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quarta-feira, 3 de novembro de 2010

Despertar em Nagoya

A comunidade internacional finalmente despertou para um dos grandes desafios contemporâneos e chegou a um novo acordo para deter o desaparecimento da natureza que sustenta a vida humana. O novo acordo, assinado pelos mais de 190 Estados-membros do Convênio sobre a Diversidade Biológica, inclui o compromisso de reduzir pela metade a proporção de perda de espécies até 2020, bem como o histórico Protocolo de Nagoya de Acesso e Participação nos Benefícios dos Recursos Genéticos.

No entanto, este despertar só se aplica aos primeiros madrugadores. A vasta maioria continua dormindo, sem consciência de que os seres humanos dependem da variedade de formas de vida que integram o ecossistema e que nos fornecem oxigênio, água, alimentos e combustível. E também sem consciência diante do fato de que a natureza é nossa realidade, enquanto a economia é simplesmente um jogo complicado criado por nós mesmos.

O Japão importa mais de 60% de seus alimentos e a maioria dos ecossistemas da Europa foi devastada, restando apenas 17% deles em estado razoável, segundo a primeira avaliação desse tipo. O único motivo pelo qual esses países não faliram é que são suficientemente ricos para se ajudarem em matéria de recursos ecológicos e serviços da natureza.

“Exploramos os recursos biológicos no exterior, especialmente no Sul. Por isso nós, o povo de Aichi, Nagoya, devemos nos desculpar pela deterioração dos ecossistemas e da biodiversidade que causamos”, afirma um documento público divulgado pela sociedade civil de Nagoya, onde, de 18 a 29 de outubro, aconteceu a 10ª Conferência das Partes (COP 10) do Convênio sobre Diversidade Biológica. Embora o governo japonês não tenha se mostrado disposto a reconhecer publicamente, essa realidade pressionou para que os países participantes chegassem a um acordo apesar da habitual divisão entre o Norte industrializado e o Sul em desenvolvimento.

O conflito central é que as nações do Norte são como biopiratas desesperados, viciados em saquear os ecossistemas mais ricos do Sul em busca de alimentos, matéria-prima e mão-de-obra barata. Cada vez mais, o Sul resiste e busca compensações. E isto implica transformar a economia do crescimento para deter a perda de espécies. Estima-se que anualmente aconteçam entre cinco mil e 30 mil extinções.

“O Japão teve um papel central na economia do crescimento. Precisamos passar para uma economia de subsistência”, disse à IPS o professor Kinhide Mushakoji, da Universidade de Economia e Direito de Osaka e um dos organizadores. A petição foi assinada por 156 organizações no Japão. Porém, nas negociações formais não se falou dessa virada para uma economia de subsistência.

De modo perverso, a atual economia do crescimento levou países como o Japão e muitos europeus a subsidiarem a destruição da pesca marinha com a pesca excessiva, disse Achim Steiner, diretor-executivo do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma), que administra o Convênio. Promover uma economia verde exigiria investir “US$ 8 bilhões dos estimados US$ 27 bilhões a título de subsídios em zonas como as Áreas Marinhas Protegidas, e cotas de pesca comercial”, disse Steiner na abertura da Conferência.

Estudos do Pnuma mostram que esse enfoque representa maiores capturas no futuro, elevando a renda das populações locais e garantindo que quase um bilhão de indigentes do mundo tenham acesso a mais proteínas derivadas do pescado. Acabar com esses subsídios é o terceiro dos 20 objetivos estratégicos para até 2020 do acordo, conhecidos coletivamente como Objetivos de Aichi.

“É necessário frear a perda de biodiversidade até 2020. Isso não pode ser adiado”, disse Mario Tanao, um delegado juvenil e membro da organização japonesa Biodiversity on the Brink. Mario e outros criaram uma rede chamada Global Youth Biodiversity Organisation, que foi oficialmente reconhecida pela secretaria do Convênio ao final da reunião. “Esperamos ter jovens de mais de cem países na próxima COP”, disse Christian Schwarzer, representante juvenil do Fórum Alemão sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento.

O governo holandês divulgou na COP 10 uma análise científica segundo a qual frear a perda de biodiversidade mundial até 2050 será extremamente difícil, quando não impossível. E até 2020, absolutamente impossível, disse o diretor do estudo, Maarten Hajer, da Agência Holandesa de Avaliação Ambiental.

O estudo de Maarten dá ênfase às principais causas da perda de biodiversidade: agricultura, desmatamento, pesca excessiva e mudança climática, e nas opções que podem ser usadas até 2050 em um mundo que – estima-se – nesse ano terá cerca de nove bilhões de habitantes. Apenas aumentar o tamanho das áreas protegidas para 20% de toda a área terrestre é altamente insuficiente, afirmou.

A única esperança é uma combinação de grandes áreas protegidas e uma virada para uma produção e um consumo sustentáveis. “Mesmo assim, só poderemos reduzir a proporção de perda de biodiversidade, não detê-la”, disse Maarten à IPS. Segundo Kinhide, “a economia verde é uma solução apenas para aqueles que atuam na economia monetária. Milhares de milhões de pessoas não o fazem”.
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FONTE : Envolverde/IPS

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