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sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Barragens de rios impactam a zona costeira, prejudicam atividade pesqueira e provocam erosão no litoral

Barragem de rio prejudica atividade pesqueira e provoca erosão no litoral – Impactos são observados a quilômetros de distância, mostra estudo do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Transferência de Materiais Continente-Oceano; pesquisador defende nova forma de zoneamento para que problemas sejam evitados

As barragens de rios – tanto as que servem a hidrelétricas quanto as que têm a função de manter açudes em ambientes áridos – impactam a zona costeira a quilômetros de distância de onde foram construídas. É o que prova um estudo do Instituto Nacional de Ciência e Tecnologia de Transferência de Materiais Continente-Oceano, que ganhou neste ano o Prêmio Fundação Bunge no tema Oceanografia. Reportagem de Karina Ninni, em O Estado de S.Paulo.

“Quando se constrói uma barragem, parte dos sedimentos que o rio levaria para o mar acaba ficando no mesmo lugar. Estima-se que hoje em dia os oceanos recebam apenas 50% dos sedimentos transportados há 100 anos, antes da construção das grandes represas”, afirma Luiz Drude de Lacerda, pesquisador que trabalha na bacia do Rio Jaguaribe, que corta 70% do Ceará e tem 87 reservatórios de água.

Esse material deveria repor o alimento das espécies marinhas e substituir parte do terreno que é engolido pela ação do mar. Por isso, Drude defende que os relatórios de impacto ambiental de barragens considerem também os ecossistemas marinhos onde os rios afetados deságuam.

“No Nordeste, os barramentos dos rios são necessários para manter a regularidade do fluxo de água para as populações do interior. É uma região onde 90% do fluxo de água é controlado artificialmente. Há impacto, e isso precisa ser encarado.”

Drude afirma que no Sudeste as chuvas provêm quase a totalidade do sedimento que está no litoral. “No semiárido é diferente, porque não chove. Todo o material que vem da bacia de drenagem ao longo do ano é cuspido em direção ao mar nos períodos de alta pluviosidade, quando há fluxo para isso. Mas as barragens regularizam a vazão dos rios, fazendo com que, ao longo do ano, seja relativamente constante.”

Consequências. Os impactos atingem as zonas do barramento e costeira e as atividades desenvolvidas, como a pesca. No local da barragem, os sedimentos se acumulam, aumentando as ilhas e as praias fluviais; a foz dos rios fica entupida de material. Os manguezais também crescem e começam a colonizar ilhas e praias. Os canais de acesso para barcos de pesca ficam mais difíceis. Há ainda impactos sociais.

“Na outra ponta, na costa, o maior impacto é a erosão, que já é uma consequência da intervenção do oceano no continente, independentemente das barragens. Mas, com menos aporte de sedimentos do continente, surgem problemas. As águas oceânicas penetram mais e salinizam os aquíferos costeiros, prejudicando o abastecimento da população.” A regulação do fluxo dos rios compromete toda a produtividade pesqueira da costa. “Principalmente no Nordeste, a pesca costeira depende dos sedimentos do continente. Ele é o combustível da cadeia alimentar marinha”, explica Drude.

Para o pesquisador, é preciso mudar a forma de fazer o zoneamento costeiro, levando em consideração os impactos das barragens. “É preciso identificar os efeitos das barragens na zona costeira para poder gerar cenários futuros. E planejar o gerenciamento costeiro de forma séria, para que as pessoas não sejam tão prejudicadas.”


Usina Hidrelétrica do Xingó (AL), a 270 km da costa, também causou o desaparecimento de peixes de água doce

Lagoas secaram e não há mais onde plantar arroz – Os prejuízos provocados pelo fluxo controlado da água em direção ao litoral ocorrem independentemente da distância que a barragem estiver da costa. “O efeito da Usina Hidrelétrica do Xingó, em Alagoas, que está a 270 km da costa, ou da Barragem de Itaiçaba, no Ceará, a 34 km, é o mesmo”, diz o pesquisador Luiz Drude de Lacerda. Reportagem de Ricardo Rodrigues – O Estado de S.Paulo.

A hidrelétrica do Xingó, que represou as águas do São Francisco na altura da cidade de Delmiro Gouveia (AL), divisa com Paulo Afonso (BA), acentuou o avanço do mar no município de Piaçabuçu, a 190 km de Maceió, segundo o presidente da Colônia de Pescadores da cidade, Antônio Amorim, de 49 anos.

Amorim conta que antes as águas do São Francisco chegavam em abundância e formavam imensas lagoas, que eram usadas para o plantio de arroz.

“Com o barramento do rio, as lagoas secaram, não enchem mais, nem com a maré alta. Com isso, os ribeirinhos ficaram sem ter onde plantar o arroz”, relata o pescador. “As enchentes do rio traziam sedimentos, que serviam como adubos naturais para o cultivo”, explica.

Nova paisagem. Do final do anos 80 para cá, o mar entrou tanto que modificou completamente a paisagem no Pontal do Peba, no município Piaçabuçu, engolindo pelo menos três povoados na região. Do povoado Cabeço, que ficava no lado sergipano da foz e onde moravam cerca de 200 famílias, apenas o antigo farol da Marinha ainda não foi totalmente submerso.

“O mar cobriu as casas dos moradores, a igrejinha, os bares, a pracinha e o cemitério. Só restou mesmo o farol”, conta o barqueiro Ailton Santos Bezerra, de 41 anos. Segundo ele, outras duas vilas de pescadores também foram destruídas.

A quantidade de peixes disponíveis para a pesca também caiu. O pescador Antônio Veiga, de 65 anos, conta que chegou a pescar de 200 a 300 quilos de Xirá nas enchentes do São Francisco. “Hoje não temos mais essa fartura. Quando pescamos 30 quilos já ganhamos o dia.”

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FONTE : EcoDebate, 09/09/2011

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