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segunda-feira, 4 de agosto de 2014
Patativa-tropeira (Sporophila beltoni): Nova espécie de ave é descoberta no Brasil e já está ameaçada
Ornitólogos descreveram a patativa-tropeira (Sporophila beltoni), ave que ocorre no Cerrado e nos campos de altitude associados à Floresta com Araucárias, ecossistema brasileiro quase extinto
Uma nova espécie de ave que só ocorre no Brasil foi descoberta por ornitólogos da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC/RS), com apoio da Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza. O estudo, conduzido por Márcio Repenning e Carla Suertegaray Fontana, foi publicado no periódico norte-americano The Auk – American Ornithologists’ Union após mais de oito anos de pesquisas.
Até então se acreditava que a patativa-tropeira (Sporophila beltoni) era da mesma espécie que a já conhecida patativa-verdadeira (Sporophila plumbea). Porém, após uma pesquisa financiada também pela Fundação Grupo Boticário, percebeu-se que ela possuía características que a diferenciavam das outras, tratando-se de uma nova espécie. “A ave recém-descoberta possui plumagem e canto diferentes, além de usar seu habitat de forma própria”, explica Repenning. O nome popular da nova espécie é alusivo aos limites da área de reprodução e regiões por onde a ave migra. Essas áreas coincidem com as regiões da rota que os tropeiros utilizavam no Sul do país, desde o século XVIII, para conduzir rebanhos e carne seca que seriam comercializados no Sudeste brasileiro.
A patativa-tropeira ocorre desde o nordeste do Rio Grande do Sul até Minas Gerais, nos biomas Mata Atlântica e Cerrado. Porém, apesar de ter como distribuição uma extensão razoavelmente grande, incluindo diversos estados brasileiros, essa espécie já ‘nasce’ ameaçada. Um dos motivos dessa realidade é porque a reprodução da espécie acontece nos campos naturais em bom estado de conservação das regiões altas e montanhosas do Sul, como os Campos Gerais do Paraná, o Planalto Catarinense e os Campos de Cima da Serra do Rio Grande do Sul, sempre em áreas junto da Floresta com Araucárias, ecossistema bastante ameaçado.
Após o período de reprodução (de novembro a março), a chegada do frio mais rigoroso no Sul faz com que o capim utilizado pela patativa-tropeira não frutifique mais. Com a redução na disponibilidade do alimento, a ave migra temporariamente para o Bioma Cerrado, em áreas de Minas Gerais principalmente, permanecendo na região de abril a outubro.
Ecossistema onde a espécie se reproduz está quase extinto
Os campos de altitude associados à Floresta com Araucárias, onde a espécie se reproduz, vem sofrendo drasticamente em decorrência da contínua e rápida degradação e fragmentação dos ambientes naturais, bem como da substituição de espécies nativas por exóticas como o pinus (Pinus elliottii) e o barramento de rios para geração de energia. A própria Floresta com Araucárias tem apenas 3% de sua cobertura original, sendo alvo contínuo do avanço agrícola desordenado que destrói cada vez mais os ambientes naturais. Repenning explica que a patativa-tropeira depende desse ecossistema misto (em mosaico na paisagem), considerado praticamente extinto. “Ela necessita de áreas específicas para se reproduzir e que invariavelmente estão próximas a matas ciliares ou entremeadas com manchas de capões de florestas típicos dos campos com araucárias, por isso a necessidade de se conservar esse ecossistema tão ameaçado”, comenta.
Além disso, com base nas pesquisas, estima-se que haja cerca de 4.500 casais na natureza, número considerado baixo para aves. Outra dificuldade que a patativa-tropeira enfrenta e que a deixa vulnerável é a captura de indivíduos silvestres para abastecer o mercado clandestino de pássaros. “Por conta da somatória dessas situações, essa nova espécie já é considerada globalmente em perigo de extinção, conforme atualização da lista nacional de espécies ameaçadas de extinção que está em preparação”, destaca o pesquisador.
Habitats da espécie favoreciam sua descoberta
Por viver e se reproduzir exclusivamente em campos abertos com ausência de formação florestal, seja no Cerrado ou na Mata Atlântica, a ave já poderia ter sido descrita há muito tempo. “Isso não aconteceu por falta de pesquisa básica. Reconhecer e nomear espécies são alicerces para explorar questões mais complexas sobre a biodiversidade e os ecossistemas”, ressaltam os pesquisadores responsáveis pelo estudo.
De acordo com Malu Nunes, diretora executiva da Fundação Grupo Boticário, instituição apoiadora do projeto que descobriu a ave, fomentar o desenvolvimento científico é indispensável para ampliar o conhecimento da biodiversidade brasileira. “Só é possível conservar aquilo que conhecemos. Por isso, a pesquisa científica é um importante subsídio para o avanço na proteção dos ambientes naturais brasileiros, bem como da fauna que neles ocorrem”, destaca. Para Nunes, quando um projeto descobre uma espécie, viabiliza a proposição de estratégias adequadas de conservação, tanto dela como de seu habitat, facilitando a implementação de políticas públicas mais assertivas e eficientes para protegê-los. Em 24 anos, a Fundação Grupo Boticário já apoiou 1.398 projetos, contribuindo para a descrição de 70 novas espécies.
Edital busca novos projetos de conservação da natureza no Sul
Para ampliar o conhecimento dos ecossistemas ameaçados do Sul do país e proteger espécies como a própria patativa-tropeira, a Fundação Grupo Boticário abriu o Edital de Apoio a Projetos com foco nos ecossistemas sulinos. Podem se inscrever autores de pesquisas que busquem a conservação da biodiversidade no Bioma Pampa, exclusivo do Rio Grande do Sul, além daquelas com foco nos ecossistemas Floresta com Araucárias e Campos Sulinos Associados, ambos integrantes do Bioma Mata Atlântica e que ocorrem principalmente no três estados do Sul.
Sobre a Fundação Grupo Boticário – A Fundação Grupo Boticário de Proteção à Natureza é uma organização sem fins lucrativos cuja missão é promover e realizar ações de conservação da natureza. Criada em 1990 por iniciativa do fundador de O Boticário, Miguel Krigsner, a atuação da Fundação Grupo Boticário é nacional e suas ações incluem proteção de áreas naturais, apoio a projetos de outras instituições e disseminação de conhecimento. Desde a sua criação, a Fundação Grupo Boticário já apoiou 1.398 projetos de 480 instituições em todo o Brasil. A instituição mantém duas reservas naturais, a Reserva Natural Salto Morato, na Mata Atlântica; e a Reserva Natural Serra do Tombador, no Cerrado, os dois biomas mais ameaçados do país. Outra iniciativa é um projeto pioneiro de pagamento por serviços ambientais em regiões de manancial, o Oásis. Na internet: www.fundacaogrupoboticario.org.br, www.twitter.com/fund_boticario e www.facebook.com/fundacaogrupoboticario.
EcoDebate, 04/08/2014
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