O Himalaia está mudando… para pior
por Amantha Perera, da IPS
Jhirpu Phulpingkatt, Nepal, 5/6/2013 – Os habitantes de Jhirpu Phulpingkatt, aldeia localizada ao pé do Himalaia, a cerca de 110 quilômetros da capital Katmandu, estão em alerta vermelho. Enquanto os impactos da mudança climática maltratam as montanhas que se erguem sobre eles, estes aldeões das ribeiras do rio Bhote Koshi vivem com medo ao som das mensagens de texto, que podem trazer avisos para evacuação.
Seu medo tem fundamento. Uma pesquisa feita por especialistas da Universidade de Milão, na Itália, mostra que a neve do Monte Everest, na Cordilheira do Himalaia, diminuiu 180 metros nos últimos 50 anos, enquanto as geleiras perderam 13% de seu tamanho.
Na última semana de maio, todos os olhares se centraram no Everest, que, com 8.848 quilômetros de altitude, é a montanha mais alta do mundo, na fronteira entre China e Nepal. Isso porque no dia 30 completaram-se 60 anos da primeira vez que foi escalado. E esta ocasião foi motivo de celebração e também de pânico, quando foi possível ver que, debaixo das camadas geladas que se desfaziam, surgiam rochas, chamando a atenção diante das rápidas mudanças que afetam esta majestosa cadeia montanhosa.
Sudeep Thakuri, que liderou a equipe de pesquisadores, disse à IPS que, provavelmente, o derretimento contínuo e cada vez maior se deve ao aumento das temperaturas, que este ano estão 0,6 grau mais altas do que nos anos anteriores. Juntos, os dois fenômenos levaram à proliferação de enormes lagos de glaciais – gelo derretido e contido por diques naturais de pedra, lama e escombros – que podem ser sinônimo de desastre para quem vive nas partes rochosas abaixo.
Avalanches, erosão, forte pressão da água e inclusive tempestades de neve podem causar transbordamento desses lagos, “liberando milhões de metros cúbicos de água em poucas horas, o que provocaria inundações catastróficas corrente abaixo”, afirma um estudo da Germanwatch, uma organização não governamental dedicada ao desenvolvimento sustentável.
Esses transbordamentos são comuns: no último século, os cientistas registraram pelo menos 50 incidentes deste tipo. Um dos mais devastadores ocorreu quando o lago glacial Sangwang Cho, no Tibete, transbordou em 1954, inundando as cidades de Gyangze (120 quilômetros corrente abaixo) e Xigaze (a 20 quilômetros de distância). Agora, especialistas alertam que os lagos estão enchendo mais rápido do que nunca e que novos estão surgindo a um ritmo alarmante.
“Se o aquecimento global continuar, tal como se prevê, é provável que haja aceleração da redução da espessura das geleiras”, disse à IPS Pradeep Mool, coordenador de programa no Centro Internacional para o Desenvolvimento Integrado de Regiões Montanhosas (Icimod), em Katmandu. “O perigo que representam as inundações derivadas de transbordamento de lagos glaciais aumentará”, advertiu.
Pesquisas realizadas pelo Icimod mostram que na zona de Hindu Kush do Himalaia há cerca de 20 mil lagos glaciais, que se estendem do Afeganistão, no ocidente, até a Birmânia, no leste. A bacia do rio Dudh Kosi, no leste do Nepal, abriga 278 geleiras, sendo que algumas estão diminuindo ao ritmo de 74 metros por ano. Mool explicou à IPS que agora a região tem 34 lagos, incluídas 24 formações recentes, dez delas qualificadas como potencialmente perigosas, e alertou que os terremotos também representam uma séria ameaça.
“A região de Hindu Kush no Himalaia é de extrema instabilidade sísmica. Os terremotos podem atuar como importantes disparadores de transbordamento de lagos glaciais”, ressaltou. Nos últimos 500 anos houve pelo menos um transbordamento na região de Seti Khola causado por atividade sísmica, lembrou Mool. Esse fato produziu um acúmulo de escombros de 50 metros de altura na região de Pokhara.
Segundo Thakuri, o futuro bem-estar das geleiras depende amplamente do clima. São necessárias pesquisas científicas muito mais concretas para determinar possíveis resultados, acrescentou. Mas os que vivem nas ladeiras do Himalaia, como os moradores de Jhirpu Phulpingkatt, afirmam que já há evidências suficientes dos possíveis desastres que virão. As empinadas ladeiras das montanhas nesta aldeia, majoritariamente cobertas por exuberante vegetação, se veem frequentemente alteradas por profundos afundamentos causados por deslizamentos de terra que ocorrem após chuvas fortes.
Na pequena central elétrica que fica bem ao lado do rio Bhote Koshi os funcionários dependem de um sistema de alerta para avisar os moradores do lugar quando tiverem de fugir dos transbordamentos. Porém, o gerente da usina, Janak Raj Pant, disse à IPS que o alerta daria apenas uma “janela” de fuga de seis a dez minutos, e que se estenderia somente até a fronteira nepalesa, que fica a dez quilômetros da central. Porém, muitos dos lagos glaciais que podem ter impacto sobre esta e outras aldeias ficam no Tibete, controlado pela China, e onde o sistema de alerta não chega.
Mool afirmou à IPS que é necessário urgentemente melhor controle dos lagos e dos níveis de suas águas. O cientista apontou alguns exemplos isolados de implantação de vias de saída nos diques naturais de alguns lagos glaciais no Nepal e no Butão, para dar vazão ao excesso de água, mas disse que é preciso que tais ações preventivas sejam mais uniformes. Também existe um imperativo econômico para tomar medidas, pelo menos no vale do rio Bhote Koshi, onde as autoridades nepalesas planejam construir pelo menos quatro novas hidrelétricas. Envolverde/IPS
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