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quarta-feira, 23 de setembro de 2009

Urgência contra as alterações climáticas


As alterações climáticas estão a acontecer mais rapidamente do que se pensava ainda há dois anos. Continuar a comportar-nos como se nada fosse, equivale a tornar praticamente inevitáveis alterações perigosas, talvez mesmo catastróficas, do clima durante este século. Trata-se do desafio mais importante para a atual geração de políticos.

O que mais me preocupa agora são as perspectivas para a cimeira de Copenhague. Neste momento, as negociações aproximam-se perigosamente de um beco sem saída, que poderá ser bem mais grave do que um simples impasse, ultrapassável no próximo ano. As negociações correm o risco de fracassar num clima de acrimônia e, talvez, de profunda divisão entre os países desenvolvidos e os países em desenvolvimento. Na atual conjuntura, o mundo não se pode dar ao luxo de um resultado tão desastroso.

Os líderes mundiais reúnem-se esta semana em Nova York e em Pittsburg: espero que tomem consciência de que estamos à beira do abismo e que não nos resta outra solução senão avançar ativamente com as negociações.

Este não é o momento de jogar pôquer. É o momento de pôr as propostas na mesa, que devem ser tão ambiciosas quanto as nossas limitações políticas o permitam. Foi precisamente o que a Europa fez e continuará a fazer.

A resposta consiste, em parte, em identificar o cerne de um potencial compromisso que nos permita ainda chegar a uma conclusão positiva e, nesse sentido, penso que a reunião dos líderes mundiais em Nova York pode revelar-se decisiva.

A primeira parte do compromisso deve levar todos os países desenvolvidos a clarificar os seus planos em matéria de redução das emissões a médio prazo e a mostrar a liderança necessária, quanto mais não seja em nome das nossas responsabilidades pelas emissões do passado. Para concretizar o nosso objetivo de redução das emissões de, pelo menos, 80% até 2050, os países desenvolvidos devem esforçar-se por alcançar uma redução coletiva de 25-40% até 2020. A UE está disposta a elevar o objetivo de 20% para 30% se os outros fizerem esforços no mesmo sentido. Em segundo lugar, os países desenvolvidos devem agora reconhecer explicitamente que é preciso contribuir ativamente para o financiamento das medidas de atenuação e de adaptação que os países em desenvolvimento possam vir a adotar. Segundo as nossas estimativas, até 2020 esses países terão necessidade de cerca de 100 bilhões de euros suplementares (US$ 150 bilhões) por ano para combater as alterações climáticas. Parte desse montante será financiada pelos próprios países em desenvolvimento economicamente mais avançados. A maior fatia deverá vir do mercado do carbono, se de fato tivermos a coragem de estabelecer um sistema ambicioso à escala mundial.

Uma parte das medidas deverá, no entanto, ser financiada por transferências de fundos públicos dos países desenvolvidos para os países em desenvolvimento — montante que poderá oscilar entre os 22 e os 50 bilhões de euros (US$ 30 bilhões a US$ 70 bilhões) por ano, até 2020. Quase metade desse montante servirá para financiar medidas de adaptação, devendo ser dada prioridade aos países em desenvolvimento mais pobres e vulneráveis. Em função do resultado das negociações sobre a repartição dessa responsabilidade em nível internacional, a parte a assumir pela UE poderá situar-se entre 10% e 30%, ou seja, cerca de 15 bilhões de euros (US$ 22 bilhões) por ano. Por outras palavras, devemos estar preparados para fornecer uma contribuição significativa a médio prazo e encarar a possibilidade de avançar, talvez já no próximo ano, com financiamentos de arranque a favor dos países em desenvolvimento. Tenciono discutir esse assunto com os líderes da UE quando no reunirmos em fins de outubro.

Devemos, pois, mostrar a nossa disponibilidade para falar de dinheiro esta semana. Como contrapartida, os países em desenvolvimento, pelo menos os que são economicamente mais avançados, devem ser muito mais claros sobre o que estão dispostos a fazer para reduzir as emissões de carbono no âmbito de um acordo internacional. Embora já estejam a ser aplicadas medidas em nível nacional para limitar as emissões, é claramente necessário intensificar esses esforços — refiro-me em especial aos países em desenvolvimento mais avançados. Esses países sublinham, naturalmente, que não poderão adotar medidas de atenuação se não estiverem disponíveis financiamentos alimentados pelo comércio do carbono provenientes dos países ricos, como aliás ficou acordado em Bali. Mas o mundo desenvolvido não terá nada para financiar se não houver um compromisso nesse nível.

Temos menos de 80 dias para chegar a Copenhague. Da reunião de Bonn do mês passado resultou um texto provisório com cerca de 250 páginas, que é um festival de opções alternativas, um emaranhado de parênteses retos. Se não for deslindado, o documento corre o risco de se tornar a carta de suicídio coletivo mais longa da história.

Esta semana em Nova York e em Pittsburg promete ser crucial, quanto mais não seja porque servirá para mostrar até que ponto os líderes mundiais estão dispostos a investir nestas negociações para alcançar um bom resultado. A escolha é simples: sem dinheiro, não há acordo, mas sem medidas não há dinheiro!

Copenhague é uma ocasião crucial para enveredarmos coletivamente por uma trajetória de emissões que mantenha o aquecimento global abaixo dos dois graus centígrados (3,6 graus Fahrenheit). A contra-ofensiva deve então começar esta semana em Nova York.
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FONTE : José Manuel Barroso é Presidente da Comissão Europeia (Publicado originalmente no Correio Braziliense - 22/09/2009)(Envolverde/Correio da Cidadania)

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