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segunda-feira, 31 de outubro de 2011

TERRAMÉRICA: Indicadores para a crise climática

Os dados oficiais relevantes sobre a Amazônia colombiana apresentam tantas falhas que os pesquisadores de um novo índice de sustentabilidade regional deixaram registrado que “foi difícil conseguir grande parte da informação”.

Bogotá, Colômbia, 31 de outubro de 2011 (Terramérica).- “É uma grande notícia” o governo da Colômbia estudar a anulação de títulos de mineração concedidos em áreas protegidas e regiões fronteiriças declaradas de segurança nacional, disse ao Terramérica o antropólogo Martín von Hildebrand, diretor da Fundação Gaia Amazonas. Na Amazônia colombiana, os parques nacionais representam sete milhões de hectares. A área considerada de segurança pelo Ministério da Defesa tem 4,8 milhões de hectares, mas poderia ser redefinida.

No total da Amazônia, há atualmente 138.571 hectares com títulos de mineração em vigor. As solicitações em trâmite e ainda vigentes incluem 5,4 milhões de hectares, segundo o Ministério de Minas e Energia. “Infelizmente, alertou Martín, “temos de pensar também que, na medida em que se defende certos territórios, como parques e áreas de segurança nacional, quem está ali buscando minerais se dispersa para outras áreas onde não há esta proteção. Por isso, são necessárias políticas muito sérias de acompanhamento e controle para as outras áreas da selva, afirmou.

Da Amazônia colombiana, 70% é considerada área florestal com certo grau de proteção. O título para mineração é concedido, mas condicionado a uma licença ambiental. O anúncio do Ministério de Minas e Energia, de que estuda anular concessões, foi feito no dia 26, na apresentação do Índice Amazonas 2030, elaborado por uma aliança de mesmo nome que recopila informação social, ambiental e econômica da parte colombiana desta selva que constitui o coração da América do Sul.

O estudo é inovador, pois concede a mesma importância às dimensões ambiental e indígena e às de caráter econômico, social e institucional. Cada uma tem peso de 20%. O valor mínimo do índice é zero (pior cenário) e o máximo é cem (melhor cenário). O resultado é uma análise estratégica equilibrada: a exata visão que requerem a crise ambiental e a mudança climática, na contramão de estudos habituais que privilegiam o econômico.

O xis da questão está em medir a vida dos ecossistemas. Se esta é avaliada na Amazônia segundo o índice de necessidades básicas insatisfeitas, o resultado indicaria que as comunidades indígenas vivem na indigência, e não é assim. Ao considerar o componente ambiental e a relação de conhecimento ancestral dos indígenas com seu território, objetivamente é verificável que a selva e a cultura proporcionam qualidade de vida.

Em todo caso, por meio de dezenas de variáveis que poderiam ser chamadas de “convencionais” (como nível educacional e serviços públicos), o índice observa o efeito das políticas públicas, em primeiro lugar, e da gestão privada, em segundo. “A visão é que, bem ou mal, é isto que tem, ou não tem, o Estado na Amazônia. E, depois, trata-se de fazer entender que estes indicadores para a Amazônia têm outras bases”, disse ao Terramérica a bióloga Natalia Hernández, que coordenou a desenho do estudo Amazonas 2030 em seu início.

“Somente considerando no mesmo nível o cultural, o social e o ambiental com o econômico e o institucional, se estará abrindo caminho para uma visão de desenvolvimento a partir da Amazônia”, acrescentou Natalia. A Amazonas 2030 é uma aliança de organizações não governamentais, empresas e meios de comunicação que promove a sustentabilidade e a qualidade de vida nesta região colombiana para colocá-las nas agendas nacional e internacional.

Seu nome se deve ao fato de, segundo o Grupo Intergovernamental de Especialistas sobre Mudança Climática, se for mantido o ritmo de desmatamento, em 2030 mais da metade da floresta amazônica estará degradada. Os dados oficiais relevantes sobre a Amazônia apresentam tantas falhas, que os pesquisadores fizeram constar no relatório que “foi difícil conseguir grande parte da informação, especialmente dados relacionados com salvo-condutos de movimentação de madeira, etnoeducação e legalização de extrações de áreas situadas em reserva florestal, entre outros”.

Além disso, os números coletados e incluídos no índice correspondem apenas a assentamentos urbanos. “O índice não reflete a cosmovisão dos indígenas devido à falta de informação que possa ser coletada”, alerta um texto sobre a metodologia. Talvez, as variáveis onde esta falha é mais intensa sejam as de saúde, que não levam em conta o trabalho dos xamãs, cujo impacto nunca foi medido.

Os departamentos avaliados são Amazonas, Putumayo, Caquetá, Guaviare, Vaupés e Guainía, que somam 403.348 quilômetros quadrados, uma extensa região que inclui o sul e o sudeste. O estatal Instituto Amazônico de Pesquisas Científicas Sinchi acrescenta ao território amazônico colombiano nove municípios do departamento do Meta, um de Vichada, três de Cauca e quatro de Nariño.

Dessa forma, a Amazônia colombiana compreende 483.164 quilômetros quadrados, 42% de seu território continental de 1,1 milhão de quilômetros quadrados. A Colômbia possui 17% dos rios da região amazônica, que por sua vez são fonte de 20% da água doce do planeta. Por seu tamanho, a Amazônia regula o clima global. Contudo, a dimensão geográfica da Amazônia varia, segundo três formas de entender este grande tesouro de diversidade biológica e cultural.

Uma compreende a Amazônia como região ou bioma, e inclui a bacia do Rio Amazonas e parte as dos rios Orenoco e Paraná. A outra inclui a bacia e os afluentes do Amazonas, e, finalmente há a Amazônia político-administrativa de cada país, que é medida em termos de planejamento e desenvolvimento. Bolívia, Peru e Equador, chamados, com a Colômbia, de países “andinos”, na realidade têm quase a metade de seus territórios na Amazônia. A Venezuela definiu que sua Amazônia inclui apenas a bacia amazônica, na beira do Estado venezuelano do Amazonas. Assim, se denomina Guayana Venezuelana toda a selva no resto desse Estado e a maior parte da do Estado Bolívar, ao sul do Orenoco.

O resultado global do Índice Amazonas 2030 é de 51,4, um número que apresenta acentuados contrastes. No colombiano Caquetá, foi destruída quase metade da selva, em Putumayo a quarta parte e em Guaviare um terço. Estes três departamentos do nordeste da Amazônia se caracterizam por uma alta proporção de colonos, poucos nativos e resguardos (territórios sob administração indígena), cidades grandes e infraestrutura viária.

Já nos também colombianos Amazonas, Vaupés, e Guainía, há muito pouco desmatamento e parques nacionais e não existe infraestrutura viária. As diferenças entre estas duas regiões da Amazônia colombiana se refletem meridianamente em uma pesquisa de percepção entre os habitantes da região, apresentada também pela Amazonas 2030 e realizada apenas em centros urbanos.

FONTE :Constanza Vieira, correspondente da IPS. ENVOLVERDE,31.outubro.2011.

AMAZÔNIA : LIMITE PRÓXIMO

Agência Fapesp – A Amazônia está muito próxima de um ponto de não retorno para sua sobrevivência, devido a uma combinação de fatores que incluem aquecimento global, desflorestamento e queimadas que minam seu sistema hidrogeológico.

A advertência foi feita por Thomas Lovejoy, atualmente professor da George Mason University, no Estado de Virgínia, Estados Unidos, no primeiro dia do simpósio internacional Fapesp Week, em Washington, no dia 17.

O biólogo Lovejoy, um dos mais importantes especialistas em Amazônia do mundo, começou a trabalhar na floresta brasileira em 1965, “apenas três anos depois da fundação da Fapesp”, lembrou.

Apesar de muita coisa positiva ter acontecido nestes 47 anos (“quando pisei pela primeira vez em Belém, só havia uma floresta nacional e uma área indígena demarcada e quase nenhum cientista brasileiro se interessava em estudar a Amazônia; hoje esta situação está totalmente invertida”), também apareceram no período diversos fatores de preocupação.

Lovejoy acredita que restam cinco anos para inverter as tendências em tempo de evitar problemas de maior gravidade. O aquecimento da temperatura média do planeta já está na casa de 0,8 grau centígrado. Ele acredita que o limite aceitável é de dois graus centígrados e que ele pode ser alcançado até 2016 se nada for feito para efetivamente reduzi-lo.

O objetivo fixado nas mais recentes reuniões sobre o clima em Cancun e Copenhague, de limitar o aumento médio da temperatura média global em dois graus centígrados, pode ser insuficiente, na opinião de Lovejoy, devido a essa conjugação de elementos.

De forma similar, Lovejoy crê que 20% de desflorestamento em relação ao tamanho original da Amazônia é o máximo que ela consegue suportar e o atual índice já é de 17% (em 1965, a taxa era de 3%).

A boa notícia, diz o biólogo, é que há bastante terra abandonada, sem nenhuma perspectiva de utilização econômica na Amazônia e que pode ser de alguma forma reflorestada, o que poderia proporcionar certa margem de segurança.

Em sua palestra, Lovejoy saudou vários cientistas brasileiros como exemplares em excelência em suas pesquisas. Entre outros, Eneas Salati, Carlos Nobre e Carlos Joly.

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FONTE : Publicado originalmente no site Agência Fapesp. Envolverde, 31/10/2011.

Falta de água é o maior entrave para alimentar população crescente, diz Graziano

“Se pudéssemos mudar o padrão de consumo em países desenvolvidos, haveria comida para todos. Nós desperdiçamos muita comida hoje, não só na produção, mas também no transporte e no consumo” – José Graziano

A necessidade de aumentar a produção agrícola para alimentar a crescente população mundial pressionará os recursos naturais, principalmente a água, segundo José Graziano, que em 2012 assumirá a direção geral da FAO (agência da ONU para agricultura e segurança alimentar).

“A água se tornou o maior entrave à expansão da produção (de comida), especialmente em algumas áreas como a região andina, na América do Sul, e os países da África Subsaariana”, diz à BBC Brasil Graziano, atualmente diretor da FAO para a América Latina e ex-ministro de Segurança Alimentar e Combate à Fome no governo Luiz Inácio Lula da Silva, quando foi o responsável pela implementação do Programa Fome Zero.

Segundo previsão da FAO, até 2050, a produção mundial de alimentos terá de crescer 70% para dar conta do aumento populacional.

Graziano diz que, apesar da pressão sobre os recursos naturais, é possível pôr fim à fome no mundo por meio de quatro ações principais: a aplicação de tecnologias modernas na lavoura (muitas já disponíveis), a criação de uma rede de proteção social para populações mais vulneráveis, a recuperação de produtos locais e mudanças nos padrões de consumo em países ricos.

“Se pudéssemos mudar o padrão de consumo em países desenvolvidos, haveria comida para todos”, diz ele. “Nós desperdiçamos muita comida hoje, não só na produção, mas também no transporte e no consumo”.

Segundo Graziano, enquanto a comida é mal aproveitada em nações ricas, cerca de 1 bilhão de pessoas passam fome em países emergentes.

“Precisamos assegurar que esse bilhão de pessoas sejam alimentados, que tenham bons empregos, bons salários e, se não pudermos dar-lhes empregos, encontrar uma forma de proteção social para eles”.
Bolsa Família

Graziano afirma que programas de transferência de renda, como o Bolsa Família no Brasil, hoje atendem cerca de 120 milhões de pessoas na América Latina, ajudando a combater os índices de fome na região. Ele defende ampliar essas ações para outros países afetados pela falta de alimentos, especialmente na África.

Outra ação que Graziano advoga é recuperar produtos agrícolas típicos de cada região. Segundo ele, por não serem commodities, esses produtos não são afetados por variações bruscas de preços, o que favorece consumidores e produtores. Além disso, geram um ciclo de produção e consumo local, barateando a comida.

“O que é caro nos alimentos é o transporte, a produção de alimentos é muito barata. Se conseguirmos diversificar, fazer uma regionalização e melhor distribuição de alimentos e consumo, os preços serão muito mais baixos.”

Graziano diz ainda que o estímulo à produção de produtos tradicionais ajudaria a diversificar a fonte de alimentos.

“Hoje caminhamos para ter poucos produtos responsáveis pela alimentação de quase 7 bilhões de pessoas. Precisamos diversificar essa fonte, criar maior variabilidade”.

Ele afirma que a prioridade dada a alimentos cotados em mercados internacionais tem feito com que a América Latina, por exemplo, venha perdendo a capacidade de produzir feijão – um alimento tradicional altamente nutritivo, produzido a um custo baixo.

Obesidade

A diversificação da produção agrícola, segundo Graziano, também ajudaria a combater outro problema global relacionado à alimentação: os crescentes índices de obesidade, inclusive em países emergentes.

Ele afirma que o número de pessoas com problemas de má alimentação ou obesidade já alcança 2 bilhões, duas vezes mais que o total de pessoas afetadas pela fome.

Ele atribui o índice à “comodidade da vida moderna”, que amplia o acesso a produtos industrializados, com alta concentração de açúcares, ao mesmo tempo em que desestimula atividades físicas.

Para Graziano, o combate desse mal também deve incluir ações educativas.

“Achamos que nossas mães sabem o que devemos comer. Isso valia para nossas avós, que colhiam produtos na horta, mas hoje nossas mães buscam comidas prontas, fast food, já que elas também trabalham e têm longas jornadas fora de casa”.

Graziano também cobra que as grandes empresas de fast food se sensibilizem quanto ao problema e ampliem a oferta de comidas frescas em seus cardápios.

Biocombustíveis

Apesar de 1 bilhão passarem fome, aumenta a preocupação com os 2 bilhões de obesos no mundo

Na entrevista à BBC Brasil, Graziano também aborda outros dois temas que têm permeado discussões recentes sobre a produção de alimentos: a suposta competição entre a produção de comida e a de bicombustíveis e os riscos que o aumento da produção agrícola impõem à preservação ambiental.

Ele afirma que, em duas das três maiores regiões produtoras de biocombustíveis do globo (Estados Unidos e Europa), houve incremento em alguns preços de alimentos por causa da competição com biocombustíveis.

No Brasil, porém, ele afirma que a produção de etanol a partir da cana de açúcar não teve qualquer impacto nos alimentos, já que a produção cresceu principalmente em terras improdutivas e por meio da modernização de técnicas agrícolas.

Graziano também diz não ver conflitos em conciliar a preservação ambiental à necessidade de ampliar a produção agrícola.

“A intensificação da produção com modernas tecnologias, menor uso de fertilizantes e defensivos pode beneficiar muito o meio ambiente”, diz.

“O avanço da tecnologia nessa direção permiria terminar com essa falsa dicotonomia entre ecologistas e agricultores”.

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FONTE : reportagem de João Fellet,da BBC Brasil, publicada pelo EcoDebate, 31/10/2011

Somos 7 bilhões: Consumismo é maior ameaça à sustentabilidade, artigo de George Martine

Sete bilhões é muito ou pouco? Depende. Fisicamente, cabemos todos no perímetro da Grande São Paulo. Mas basta uma minoria de consumistas modernos -incluindo nós, leitores da Folha- para ameaçar o futuro da humanidade na Terra.

O crescimento demográfico importa, é óbvio! Mas os números absolutos em si dizem muito pouco, porque o tamanho da pegada ecológica varia enormemente entre sociedades e grupos sociais.

A população é diferenciada não somente por idade, sexo, tamanho, cor, residência e ocupação, mas também por níveis de renda e consumo.

Precisamos de uma demografia da sustentabilidade que trate de qualificar consumidores, e não de contar pessoas equivalentes ou intercambiáveis.

O que assusta mesmo é que o aumento de consumidores é muito mais rápido que o de pessoas. Movido pela cultura do consumo, o nosso modelo de desenvolvimento, eficaz e sedutor, incorpora milhões de novos consumidores anualmente.

Há décadas nossos valores são moldados cada vez mais pelas instituições que promovem essa cultura e esse modelo de desenvolvimento. Comprar coisas nos faz feliz e estimula a produção; pena que esse incremento do consumo implique a destruição de recursos e o acúmulo de dejetos, inclusive dos gases de estufa que trazem as mudanças climáticas.

Contempla-se alterar esse paradigma por meio da economia verde, dentro da qual seria reduzido o desperdício de recursos naturais e a produção de dejetos nocivos. Vai funcionar?

Na melhor das hipóteses, uma mudança radical e imediata nesse sentido poderia reduzir o perigo iminente, mas não se continuarmos definindo o consumo crescente como o caminho da felicidade.

Reduzir o crescimento populacional ajudaria? Pode ajudar, sem dúvida. Mas a solução fácil do “controlismo” engana, pois famílias menores tendem a consumir mais per capita.

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FONTE : GEORGE MARTINE é doutor em demografia e ecologia pela Universidade Brown. Artigo originalmente publicado na Folha de S.Paulo e enviado por José Eustáquio Diniz Alves, colunista do Portal EcoDebate. EcoDebate, 31/10/2011.

Somos 7 bilhões: Esperança de vida sobe junto com a população, artigo de José Eustáquio Diniz Alves

[Folha de S.Paulo] Quando nasci, em agosto de 1953, fui o habitante de número 2.610.233.456. Quando minha filha veio ao mundo, em março de 1985, ela foi o habitante de número 4.710.843.383.

Em 58 anos, a população mundial aumentou em 4,4 bilhões de habitantes. Durante os 26 anos de vida de minha filha caçula, o aumento foi de 2,3 bilhões. Nos próximos 32 anos, teremos mais 2 bilhões de pessoas, e a população mundial deve chegar a 9 bilhões em 2043.

Existem duas boas noticias acompanhando esses números. A primeira é que a população mundial cresceu, aumentando conjuntamente a esperança de vida, que era de 48 anos no quinquênio 1950-55 e passou para 68 anos no período 2005-2010. A segunda é que o ritmo de crescimento demográfico está em declínio e existe grande probabilidade de a população mundial se estabilizar na segunda metade do século 21.

O número de nascimentos no mundo ficou estabilizado em torno de 136 milhões de crianças entre 1990 e 2010. Porém esse número já começou a cair.

Com a redução da base da pirâmide populacional, a razão de dependência demográfica vai ficar abaixo de 60% entre o ano 2000 e 2050. A mudança na estrutura etária, em geral, traz um bônus demográfico que pode ajudar na redução da pobreza no mundo.

Mas essa janela de oportunidade só será aproveitada se mudar o modelo de produção e consumo que tem provocado o aumento da pegada ecológica da humanidade. O nível atual de exploração do ambiente já ultrapassou em 50% a capacidade de regeneração do planeta. Estima-se em US$ 1,3 trilhão o custo anual da transição para uma economia verde, sustentável e de baixo carbono. É 30% menos que o gasto militar do mundo anualmente.

Vamos dar as boas vindas ao habitante de número 7 bilhões. Mas, principalmente, vamos nos esforçar para deixar uma herança positiva para que esse bebê de hoje não se torne um jovem frustrado.

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FONTE : JOSÉ EUSTÁQUIO DINIZ ALVES é professor da Escola Nacional de Ciências Estatísticas do IBGE. Artigo originalmente publicado na Folha de S.Paulo e enviado pelo Autor, colunista do Portal EcoDebate. EcoDebate, 31/10/2011.

População mundial chega a 7 bilhões de pessoas, com crescentes desigualdades

A população mundial chega, nesta segunda-feira, a 7 bilhões de pessoas, segundo estimativas da ONU, em meio a necessidades urgentes de redistribuição da riqueza para o combate a crescentes desigualdades.

Cada país celebrará à própria moda este novo recorde de explosão demográfica: alguns vão até eleger um bebê como símbolo e outros vão organizar competições esportivas e festividades. Reportagem da AFP.

Em Zâmbia, será realizado um concurso musical, e no Vietnã, um show intitulado “7 Billion: Counting On Each Other” (7 bilhões de pessoas apoiando-se mutuamente). Na Rússia, as autoridades vão entregar presentes a alguns recém-nascidos.

No entanto, para o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, o dia que marca a existência de 7 bilhões de seres humanos não é motivo de alegria. Os recém-nascidos chegam a um mundo contraditório, com muita comida para uns e com a falta de alimentos para um bilhão de pessoas que vão dormir com fome todas as noites”.

“Muitas pessoas gozam de luxuosos estilos de vida e muitos outros vivem na pobreza”, disse Ban em entrevista à revista americana Time.

O recorde demográfico deveria ser visto como “um chamado à ação”, insistiu.

A nova cifra demográfica representa un incremento de 1 bilhão de pessoas em relação ao número anunciado à meia-noite de 12 de outubro de 1999, quando a ONU nomeou um recém-nascido bósnio, Adnan Mevic, como o terráqueo de número 6 bilhões.

O então secretário-geral da ONU, Kofi Annan, foi fotografado num hospital de Sarajevo, segurando Mevic em seus braços.

A família da criança vive, hoje, mergulhada na pobreza, o que explica, em parte, o fato de este ano não haver foto simbólica com o chefe da ONU para imortalizar o novo recorde demográfico.

“Não se trata de números. Trata-se de pessoas”, disse Ban numa escola de Nova York semana passada.

“Serão sete bilhões de pessoas que vão precisar de alimentos em quantidade suficiente, assim como de energia, além de boas oportunidades na vida de emprego e educação; direitos e a própria liberdade de criar seus próprios filhos em paz e segurança”, acrescentou.

Dirigindo-se aos estudantes, o chefe das Nações Unidas acrescentou: “Tudo o que quiserem para vocês mesmos deverá ser multiplicado por 7 bilhões”.

Ban levará esta mensagem ao G20, que reunirá as economias desenvolvidas e as emergentes mais importantes, na próxima semana no sul da França.

Segundo estimativas da ONU, cerca de dois bebês nascem a cada segundo, pelo que a cifra de 7 bilhões continuará aumentando na próxima década, até chegar a 10 bilhões em 2100.

As Nações Unidas preveem que a Índia se converta no país mais povoado do mundo em 2025, quando seus habitantes somarem 1,5 bilhão, superando a China.

Enquanto isto, um relatório do Fundo de População da ONU (UNFPA) destaca que o mundo enfrentará crescentes obstáculos para criar empregos para as novas gerações, especialmente nos países pobres, e que a mudança climática e a explosão demográfica vão agravar as crises de fome e de seca.

Ao mesmo tempo, o envelhecimento da população se tornará um problema para o Japão e os países europeus, com suas repercussões afetando as políticas de migração, saúde e emprego, adverte o documento.

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FONTE : reportagem da AFP, no UOL Notícias. EcoDebate, 31/10/2011.

Desastre nuclear de Fukushima pode ter causado dano mais intenso do que o divulgado

Estudo mostra que os acidentes nucleares no Japão, em março deste ano, lançaram na atmosfera o dobro de substâncias radioativas do que foi divulgado oficialmente pelas autoridades japonesas. Por esse estudo, a elevação equivale a 40% do total emitido no acidente de Chernobyl, na Ucrânia, em 1986. As explosões e os vazamentos na Usina de Fukushima Daiichi, no Nordeste do Japão, foram provocados pela sequência de tremores de terra seguido por um tsunami.

O autor do estudo, Andreas Stohl, do Instituto Norueguês de Pesquisa Aérea, disse que os cálculos das autoridades do Japão desconsideraram as emissões que afetaram o mar. Segundo ele, a estimativa sobre os níveis da substância radioativa césio 137 se baseiam na análise de uma rede mundial de sensores.

Pelo estudo, os efeitos a longo prazo dos acidentes nucleares de Fukushima não podem ser avaliados como um todo por causa da dificuldade de medir a radiação recebida ou absorvida pelas pessoas. Segundo Stohl, as estimativas em termos da emissão de radiação são imprecisas.

O jornal científico Atmospheric Chemistry and Physics publicou o estudo, que aguarda mais observações para ser considerado oficial. Os acidentes radioativos no Japão, ocorridos há sete meses, provocaram uma reação entre os especialistas mundiais em busca da ampliação do sistema de segurança para o setor.

No Japão, os vazamentos e as explosões de Fukushima fizeram com que as autoridades determinassem a retirada dos moradores das cidades vizinhas à usina. Muitos ainda estão em abrigos provisórios aguardando autorização para o retorno. Produtos e mercadorias da Região Nordeste do país foram proibidos para a venda e consumo na tentativa de evitar riscos de contaminação.

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FONTE : *Com informações da agência pública de notícias de Portugal, Lusa // Edição: Juliana Andrade. Reportagem de Renata Giraldi*, da Agência Brasil, publicada pelo EcoDebate, 31/10/2011.

Protestos contra o futuro radioativo do Brasil

Países como Alemanha e Suíça estão saindo do uso da Energia Nuclear: simplesmente porque é perigoso demais e ninguém sabe onde deixar o lixo atômico no final. Itália e Áustria já desistiram há muitos anos atrás da opção nuclear.

A realidade do século 21 depois de Chernobyl e Fukushima é essa: a maioria dos países do mundo nunca quiseram ou não querem mais usinas nucleares. Até a grande empresa alemã Siemens acabou com o seu setor de energia nuclear.

Mas, ao contrário desta onda de países “desenvolvidos”, países como o Brasil e a Índia estão investindo bilhões de dolares neste setor radioativo e de riscos não contráveis.

A nova Presidente do Brasil, Dilma Rousseff, continua o programa nuclear civil e militar do Governo Lula da Silva. A Dilma não apenas confirmou a construção do primeiro submarino nuclear da América Latina, como também iniciou a construção de Angra 3, no Estado do Rio de Janeiro e deu sinal verde a outras usinas nucleares no Nordeste, especialmente no Sertão de Pernambuco, às margens do Rio São Francisco.

Em Recife, um documento oficial do escritório regional da Eletronuclear, estatal responsável pela implantação e operação de usinas nucleares no governo federal, aponta às margens do Lago de Itaparica, perto da pequena cidade de Itacuruba, no Sertão do São Francisco, distante 481 km do Recife, como a primeira opção para a instalação de uma usina nuclear no Nordeste. “Em Pernambuco, o local escolhido é Itacuruba. É o local mais adequado ao projeto. Outros Estados também têm interesse e o governo Dilma pode fazer duas centrais”, afirma uma fonte do governo do Estado, sob reserva.

Mas nem todo mundo no Brasil está satisfeito com a decisão Pro-Nuclear do Governo Dilma. Começaram prostestos, especialmente contra os planos de novas usinas nucleares . Do dia 28 a 31 de outubro, a Caravana Antinuclear estará percorrendo os municípios pernambucanos de Belém do São Francisco, Floresta, Itacuruba e Jatobá. O objetivo é levar para estas cidades sertanejas informações sobre os impactos que ocorrerão com a instalação de uma usina nuclear em Itacuruba.

A caravana anti-nuclear é liderada pelo MESPE – Movimento Ecossocialista de Pernambuco, com apoio da Fundação Heinrich Boell, Caritas, Greenpeace, Articulação Anti Nuclear Brasileira e CESE – Coordenadoria Ecumênica de Serviço.

“A Caravana terá atividades integradas como exposições, debates, feira de ciências, apresentação de teatro, cantadores e poetas populares, para ajudar a população a compreender os riscos de uma usina nuclear na região, assim como as possibilidades de gerar energia elétrica a partir do sol, dos ventos, de outras fontes renováveis de energia que não destroem a natureza e nem causam danos às pessoas”, informa o coordenador da Caravana, Físico e Professor da Universidade Federal de Pernambuco Heitor Scalambrini Costa. “A Caravana Antinuclear espera alertar as populações para os riscos da instalação dessa usina. O governo decidiu e planeja instalar a usina nuclear, mas não faz um diálogo com o povo da região para que ele fique ciente dos riscos, principalmente à saúde e ao meio ambiente. A Caravana vem para cumprir esse papel, para isso organizações locais ajudam a mobilizar o maior número de pessoas.”

Faz parte da Caravana Antinuclear a minha exposição fotográfica “Mãos de Césio” sobre as vítimas do acidente com o Césio 137 em Goiânia. As vítimas do césio ainda lutam por indenizações. A exposição é um projeto do Arquivo Amerelo e do Uranium Film Festival e foi feita com fotos da AVCésio, DocJB e Memória Roberto Pires, com apoio da Fundação Heinrich Boell. Também é importante saber que este grave acidente nuclear pode acontecer a qualquer momento e em qualquer lugar do Brasil e do mundo, onde tiver falta de controle adequado dos aparelhos radioativos usados em hospitais e dos aparelhos usados para a radiação dos alimentos. A exposição já foi exibida no Rio de Janeiro e Salvador. Espero que a exposição “Mãos de Césio” chegue à Goiânia, à Brasília e a outras regiões e países, como por exemplo, Galícia e Portugal.

Veja a lista de alguns países sem Usina Nuclear: Arábia Saudita, Áustria, Austrália, Bahamas, Barbados, Bolívia, Cazaquistão, Chile, Cingapura, Colômbia, Costa Rica, Croácia, Cuba, Dinamarca, Escócia, El Salvador, Estônia, Filipinas, Grécia, Guatemala, Honduras, Irlanda, Islândia, Israel, Itália,, Letónia, Líbano, Luxemburgo, Madagáscar, Malásia, Marrocos, Namíbia, Nova Zelândia, Nicarágua, Nigéria, Noruega, Panamá, Paraguai, Peru, Portugal, Quênia, República Dominicana e Uruguai.

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FONTE : Norbert Suchanek, Correspondente e Jornalista de Ciência e Ecologia, é articulista e colaborador do EcoDebate

Contato para aluguel da Exposição Mãos de Césio
Márcia Gomes de Oliveira
Coordenadora Uranium Film Festival & Arquivo Amarelo, Rio de Janeiro
Telefone 0055 21 2507 6704
info@uraniumfilmfestival.org
http://www.uraniumfilmfestival.org
EcoDebate, 31/10/2011

Tecnologias aplicáveis aos resíduos sólidos, artigo de Antonio Silvio Hendges

O Plano Nacional de Resíduos Sólidos em sua versão preliminar divulgada em 1º de setembro de 2011 e que está disponível para consultas públicas através de audiências regionais e no site do Ministério do Meio Ambiente (www.mma.gov.br/), além do diagnóstico da situação atual dos resíduos sólidos e da proposição de cenários, estabelece metas para a redução, reutilização, reciclagem, aproveitamento energético dos gases gerados nas unidades de disposição final, recuperação e eliminação dos lixões até 2014, normas e diretrizes para a disposição final dos rejeitos. O fortalecimento das cooperativas e associações de trabalhadores com materiais reutilizáveis/recicláveis, elevando os níveis de eficiência e capacitação destas organizações também está em destaque. Os planos estaduais e municipais que serão elaborados durante 2012 também devem prever estes objetivos.

Para que se possam atingir as metas estabelecidas para a gestão integrada e o gerenciamento correto dos resíduos sólidos, serão indispensáveis tecnologias às diversas etapas necessárias, desde a coleta até a destinação ambiental adequada dos rejeitos. Tecnologias sociais que estimulem a interação comunitária como a educação ambiental em todos os setores sociais e produtivos, valorização do associativismo, cooperativação e organização socioprodutiva dos catadores (aproximadamente 600 mil no país), capacitação administrativa, gerencial e financeira dos agentes públicos e privados são fundamentais.

Também indispensáveis são as tecnologias capazes de realizarem com eficiência técnica as diversas etapas desde a coleta, separação, seleção, tratamento, reintrodução nas cadeias produtivas e destino ambiental adequado dos rejeitos. Neste artigo estão descritas de forma bem fundamental algumas tecnologias aplicáveis aos resíduos sólidos. Todas já estão em operação em diversos países, inclusive no Brasil.

- Combustíveis Derivados de Resíduos (CDR): A geração de energia através do tratamento térmico do lixo é realizada em duas fases: na primeira, após a separação dos materiais recicláveis, a matéria orgânica e os resíduos não-recicláveis (papel e plástico que tiveram contato com matéria orgânica) são encaminhados para incineração. Esses materiais são fragmentados e triturados dando forma ao combustível derivado dos resíduos que é incinerado a uma temperatura de cerca de 1000 ºC. Os gases quentes são aspirados para uma caldeira, onde é produzido o vapor que aciona um turbogerador. Os gases extraídos da caldeira são neutralizados por um processo de filtragem, com rotores que giram a 900 rpm e lavados com água alcalina. Os gases limpos são lançados na atmosfera e os resíduos inertes arrastados para um decantador e podem ser aproveitados na produção de material de construção. Com 150 toneladas/dia de lixo é possível gerar 2,8 MW diários e fabricar pisos e tijolos para 28 casas populares de 50m² por mês. Esta tecnologia é nacional e está em funcionamento na Usina Verde no RJ (http://www.usinaverde.com.br/).

Existem outras tecnologias que também são direcionadas para a produção de combustíveis derivados de resíduos como a combustão em leito fluidificado em que a queima é realizada através do aquecimento de partículas inertes como areia ou cinzas, a gaseificação que converte materiais sólidos ou líquidos em gás através da aplicação de calor e a pirólise, processo formado por uma série de reações quando o material é aquecido na ausência de oxigênio e utilizado principalmente para fontes específicas como pneus e plásticos. Estas tecnologias são bastante utilizadas nos países europeus.

- Tecnologias Automatizadas de Separação e Classificação de Resíduos: Utilizam tecnologia de sensores óticos para diferenciar os tipos de materiais e acelerar a separação dos materiais recicláveis. Os plásticos, por exemplo, podem ser separados de acordo com os polímeros com que são fabricados, cor ou tamanho. Papéis e papelões de diferentes tipos também podem ser automaticamente classificados. Também podem ser separados diferentes materiais em um mesmo fluxo e os processos controlados em tempo real, assim como a análise estatística dos materiais separados. Os projetos também podem ser personalizados com as necessidades específicas dos empreendimentos. Esta tecnologia pode ser utilizada para os resíduos domésticos, industriais, comerciais, limpeza urbana e construção civil. Também na produção de combustíveis derivados de resíduos (CDR), esta tecnologia pode ser aplicada na eliminação dos resíduos clorados e metais e na homogeneização do valor calorífico do combustível.

Destaca-se nesta área de tecnologia ótica a empresa francesa Pellenc Selective Technologies – Pellenc ST (http://pellencst.com/), que desenvolve pesquisas, máquinas e equipamentos para a classificação automática dos resíduos sólidos. Nos EUA, a Bulk Andling Systems – BHS (http://www.bulkandlingsystems.com/), Em cache - Similares também desenvolve sistemas de automação nesta área. No Brasil esta tecnologia é pouco utilizada, mas já existem projetos e empresas como a Quattro Vento (http://www.quattrovento.com.br/) de Porto Alegre/RS que representa a Pellenc ST na Região Sul do Brasil, inclusive com a possibilidade de financiamento do banco francês Coface para a aquisição dos equipamentos. Em 2012 entrará em funcionamento uma unidade que utiliza esta tecnologia na cidade de Farroupilha/RS.

- Plasma térmico: Quando um gás é aquecido em temperaturas elevadas há mudanças importantes em suas propriedades. Com cerca de 2000 ºC, as moléculas do gás começam a dissociarem-se em estado atômico. Em 3000 ºC os átomos são ionizados pela perda de parte dos elétrons. Este gás ionizado é chamado de plasma. O gás no estado de plasma tem excelente condutividade eléctrica e alta viscosidade se comparado a um gás normal.


Um gerador ou tocha de plasma é um dispositivo que transforma energia eléctrica em calor transportado por um gás. Qualquer gás pode ser levado ao estado de plasma e o gás utilizado pode ter participação significativa na reação. O fluxo de calor pode ser medido e controlado e ser utilizado para aquecer, gaseificar e promover reações químicas em um reator acoplado ao gerador de plasma. Temperaturas alcançadas por plasmas térmicos são da ordem de 15.000 ºC, mas temperaturas de até 50.000 ºC são possíveis.

O plasma térmico é uma tecnologia bastante versatil que é utilizada principalmente para o processamento de resíduos perigosos (inclusive os organoclorados), lamas, cinzas de incineração, lixo hospitalar, sucatas metálicas, resíduos da produção de alumínio e outros metais. São dois métodos de tratamento: com a tocha diretamente sobre os resíduos um campo de energia de alta intensidade é aplicado e produz a dissociação das ligações moleculares dos resíduos sólidos, líquidos ou gases, orgânicos ou inorgânicos, perigosos ou não, alterando a composição química original para compostos mais simples; no processamento em duas câmaras, os resíduos são inseridos em uma primeira câmara em que é gaseificada a parte orgânica e fundida a parte inorgânica. Os gases e líquidos são posteriormente decompostos em uma segunda câmara através de um reator de plasma. Os gases gerados podem ser utilizados como combustíveis após a lavagem e incineração dos metais voláteis e gases ácidos. Os outros materiais resultantes são compostos vítreos semelhantes a minerais de origem vulcânica e podem ser utilizados em processos industriais.

No Brasil, as principais pesquisas são realizadas pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte que desde 1985 mantém o LabPlasma – Laboratório de Processamento de Materiais por Plasma (www.labplasma.ct.ufrn.com/) e pela Universidade do Estado de Santa Catarina que através do Departamento de Física do Centro de Ciências Tecnológicas mantém desde 1998 na cidade de Joinvile o Laboratório de Física de Plasmas (http://www2.joinville.udesc.br/~plasma/). Uma das principais empresas que desenvolvem pesquisa e equipamentos é a Scanarc Plasma Tecnologies (http://www.scanarc.se/), empresa sueca que tem como principal atividade o processamento de resíduos industriais e perigosos para a extração de valores. A principal desvantagem desta tecnologia é o elevado custo de implantação das unidades.

- Produção de adubos orgânicos: Os adubos orgânicos são o resultado da degradação biológica da matéria orgânica, em presença de oxigênio do ar e sob condições controladas. Podem ser produzidos a partir de qualquer matéria orgânica, mas a diversificação e fragmentação adequada dos componentes permitem um produto final de melhor qualidade, com mais nutrientes e melhor capacidade de recuperação dos solos. Os adubos orgânicos são muito eficientes na recomposição de solos e pastagens degradadas, assim como na manutenção e melhoria da fertilidade em áreas agrícolas e de atividades como floricultura, horticultura, fruticultura e produção de alimentos orgânicos.

Existem diversos métodos de produção de adubos orgânicos desde os artesanais até os sistemas fechados com condições controladas que proporcionam tratamento especial à matéria prima e melhoram as condições de fermentação e dos produtos finais. Esta é uma tecnologia natural e muito versátil que pode ser aplicada para a produção independente e adequada às atividades desenvolvidas nas propriedades rurais ou para a produção comercial, principalmente utilizando-se os resíduos orgânicos produzidos nas áreas urbanas e transformados em compostos por empresas, cooperativas ou organizações específicas.

Existem muitas pesquisas, empresas, cooperativas e empreendimentos que produzem e comercializam adubos orgânicos, mas certamente ainda existe um mercado amplo e em expansão para estes produtos. A empresa Organoaço (http://www.dailymotion.com/video/x86x1m_fabrica-de-adubos-organicos_tech) e (http://www.dailymotion.com/leandronantes#videoId=x86x1m), fabrica equipamentos adequados para a produção comercial de adubos orgânicos.

- Aproveitamento de biogás de aterros sanitários: A produção de metano durante a decomposição dos resíduos orgânicos depositados em aterros sanitários pode ser aproveitada para a geração de energia elétrica, evitando-se o lançamento deste gás de efeito estufa na atmosfera. Os aterros devem ser projetados para recuperar o metano através de drenos de captação onde são instaladas tubulações que transportam-no para uma planta de biogás onde a sua queima controlada aciona uma turbina que gera energia elétrica. Também pode ser utilizado na iluminação a gás. A produção vai depender da capacidade do aterro e do grupo gerador.

Esta mesma tecnologia pode ser aplicada no aproveitamento do metano captado em estações de tratamento de esgotos ou de resíduos rurais como os gerados na criação de suínos e outros animais.

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FONTE : Antonio Silvio Hendges, articulista do EcoDebate, é Professor de Ciências Biológicas; Agente Educacional no RS; assessoria em tendências ambientais, resíduos sólidos e educação ambiental. EcoDebate, 31/10/2011.

domingo, 30 de outubro de 2011

PARÓDIA CONTRA A POLUIÇÃO CAUSADA PELO FUMO


FONTE : Jorge Cosmo (Mexe) Mauri de Castro (Vira) Obs.: Paródia de Jorge Cosmo, campanha contra o fumo em Minas Gerais.
Paródia com a música "We are the World", de M. Jackson.

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Brasil reciclou 17 bilhões de latinhas de alumínio no ano passado

O Brasil reciclou 97,6% das latas de alumínio produzidas para embalagens de bebidas em 2010, um total de 239 mil toneladas de sucata, o equivalente a mais de 17 bilhões de unidades de latas. De acordo com a Associação Brasileira do Alumínio (Abal) e a Associação Brasileira dos Fabricantes de Latas de Alta Reciclabilidade (Abralatas), que divulgaram ontem (27) os resultados, os números de 2010 mostram crescimento de 20,3% na reciclagem e de 21% na produção, na comparação com 2009.

O índice mantém o Brasil na liderança da reciclagem de latas de alumínio para bebidas. No mesmo período, o Japão reciclou 92,6% da produção e a Argentina, 91,1%. Nos Estados Unidos, o índice foi 58,1%, mas o volume de produção é muito maior, cerca de 100 bilhões de latas por ano.

Em 2010, a reciclagem de latas no país movimentou cerca de R$ 1,8 bilhão. Desse total, R$ 555 milhões foram injetados diretamente na coleta. De acordo com o empresariado, o volume de latas de alumínio coletado em 2010 equivale à geração de pelo menos 251 mil empregos no setor.

As entidades também apresentaram os resultados da Greendex 2010, pesquisa feita anualmente pela National Geographic desde 2008 sobre consumo ambientalmente sustentável no mundo. O Brasil ficou em segundo lugar entre 17 nações, atrás apenas da Índia. Segundo o diretor executivo da Abralatas, Renault Castro, deve-se comemorar o resultado, mas com ressalvas.

“Comemoramos porque a base do nosso consumo é mais sustentável do que a de muitos países, mas alguns índices são reflexo do estágio de desenvolvimento econômico do país”, disse Castro, referindo-se a dados da pesquisa como o que mostra que os brasileiros se locomovem mais do que a média mundial por meio de transportes públicos e considerando que essa tendência pode se inverter caso não sejam feitos investimentos governamentais nesse tipo de locomoção.

Para avaliar o consumo sustentável das populações dos 17 países – entre eles a Argentina, Austrália, os Estados Unidos, a China, o México, a Inglaterra, Rússia, o Japão, Suécia e Alemanha – a pesquisa entrevistou 17 mil pessoas sobre itens como moradia, transporte, alimentação, energia e atitudes.

No quesito moradia, os brasileiros conquistaram o primeiro lugar, que considera o número de quartos nas casas, a tendência de ter aquecedores e ar-condicionado e o uso de eletricidade “verde”, principalmente pelo uso de energia hidrelétrica, entre outras fontes renováveis. A pior colocação brasileira foi a do quesito alimentação, com a 16ª colocação, graças ao baixo consumo de frutas e legumes e à ingestão de carne em maior quantidade que outras nacionalidades. No consumo de carnes, o Brasil se iguala à Argentina.

“Essas pesquisas podem ajudar a orientar políticas públicas”, disse Castro. “A atitude do brasileiro mostra uma evolução. Notamos, por exemplo, o aumento da preocupação com as embalagens dos produtos”.

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FONTE : Danilo Macedo e Luana Lourenço, da Agência Brasil
(Edição: Lana Cristina). Publicado originalmente no site Agência Brasil, reproduzido em ENVOLVERDE.

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Brasileiros desconhecem a Rio+20: e nós jornalistas com isso?

Conferência internacional a ser realizada em 2012 em nosso país é ignorada pela maioria da população.

Pergunte a qualquer vizinho, familiar, amigo ou colega de trabalho sobre a Copa do Mundo no Brasil. Existe alguém que não saiba da sua realização em 2014? É pouco provável que encontremos pessoas alheias a esse fato tão comentado e discutido, nem sempre de maneira muito positiva. O certo é que faltam ainda três anos para o início da disputa e, certamente, a maioria dos brasileiros está devidamente informada sobre esse grande acontecimento.

Já em relação à Rio+20, evento capaz de atrair representantes de 200 países e que vai colocar o país, vinte anos após a Eco-92, novamente no centro das discussões ambientais, com temas relevantes como desenvolvimento sustentável, economia verde e erradicação da pobreza, faça a mesma pergunta e a resposta invariavelmente será uma interrogação.

É chocante, mas ao mesmo tempo não surpreende o resultado da pesquisa divulgada pelo Instituto Vitae Civilis em parceria com a Market Analysis. O estudo concluiu que apenas 11,5% estão familiarizados com a Rio+20 e dois em cada três entrevistados não tem ideia do que se trata.

A enquete foi feita por telefone com 806 pessoas, integrantes de todas as classes sociais. Das respostas, 4,4% disseram ter ouvido “muito” sobre a Conferência e 7,7% escutaram “alguma coisa” sobre ela.

Menos mal que essa minoria informada sobre a Rio+20 tem grande interesse nos temas a serem discutidos na conferência (73%) e consideram as mudanças climáticas um problema sério a ser combatido (92%). O que só reforça o caráter, infelizmente, “elitista” do tema.

Mas como é possível aceitar placidamente que discussões sérias e altamente relevantes para a vida das pessoas e suas famílias sejam simplesmente ignoradas? Enquanto a Copa do Mundo, evento transitório, de ganhos duvidosos para o Brasil receba tanta atenção de todos?

Quero deixar claro que não contesto aqui a boa cobertura da Copa, pois são extremamente relevantes as matérias sobre os valores e orçamentos envolvidos, as grandes obras de estádios e de infraestrutura necessárias para sediar o evento. É óbvia a importância da Copa e ponto. Nesse caso, é impossível fazer tal comparação e, certamente, a magnitude da Copa leva nítidas vantagens. Mas, talvez melhor que comparar, a ideia central desse artigo seja de indagar: por que tantos sabem sobre um evento e tão poucos sobre outro?

Em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo, o coordenador de Processos Internacionais do Instituto Vitae Civilis, Aron Belinky, aponta o ceticismo quanto ao alcance de resultados concretos, a complexidade e difícil compreensão dos temas e até mesmo a responsabilidade do governo em dar visibilidade ao evento, entre as principais razões para o decepcionante interesse da população sobre a Rio+20.

Desafio para a IV Conferência Brasileira de Jornalismo Ambiental

E qual a responsabilidade de nós jornalistas? Será que a imprensa tem conseguido colocar na pauta os temas da sustentabilidade de maneira que as pessoas compreendam a sua importância? O que falta e o que devemos fazer para transformar esses assuntos de, “difícil compreensão”, mas vitais para o nosso futuro, em algo que seja facilmente entendível, assimilável por qualquer pessoa?

Afinal, por que tem sido tão complicado “vender” a ideia de que o nosso futuro depende de um mundo mais equilibrado e, portanto, mais sustentável? O que e como precisamos dizer, para uma boa compreensão, que muitos dos nossos problemas atuais residem no consumismo exacerbado, na destruição de nossos recursos mais essenciais em nome da ganância de alguns poucos?

Em novembro, mais precisamente nos dias 17, 18 e 19, vai acontecer a quarta edição do Congresso Brasileiro de Jornalismo Ambiental, e não é por outra razão que a cidade do Rio de Janeiro será a sede desse nosso encontro.

Essa será uma ótima oportunidade para debatermos nosso papel na discussão e no entendimento da Rio+20, assim como, nas coberturas de temas ambientais, desenvolvimento sustentável e afins.

Com certeza, a nós jornalistas não podem ser debitadas, isoladamente, a pouca compreensão e interesse com relação à Rio+20. Mas posso afirmar que temos espaço e condições para desempenhar com maior eficiência o nosso papel de informar a sociedade sobre os desafios rumo a um mundo mais justo e sustentável.

* Reinaldo Canto é jornalista, consultor e palestrante. Foi diretor de comunicação do Greenpeace e coordenador de comunicação do Instituto Akatu. É colunista da revista Carta Capital e colaborador da Envolverde.

Blog: cantodasustentabilidade.blogspot.com
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Twitter: @ReinaldoCanto

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FONTE : Reinaldo Canto (ENVOLVERDE,24/10/2011).

Amazônia. Desenvolvimento insustentável e a busca de outro modelo

“Está acontecendo na Amazônia um processo avassalador de destruição que pode ser comparado ao período da ditadura militar da década de 1970″, constata o professor da Universidade Federal do Acre, Elder Andrade de Paula.

“É possível continuarmos com essa lógica que preside a ideologia do desenvolvimento?”, questiona Elder Andrade de Paula, em entrevista concedida à IHU On-Line por telefone. Professor da Universidade Federal do Acre – UFAC, ele tem acompanhado os impactos gerados pelos grandes empreendimentos nos povos da Amazônia e é categórico ao dizer que as comunidades locais não se beneficiam da exploração madeireira e energética. “Todas as famílias que vivem do Projeto de Assentamento Agroextrativista Chico Mendes estão cadastradas no programa Bolsa Família, apesar de praticarem o manejo comunitário de madeira há quase uma década. Segundo depoimento de uma das principais lideranças do projeto, a renda que essas pessoas obtêm anualmente com a venda de madeira é 2,500 reais porque vendem o metro cúbico de madeira a 90 reais para a Laminados Triunfo, que é a grande madeireira que domina este pedaço”, denuncia.

Crítico do conceito de desenvolvimento sustentável, ele argumenta que o termo “é somente uma forma de tentar dar outra coloração para um processo que não tem solução”. Na entrevista a seguir, Elder Andrade de Paula também se opõe à política de financiamento do BNDES, que fortalece o modelo “de exploração em curso”, e argumenta que a construção da estrada que liga San Ignacio de Moxos até Villa Tunari, em Cochabamba, põe em xeque a soberania boliviana. “Para enfrentar o poder estadunidense, o governo boliviano teve que fazer alianças regionais com os governos venezuelano e brasileiro. No caso brasileiro, a fatura que o governo tem cobrado é muito alta. (…) Como o Brasil é o Estado mais poderoso entre os envolvidos diretamente, ele acaba interferindo na capacidade interna do Estado boliviano de decidir soberanamente sobre o que é mais adequado para o conjunto da sua população”.

Elder Andrade de Paula é licenciado em Ciências Agrícolas, pela UFRRJ, especialista em Ciências Sociais com enfoque na Amazônia, pela UFAC, mestre e doutor em Desenvolvimento Agrícola e Sociedade. Atualmente é docente dos programas de Mestrado em Desenvolvimento Regional e de Ecologia e Manejo de Recursos Naturais, da Universidade Federal do Acre – UFAC.

Confira a entrevista.

IHU On-Line – Quais são as contradições das políticas climáticas e da economia verde?

Elder Andrade de Paula – São muitas. A primeira delas é que as políticas climáticas e a economia verde não enfrentam os problemas estruturais que geram as mudanças climáticas no mundo, como, por exemplo, o atual padrão da civilização capitalista, denominado por um consumo crescente de mercadorias, que demandam mais e mais energia, e a concentração de renda que acompanha esse movimento. Portanto, todas as políticas que têm sido pactadas internacionalmente, no sentido de “enfrentar” as mudanças climáticas, funcionam como aspirinas para pacientes terminais, uma vez que não enfrentam o problema estrutural. O modo de enfrentamento dos problemas ambientais tende a reproduzir, em escala ainda mais profunda, as desigualdades entre norte e sul e as desigualdades internas dos países.

Normalmente, os meios de comunicação têm tratado o resultado das Conferências do Clima como um fracasso, mas, na verdade, não é isso. Essas convenções têm chegado a acordos que vão se implantando mundialmente, acordos esses que tendem a prevalecer os interesses daqueles que destroem o planeta e ganham dinheiro com isso. Essas pessoas passam a ganhar dinheiro com o discurso de que conservarão o planeta, seja através de documentos diversos, como a comercialização dos créditos de carbono, serviços ambientais. Enfim, todas essas políticas que são vendidas como a salvação dos problemas climáticos.

IHU On-Line – Como enfrentar os efeitos para solucionar os problemas ambientais, climáticos e sociais? O senhor critica a visão de desenvolvimento sustentável, mas como compatibilizar desenvolvimento e sustentabilidade?

Elder Andrade de Paula – Temos de nos perguntar se é possível continuarmos com essa lógica que preside a ideologia do desenvolvimento. Se você analisar a manchete da Folha de S.Paulo do último domingo, verá uma chamada que diz assim: “A Amazônia vira motor do desenvolvimento”, e, logo abaixo, tem uma foto ilustrando os conflitos da juventude em Roma, que está lutando contra as grandes corporações, contra o sistema financeiro, que tem intensificado a crise social e a crise ambiental. Portanto, veja bem, a mesma chamada que anuncia uma região como motor de desenvolvimento mostra, a partir da foto, o resultado desse desenvolvimento.

Nos anos 1990 surgiu esse nome simpático de desenvolvimento sustentável. Mas como os críticos de primeira hora já anunciaram, essa é somente uma forma de tentar dar outra coloração para um processo que não tem solução. Dentro dessa lógica de expansão incessante do processo de acumulação do capital em nível local e internacional, não há como contornar os problemas gerados. Existem inúmeras alternativas para isso, as quais têm sido propostas mundialmente. A Bolívia e o Equador estão propondo uma ruptura com essa ideia de desenvolvimento, ou desenvolvimento sustentável, para se construir outros mundos necessários.

Na Bolívia e no Equador, eles apresentam o bem-viver como uma possibilidade pautada em heranças culturais, em outra visão de relação entre sociedade e natureza, que não tem como fundamento a acumulação incessante de capital e de mercadorias, mas, sim, outro tipo de vida que possa fazer com que todos tenham o suficiente para viver e não destruir o lugar em que vivem. Está mais do que na hora de enfrentarmos esse problema de forma contundente.

O bem-viver não é somente um caminho para a civilização em curso. Não podemos pensar em importar o bem-viver como percepção do mundo andino para o Brasil, por exemplo. Mas podemos pensar que a civilização, tal como se apresenta hoje, não tem saída possível para uma vida melhor para todos. Então, podemos nos inspirar na ideia de que todos podem viver melhor, e que não haja, numa sociedade, um grupo muito pequeno que explora todos os recursos para manter um padrão de vida extremamente elevado, enquanto a maioria não tem nada. As chamadas políticas compensatórias são provisórias, são conjunturais.

IHU On-Line – Como a política ambiental e a política econômica do governo federal têm impactado os povos tradicionais da Amazônia?

Elder Andrade de Paula – Em 2003, defendi uma tese de doutorado cujo título é “Estado em desenvolvimento insustentável na Amazônia Ocidental: dos missionários do progresso aos mercadores da natureza”. Portanto, há oito anos faço uma crítica a esse novo modelo que começava a aparecer como a solução para os problemas da Amazônia. Procurei mostrar a incompatibilidade entre a conservação da natureza e o bem-estar social com a rentabilidade do capital. O que estamos vendo é uma aceleração monumental da insustentabilidade.

Está acontecendo na Amazônia um processo avassalador de destruição que pode ser comparado ao período da ditadura militar da década de 1970. Todos os esforços realizados pelo governo em nível federal ou estadual são para transformar a Amazônia em uma base de expansão desse modelo primário exportador. As repercussões para as populações que vivem em tais territórios são enormes, uma vez que eles estão sendo avassalados de formas diversas por empresas madeireiras e mineradoras. As populações camponesas, os seringueiros, os ribeirinhos, todos os assentados, todos os que vivem da terra e na terra estão sendo afetados por essas grandes obras. Além disso, a população que vive no meio urbano, que representa mais de 70% da população na Amazônia Legal, está concentrada em condições extremamente precárias, porque não existe um projeto de industrialização que possa gerar trabalho e condições dignas de vida para as pessoas.

A criação de unidades de conservação, anunciada como solução para preservar a Amazônia, tem sido um artifício para transferir a capitais privados o direito de uso desses territórios. O exemplo mais emblemático disso é a lei 11.286, de 2006, que instituiu a concessão de florestas públicas para a exploração por parte das madeireiras. Iniciativas como essas promovem a privatização de tudo que existe nessa região.

Hoje, a situação da Amazônia é muito mais dramática do que na década de 1970, quando a questão da terra estava posta como elemento essencial na luta de resistência. Atualmente a luta é contra a mercantilização da natureza e da vida. É bom ter consciência de que isso não está sendo feito sem resistência. Os povos do Pará estão se mobilizando contra Belo Monte e conseguindo apoio nacional e internacional. Na Bolívia, a 8a marcha dos povos das terras baixas contra a estrada que vai cortar as terras indígenas e o Territorio Indígena y Parque Nacional Isiboro Sécure – Tipnis mostram a disposição dos povos indígenas em enfrentar esse projeto. Estamos vivendo um período que vai abrir conflitos de alta intensidade nessa região para se contrapor à expansão avassaladora do processo de destruição capitalista em curso.

IHU On-Line – No Acre, um milhão de hectares é concedido para o manejo florestal madeireiro. Que áreas são essas? Atingem comunidades indígenas?

Elder Andrade de Paula – Grandes empresas transnacionais operam regionalmente com laranjas, muito associadas ao poder local. É possível comparar a situação que acontece no Acre a do Mato Grosso, que foi capturado e dominado pelos interesses do agronegócio. No Acre, o poder estadual foi capturado pelo agronegócio da madeira. O grupo que domina o poder desse estado há 13 anos tem o PT como liderança e está associado à importação da madeira.

Digo com toda a segurança que nem a população camponesa nem os indígenas se beneficiam com a plantação madeireira na região. Ao contrário, elas têm sido extremamente afetadas por este movimento crescente de destruição das matas. Para se ter uma ideia, o projeto que é dito como modelo pelos ambientalistas de mercado no Brasil, difundido internacionalmente como modelo de exploração sustentável de madeira, de manejo comunitário, não atende à comunidade. Todas as famílias que vivem do Projeto de Assentamento Agroextrativista Chico Mendes estão cadastradas no programa Bolsa Família, apesar de praticarem o manejo comunitário de madeira há quase uma década. Segundo depoimento de uma das principais lideranças do projeto, a renda que essas pessoas obtêm anualmente com a venda de madeira é 2,500 reais porque vendem o metro cúbico de madeira a 90 reais para a Laminados Triunfo, que é a grande madeireira que domina este pedaço. Os 90 reais não são líquidos, porque as pessoas têm que pagar o serviço das máquinas.

Enquanto a madeireira compra esta madeira a 90 reais por metro cúbico, na cidade ninguém consegue comprar madeira desta qualidade por menos de 1,400 reais o metro cúbico. Boa parte dela é destinada à exportação com o chamado selo verde. As marcenarias, de pequeno porte, que envolviam o trabalho familiar, encerraram suas atividades, e as que ainda funcionam utilizam o MDF que vem do sul do Brasil. As marcenarias não têm acesso à madeira porque o preço é exorbitante.

IHU On-Line – Além do Projeto de Assentamento Agroextrativista Chico Mendes, conhece como funciona a Fábrica de Preservativos Natex e o Seringal São Bernardo? Qual a finalidade dessas entidades e seus projetos em relação ao meio ambiente?

Elder Andrade de Paula – A Natex é uma fábrica de preservativos que foi financiada pelo BNDES, ou seja, funciona com recursos públicos e tem um contrato de fornecimento dos preservativos para o Ministério da Saúde. O objetivo anunciado dela seria criar uma alternativa para os seringueiros que têm a extração do látex como atividade importante para a composição de sua renda familiar. Todavia, ela compra o látex tão somente de 700 seringueiros. Para se ter uma ideia, somente na reserva extrativista Chico Mendes vivem 1800 famílias. Isso quer dizer que a fábrica de preservativos não atende sequer 50% dos moradores da reserva extrativista Chico Mendes.
Não sabemos efetivamente o montante dos recursos que foram destinados para a implantação da empresa. Temos a desconfiança de que, com o que foi utilizado para a construção e manutenção da fábrica, seria possível atender mais de 50% das famílias existentes em todo o Acre. Mas como não há nenhuma transparência, nada que possa parecer com possibilidade de controle do público sobre o governamental nessas terras, não temos informações seguras.

O seringal São Bernardo é uma área que está sendo explorada pela mesma madeireira, a Laminados Triunfo. A área explorada por eles é ocupada por famílias que vivem lá há décadas, mas que não têm documentos de regulamentação da terra. Por isso elas estão sendo pressionadas a desocuparem a terra para que a exploração madeireira possa acontecer. Os depoimentos das pessoas são extremamente comoventes. Estive lá por mais de duas vezes conversando com os que estão sendo atingidos, e somente agora estão encontrando uma forma de reagir, porque o fato ganhou notabilidade pública nacional. Antes eles não conseguiam reagir porque o movimento sindical é controlado pelo governo. As organizações representativas dos segmentos sociais subalternos, em sua maioria, estão subordinadas ao esquema partidário e clientelista, que foi reconfigurado pela aliança entre o PT a direita tradicional, que representa parte do poder oligárquico.

Movimento sindical

O sindicado dos trabalhadores rurais de Xapuri, que tem como presidente a Dercy Teles, que foi a primeira presidente do sindicato dos trabalhadores rurais do Brasil, também tem enfrentado e feito oposição a tal modelo. Na universidade, professores e estudantes manifestam críticas ao modelo que está em curso.

IHU On-Line – Como avalia a atuação do BNDES no financiamento da construção de novas hidrelétricas na região amazônica?

Elder Andrade de Paula – Os projetos que o BNDES tem financiado, seja na Amazônia brasileira, seja na Amazônia continental, estão repercutindo de forma negativa nesses territórios. A fábrica de tacos, que foi financiada no eixo da BR-317, perto de Xapuri, produzirá enorme impacto, destruindo a reserva extrativista Chico Mendes e tirando madeira de lá. As obras da construção de hidrelétricas em Madre Dios, que fazem parte do acordo energético entre Brasil e Peru, também produzirão impactos enormes, desalojando povos indígenas e camponeses de áreas que vivem lá secularmente.

O caso da Bolívia é bastante emblemático. A 8ª marcha está lutando contra o projeto financiado pelo BNDES de construir a estrada que liga San Ignacio de Moxos até Villa Tunari, em Cochabamba. A empreiteira que vai construir a estrada é a brasileira OAS, e quem mais vai se beneficiar com esse projeto são o agronegócio da pecuária de Beni e o agronegócio da soja, que estão em Santa Cruz. O BNDES tem atuado contra os interesses dos povos que vivem nessa região e a favor da continuidade desse projeto de espoliação não só da Amazônia brasileira, mas também da Amazônia continental.

O que o BNDES faz hoje não é diferente do que o Banco Mundial tem feito, desde a sua criação, nos países colonizados. Então, o banco reproduz, fora do Brasil, um modelo de exploração.

IHU On-Line – Tem acompanhado os protestos na Bolívia por causa da construção da estrada que afetará as comunidades indígenas? Como vê esse debate?

Elder Andrade de Paula – Sim. Estive na Bolívia na última semana de setembro, participando de um seminário e conversei com lideranças indígenas e camponesas da tríplice fronteira.

O governo de Evo Morales tem um forte apoio dos dois povos mais poderosos da Bolívia, Aymará e os Quéchua. Nas terras baixas, vivem 34 dos 36 povos da Bolívia, os quais serão mais afetados pela construção da estrada. O projeto de governo de Evo Morales, no sentido de enfrentar o drama social da Bolívia de extremo empobrecimento da população, passa pela capacidade de o Estado obter recursos para dar continuidade à política governamental, que é muito parecida com a política filantrópica posta em marcha no governo Lula. Para isso ele tem que expandir as ações entre governos para a exploração do território amazônico, onde estão as maiores riquezas naturais do país. Ocorre que nessa região vive a minoria da população, e, portanto, o governo irá contar sempre com o apoio da maioria para “desenvolver” em nome do Estado plurinacional. A ideia é de que o Estado boliviano necessita obter ingressos para fazer as políticas necessárias a fim de “cambiar”, transformar a sociedade.

O ponto essencial é que os povos que estão marchando se opõem a essa expansão avassaladora da exploração predatória sobre seus territórios. Conflitos contra esse processo de expansão acelerada de grupos capitalistas de diversos locais do mundo (Chile, China, Estados Unidos, Brasil) ocorrem em todas as partes dos territórios que compõem a Amazônia Continental. Há aí uma disputa enorme para extrair as riquezas existentes.

O que acontece hoje não se compara com o processo de exploração ocorrido na Amazônia do século XIX para o XX, quando se deu a exploração da borracha para movimentar a principal indústria automobilística emergente naquele período. Agora, o processo de acumulação demanda outras matérias-primas que repercutem na destruição do território, como energia para explorar minerais, produtos oriundos do setor do agronegócio, como soja, biocombustíveis, madeira, exploração petroleira. Quem trabalha com petróleo, mineração e madeira são grandes transnacionais que controlam esses comércios mundialmente.

IHU On-Line – O presidente Evo Morales vive um dilema ao tentar desenvolver o país e garantir os direitos das comunidades indígenas?

Elder Andrade de Paula – Sim, vive muitos dilemas. Entre a efetivação de uma Constituição que garantiu o exercício das autonomias pelas diferentes nações que vivem naquele território sob seus territórios, Evo Morales assumiu o compromisso com a efetivação de um Estado plurinacional – essa foi uma forma de descolonizar o saber e o poder e de fazer com que essas autonomias tivessem formas efetivas de se implementarem. Ao mesmo tempo, ele assumiu o compromisso de reduzir ou eliminar a pobreza do país, garantindo uma redistribuição de renda. Evo Morales tem enfrentado dilemas não só no nível nacional com o poder oligárquico, mas também entre os movimentos sociais que acabam se dividindo de acordo com os interesses de seus representados ou de quem os representa. Outro grande dilema diz respeito à baixa autonomia relativa do Estado plurinacional boliviano no jogo interestatal internacional.

Para enfrentar o poder estadunidense, o governo boliviano teve que fazer alianças regionais com os governos venezuelano e brasileiro. No caso brasileiro, a fatura que o governo tem cobrado é muito alta. O governo brasileiro não abre mão da construção da estrada do Tipnis. Como o Brasil é o Estado mais poderoso entre os envolvidos diretamente, ele acaba interferindo na capacidade interna do Estado boliviano de decidir soberanamente sobre o que é mais adequado para o conjunto da sua população.

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FONTE : Publicado originalmente no site IHU On-Line.(ENVOLVERDE).
(IHU On-Line)

Organizações civis se unem contra caça de baleias

Sessenta e três entidades da América Latina e Caribe solicitam a seus governos a adoção de medidas oposicionistas frente à próxima temporada de caça ‘científica’ de baleias pelo Japão no Oceano Austral

Medidas diplomáticas e de rechaço à dita caça para fins ‘científicos’ na Antártida, realizada na realidade com caráter comercial pelo Japão, é o que desejam as organizações que trabalham com conservação marinha na região, segundo a carta entregue a 14 países do Grupo Buenos Aires, entre eles o Brasil.

Segundo a denuncia das organizações, a cota anual de baleias caçadas sob o programa JARPA II, iniciado em 2006, aumentou quase 50% ao ano devido a concessões especiais, alcançando níveis similares a cota anual de caça comercial à baleia minke antártica antes da implementação da moratória.

A caça para fins ’científicos” é uma prática tolerada pela Comissão Internacional da Baleia (CIB), que proíbe desde 1986 a caça comercial aos cetáceos. “Além de construir uma fachada para encobrir as operações baleeiras de caráter comercial e violar a moratória sobre a caça comercial, o programa representa uma crescente e preocupante ameaça à governança do Oceano Austral, à segurança da vida humana em alto mar e à proteção do delicado ecossistema marinho antártico”, relata a carta.

Segundo José Truda Palazzo, do Centro de Conservação Cetácea Brasil, a CIB atua com base em um tratado arcaico, a Convenção Baleeira de 1946, que permite expressamente através de seu Artigo 8º que os países se auto-outorguem licenças de captura para fins científicos.

“Logicamente, o que o Japão faz é um abuso do direito concedido por esse Artigo, tanto que a Austrália está processando o país na Corte Internacional de Justiça, mas a CIB alega que não pode fazer nada. A CIB se transformou num anacronismo no século XXI, e acredito que a conservação das baleias no plano global estaria melhor se essa Comissão acabasse e fosse substituída por um tratado moderno de conservação dos cetáceos. Mas falta vontade política, mesmo dos países que se dizem “conservacionistas”, para dar esse passo à frente”, afirmou Palazzo.

Além da segurança ambiental contra a caça de animais ameaçados de extinção como a baleia jubarte, as organizações denunciam a quebra do Tratado Antártico como uma zona de paz livre de armas, já que o governo japonês pretende enviar uma embarcação de escolta para proteger a tripulação baleeira.

“É inaceitável que o governo japonês transforme novamente as águas do Santuário de Baleias do Oceano Austral no cenário de massacre de centenas de baleias que se encontram protegidas”, lamentou a diretora executiva do Centro de Conservação Cetácea do Chile Elsa Cabrera.

A carta ainda acrescenta a preocupação sobre a conduta do governo japonês no âmbito da CBI, “mostrando a sua nula disposição em melhorar o funcionamento deste importante organismo”.

As organizações brasileiras que assinaram a carta são: Centro de Conservação Cetácea Brasil, Instituto Baleia Jubarte e Centro Golfinho Rotador.

De acordo com Palazzo, o governo do Brasil mantém uma posição firmemente conservacionista na CIB, graças principalmente à atuação do Itamaraty, mas poderia fazer bem mais.

“Estou convencido de que a proposta brasileira de criação do Santuário de Baleias do Atlântico Sul não prospera porque as gestões que deveriam ser feitas em altíssimo nível, de Presidente para Primeiros-Ministros e outros Presidentes, simplesmente não acontece. Aí, vemos o sujeito do Gabão, de quem o Brasil há pouco perdoou centenas de milhões em dívidas, literalmente xingar a delegação brasileira nas plenárias da CIB e votar com os baleeiros japoneses, e fica por isso mesmo. O Brasil tinha de exercer mais pressão em nível mais elevado pra lograr seus objetivos de conservação no Atlântico Sul” resumiu o ecologista, que lançará na semana que vem o livro SOS Baleias.

Histórico

Em uma nota divulgada em fevereiro, o Grupo Buenos Aires já havia reafirmado seu “compromisso com a conservação das baleias, a manutenção da moratória comercial em vigência desde 1986, a promoção do uso não letal do recurso e o respeito à integridade dos santuários baleeiros reconhecidos pela CBI”, rejeitando a caça dos cetáceos.

Logo após esta manifestação, o governo japonês decidiu suspender sua campanha de caça às baleias na Antártida até o final da temporada passada, porém motivado pela “dificuldade de se garantir a segurança das tripulações diante do assédio incessante da Sea Shepherd”, alegou na ocasião o ministro da Agricultura e Pesca, Michihiko Kano.

As capturas da frota japonesa, que tem uma cota anual de cerca de mil cetáceos, foram reduzidas para 507 baleias no ano passado, fato que a Agência de Pesca atribuiu às atividades de “obstrução” da Sea Shepherd.

O Japão anunciou no início de outubro que vai regressar às águas da Antártida a partir de Dezembro para caçar. Mas desta vez, a frota baleeira terá uma escolta nipônica para proteção contra os navios ecologistas da Sea Shepherd.

A ONG mobiliza várias embarcações para seguir a frota japonesa, utilizando cordas para bloquear as hélices dos navios japoneses e colocando-se entre estes e as baleias. A organização garante ter conseguido evitar a morte de 800 animais.

Outras ameaças

Em meio a este embate, a Convenção sobre Conservação de Espécies Migratórias de Animais Selvagens sob o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (UNEP/CMS, em inglês) divulgou um relatório que detalha as mais recentes descobertas científicas sobre a distribuição, migração, comportamento e ameaças aos cetáceos.

O alerta trazido pelo relatório é diretamente relacionado ao bycatch, ou seja, a captura de espécies diferentes da espécie-alvo na pesca. A constatação é que 86% dos Odontoceti, uma subordem de cetáceos popularmente chamada de baleias com dentes, como as a cachalote e os golfinhos, morrem emaranhados em armadilhas, redes de emalhar e de arrasto, espinhel e outros aparatos pesqueiros.

Além disso, a sobrepesca das suas presas também foi identificada como uma ameaça a 13 espécies em 2011 em comparação com 11 em 2001. O relatório enfatiza que a caça local, matanças ou capturas deliberadas são ameaças graves.

A secretária executiva da UNEP/CMS Elizabeth Mrema, comentou que lidar com estas ameaças exige regulamentação internacional e que durante a 10 ° Conferência das Partes da CMS em novembro será discutida a adoção de um Programa de Trabalho Global para Cetáceos.

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FONTE : publicado originalmente no site do CarbonoBrasil. (ENVOLVERDE).

Alto consumo e ocupação das dunas podem levar à falta de água para consumo no litoral do Nordeste

‘Em dez anos faltará água no litoral do Nordeste’ – Ocupação desordenada das dunas causa poluição e salinização do Barreiras, diz especialista de instituto do Ceará

O sistema Barreiras, que vai do Espírito Santo à Região Norte, margeando o litoral, é outra reserva estratégica com problemas. A salinização e a contaminação por nitrato, oriundo de fossas e esgotos, são as mais graves. Reportagem em O Estado de S.Paulo.

Especialistas alertam que, se o consumo e a ocupação das dunas continuarem, em cerca de dez anos faltará água para consumo no litoral do Nordeste.

“As dunas que existem nas praias protegem a reserva em algumas localidades. O problema é que as elas são muito sensíveis e todo mundo quer ocupá-las: o turismo, a indústria de energia eólica etc. E tudo o que vaza pelas dunas cai direto no aquífero”, explica Luis Parente Maia, diretor do Instituto de Ciências do Mar, da Universidade Federal do Ceará.

Ele afirma que as partes mais sensíveis do sistema ocorrem onde ele é mais arenoso e há menos argila. O Barreiras é pouco espesso: em suas áreas mais largas tem cerca de 60 metros de espessura. Maia estuda uma região próxima a Fortaleza, onde ficam os balneários de Icaraí e do Pacheco.

“Tem pontos em que já há níveis de coliforme bastante elevados. Você tem poluição possível direta por efluentes líquidos e por resíduos sólidos, porque não se recolhe lixo. Ou se joga nos montes ou se enterra no fundo das casas”, explica ele.

O pesquisador diz que na localidade de Icaraí não existe abastecimento por rede. “Só se usa água de poço.”

Salinização. A ocupação desordenada e a explotação sem cuidados estão acentuando a salinização das reservas litorâneas do Barreiras.

“Só temos água boa onde há duna, pois aqui, nessa região, não temos bacia sedimentar. O fundo é granito e lá já há água salgada por natureza. Mas há um problema adicional: a superexploração da água. Todo mundo bombeia sem nenhum controle. O espaço antes ocupado pela água doce, que foi retirada, acaba invadido pelas águas salgadas do mar”, explica Maia.

Ele afirma que a situação deve piorar, pois as obras do complexo industrial e portuário do Pecém, que está sendo ampliado, já pressionam as cidades de Icaraí, Cumbuco e Pacheco. “O que antes era um problema isolado nas temporadas, pois estes eram locais de veraneio, pode se tornar uma dificuldade crônica.”

O dentista Aldemir Arruda teve uma casa de veraneio na Praia do Pacheco por 30 anos. “O meu poço tinha 34 metros de profundidade e a água era salobra. Então eu tive de desativar”, explica.

Arruda afirma que precisou cavar o poço durante um período de seca muito forte, na década de 1980. “Foram cinco anos seguidos de seca. Nós tínhamos cacimbas, que são poços mais superficiais, mas todos secaram. Então, tive de cavar este, mais fundo. Mas a água não servia para cozinhar nem para banho. Só para limpeza mesmo. Tínhamos de levar água de Fortaleza, em galões, para poder usar na praia”, conta.

Arruda afirma que sua casa ficava bem próxima a uma antiga salina desativada, entre Caucaia e Fortaleza. “Ali a salinidade é imensa. Aquilo foi desativado, mas as casas ao redor ainda sofrem as consequências”, diz Maia. “Um vizinho tinha uma casa mais próxima da praia, das dunas. Ele possuía um poço de água excelente”, lembra.

Norte. O Barreiras abastece várias cidades litorâneas no Nordeste e chega até o Amapá, na Região Norte. A região metropolitana de Belém (PA) usa 30% de águas subterrâneas para abastecimento público, parte do Barreiras e parte de um outro aquífero que ocorre no local: o Pirabas.

“É um excelente reservatório. Um poço produtivo no Pirabas tem vazão média de 600 m³/hora, o que é ótimo”, explica o geólogo Milton Matta, da Universidade Federal do Pará. Ele alerta, porém, para a ocorrência dos chamados “poços Amazonas”, vetores de contaminação local da água subterrânea.

“Em Belém há mais de 30 mil poços desses. São buracos cavados no chão, sem proteção. A água é puxada para cima em latas de manteiga enferrujada. Um caos.” / K.N.

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FONTE : EcoDebate, 27/10/2011

Milhares de cientistas e a ONU estão preocupados com o uso do milho transgênico

O milho crioulo, originário do México, já que ali se encontram 59 de suas variedades, não apenas é o cultivo mais importante no mundo e faz parte do patrimônio cultural e alimentar da humanidade, mas também servirá para fazer frente à mudança climática e à fome, garantiu Antonio Turrent, vice-presidente da União de Cientistas Comprometidos com a Sociedade (UCCS).

A reportagem é de Angélica Enciso e está publicada no jornal mexicano La Jornada, 25-10-2011. A tradução é do Cepat.

Turrent asseverou que grande parte da plantação feita no país é das variedades nativas, razão pela qual acabar com elas e semear milho transgênico significaria uma produção próxima a zero do grão crioulo nessas áreas.

Não haverá maneira de deter o fluxo genético dos milhos transgênicos, razão pela qual se estenderá a todo o país em um caminho sem retorno. Os grãos geneticamente modificados também não representam produtividade maior, além de colocarem em risco os milhos nativos, assinalou.

O Greenspeace, Sementes da Vida e Raúl Hernández – ganhador do Iniciativa México 2010 – assinalaram que já se detectou milho contaminado com transgênicos. Por essa maneira, coloca-se em risco a condição privilegiada do México como reservatório genético.

Entidades internacionais privilegiadas, como a FAO, demonstraram sua preocupação com a contaminação genética no caso de se introduzirem cultivos transgênicos nos centros de origem, por exemplo, a batatinha transgênica na Bolívia ou o milho transgênico no México. Fizeram um apelo à organização Iniciativa México para não permitir que se contamine com a premiação o projeto Milhos Mexicanos, que, garantiram, foi financiado pela Monsanto, empresa transnacional que busca comercializar sementes transgênicas no país, as quais representam um sério risco de contaminação por fluxo genético os milhos mexicanos.

Aproximadamente mil cientistas nacionais e internacionais manifestaram sua preocupação com os riscos do uso de milho transgênico no México, e inclusive o relator especial da Organização das Nações Unidas para o Direito à Alimentação, Olivier De Schutter, propôs, em sua recomendação oficial, a volta da moratória sobre as provas de campo e no cultivo comercial de milho transgênico, com a finalidade de proteger a biodiversidade das gramíneas.

Os consumidores serão afetados, pois o principal alimento – que provê 55% de ingestão calórica diária e 22% das proteínas aos mexicanos – será colocado em perigo. Também coloca em perigo a produção e variabilidade que possibilita a riqueza de pratos mexicanos, para cada um dos quais se requer uma variedade específica, disse Adelita San Vicente Tello, da Sementes da Vida.

Além disso, está demonstrado que a coexistência de milhos transgênicos e não transgênicos não é possível. É muito grave que indústria e governo façam falsas promessas para os problemas do campo, como os milhos transgênicos tolerantes a secas. É do conhecimento da Monsanto e dos funcionários da Secretaria de Agricultura, Pecuária, Desenvolvimento Rural, Pesca e Alimentação que estes milhos acabarão na lista de promessas falidas da tecnologia dos transgênicos: maior rendimento e menor uso de agroquímicos, disse, por sua vez, Alejandro Espinosa, das UCCS.

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FONTE : (Ecodebate, 27/10/2011) publicado pela IHU On-line, parceiro estratégico do EcoDebate na socialização da informação. [IHU On-line é publicada pelo Instituto Humanitas Unisinos - IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]

Alternativa agroecológica contra os agrotóxicos e transgênicos, entrevista com Fernando Ferreira Carneiro

O modelo desse tipo de agricultura é um caminho para uma alimentação saudável, diz o docente da UnB Fernando Ferreira Carneiro

Em entrevista concedida por telefone à IHU On-Line, o pesquisador alerta que desde os últimos três anos o Brasil já é o maior consumidor de agrotóxicos do mundo, “em função de todo esse modelo que privilegiou a grande propriedade, a monocultura para exportação”. Além disso, Fernando Carneiro diz que as notificações por agrotóxicos no Brasil não refletem a realidade da população. “O sistema ainda é muito precário de notificações, pouco utilizado; os médicos, em sua maioria, não têm inclusive formação adequada para identificar os casos. Existe até medo de se notificar uma intoxicação por agrotóxicos”. Ele diz que “segundo a própria Organização Mundial da Saúde – OMS, os estudos feitos em outros países indicam que, geralmente, a cada uma notificação, têm 50 outras que não o foram, em função de todas essas dificuldades”. E afirma: “Não temos ideia do real grau de impacto na saúde da população de trabalhadores com relação ao uso de agrotóxicos no Brasil”.

Fernando Ferreira Carneiro possui graduação em Ciências Biológicas pela Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG, especialização em Vigilância em Saúde Ambiental pela Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, mestrado em Ciências da Saúde, pelo Instituto Nacional de Salud Pública de México e doutorado em Ciência Animal, pela UFMG. Possui experiência na área de Saúde Coletiva, com ênfase em vigilância em saúde ambiental e saúde no campo, atuando principalmente junto aos movimentos sociais na luta por melhores condições de saúde e ambiente. Foi consultor do Ministério do Meio Ambiente, Ministério da Saúde e servidor da Agência Nacional de Vigilância Sanitária. Atuou como coordenador geral de vigilância em saúde ambiental do Ministério da Saúde. Atualmente é professor adjunto da Universidade de Brasília – UnB. É pesquisador no Núcleo de Estudos de Saúde Pública da UnB e participante da Unidade de Pesquisa de Saúde, Trabalho, Ambiente e Desenvolvimento. É membro do Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva e do Programa de Ciências da Saúde da UnB. Faz parte do GT de Saúde e Ambiente da Associação Brasileira de Pós-Graduação em Saúde Coletiva – Abrasco e da Rede Brasileira de Justiça Ambiental.

Confira a entrevista.

IHU On-Line – A que atribui o crescente uso de agrotóxicos no Brasil?

Fernando Ferreira Carneiro – É uma questão histórica, ligada à opção que o Brasil fez quanto a seu modelo de desenvolvimento para o campo. Há mais de 30 ou 40 anos, quando se inicia o que foi denominado “revolução verde”, principalmente na época da ditadura, o Brasil decidiu modernizar o campo sem fazer reforma agrária. Essa estratégia foi denominada como a modernização conservadora da agricultura. Então, tiveram vários planos de desenvolvimento, conduzidos pelo governo, de acertar créditos baratos, em que obrigava o agricultor a comprar um pacote tecnológico para receber esse crédito, e o pacote colhia os agrotóxicos. Então, ao longo de décadas, foi se mudando a cultura, muitas vezes ancestral, em que camponeses também utilizavam outras soluções, a própria biodiversidade, para eliminar ou reduzir o risco de pragas. E esses agricultores foram entrando num ciclo vicioso de dependência com os agrotóxicos. Desde os últimos três anos, o Brasil já é o maior consumidor de agrotóxicos do mundo, em função de todo esse modelo que privilegiou a grande propriedade, a monocultura para exportação. Esses sistemas são muito instáveis, porque tentemos imaginar grandes extensões de terra com uma só espécie. Então, eles exigem grande aplicação de agrotóxico, muito uso de água etc., e o que acontece é que isso está resultando em uma contaminação não só dos alimentos, mas também dos trabalhadores que atuam nessas áreas, nas comunidades que vivem próximo, já que 30% da aplicação de agrotóxicos no Brasil são por aeronaves.

Enfim, estamos hoje nessa situação por causa de uma política de Estado comprometida com interesses do grande capital, principalmente do capital internacional, e com a adoção dos transgênicos. E isso tem se intensificado, uma vez que os transgênicos disponibilizados no mercado são justamente para garantir ainda maior uso de agrotóxicos, porque os transgênicos são resistentes ao próprio agrotóxico que é vendido no pacote. Além disso, a economia brasileira está atualmente se reprimarizando. O que significa isso? O Brasil atualmente é a sétima economia mundial, mas baseada em exportação de commodities agrícolas e minerais. Então, mais de 50% de nossa pauta exportadora são de produtos primários. Estamos voltando a ser o que éramos há 30, 40, 50 anos. E isso tem impacto na saúde das pessoas e no ecossistema, na medida em que esse caminho adotado pelo Brasil não é um caminho, por exemplo, da agroecologia, dessa grande agricultura que tem ficado mecanizada para a exportação. Nós estamos nos transformando no maior produtor de alimentos do mundo, mas a um custo social e ambiental muito alto. E isso é uma questão muito importante, porque o mundo todo está de olho no Brasil, porque nosso país está virando um grande exportador de produtos primários. Eles são manufaturados e industrializados nos grandes países, e voltam mais caros para nós. Estamos vivendo quase o mesmo dilema dos tempos de Colônia.

IHU On-Line – Qual o impacto dos agrotóxicos na agricultura? É possível uma agricultura sem o uso de agrotóxico? Qual seria a alternativa?

Fernando Ferreira Carneiro – A agricultura tem mais de dez mil anos; a implantação dos agrotóxicos existe desde os últimos 1960. Possível é. A própria história da humanidade mostra isso. O que a gente tem observado também é que se critica muito que a agricultura agroecológica não teria a capacidade de escala para abastecer os mercados. Mas se analisarmos informações do censo agropecuário do IBGE, por exemplo, iremos perceber, e isso está comprovado, que quem garante o alimento para a população brasileira é justamente a agricultura familiar, que se baseiam em pequenas propriedades e que está em torno de 60%. Dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada – Ipea mostram que praticamente 87% da mandioca vêm da agricultura familiar; 70% do feijão; 46% do milho consumido no Brasil; 58% do leite e 59% dos suínos. Agora, quando falamos de soja a situação é diferente. 84% dela são de agricultura não familiar. 79% do trigo são não familiares. Além disso, 84% dessa soja não servem para alimentar nosso povo; estão alimentando os bois nos EUA, na Europa ou na China. Então, o que os censos do IBGE têm nos mostrado é que existe uma possibilidade real dessa agricultura familiar, agroecológica, de alimentar a nossa população. Para a conversão do modelo da revolução verde houve muito subsídio governamental, o que a gente não vê hoje. No Ministério do Desenvolvimento Agrário não existe um programa de incentivo à agroecologia. Então, percebemos que existe uma ausência de políticas, o que eu chamaria de “políticas de estado inteligentes”, porque a tendência hoje no mundo é olhar para ver a diversidade; cuidar para que os fatores de risco associados às mudanças climáticas sejam minimizados e o governo brasileiro não tem proposto políticas públicas e nem mostrado uma preocupação para fazer políticas que obstruam essa tendência quase que destrutiva da agricultura de grande escala.

IHU On-Line – Então, a que se deve essa falta de incentivo à agroecologia?

Fernando Ferreira Carneiro – Podemos traçar várias hipóteses. Essa grande agricultura baseada no latifúndio e na mecanização da produção está ligada a grandes grupos multinacionais, que têm faturamentos bilionários. Existem empresas hoje que têm mais de 8 bilhões de dólares por ano de financiamento, sendo metade com sementes, que são sementes transgênicas, e outra metade com agrotóxicos, que servem para essa mesma semente. Essas grandes empresas, só para dar esse exemplo de agrotóxico, financiam campanhas de diversos políticos. E boa parte da bancada ruralista, uma das maiores bancadas do Congresso Nacional, é financiada por essas grandes empresas. Então, historicamente no Congresso Nacional, toda a discussão sobre a questão dos agrotóxicos se deu no sentido inverso do que nós estamos conversando. Existem mais de 17 projetos de lei visando liberalizar o uso de agrotóxico no Brasil. Também se quer diminuir o papel de instituições como a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), que tem feito um belo trabalho de vigilância e fiscalização. Outra ideia é facilitar a entrada de produtos via Paraguai. Só mais recentemente, muito em função da Campanha Nacional Contra os Agrotóxicos, que a sociedade civil, em função de toda essa omissão governamental, passa a tomar a frente e a denunciar isso de inúmeras formas, como por meio de altas políticas do MST, da via campesina etc. E agora no Congresso, na Comissão de Seguridade Social e Família, que houve uma subcomissão de agrotóxicos. Isso é histórico. É a primeira vez no Congresso que se cria uma comissão não para liberalizar, mas para responsabilizar, discutir, o papel do governo na regulação do uso de agrotóxicos no Brasil. São fatos novos muito em função da reação da sociedade. Já tive oportunidade de trabalhar na Anvisa, e sei que existe constantemente pressão sobre a Casa Civil e sobre os ministérios para restringir o trabalho dos órgãos de fiscalização e controle, principalmente daqueles da saúde. É um “lobby” muito poderoso e forte que tem tentáculos nos aparelhos legislativo, judiciário e executivo. Quando a Anvisa pede, por exemplo, a proibição de produtos que já estão proibidos no exterior, surgem várias ações na Justiça para tutelar e adiar. Então, é um setor com muito poder e ramificações em vários outros poderes.

IHU On-Line – Dados do Ministério da Saúde apontam que o número de intoxicação por agrotóxicos a cada ano aumentou de mil para seis mil na última década. Até que ponto esses números refletem a realidade? E como são feitas essas contabilizações?

Fernando Ferreira Carneiro – Já trabalhei no Ministério da Saúde e coordenei a área de Vigilância Ambiental e, antes de responder à pergunta, gostaria de comentar o dado. Esse dado que você cita é ainda a ponta de um iceberg. O sistema ainda é muito precário em termos de notificações, e pouco utilizado. Os médicos, em sua maioria, não têm inclusive formação adequada para identificar os casos. Existe até medo de se notificar uma intoxicação por agrotóxicos. No interior, os próprios médicos têm até medo de represálias. Segundo a própria Organização Mundial da Saúde – OMS, os estudos feitos em outros países indicam que geralmente a cada notificação, têm 50 outras que não o foram, em função de todas essas dificuldades. Logo, a situação é muito mais grave do que essa que você apresentou. A outra questão é que o Ministério chegou a construir um plano de vigilância e saúde para as populações expostas aos agrotóxicos. Esse plano era muito interessante porque integrava várias áreas, desde assistência, vigilâncias, vigilâncias sanitárias, epidemiológica, ambiental, área de saúde do trabalhador e ajudava a articular melhor o Sistema Único de Saúde – SUS , para fazer um trabalho (de vigilância) que levantaria informações e iria realizar uma ação melhor. A última notícia que tive é que esse plano, na prática, está engavetado. Creio que houve reações de representações de secretarias municipais de saúde, secretários estaduais, alegando dificuldade de implantação, recursos etc. Ou seja, no âmbito do SUS, não evoluiu essa pactuação. A saúde ainda está sem uma ação efetiva, apesar de já existir um debate de décadas e propostas, mas não existe uma priorização política, tanto do governo federal, estadual e municipal, de fazer valer e construir realmente um sistema de vigilância, pois não temos ideia do real grau de impacto na saúde da população de trabalhadores com relação ao uso de agrotóxicos no Brasil. Então, gostaria de dar esse alerta e espero que essas questões cheguem realmente à sociedade, de forma que pressionem os gestores federais, estaduais e municipais para implantar uma política de vigilância e cuidado na saúde à altura do atual contexto de risco no Brasil.

IHU On-Line – Como avalia a fiscalização com relação ao uso de agrotóxicos no Brasil pelos órgãos oficiais?

Fernando Ferreira Carneiro – Faço parte do Fórum de Combate aos efeitos dos Agrotóxicos, que é coordenado pelo Ministério Público Federal, onde já tive oportunidade de conversar sobre esse tema participando nos Ministérios da Saúde, da Agricultura, do Meio Ambiente e do Trabalho. A fiscalização de uso atualmente é atribuição das secretarias estaduais de agricultura. Posso dizer que na prática, hoje, eles alegam que é praticamente impossível a fiscalização do uso de agrotóxicos devido ao tamanho do Brasil. Então, a fiscalização do uso de agrotóxicos pelo Estado hoje no Brasil é uma ficção, porque as secretarias de agricultura estão muito mais preocupadas em preconizar o uso dos agrotóxicos, em expandir as fronteiras agrícolas, do que fazer a regulação. É como dizer para o lobo tomar conta do galinheiro. Então, infelizmente, na maioria dos estados, salvo algumas exceções, a fiscalização do uso, a exemplo da pulverização aérea de agrotóxicos, por exemplo, que é uma das que mais atingem o ecossistema e as comunidades, ainda é praticamente inexistente.

IHU On-Line – Como as pessoas podem identificar os alimentos com agrotóxicos?

Fernando Ferreira Carneiro – Todo ano a Anvisa disponibiliza no seu site uma lista de alimentos avaliados em todos os estados, em parceria com as vigilâncias sanitárias, com o grau de contaminação. Então, consultar é a primeira saída. Você saberá, por exemplo, que o pimentão, morango e tomate sempre batem recorde de contaminação. É muito importante que o consumidor esteja atento que busque esses produtos em feiras agroecológicas, em assentamentos da reforma agrária que não utilizem esse tipo de produto; na parte dos supermercados em que há orgânicos certificados. Temos que conjugar essas duas coisas: a informação e o estímulo à economia solidária sustentável. Ou seja, existem várias feiras em cada cidade, e é importante que o consumidor esteja atento. Só aqui em Brasília conheço várias. Eu sei que o Rio Grande do Sul é, inclusive, um dos estados que está mais avançado no Brasil nesse setor. Existem experiências da agroecologia que remontam a décadas. Então, não acredito que o consumidor terá dificuldades em encontrar essas feiras. Além disso, outra saída é a organização, procurar movimentos sociais do campo próximo em que cada um vive, integrar-se no Comitê da Campanha Nacional Contra os Agrotóxicos pela Vida, que é uma campanha dos movimentos sociais, que tem se preocupado em disponibilizar informações para a sociedade, uma coisa que o governo tem feito muito pouco, além de ajudar na formação das pessoas para esse tipo de tema de movimentos de líderes. Se cada um procurar o Comitê da Campanha (e há um em praticamente todos os estados), acredito que pode haver não apenas solução individual para o problema, no caso, como se alimentar de maneira mais saudável, mas ajudar a transformar uma situação e às vezes a criar alternativas no seu território, porque coletivamente temos muito mais chances de encontrar saídas para esses dilemas que o agronegócio tem nos colocado. Não vou dizer que não devemos comer frutas e verduras. Sou o último a dizer isso. Temos que comer frutas e verduras, mas saudáveis e, para isso, não há, muitas vezes, como ter uma solução individual. Logo, é importante nós nos organizarmos, mobilizarmos, a contribuirmos para alterar esse quadro. Espero que no próximo ano o Brasil não seja mais o primeiro consumidor de agrotóxicos. Almejo que toda essa mobilização que nós estamos fazendo na sociedade e academia ajude a pressionar o governo, o Estado brasileiro, a criar programas de incentivo à agroecologia, para criarmos um futuro mais sustentável para o planeta e o nosso país.

IHU On-Line – Por que agrotóxicos proibidos em outros países são permitidos no Brasil?

Fernando Ferreira Carneiro – O lucro ainda está acima da vida. Quando a Anvisa proíbe um agrotóxico em função de seus riscos, como causar câncer, por exemplo, há uma estratégia acordada entre alguns órgãos que faz com que se demore ainda dois ou três anos para tirar o produto totalmente do mercado. Assim, todos os estoques poderão ser vendidos. Olha que coisa perversa! Já está comprovado que ele causa dano à saúde, mas, para a empresa não ter prejuízo, estende-se o prazo total, quer dizer, não se pode mais produzir, mas pode-se vender, para que os estoques sejam comercializados.

IHU On-Line – Quem são os responsáveis, de fato, pela autorização do uso de agrotóxicos no Brasil?

Fernando Ferreira Carneiro – O Brasil hoje possui uma lei avançada. São três órgãos: a agricultura, que avalia a eficiência agronômica do agrotóxico; o Ibama, que analisa o impacto no ecossistema; e a Anvisa, que percebe o impacto na saúde humana. Então, para um agrotóxico ser liberado, tem que haver o parecer produtivo desses três órgãos.

IHU On-Line – Que ações as autoridades devem tomar para conscientizar a população com relação aos alimentos transgênicos?

Fernando Ferreira Carneiro – Ainda existe muita incerteza científica relacionada ao impacto que os transgênicos causam à saúde. Não existe um consenso científico que diga que eles causa, ou não, males. Veja só a perversidade do modelo: as empresas que produzem os transgênicos estavam resistentes a colocar a rotulagem. Se eles acreditam que não fazem mal, por que estão preocupados com a rotulagem? Eles não querem dar nem a opção para o consumidor em escolher se quer ou não comer um alimento transgênico. Eu, à medida que identifico, não compro produtos de origem transgênica. Essa tem sido a minha conduta. Acredito que a questão dos transgênicos entra na mesma luta dos agrotóxicos. No Rio Grande do Sul, os agrotóxicos, após a implantação dos transgênicos, aumentaram três vezes. E no Brasil dobrou. Então, alegar que os transgênicos iriam chegam para diminuir o uso dos agrotóxicos é uma grande falácia.

IHU On-Line – Quais as implicações que os transgênicos podem trazer para o cidadão?

Fernando Ferreira Carneiro – Acredito que para o cidadão, e talvez ainda mais para o produtor, o transgênico aumenta a vulnerabilidade de nossa economia. Estamos falando de grandes grupos internacionais, como a Monsanto, que cobram royalties pelo uso da semente transgênica. O produtor paga royalties para a Monsanto. Então, as pessoas entram num sistema que, para plantar, têm que comprar sempre da empresa. E é ela quem coloca o preço. Isso atenta contra a soberania alimentar do povo. De repente, agricultores que tinham uma independência, uma forma de plantar, ficaram totalmente dependentes da Monsanto e começaram a aumentar os preços dos produtos, gerando desequilíbrio à comunidade. Na verdade, estamos lidando com algo que ainda não temos completa certeza científica e não sabemos direito no que isso vai dar. Só sabemos que, às vezes, pessoas com suas plantações que não querem ser contaminadas com os transgênicos estão assim sofrendo, porque a contaminação pode chegar a uma planta não transgênica, uma vez que não existe muro entre uma plantação e outra e acabam sendo carreados, muitas vezes, pelo vento. Então, o que eu acho pior para o consumidor é que ele está perdendo a capacidade de escolha, seja porque as empresas não querem evidenciar que usam transgênicos, seja pela dificuldade de isolar esses plantios. Logo, a saída que nós defendemos é a implantação de um modelo de agricultura agroecológica no Brasil, sem a utilização de agrotóxicos e transgênicos.

Se a Embrapa, que investe bilhões em pesquisa nesse modelo convencional, começasse a investir de forma importante na agricultura e tecnologias para a agroecologia, o Brasil poderia ser uma grande potência mundial de produção de produtos pilares, talvez, mas produtos mais saudáveis, que gerassem biodiversidade, que ajudassem a gerar qualidade de vida no campo. Eu acredito que aí, sim, poderíamos ser realmente líderes para o mundo. Então, iríamos nos orgulhar em sermos o número um. Mas seria o número um de produção agroecológica, respeitando a natureza e a vida das pessoas. Penso que é essa a nossa utopia e é isso o que nós acreditamos que tem que ser construído para o nosso país, porque a outra opção é o que estamos vendo em vários outros países do mundo: a degradação das terras em busca da mais-valia, do lucro fácil, à custa da natureza e da vida.

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FONTE : (Ecodebate, 27/10/2011) Entrevista realizada por Thamiris Magalhães e publicada pela IHU On-line, parceiro estratégico do EcoDebate na socialização da informação.[IHU On-line é publicada pelo Instituto Humanitas Unisinos - IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]