas públicas que defendam a um só tempo tanto o meio ambiente quanto a vida e direito dos povos indígenas existentes no Brasil, dentro do conceito de Ecologia Integral, como tanto tem enfatizado o Papa Francisco, “onde tudo está interligado, nessa Casa Comum”, que é o nosso Planeta Terra. Neste sentido, precisamos também de Igrejas, Católica e Evangélicas e de outras crenças, não apenas as que representam o cristianismo, que promovam uma evangelização “aculturada”, que tenham também a cara e o olhar dos povos originários, que respeitem suas culturas, suas línguas, suas tradições, suas crenças e não apenas a cara dos colonizadores e destruidores das culturas desses povos. Enfim, a questão indígena no Brasil não é um tema ou um assunto de interesse exclusivo dos povos indígenas, mas da sociedade como um todo, não podemos fazer coro com quem imagina e vocifera o tempo todo que no Brasil “existe muita terra para poucos indígenas” ou que esses povos e a defesa do meio ambiente sejam empecilho ou obstáculo para o desenvolvimento, local, estadual ou nacional. Precisamos repensar nossos conceitos, nossas atitudes e nossas ações, os povos indígenas representam vidas e precisamos defender todas as formas e tipos de vida, inclusive ou principalmente dos povos indígenas, que são excluídos social, econômica e politicamente e que continuam ameaçados em todos os aspectos tão caros/importantes para essas pessoas, que também, como diz o adágio, “são filhos e filhas de Deus”! JUACY DA SILVA, 80 anos, professor titular aposentado UFMT, sociólogo, mestre em sociologia, ambientalista, articulador da PEI Pastoral da Ecologia integral. Email profjuacy@yahoo.com.br Instagram @profjuacy [ Se você gostou desse artigo, deixe um comentário. Além disso, compartilhe esse post em suas redes sociais, assim você ajuda a socializar a informação socioambiental ] in EcoDebate, ISSN 2446-9394

Mapbiomas identifica centenas de pistas de pouso ilegais em terras indígenas e áreas protegidas

Por Agência Brasil- Total de pistas de pouso encontradas na Amazônia é mais que o dobro das registradas oficialmente na Anac Levantamento feito pelo Mapbiomas, divulgado nessa segunda feira, revelou mais de 2.800 pistas de pouso na Amazônia, número que é mais que o dobro das pistas que estão legalmente registradas na Agência Nacional da Aviação Civil (Anac). Além disso, 804 dessas pistas estavam dentro de uma área protegida, 320 no interior de terras indígenas e mais de 450 a menos de cinco quilômetros de um garimpo. De acordo com a organização, o objetivo na divulgação desse mapa é contribuir no trabalho de acabar com essas pistas clandestinas que ficam na Amazônia. O coordenador técnico do mapeamento de mineração do Mapbiomas, Cesar Diniz, explicou que, apesar das pistas clandestinas poderem ser utilizadas para outros fins ilícitos como o tráfico de drogas ou o transporte ilegal de madeira ou animais silvestres, é o garimpo que utiliza de forma intensa esse meio de transporte na Amazônia, tanto para trazer maquinário quanto para o escoamento do ouro. Cesar também sugeriu alternativas para evitar que garimpeiros expulsos da terra indígena Yanomami voltem. Ainda segundo o levantamento, cerca de 12% da área de garimpo no país é ilegal, o que equivale a 23 mil hectares de terra, uma área equivalente a cidade de Recife, capital de Pernambuco. *Crédito da imagem destacada: Garimpo Tatuzão, na região do rio Uraricoera na TI Yanomami – Bruno Kelly/Amazonia Real #Envolverde

Estudo do Cebri, BID, EPE e Cenergia aponta desafios da transição energética brasileira

O objetivo de atingir o NetZero até 2050 pode requerer tornar as emissões de CO2 negativas até 2040 Embora o Brasil se encontre em um estado avançado no que se refere à transição energética, novas tecnologias e novos vetores energéticos são fundamentais para alcançar a ambição climática de neutralidade líquida em gases de efeito estufa (GEE) até 2050. Além disso, é necessária, em curto prazo, uma profunda mudança nas emissões decorrentes das dinâmicas do uso da terra e do desmatamento. Se até o fim desta década o país não conseguir eliminar o desmatamento ilegal, não há viabilidade técnica e realista para zerar os GEE até 2050, como prevê compromisso nacional no Acordo de Paris. A conclusão é de um estudo inédito, feito em parceria entre o Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri), o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) e o Centro de Economia Energética e Ambiental (Cenergia), da Coppe/UFRJ. O relatório final do “Programa de Transição Energética” apresenta três cenários distintos de transição energética para o país até 2050 — “Transição Brasil”, “Transição Alternativa” e “Transição Global”. Os cenários são usados para explorar diferentes opções de mitigação de emissões, apresentando trajetórias de emissão convergentes com objetivo de neutralidade de carbono no Brasil até meados do século. Os cenários “Transição Brasil” (TB) e “Transição Alternativa” (TA) são construídos com base nos compromissos assumidos pelo país em sua Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC), buscando indicar trajetórias ótimas custo-eficiente para o país a partir de diferentes perspectivas sobre como evoluem as políticas públicas, os consensos sociais, os comportamentos de empresas e consumidores, e como se desenvolvem e difundem novas tecnologias. Já no cenário “Transição Global” (TG), a trajetória de descarbonização é moldada a partir da contribuição do Brasil em um mundo alinhado para limitar o aumento médio da temperatura superficial global em até 1,5°C. Com uma matriz energética em que aproximadamente metade da energia primária provém de fontes renováveis, o Brasil tem uma das matrizes mais convergentes com uma economia de baixo carbono, apresentando uma renovabilidade três vezes acima da média mundial (14% em 2019). Porém, a análise das trajetórias de descarbonização relativas aos próximos 30 anos, apresentadas nos três cenários, mostram dinâmicas para a matriz energética distintas das observadas nas últimas três décadas, com novos desafios e oportunidades para o Brasil. Os três cenários de descarbonização incorporam as mudanças estruturais para os setores de oferta e demanda de energia, bem como de uso da terra (agropecuária e florestas) necessárias para alcançar a neutralidade climática no Brasil na década de 2050. Para os cenários TB e TA seriam evitadas, aproximadamente, 30 bilhões de toneladas equivalentes de CO2 no horizonte. Para o cenário TG, o esforço de mitigação de emissões é ainda maior, alçando cerca de 40 bilhões de toneladas equivalentes de CO2 no período. Para que a neutralidade em GEE seja alcançada no horizonte de 2050 é necessário haver emissões negativas de CO2 (o principal GEE) em torno de 2035-2040, ou seja, uma década antes do momento de alcance da neutralidade em GEE no país. Nos três cenários de descarbonização, as emissões de CO2 se tornam negativas em torno de 500 milhões de toneladas, dimensionando o tamanho do desafio. Os primeiros resultados do estudo apontam uma série de desafios para o Brasil alcançar a neutralidade em carbono até 2050: tendência de crescimento na demanda por energia, a necessidade de se atualizar e até criar marcos regulatórios para a transição energética e o fato de novas tecnologias e infraestrutura ainda demandarem desenvolvimento, escala e competitividade. “O Programa de Transição Energética é importantíssimo para a EPE e para o Estado brasileiro, pois contribui para formar consensos sobre dilemas, incertezas, desafios e oportunidades para os stakeholders e a sociedade como um todo. Ao adotar uma abordagem com múltiplos participantes, permite também ratificar ou contestar condicionantes ou informações específicas para o processo de delinear cenários e trajetórias”, afirma o presidente da EPE, Thiago Barral. “Os resultados do Programa mostram que o Brasil pode se posicionar como um hub energético global, liderando uma transição energética justa, inclusiva e eficiente. Para isso, será necessário aprimorar e criar marcos legais e regulatórios adequados e mobilizar grandes investimentos. O BID está pronto para continuar apoiando técnica e financeiramente nesses dois eixos fundamentais para catalisar esse processo”, afirma Morgan Doyle, representante do Grupo BID no Brasil. CUSTO DE COMPENSAÇÃO PODE CHEGAR A US$ 3,4 TRILHÕES Face à necessidade de haver emissões negativas de CO2 em 2040, na ausência de eliminação das emissões oriundas de desmatamento e mudança do uso da terra, o setor energético precisaria compensar parcialmente as emissões destas fontes e ao mesmo tempo lidar com as emissões remanescentes de GEE dos setores de difícil abatimento de emissões (hard-to-abate), como transporte de carga a longa distância e processos industriais carbono-intensivos, tornando a transição energética ainda mais onerosa e, portanto, um fator de perda de competitividade. Desta forma, caso o país não consiga eliminar o desmatamento ilegal nesta década, encontra-se uma impossibilidade de viabilidade técnica e realista para que as emissões de GEE sejam zeradas em 2050, fazendo com que o país tenha que compensar suas emissões, se tornando um comprador (e não um vendedor) de créditos de carbono. De acordo com o relatório, eliminar o desmatamento ilegal significa evitar o lançamento na atmosfera de 21 bilhões de toneladas de gases de efeito estufa até 2050. Caso isso não aconteça, o Brasil terá que arcar com um custo de compensação de até US$ 3,4 trilhões para atingir os compromissos assumidos por sua Contribuição Nacionalmente Determinada (NDC, na sigla em inglês), considerando as perspectivas mais elevadas de preços de carbono no longo prazo. O perfil de emissões no Brasil é completamente distinto do perfil global. No mundo, o setor energético representa 76% das emissões totais líquidas de gases de efeito estufa. Já no Brasil, onde quase metade da matriz é renovável, esse setor representa apenas 31% das emissões líquidas, e 18% das emissões brutas. De fato, o estudo aponta que o segmento de uso da terra dispõe de opções para remoção natural de carbono (chamadas soluções baseadas na natureza — NBS), que além de remover carbono geram um conjunto de co-benefícios socioambientais. “O Brasil detém 20% das melhores oportunidades de soluções baseadas na natureza, ou seja, oportunidades custo-eficientes. Na década de 2020-2030, deve ser uma das prioridades aproveitar este potencial, conciliando a agenda climática e social gerando valor a partir da floresta em pé. No caso brasileiro, é possível conciliar objetivos alimentares, energéticos e ambientais, por meio da conversação de 60-85 milhões de hectares de pastagens degradadas em florestas nativas, florestas energéticas plantadas e agropecuária sustentável”, observa a senior fellow do Cebri Rafaela Guedes. Portanto, é muito relevante o papel redutor de emissões oriundo das mudanças positivas no uso da terra, com destaque para o reflorestamento e a restauração de florestas. E nesta frente, o estudo lança luz para um nexo importante com a oferta de energia. Projeta-se, por exemplo, um incremento entre 3-6 milhões de hectares de florestas plantadas (eucalipto e pinus) em áreas degradadas para atender à demanda por biomassa para a produção de biocombustíveis celulósicos em substituição aos combustíveis fósseis. UMA MATRIZ ENERGÉTICA BRASILEIRA AINDA MAIS RENOVÁVEL Ao avaliar a matriz energética, o documento traz insights importantes para as próximas décadas. A demanda de energia primária, por exemplo, passará de 268 milhões teps (tonelada equivalente de petróleo) em 2020 para cerca de 400 milhões de teps em 2050. Em contrapartida, haverá queda da utilização de combustíveis fósseis e aumento do uso de fontes renováveis com destaque para os biocombustíveis avançados. O estudo também indica que as fontes renováveis superarão a participação de 70% na matriz energética primária. Nos três cenários, até os anos de 2030, o etanol e o biodiesel, biocombustíveis convencionais, responderão pela maior parcela da oferta de bionergia. Porém, o estudo aponta que, a partir de 2040, ganham destaque os biocombustíveis avançados, produzidos por meio de diversas rotas tecnológicas, tais como: o diesel verde, o bioquerosene de aviação, a gasolina verde e os biocombustíveis para uso marítimo que despontam como o principal vetor de substituição aos combustíveis fósseis. A utilização de biocombustíveis avançados se expande por dois motivos principais: (i) descarbonização de segmentos do setor de transportes mais difíceis de serem eletrificados, como o aéreo, o marítimo e o transporte de cargas; (ii) captura e armazenamento do CO2, que permitem gerar abatimento de emissões de outros setores. Com seu papel de descarbonizar o gás natural e a possibilidade de aproveitamento da infraestrutura de gás, o biometano se mostra como uma fonte importante para atingir as metas climáticas. Nos três cenários, ele alcança, em 2050, uma demanda entre 15-18 milhões de m3/dia. O estudo analisou ainda as perspectivas para o hidrogênio. O maior destaque é para sua aplicação indireta, ou seja, o hidrogênio entra como insumo intermediário na produção de gás de síntese que na reação química final por meio da captura de carbono produz combustíveis sintéticos descarbonizados (como, por exemplo, querosene de aviação ou diesel) e a utilização em células a combustível alimentadas por biocombustíveis. O estudo também explorou um cenário em que se projeta um potencial de exportação de hidrogênio verde (obtido por eletrólise com eletricidade de fontes renováveis: quebra da molécula da água usando como energia fontes renováveis tais como solar ou eólica) da ordem de 4 milhões de toneladas em 2050, o que pode representar 10% das exportações globais de hidrogênio neste horizonte. Em todos os cenários, projeta-se um forte crescimento da demanda por eletricidade, que vai requerer expansão da capacidade de geração, respondida predominantemente pelas fontes eólica e solar, com consequente redução da participação relativa da hidreletricidade no parque gerador. Isto reflete, por um lado, as limitações à construção de novos projetos hidroelétricos com barragem em virtude do impacto ambiental e social causado e, por outro lado, a própria competitividade destas fontes renováveis. A participação de fontes renováveis na geração elétrica brasileira continuará a se ampliar, ultrapassando a marco de 90% do mix elétrico. O crescimento da demanda por eletricidade é acompanhado por uma consequente necessidade de expansão das linhas de transmissão do Sistema Interligado Nacional (SIN), para comportar o aumento do fluxo de eletricidade, ampliando-se entre 181-221 GW até 2050. OS DESAFIOS DO SETOR DE ÓLEO E GÁS Até 2050, o consumo de derivados de petróleo no Brasil apresentará forte queda. Contudo, a produção brasileira de O&G poderá continuar sendo relevante para se manter como um potencial exportador de petróleo e atender à demanda remanescente em 2050. Como o próprio documento destaca, o petróleo brasileiro apresenta tripla resiliência (técnica, econômica e ambiental) e tem uma das menores intensidades de carbono no mercado internacional. Segundo a Rystad, a média do petróleo no mundo é de 22 quilos de CO2 por barril de óleo equivalente produzido (kg CO2 /b), enquanto a do Brasil é de cerca de 15 kg CO2 eq/b (sendo que o pré-sal chega a 10kg CO2 eq/b). Além disso, mantém-se como vetor para garantir a segurança energética dos países ao longo do processo de transição. “Com um petróleo de baixa intensidade de carbono e baixo custo, a riqueza gerada pela indústria de O&G contribuirá para financiar a transição energética e as inovações necessárias para a neutralidade de carbono no Brasil até 2050” afirma Jorge Camargo, Vice-Presidente do CEBRI e coordenador do núcleo Energia. A produção de gás natural tem comportamento similar à do petróleo sendo que seu consumo segue sendo prioritariamente nacional. O consumo doméstico de GN perde sua relevância no setor elétrico, mas se intensifica no uso residencial e na indústria, puxado pelos setores de química, cimento e cerâmica, entre outros. CONCILIAR CRESCIMENTO DA DEMANDA COM REDUÇÃO DE EMISSÕES Atualmente, as emissões decorrentes do uso de energia no Brasil correspondem por apenas 18% das emissões totais, sendo que os setores de transportes, industrial e residencial respondem por mais ¾ desta parcela das emissões. Como cada setor da economia se comporta nos cenários desenvolvidos pelo “Programa de Transição Energética”? Os cenários indicam que a descarbonização desses setores enfrenta ao menos três grandes desafios: (1) a tendência esperada de crescimento na demanda por serviços energéticos, refletindo o crescimento populacional e econômico. Assim, o maior desafio destes setores será conciliar essa tendência de crescimento na demanda com a sustentabilidade; (2) para algumas aplicações, as soluções tecnológicas para mitigar emissões ainda precisam de desenvolvimento e escala; e (3) seus custos de implantação ainda são elevados e mecanismos de financiamento e incentivo se mostram incipientes. No segmento de transporte, o Brasil já se destaca globalmente, com uma participação de 25% de energias renováveis (biocombustíveis) em comparação aos menos 5% na média mundial. A existência de uma indústria de biocombustíveis consolidada ao longo de décadas, uma rede de abastecimento de abrangência nacional e elevada participação de veículos flexfuel na frota delineia uma vantagem competitiva para o país, que conta com soluções de descarbonização que antecedem em muitos anos o processo de eletrificação, movimento que vem ganhando tração em diversas regiões do mundo. Como desdobramento, os biocombustíveis (especialmente os avançados a partir da década 2040) se configuram como o principal vetor de descarbonização do segmento de transporte no Brasil. Não obstante, como os movimentos e estratégias globais da indústria automotiva apontam cada vez mais para a introdução de veículos elétricos, os cenários apontam a eletrificação em nichos de mercado e de forma mais abrangente no cenário Transição Alternativa. Adicionalmente, os cenários chamam a atenção para as diferentes vertentes de eletrificação do transporte (que não apenas via veículos a bateria), de forma que é central desenvolver soluções nacionais que se insiram internacionalmente na cadeia global de valor da indústria automotiva, como, por exemplo, o desenvolvimento de veículos elétricos a célula combustível a partir de etanol e a disseminação da tecnologia híbrido flex para outros mercados. O setor industrial contribui para as emissões totais do país tanto pela queima de combustíveis fósseis quanto por seus próprios processos produtivos. Ganhos de eficiência, maior penetração de gás natural e biomassa se apresentam como os principais vetores de descarbonização nos cenários. O maior desafio deste segmento é encontrar soluções para as áreas de metalurgia e fabricação de cimento, que respondem pela maior parte das emissões do setor e apresentam emissões que são intrínsecas a seus próprios processos de produção, demandando tecnologias disruptivas de descarbonização. No setor residencial e de serviços projeta-se um crescimento de aproximadamente 60% na demanda energética, refletindo o aumento da renda média, ampliação da posse de equipamentos eletrônicos e digitalização de atividades, bem como a ampliação no número de unidades consumidoras. Para atender a este crescimento com redução de emissões, a eletricidade se consolida como a fonte mais importante. Adicionalmente, os cenários apontam para uma forte substituição do gás liquefeito de petróleo (GLP) pelo gás natural para as aplicações de cocção de alimentos e aquecimento, fazendo com que a demanda de gás natural quase que decuplica entre 2020 e 2050 neste setor. PROPOSTAS PARA A TRANSIÇÃO ENERGÉTICA O relatório apresenta nove propostas para a transição energética. Elas abrangem compromissos públicos e privados e reforçam a meta brasileira de contribuir decisivamente para o objetivo global de reduzir as emissões de GEE e limitar o aquecimento global. São elas: Adotar agenda de política energética e desenho de mercados que crie condições para caminhos flexíveis de descarbonização; Harmonizar objetivos de desenvolvimento sustentável, transição energética e segurança energética, aproveitando o potencial de recursos e as oportunidades de mercado e inovação para o Brasil; Minimizar arrependimentos mediante abordagens de mercados abertos, diversos e competitivos; Aproveitar vantagens competitivas existentes no Brasil para construir e financiar vantagens competitivas do amanhã, requalificando ativos e migrando expertises; Cumprir objetivos/metas já estabelecidas pelo país em linha com o compromisso de neutralidade climática (líquida); Assegurar que o setor energético brasileiro tenha uma transição justa, inclusiva e custo-efetiva; Aperfeiçoar ou estabelecer arcabouços institucional, legal e regulatório que promovam o desenvolvimento e adoção de tecnologias e modelos de negócios com foco na redução de emissões e remoção de carbono de emissões de gases de efeito estufa; Mapear, detalhar e disseminar informações sobre potencial técnico, econômico e de mercado para as alternativas identificadas nos diferentes cenários; Aprofundar estudos sobre resiliência climática das soluções energéticas encontradas no projeto. O documento bem como o caderno executivo do programa estão disponíveis no site do CEBRI: https://cebri.org/br/doc/309/neutralidade-de-carbono-ate-2050-cenarios-para-uma-transicao-eficiente-no-brasil (#Envolverde)

sábado, 18 de fevereiro de 2023

Chacina e resistência: relembre fatos históricos da realidade yanomami

Por Agência Brasil – Impacto do garimpo nas comunidades é denunciado há décadas Na Terra Indígena (TI) Yanomami, de 9,6 milhões de hectares, a forma como o garimpo impacta as comunidades é denunciada há décadas, tanto por lideranças quanto por veículos do jornalismo independente e local. Os yanomami são um povo que constantemente rememora um dos eventos mais marcantes e extremos de violação de direitos, conhecido como Massacre de Haximu. Esse foi o primeiro caso reconhecido pela Justiça brasileira como um crime de genocídio. A chacina ocorreu em agosto de 1993. O conflito começou quando garimpeiros ilegais do Alto Orinoco descumpriram um acordo feito com os yanomami que viviam em uma região montanhosa de fronteira entre o Brasil e a Venezuela. No dia 15 de junho, sete garimpeiros convidaram seis indígenas para caçar e executaram quatro deles durante o percurso. Em retaliação, os yanomami assassinaram um dos garimpeiros. Pouco mais de um mês se passou e, no dia 23 de julho, um grupo de garimpeiros invadiu a aldeia, onde estavam alguns yanomami – a maioria, mulheres e crianças –, e mataram a tiros e golpes de facão 12 yanomami. As vítimas foram um homem, uma mulher, três adolescentes, duas idosas, quatro crianças e um bebê. Em 2022, completaram-se 30 anos da homologação da TI, em meio a problemas ainda sem solução definitiva. Segundo o Conselho Indigenista Missionário (Cimi), no mês de junho, a comunidade de Xihopi fazia uma celebração para marcar a data, mas também aproveitava a ocasião para compartilhar relatos de episódios de violência causados, ainda hoje, por garimpeiros. Ao todo, estima-se que haja, atualmente, cerca de 20 mil garimpeiros na TI. Oito meses antes, em 13 de outubro de 2021, lideranças da comunidade Macuxi Yano, região do Rio Parima comunicavam à Hutukara Associação Yanomami (HAY) o desaparecimento de duas crianças, de 5 e 7 anos de idade, enquanto brincavam na água, próximo a uma balsa de garimpo. Uma equipe do Corpo de Bombeiros iniciou as buscas imediatamente e, no mesmo dia, encontrou o corpo do menino mais novo. No dia seguinte, a corporação localizou a segunda criança, também sem vida. Em abril de 2022, outra tragédia arrasava o povo yanomami. O luto agora se instalava pela perda de uma menina de 12 anos, estuprada e morta por garimpeiros, na comunidade de Aracaçá, que fica na região Waiakás, estado de Roraima. A região é uma das mais impactadas pelo garimpo. Malária e insegurança alimentar No local, concorrem com a fome, a malária e a contaminação pelo mercúrio. Como resposta, o Ministério da Saúde declarou Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (Espin) e instalou o Centro de Operações de Emergências em Saúde Pública (COE – Yanomami). As ameaças à segurança alimentar, especificamente, já estiveram, inclusive, em outubro de 2019, no radar do Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), que alertou para a fome de crianças yanomami. Na época, calculava-se que, entre a parcela aldeada, oito em cada dez crianças menores de 5 anos padeciam de desnutrição crônica, condição que pode comprometer, de modo irreversível, o desenvolvimento mental, motor e cognitivo ou mesmo levar a óbito. Desde que vieram à tona imagens de yanomami desnutridos, debates também foram suscitados, abordando, inclusive, a necessidade de se seguir certo protocolo de divulgação, para se respeitar a memória das vítimas da crise socioambiental que esfacela o território. *Crédito da imagem destacada: Divulgação/Força Aérea Brasileira #Envolverde

Mineração em Terras Indígenas explode em mais de 1.200% nos últimos 35 anos

Por ClimaInfo – Um estudo publicado por pesquisadores do INPE e da Universidade do Sul do Alabama (EUA) mostrou a dimensão do avanço da mineração em territórios indígenas na Amazônia Legal nas últimas décadas. De acordo com a análise, a área total ocupada pela extração ilegal de minérios nessas terras saltou de 7,45 km2 em 1985 para 102,16 km2 em 2020, um aumento de 1.217%. Cerca de 95% das áreas de mineração estão concentradas em três terras indígenas: Kayapó, Munduruku e Yanomami. O artigo também destaca a explosão dessa atividade desde 2017: naquele ano, a área total afetada pela mineração ilegal somava 35 km2; nos três anos seguintes, a área quase triplicou. A maior parte da mineração ilegal está associada ao garimpo de ouro (99,5%). A atividade é mais intensa na Terra Kayapó, que registrou um salto de quase 1.000% em 35 anos, com área total garimpada indo de 7,2 km2 para 77,1 km2. Já nas Terras Munduruku e Yanomami o que chamou a atenção foi a intensidade recente do garimpo: no território Munduruku, a área de garimpo pulou de 4,6 km2 em 2016 para 15,6 km2 em 2020; e no território Yanomami, foi de 0,1 km2 para 4,2 km2 no mesmo período. “Esse número alarmante do avanço da mineração em Terras Indígenas na Amazônia Legal que levantamos provavelmente é ainda maior se levarmos em conta as limitações do conjunto de dados utilizados”, explicou Guilherme Mataveli (INPE), um dos autores do estudo, à Agência FAPESP. Isso porque o estudo não inclui o garimpo em embarcações ancoradas em rios ou em pequenas áreas onde não ocorreu a conversão da floresta para esse fim.O estudo foi divulgado na revista Remote Sensing, e teve destaque na Agência Brasil. #Envolverde

Mapbiomas identifica centenas de pistas de pouso ilegais em terras indígenas e áreas protegidas

Por Agência Brasil- Total de pistas de pouso encontradas na Amazônia é mais que o dobro das registradas oficialmente na Anac Levantamento feito pelo Mapbiomas, divulgado nessa segunda feira, revelou mais de 2.800 pistas de pouso na Amazônia, número que é mais que o dobro das pistas que estão legalmente registradas na Agência Nacional da Aviação Civil (Anac). Além disso, 804 dessas pistas estavam dentro de uma área protegida, 320 no interior de terras indígenas e mais de 450 a menos de cinco quilômetros de um garimpo. De acordo com a organização, o objetivo na divulgação desse mapa é contribuir no trabalho de acabar com essas pistas clandestinas que ficam na Amazônia. O coordenador técnico do mapeamento de mineração do Mapbiomas, Cesar Diniz, explicou que, apesar das pistas clandestinas poderem ser utilizadas para outros fins ilícitos como o tráfico de drogas ou o transporte ilegal de madeira ou animais silvestres, é o garimpo que utiliza de forma intensa esse meio de transporte na Amazônia, tanto para trazer maquinário quanto para o escoamento do ouro. Cesar também sugeriu alternativas para evitar que garimpeiros expulsos da terra indígena Yanomami voltem. Ainda segundo o levantamento, cerca de 12% da área de garimpo no país é ilegal, o que equivale a 23 mil hectares de terra, uma área equivalente a cidade de Recife, capital de Pernambuco. *Crédito da imagem destacada: Garimpo Tatuzão, na região do rio Uraricoera na TI Yanomami – Bruno Kelly/Amazonia Real #Envolverde

Saiba quais são os mitos e verdades do trabalho híbrido

Apesar de algumas empresas serem resistentes, pesquisas mostram benefícios para colaboradores O trabalho híbrido faz parte da rotina de pessoas no mundo todo. No Brasil não é diferente. Segundo a pesquisa “Working from Home Around the World”, os brasileiros gostariam de trabalhar em casa em média 2,3 dias por semana. Apesar disso, as empresas aplicam o home office uma média de 0,8 dias por semana. A diferença entre o que querem os colaboradores e o que ocorre na prática demonstra que, apesar de ser uma tendência, ainda há resistência do setor corporativo a respeito do remote first. Parte disso decorre de mitos que ainda impactam na decisão das empresas sobre o melhor modelo de trabalho. O primeiro deles é justamente sobre a preferência dos colaboradores. “Muitas empresas acreditam que precisam impor o modelo remoto ou retornar ao escritório de qualquer forma, sem planejamento ou até mesmo ouvir as pessoas, pode ser um problema a longo prazo que impacta não só na produtividade, mas também na saúde mental”, explica Fernando Gorguet, Head de Global Sales da Deskbee, empresa que desenvolve tecnologia de gestão do workplace especializada no modelo híbrido. Para o especialista, o modelo remote first exige pesquisa e acompanhamento constante da percepção dos colaboradores. “É importante investir em ferramentas que gerem dados para análise do clima organizacional, onde as pessoas possam expressar opiniões livremente. Além disso, que demonstrem quais recursos mais utilizam na empresa. Isso ajuda no planejamento não só de ações voltadas às pessoas, mas também na análise de custos da empresa”, explica. Entenda o que mais é fato e o que é mito no trabalho híbrido: Trabalho híbrido é menos produtivo Falso. Um dos receios dos gestores era que a produtividade fosse impactada pelo remote first, mas a realidade é que 55,2% dos trabalhadores brasileiros afirmaram se sentirem mais produtivos trabalhando dias em casa. A sondagem é do FGV IBRE, realizada no fim de 2022. “O planejamento da rotina de trabalho no modelo híbrido se adapta a diferentes perfis de pessoas. Isso permite que as idas ao escritório sejam para momentos em que é necessária a interação presencial. Assim como os momentos de concentração podem ser no home office. De toda forma, a possibilidade de escolha facilita que o colaborador ajuste seu dia a dia conforme achar mais produtivo”, afirma Gorguet. Trabalho híbrido é favorável à diversidade Verdade. A diversidade regional, de gênero e a inclusão de pessoas com deficiência aumenta com o modelo remote first. Pessoas que moram longe da sede das empresas e que antes não podiam se candidatar às vagas por causa do tempo de deslocamento têm um impedimento a menos. O mesmo ocorre com mulheres, que muitas vezes, precisam de uma rotina flexível em razão dos filhos. Além disso, segundo uma pesquisa do Gartner, 81% dos profissionais com deficiência disseram que se sentem mais respeitados no trabalho híbrido. “O trabalho híbrido favorece a inclusão desde que seja aplicado respeitando essas diferenças. É importante que, mesmo trabalhando em home office, essas pessoas tenham a estrutura necessária para executar as tarefas e que haja uma cultura interna voltada a desenvolver esses talentos”, alerta o especialista. Trabalho híbrido prejudica a cultura de inovação Falso. A interação entre os times é essencial para a inovação. Dessa forma, é importante que os momentos de troca sejam realizados de forma inteligente. “É inevitável investir em recursos que favoreçam essas trocas e incluam verdadeiramente as pessoas. A inovação ocorrerá desde que uso de ferramentas otimizem as rotinas de reuniões e facilitem as conversas. É importante que haja uma cultura interna para que essas práticas sejam realizadas, bem como ocorra o estímulo das lideranças para engajar as pessoas”, conclui Gorguet. Apenas empresas nativas digitais podem trabalhar de forma híbrida Falso. “A falta de conhecimento a respeito de como funciona a rotina de trabalho e quais recursos podem ser usados para acompanhar os colaboradores ainda são desafios para alguns setores, mas isso tem mudado”, explica o Head de Global Sales. Segundo ele, há empresas tradicionais se adaptando,como escritórios de advocacia, varejo e até mesmo indústria. “Percebemos que as barreiras estão sendo derrubadas a respeito de como funciona o modelo. Além disso, a tecnologia facilita muito tanto a gestão quanto o funcionamento da empresa e essa informação está chegando às empresas. Há setores entendendo que mudar o modelo de trabalho é uma forma de reter talentos e até mesmo de evitar custos na operação”, explica Gorguet. #Envolverde

sexta-feira, 17 de fevereiro de 2023

Uma em cada três crianças no mundo não têm acesso à água potável nas escolas

Situação requer a construção de um plano de ação efetivo, que priorize o bem-estar infantil em regiões de extrema pobreza, explica especialista Para o desenvolvimento saudável e o bom desempenho dos alunos, do corpo docente e dos funcionários, a higienização e a limpeza das escolas precisam ser parte da rotina escolar. Segundo dados divulgados no relatório “Pronto para aprender e prosperar: saúde na escola e nutrição do mundo”, construído pela Organização das Nações para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), uma a cada três crianças no mundo não têm acesso à água potável em suas escolas. O documento ainda relata que quase metade das instituições carece de instalações sanitárias básicas, o que impossibilita os alunos de lavarem adequadamente suas mãos com água e sabão. A situação afeta, principalmente, crianças de países de baixa renda, com menos probabilidade de frequentar escolas que oferecem sistemas básicos de saúde. A cobertura mais fraca é na África Subsaariana e no Pacífico, segundo informações relatadas no texto. Para Fernando Silva, CEO da PWTech, startup voltada para sistemas de filtragem, a situação requer a construção de um plano de ação efetivo, que priorize o bem-estar infantil em regiões de extrema pobreza, que convivem com a escassez de água potável, a falta de saneamento básico e sistemas de tratamento de esgoto, para que não haja aumento no número de infecções e viroses dentro das comunidades. “A disponibilização de recursos básicos em instituições de ensino são fundamentais. A escola é sinônimo de segurança e aprendizado, um local no qual os alunos se sintam bem. Com a falta de instalações sanitárias básicas, crianças e adolescentes estão suscetíveis a doenças infecciosas, como a diarréia aguda, considerada a segunda maior causa de morte entre as crianças menores de 5 anos”, explica o especialista. Hoje, no Brasil, 14,3% das crianças e adolescentes não conseguem ter o direito ao acesso à água garantido, totalizando 7,6 milhões de crianças e adolescentes. 7.5% têm água em casa, mas não filtrada ou procedente de fonte segura e 6,8% não contam com sistema de água dentro de suas casas, estando em privação extrema. As privações de água variam de acordo com a região, sendo predominantes no Norte, no Nordeste e na zona rural. “Quando há investimento em saneamento básico, há melhorias na saúde e no meio ambiente, impactando positivamente na economia e na qualidade de vida da população. Logo, há um aumento no Índice de Desenvolvimento Humano”, reforça Silva. Sobre a PWTECH Fundada em 2019, a PWTech é uma startup brasileira voltada para a purificação de água contaminada. A solução foi desenvolvida em parceria operacional com a Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) e a Escola Politécnica da USP, e funciona de forma simples: basta conectar o equipamento na água e ligá-lo( qualquer tipo de energia) que, em poucos minutos, a água já sai pronta para ser consumida. O sistema de tratamento de água portátil esteve presente em crises humanitárias como a Guerra da Ucrânia e nos desastres naturais no Haiti, Tonga e Madagascar. No Brasil, a startup desenvolveu projetos de saneamento básico no Nordeste e na Ilha de Bororé, em São Paulo. Ao todo, mais de 1 milhão de pessoas já tiveram acesso à água potável graças à solução. #Envolverde

“Criminosos, temam o Ibama”, diz novo chefe do órgão

Por Leanderson Lima para o Amazônia Real – Manaus (AM ) – Nos últimos quatro anos, o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) deixou de lado uma de suas finalidades principais: o poder de polícia ambiental de âmbito federal. Como fazer isso se era preciso sobreviver? Sob Jair Bolsonaro (ex-presidente), Ricardo Salles (ex-ministro) e Eduardo Bim (ex-chefe do órgão), o Ibama foi sucateado, com funcionários que queriam cumprir suas obrigações sendo perseguidos e operações sabotadas pelo próprio governo federal. Mas o “Ibama voltou”. Hoje, dentro do órgão, o clima é outro. Profissionais, antes desmotivados, agora, vivem uma fase de euforia com a retomada de operações como a “Xapiri”, que vai realizar a desintrusão da Terra Indígena Yanomami (TIY), em Roraima, ao lado da Polícia Federal e da Força Nacional de Segurança Pública. Serão retirados os mais de 20 mil garimpeiros que invadiram a área e causaram a crise humanitária e sanitária que levou à morte de quase 600 crianças indígenas. Só na primeira semana de operação, a operação destruiu um trator de esteira [usado para abrir ramais na mata fechada], apreendeu 5 mil litros de combustível que seria utilizado na estrutura de funcionamento do garimpo, barcos e voadeiras que chegavam a 12 metros de comprimento, e que carregavam quase uma tonelada de alimentos. Um dos maiores prejuízos dos criminosos, porém, foi a destruição de um helicóptero avaliado em 3 milhões de dólares (mais de 15 milhões de reais). O valor é aparentemente pequeno, perto dos estimados 3 bilhões de reais de prejuízo, que a entidade Conservação Estratégica estimou pelos danos causados pelo garimpo na TIY. Neste domingo (12), quinto dia da operação para sufocar o garimpo na TIY, e que reúne ainda a Polícia Federal e a Força Nacional, fiscais do Ibama continuaram destruindo dragas e balsas. A partir desta segunda-feira, o espaço aéreo voltaria a ser fechado pela Força Aérea Brasileira (FAB), impedindo o restabelecimento de rotas de fugas de garimpeiros e mineradores. Mas a FAB decidiu prorrogar esse prazo até 6 de maio. Barcos com garimpeiros e familiares poderão sair pelo rio, desde que só levem pessoas e não cargas. O Exército continua recuperando a pista de pouso e decolagens de Surucucu, onde o governo federal quer montar um hospital de campanha. Até agora, mil Yanomami em grave estado de saúde tiveram de ser deslocados até Boa Vista para serem atendidos. À frente deste momento de retomada do Ibama, está Jair Schmitt, funcionário de carreira há mais de 20 anos. Um de seus primeiros e simbólicos atos foi revogar os despachos assinados pelo ex-presidente do Ibama, Eduardo Bim, que dificultariam o pagamento de um total de 3,6 bilhões de reais em multas por infrações ambientais. Confira a entrevista exclusiva para a Amazônia Real: Amazônia Real – Na última semana, no início da operação de retirada dos garimpeiros da Terra Indígena Yanomami, em Roraima, o Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima fez uma postagem no Twitter dizendo: “O Ibama voltou”. Qual é a sensação de ver um órgão como o Ibama ressurgir? Jair Schmitt – O Ibama voltou, de fato, depois de alguns anos em momentos difíceis de trabalho. Esse é um momento de muita empolgação e motivação de toda a equipe. O Ibama voltou nos seus trabalhos de proteção ambiental, combate aos ilícitos, de proteção das terras indígenas, então é um momento bastante comemorado aqui pelos servidores e isso reflete no trabalho e na entrega para sociedade. Amazônia Real – Como está o andamento da operação de retirada dos garimpeiros? Quantos equipamentos já foram destruídos, quantos garimpeiros já foram expulsos, já tem um balanço dessas ações? Schmitt – O Ibama iniciou a “Operação Xapiri” na quinta-feira (6). Nós já tivemos alguns resultados. A estratégia geral é neutralizar a infraestrutura empregada no garimpo, assim como asfixiar, impedir que suprimentos sejam enviados aos garimpeiros no interior da terra indígena, para que eles não continuem com a atividade ilegal. Até o momento, de maneira geral e isso acaba sendo dinâmico, nós tivemos na segunda-feira ainda a destruição de trator de esteira, de uma base de apoio logístico aos garimpeiros, que inclusive havia uma aeronave, um avião nesta base, depois apreendemos mais de dez embarcações que estavam subindo o rio, que estava levando suprimentos, combustível, comida, equipamentos para as frentes de exploração de ouro. E tivemos mais duas balsas, um outro avião e um helicóptero que foram destruídos até quinta-feira (9 de fevereiro). Amazônia Real – O que representou para o Ibama o período do ex-presidente Jair Bolsonaro e como foram as perseguições aos servidores? Schmitt – É até difícil dimensionar todos esses impactos. De maneira geral, o que a gestão anterior promoveu na instituição, primeiro, foi uma desmotivação geral. O clima organizacional era terrível. Os servidores muitas vezes eram impedidos de trabalhar ou quando trabalhavam acabavam sendo perseguidos, muitas vezes até punidos injustamente por exercerem o seu dever de ofício. Foram tempos difíceis. Bom gestores foram exonerados de seus postos de trabalho e na prática quem perde é a sociedade como um todo, porque se o Ibama não trabalha, não atua, você tem crimes ambientais, tem danos ambientais e quem sofre é a sociedade. Principalmente as populações mais vulneráveis, a exemplo dos indígenas, como das (populações) tradicionais, mas no fundo todos nós. Quando a gente fala em desmatamento, cuja emissão de gás de efeito estufa afeta o planeta como um todo, inclusive a nossa vida prática, influenciando no clima, no regime das chuvas e assim por diante, então o Ibama não trabalhando, a sociedade perde. Amazônia Real – Como está sendo o caminho para novamente motivar os servidores? Schmitt – Antes de tudo o que é importante destacar – até contrastando com a gestão anterior –, primeiro que nós temos um amplo apoio da ministra Marina Silva (Rede) para que o Ibama possa trabalhar e exercer as suas funções. Isso é decisivo para os servidores, seja na área de fiscalização, seja nas outras áreas que a instituição atua, licenciamento, gestão da biodiversidade, a parte do controle da poluição e qualidade ambiental, entre outros. Esse apoio é decisivo. Depois, começamos um processo de reorganização das nossas equipes. Tivemos a exoneração de servidores que não eram do quadro, eram da gestão anterior em diversos postos estratégicos e foram designados outros servidores para exercerem essas funções. Servidores concursados, experientes e que estão cada um na sua unidade reorganizando o trabalho. E agora estamos avançando no processo de replanejamento, atualizar nosso planejamento, obviamente que o foco acaba sendo o combate ao desmatamento na Amazônia por várias questões, é uma das ações prioritárias do governo federal, o próprio presidente Lula tem se posicionado fortemente neste assunto. Depois viemos organizando outras agendas de trabalho, também de assuntos relevantes que envolvem fauna, pesca, licenciamento, controle de madeira e assim por diante. Amazônia Real – Como ficou a questão do orçamento do Ibama para 2023? Schmitt – Também tivemos, graças à articulação de alguns parlamentares da base do governo, da própria ministra, uma recomposição orçamentária em alguns setores estratégicos do Ibama como fiscalização e combate aos incêndios florestais e estamos caminhando também para aprovar projetos de reestruturação e fortalecimento do órgão. Então, com uma boa liderança, uma boa gestão, respaldo político, insumos que provêm condições de trabalho, recursos financeiros, faz parte do processo de reconstrução da organização. E por último também estamos trabalhando para em breve aprovar um novo concurso público. Um dos fatores críticos da instituição é o déficit de pessoal. O incremento da força de trabalho também é decisivo para avançarmos nesta reconstrução. Amazônia Real – O Ibama avalia fazer postos permanentes na TIY? Não tem só a região do Surucucu, que virou o foco muito grande, mas outras regiões que necessitam de ter uma fiscalização. Schmitt – Além da Terra Indígena Yanomami, que tem conflagrada a emergência, o quadro que evoluiu gravemente nos últimos anos, existem outras terras indígenas que também são acometidas de invasores, de criminosos, seja no garimpo, extração de madeira ou outros crimes ambientais. O Ibama tem definido algumas áreas em conjunto com o Ministério dos Povos Indígenas, com a própria Funai, como (áreas) estratégicas e prioritárias, e, para cada, nós estamos montando uma estratégia, um plano específico de atuação. Cada cenário de fiscalização é um cenário que exige um tratamento diferenciado. Amazônia Real – O que se pode falar sobre os próximos passos de operações do Ibama de combate ao garimpo? Schmitt – Temos algumas áreas que são prioritárias. Estamos montando um planejamento específico para cada uma dessas áreas que vamos atuar e isso envolve desde já a coleta de informações, o levantamento da área de inteligência, identificação de atores chave. Também estamos atuando em colaboração com outros órgãos como o Ministério Público, a Polícia Federal, que também tem a responsabilidade e poderio para atuar no combate ao crime nessas áreas. Amazônia Real – Neste momento já começou a saída dos garimpeiros da TIY, mas o garimpo é um problema cíclico, vai e volta. Como fazer para tentar acabar de uma vez por todas com a prática de garimpo em território indígena? Schmitt – O Estado brasileiro tem condições e chegou mais do que a hora disso de controlar todos esses danos ambientais que decorre do garimpo ilegal. É importante esclarecer que a atividade mineral, existe a atividade mineral legal, lícita, autorizada, mas não é o caso específico que envolve as terras indígenas. A atuação continua e forte de todas as forças do Estado brasileiro, sim, é possível reduzirmos ou até mesmo acabarmos com essa exploração mineral ilegal. Amazônia Real – Existe muita gente “grande” envolvida com a prática de garimpo. Há suspeitas de envolvimento de políticos, de grandes empresas. Como é que essa operação pode chegar aos “cabeças”, já que os garimpeiros muitas vezes são apenas a ponta da lança? Schmitt – De fato o garimpeiro acaba sendo a ponta da lança, talvez a pessoa que no processo criminoso, é o que menos lucra, o que menos ganha dinheiro, e muitas vezes também acaba virando vítima até dá violência, de outros contextos, mas existem elementos centrais, o que a gente chama de cabeças aí, de todo esse processo criminoso. O Ibama tem o papel de ter essa atuação mais em primeira linha no combate, de debelar, neutralizar os garimpos, mas nesse trabalho também tem a oportunidade de levantar muitas informações, no campo, e também com o trabalho de inteligência. Essas informações que o Ibama levanta, reúne, ele repassa aos órgãos de investigação criminal, no caso o Ministério Público e a Polícia Federal. Compete a eles montar as operações para prender e deter esses criminosos, esses atores mais centrais. Seja quem fomenta, quem lucra com logística acerca do transporte aéreo, com o combustível, quem compra ou quem vende esse ouro ilegal. Amazônia Real – Já se tem uma ideia do quanto essa operação já rendeu de prejuízo aos garimpeiros, para os cabeças por trás de toda essa exploração? Schmitt – A gente não tem os números consolidados em termos do prejuízo material, mas um exemplo que te coloco, uma das aeronaves que destruímos, um helicóptero S76, ele é estimado por volta de 3 milhões de dólares. Somado a outros bens apreendidos aí, você vê que chegamos a uns 15 milhões de reais em prejuízo aos infratores. É importante destacar que essas práticas de inutilização, destruição de bens apreendidos, ela é respaldada pela legislação, existem normas específicas que dizem como e quando isso é feito, assim como existem duas decisões judiciais, uma decorrente de uma ação civil pública impetrada pelo Ministério Público Federal, em Roraima, e outra decisão judicial do Supremo Tribunal Federal (STF) que determina que o Ibama atue sobre esses garimpos ilegais, então todos esses elementos dão respaldo à atuação da instituição para a inutilização desses equipamentos. Amazônia Real – Muito já se falou, também, sobre a possibilidade de existirem facções do tráfico de drogas, envolvidas também no garimpo ilegal. O quanto isso é verdade? Há mesmo facções do narcotráfico que se associaram também à atividade garimpeira? Schmitt – Sim, há informações da presença de facções criminosas no garimpo. Amazônia Real – Para finalizar, que recado o senhor gostaria de deixar para aqueles que insistem em financiar a atividade garimpeira em territórios indígenas? Schmitt – O Ibama voltou! Criminosos, temam o Ibama porque ele vai atingir vocês. Operação de combate ao garimpo ilegal dentro da Terra Indígena Yanomami (Foto: Ascom/Ibama) *Crédito da imagem destacada: O presidente interino do Ibama, Jair Schmitt, fala sobre a operação de retirada de garimpeiros da Terra Indígena Yanomami e afirma que o prejuízo deles já é maior que 15 milhões de reais. Na imagem acima, avião que foi destruído em operação na Terra Indígena yanomami (Foto: Ascom Ibama) #Envolverde

Em meio a violência, povo Pataxó cobra demarcação e presença do governo federal no extremo sul da Bahia

Por Cimi – Pressionado por fazendeiros e empreendimentos em seu território, o povo Pataxó iniciou a autodemarcação de suas terras e sofre com ameaças, ataques e assassinatos Nos últimos meses, a violência contra o povo Pataxó, no extremo sul da Bahia, tornou-se parte do cotidiano das aldeias localizadas nas Terras Indígenas (TIs) Barra Velha do Monte Pascoal e Comexatibá. Depois do assassinato do menino Gustavo Pataxó, de 14 anos, e mais recentemente dos jovens Nauí, de 16, e Samuel, de 25, o medo ronda as aldeias e os indígenas evitam até mesmo transitar pelo próprio território. Os ataques intensificaram-se a partir de junho de 2022, quando o povo Pataxó deu início ao processo de autodemarcação de seu território. O menino Gustavo Silva da Conceição foi assassinado com um tiro pelas costas, na madrugada do dia 4 de setembro, enquanto tentava fugir dos pistoleiros que atacaram a retomada Vale do rio Cahy. No dia 13 de outubro, o corpo do Pataxó Carlone Gonçalves da Silva, de 26 anos, foi encontrado na região. Ele havia desaparecido um mês antes, quando se deslocava entre as aldeias Boca da Mata e Cassiana, na TI Barra Velha. As lideranças Pataxó afirmam que o caso está relacionado aos conflitos pela terra. Meses depois, no dia 17 de janeiro de 2023, Samuel Cristiano do Amor Divino, de 25 anos, e o adolescente Nauí Brito de Jesus, de 16 anos, foram perseguidos e executados por pistoleiros que atuam para fazendeiros da localidade. Os dois jovens tinham saído para comprar alimentos no distrito de Montinho, que fica próximo à retomada onde viviam. O distrito faz parte do município de Itabela (BA) e fica na margem oposta da BR-101, que delimita o território indígena. Ambos foram mortos na estrada, não por coincidência, onze dias depois de iniciada a retomada das fazendas Condessa e Veneza, propriedades localizadas dentro dos limites da TI Barra Velha, em meio à intensificação dos conflitos na região. “Eles mataram os parentes covardemente aqui dentro do próprio território”, indigna-se uma liderança Pataxó, que não será identificada nesta matéria por motivos de segurança. O acirramento dos conflitos e a pressão de fazendeiros e empresários do turismo sobre as terras Pataxó têm tirado a liberdade do povo para circular no próprio território e também nas cidades da região. “A gente está oprimido sem poder sair, sem ir na cidade” explica o indígena. “Porque hoje a visão [dos fazendeiros] não é só matar liderança, a visão hoje é matar qualquer indígena que sair do nosso território”. A liderança relata ainda, além do assassinato dos quatro jovens Pataxó, outras tentativas de homicídio que se evidenciam nas marcas de fuzilamento deixadas nas casas de fazendas retomadas pelos indígenas. Esses sinais de violência se fizeram comuns nas recentes áreas de retomada dos territórios de Barra Velha e Comexatibá. Mas a quantidade e o calibre dos tiros não deixam de impressionar, pois denotam o alto grau de violência investido contra os Pataxó. “Eles atiram para acertar. Nós temos provas, pegamos as cápsulas de fuzil. Nós estavámos em cinco pessoas lá e eles deram mais de cem tiros na casa. Só não pegou porque corremos”, conta. Espera, cansaço e autodemarcação A brutalidade dos ataques, ameaças e assassinatos promovidos contra o povo Pataxó se agrava à medida que a comunidade avança sobre as áreas invadidas por fazendeiros. Desde junho do ano passado, essas terras vêm sendo retomadas pelos Pataxó por meio de um processo de autodemarcação territorial. “Nós não estamos mais aguentando a morosidade, a demora da conclusão dos processos fundiários nas terras indígenas Pataxó. Com essa morosidade está vindo a prostituição, a droga, a urbanização, a degradação ambiental, a contaminação e a descaracterização do que é terra indígena pela construção imobiliária”, explica Mãndy Pataxó, cacique da aldeia Vale do Cahy, localizada na TI Comexatibá. “Por não aguentarmos mais todo esse processo violento, estamos fazendo um processo de autodemarcação, ocupando as áreas degradadas, as áreas que estão em mãos irregulares, de fazendeiros e latifundiários dentro das terras indígenas. Estamos ocupando essas áreas para poder evitar a destruição. E, por causa disso, nós estamos sofrendo toda uma represália”, relata a liderança. “Esse território é nosso”, explica Uruba Pataxó, vice-cacica da aldeia-mãe Barra Velha, ao se referir aos 52,7 mil hectares relativos à área de revisão de limites da TI Barra Velha e aos 28 mil hectares da TI Comexatibá. A autodemarcação desses dois territórios foi a saída encontrada pelo povo para efetivar o direito de viver e habitar suas terras. “Se a gente não fizer a nossa autodemarcação, governo nenhum vai fazer. Porque eles acham que se a gente não entrar para dentro da terra, ela não nos pertence”, considera a vice-cacica. Morosidade e pressão As TIs Barra Velha e Comexatibá já foram identificadas e delimitadas pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai) e, com as particularidades de cada caso, aguardam a emissão da portaria declaratória pelo Ministério da Justiça. A TI Barra Velha do Monte Pascoal aguarda a portaria desde 2009, quando foi publicado o relatório circunstanciado de identificação e delimitação da área pela Funai. Fazendeiros questionaram judicialmente a demarcação, mas foram derrotados no Superior Tribunal de Justiça (STJ), que decidiu favoravelmente aos indígenas em 2019. Desde então, não há nenhum impedimento legal à emissão da portaria. Na década de 1980, a TI Barra Velha foi reservada com uma área pequena, de apenas 8.627 hectares, deixando grande parte do território de fora da demarcação. Para os Pataxó a revisão dos limites da área demarcada é fundamental para garantia de um futuro às novas gerações. “Esses 8.627 hectares, onde eu moro, que é a área demarcada e homologada, ela é pequenininha. E tem uma parte dela, na orla, que está sendo invadida por grileiros, com venda de terras e [especulação] imobiliária dentro do nosso território”, explica Uruba. Já a TI Comexatibá, identificada e delimitada em 2015, aguarda que a Funai responda às contestações feitas no procedimento demarcatório para que, então, a portaria declaratória possa ser emitida pelo Ministério da Justiça. A Instrução Normativa 09/2020, publicada pela Funai sob o governo Bolsonaro, evidenciou a enorme pressão a que estes territórios estão submetidos. A medida liberou a certificação de fazendas sobre terras indígenas ainda não homologadas, como é o caso das duas terras Pataxó no centro dos atuais conflitos. As consequências para os Pataxó foram imediatas: nos primeiros meses após a publicação da normativa, 51 fazendas, com um total de 11,4 mil hectares, foram certificadas sobre as TIs Barra Velha do Monte Pascoal e Comexatibá, a maioria delas integralmente sobrepostas às terras indígenas. Entre abril e agosto de 2020, foram dez certificações de propriedades sobre a TI Comexatibá e 41 sobre a TI Barra Velha do Monte Pascoal, a maioria delas pertencente aos fazendeiros derrotados no STJ. Apesar das decisões judiciais suspendendo a validade na normativa em 13 estados após ações do Ministério Público Federal (MPF), inclusive na Bahia, e do anúncio de anulação da normativa pelo Ministério dos Povos Indígenas, as certificações já concedidas não perderam validade. Com elas, os fazendeiros podem negociar e financiar atividades nestas áreas, aumentando ainda mais a pressão e a devastação do território já reconhecido oficialmente como tradicionalmente ocupado pelo povo Pataxó. O movimento de autodemarcação iniciado pelos Pataxó tem sido uma resposta à omissão do Estado e uma forma de evitar a degradação ainda maior do território pelo agronegócio e por empreendimentos privados. Contudo, em meio à crescente onda de violência, ameaças e conflitos com os fazendeiros, “ter a terra no papel”, como explicou Candara, liderança do povo Pataxó e mãe de Gustavo, é ainda para seu povo à medida que colocará fim nos conflitos. “Queremos ter nossa liberdade de plantar e colher. Para viver mais em harmonia, sem violência dentro do nosso próprio território”, afirma a liderança. Força-Tarefa e atuação da PM Desde setembro do ano passado, após o assassinato de Gustavo Pataxó, um grupo policial constituído por policiais militares, civis e bombeiros tem atuado no extremo sul da Bahia a fim de conter a violência e os conflitos promovidos pelos fazendeiros. Criada pela Secretaria de Segurança Pública do governo do estado da Bahia, a Força-Tarefa, como é conhecida na região, tem se ocupado pouco de suas atribuições. Responsável por garantir a segurança e a proteção do povo Pataxó, a Força-Tarefa tem se mostrado pouco disponível para atender as denúncias feitas pelo povo. Segundo Uruba Pataxó, a Força-Tarefa só veio para a região depois do assassinato do Gustavo, mas não conseguiu evitar a morte de outros jovens como Samuel e Nauí. “Eles chegaram dizendo que vieram para apaziguar o conflito. Mas antes de sentar com os indígenas para saber o que estava acontecendo, eles foram primeiro sentar com os fazendeiros”, relata Uruba. A falta de clareza na atuação da Força-Tarefa no extremo sul da Bahia reflete-se, também, em declarações de integrantes do governo estadual. Foi o caso do secretário estadual de Justiça e Direitos Humanos, Felipe Freitas, que afirmou, no final de janeiro, que “no extremo sul [da Bahia] não existe demarcação, há um litígio, uma disputa”. O diálogo com a comunidade Pataxó só ocorreu após muita cobrança e pressão, mas ainda assim se mostrou insuficiente. “Eles passam na porta das ocupações indígena, das áreas de autodemarcação, mas não entram nas fazendas para prender os pistoleiros que estão atirando todas as noites no indígena”, denuncia Mãndy. Os questionamentos dos Pataxó quanto à conduta da Força-Tarefa não se dão em vão. Tanto o assassinato de Gustavo como de Samuel e Nauí resultaram na prisão de policiais militares, suspeitos de atuarem como pistoleiros a mando de fazendeiros. Três PMs foram presos, em outubro, suspeitos de matarem Gustavo, e outro foi preso em janeiro, acusado de assassinar os outros dois jovens. “Hoje, quem anda matando nosso povo na nossa região, fazendo pistolagem, é uma parte da Polícia Militar do estado da Bahia”, relata uma liderança não identificada por razões de segurança. “Por isso, nós queremos a presença da Polícia Federal dentro da área indígena. É dever da Polícia Federal intervir, tomando pé dessas investigações referente à morte de Samuel e Nauí”, reivindica. Essas demandas foram reforçadas pelo povo Pataxó em recente visita ao Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP), em Brasília, no dia 7 de fevereiro. Os indígenas foram recebidos pelo Secretário Nacional de Justiça, Augusto de Arruda Botelho, que prometeu, em declaração veiculada pelas redes sociais do ministério, levar ao ministro do MJSP, Flávio Dino, os pedidos de federalizar a investigação dos crimes contra indígenas na região. O povo também cobrou, novamente, a presença da Força Nacional nos territórios Pataxó. “É muito importante essa escuta e vou levar todas essas reivindicações ao ministro da Justiça, para que essas deliberações possam ser feitas”, garantiu Botelho. Para Mãndy Pataxó, a presença da Força Nacional é de extrema importância e “segurança para nós”. “Deixamos bem encaminhado [com o secretário do ministério da Justiça] o pedido e eles ficaram de solicitar ao governador essa ida da Força Nacional para região. A secretaria do ministério da justiça se comprometeu também em reunir com o governador e convocar os representantes dos movimentos indígenas para levar essa pauta da Força Nacional em nossa região”, informa a liderança. Na última sexta-feira, dia 10, representantes do povo Pataxó se reuniram com o secretário executivo do Ministério dos Povos Indígenas, Eloy Terena, a quem entregaram uma carta solicitando a visita presencial do Gabinete de Crise ao território Pataxó. “O que Eloy respondeu para gente é que a ministra Sônia Guajajara vai com a delegação do Comitê de Crise à nossa região, rápido, esses dias agora. Estamos contando com isso porque é preciso a segurança”, relata Mândy Pataxó, que esteve presente na reunião. O Gabinete de Crise foi criado no dia 18 de janeiro deste ano, um dia após o assassinato de Samuel e Nauí, “com finalidade de acompanhar a situação de conflitos na região do extremo sul da Bahia”. Constituem o Gabinete a própria ministra Sônia Guajajara, representantes da Funai e das secretarias executiva e de direitos territoriais indígenas, bem como do departamento de mediação e conciliação de conflitos indígenas. Também compõem o Gabinete, como membros convidados, representantes do Ministério da Justiça e Segurança Pública, do Governo do Estado da Bahia, da Defensoria Pública da União (DPU), do MPF, do Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH) e da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib). O povo Pataxó pede a presença do Gabinete na região “para tratar da crescente escalada de violência praticada contra o povo Pataxó por seus inimigos históricos”, diz a carta. No documento, o povo clama por socorro e por “medidas urgentes que garantam a proteção de nossas comunidades[…] Só a demarcação é capaz de resolver os conflitos de forma permanente”. Confira a carta na íntegra: Ao Ministério dos Povos Indígenas, Ministério da Justiça e Fundação Nacional dos Povos Indígenas: Nós, povo Pataxó do Extremo Sul da Bahia, solicitamos urgentemente ao Gabinete de Crise uma visita aos territórios Pataxó de Barra Velha do Monte Pascoal e Comexatibá para reunião presencial com nossas lideranças, para tratar da crescente escalada de violência praticada contra o povo Pataxó por seus inimigos históricos, que têm se articulado contra a demarcação dos nossos territórios, as Terras Indígenas Barra Velha do Monte Pascoal e Comexatibá. Nos últimos meses, quatro jovens Pataxó já foram assassinados devido à luta pela demarcação territorial. Sofremos, constantemente, ameaças e invasões de nossas aldeias por grupos armados de pistoleiros milicianos contratados por fazendeiros da região. Precisamos de medidas urgentes que garantam a proteção de nossas comunidades e a demarcação de nossas terras. Só a demarcação é capaz de resolver os conflitos de forma permanente. O povo Pataxó pede socorro!! Atenciosamente, Extremo Sul da Bahia, janeiro de 2023.