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quinta-feira, 11 de outubro de 2012

O mito de que a mineração teria prioridade sobre outras atividades econômicas. Entrevista com Bruno Milanez

“O Plano Nacional de Mineração apresenta as mesmas limitações que foram identificadas nos documentos relativos ao novo marco regulatório. Ele parte do princípio de que a mineração é sempre benéfica e, dessa forma, não propõe critérios para a criação de limites ou restrições às atividades mineradoras”, esclarece o engenheiro.
Confira a entrevista.
“O Código Mineral é baseado no mito de que a mineração teria prioridade sobre outras atividades econômicas. Dessa forma, com base em um pretenso ‘interesse nacional’ há o deslocamento e desestruturação social de assentamentos rurais, comunidades quilombolas, e de outros grupos tradicionais bem como a destruição de importantes ecossistemas”. É com essa reflexão que Bruno Milanez critica o atual código mineral e aponta as limitações do Plano Nacional de Mineração, apresentado pelo governo federal. “O novo marco regulatório se propõe a intensificar a produção mineral no país, e a aumentar a participação do Estado nos resultados financeiros gerados pelas atividades minerais”, esclarece. Segundo ele, as mudanças propostas “giram em torno da redução da burocracia envolvida no processo de concessão de lavra, no estímulo à atividade mineral e no aumento dos royalties pagos pelas empresas”.
Na entrevista a seguir, concedida à IHU On-Line por e-mail, Milanez ressalta que o novo marco regulatório está sendo “discutido em um contexto de aumento dos preços dos minérios. No caso do Brasil, a demanda das siderúrgicas chinesas por minério de ferro vem causando considerável aumento de preço. Por exemplo, entre 1997 e 2001, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior – MDIC, o preço do minério de ferro exportado pelo Brasil passou de US$ 21,44 por tonelada para US$$ 126,40 por tonelada”.
Para ele, “a política de apoio à mineração adotada pelo Estado brasileiro se insere no modelo ‘neoextrativista’, que vem sendo replicado por diferentes países da América Latina. A principal contradição desse modelo é que a mineração gera uma série de impactos sociais negativos de âmbito local. Ao mesmo tempo, o Estado argumenta que precisa fazer caixa exatamente para reduzir os problemas sociais. Portanto, cria-se um círculo vicioso”.
Bruno Milanez (foto abaixo) é graduado em Engenharia de Produção pela Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, mestre em Engenharia Urbana pela Universidade Federal de São Carlos, e doutor em Política Ambiental pela Lincoln University. Leciona na Universidade Federal de Juiz de Fora.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Como avalia o atual Código Mineral? É necessário alterá-lo?
Bruno Milanez – O atual Código Mineral apresenta limitações principalmente relativas aos direitos dos moradores das áreas a serem mineradas (proprietários superficiários).
Com relação ao primeiro ponto, o Código é baseado no mito de que a mineração teria prioridade sobre outras atividades econômicas. Dessa forma, com base em um pretenso “interesse nacional” há o deslocamento e desestruturação social de assentamentos rurais, comunidades quilombolas, de outros grupos tradicionais bem como a destruição de importantes ecossistemas, contribuindo para a redução da diversidade cultura e ecológica do país.
IHU On-Line – Em que consiste a proposta de um novo marco regulatório para as atividades minerais no país? O que motiva uma mudança no código do setor? Em que contexto histórico, político e econômico este tema está sendo discutido?
Bruno Milanez – O novo marco regulatório propõe-se a intensificar a produção mineral no país e a aumentar a participação do Estado nos resultados financeiros gerados pelas atividades minerais. As mudanças propostas giram em torno da redução da burocracia envolvida no processo de concessão de lavra, no estímulo à atividade mineral e no aumento dos royalties pagos pelas empresas.
O novo marco regulatório vem sendo discutido em um contexto de aumento dos preços dos minérios. No caso do Brasil, a demanda das siderúrgicas chinesas por minério de ferro vem causando considerável aumento de preço. Por exemplo, entre 1997 e 2001, segundo dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior – MDIC, o preço do minério de ferro exportado pelo Brasil passou de US$ 21,44 por tonelada para US$$ 126,40 por tonelada.
IHU On-Line – Quais as limitações do Plano Nacional de Mineração 2030? Que aspectos deveriam ser incorporados a ele?
Bruno Milanez – O Plano Nacional de Mineração apresenta as mesmas limitações que foram identificadas nos documentos relativos ao novo marco regulatório. Ele parte do princípio de que a mineração é sempre benéfica e, dessa forma, não propõe critérios para a criação de limites ou restrições às atividades mineradoras.
IHU On-Line – Quais as vantagens e desvantagens de intensificar a exploração mineral do país?
Bruno Milanez – Essa pergunta exige uma análise com base na escala.Isso porque, enquanto os benefícios são dispersos, os impactos negativos são concentrados principalmente nos municípios mineradores. O modelo de mineração que vem se consolidando no país tende a contribuir para o superávit da balança comercial, melhorando as contas nacionais e gerando aumento de renda no curto prazo.
Por outro lado, como a mineração é uma atividade intensiva em recursos naturais e poluição, temos a intensificação do consumo e poluição das águas. As cidades localizadas próximas a grandes minas podem apresentar sérios problemas de qualidade do ar, como é o caso de Congonhas. Além disso, a abertura de novas minas em pequenos municípios e distritos no norte do país gera a migração de um grande efetivo de mão de obra. A chegada de muitos trabalhadores, sem suas respectivas famílias, podem criar inúmeras situações de risco em tais municípios, como aumento do alcoolismo, uso de drogas, prostituição e gravidez de jovens e adolescentes.
IHU On-Line – Qual é a participação do Estado nos resultados econômicos gerados pela mineração?
Bruno Milanez – No Brasil existe uma série de incentivos fiscais à exportação de produtos de baixa intensidade tecnológica. Os minérios exportados, por exemplo, são isentos do pagamento de ICMS, PIS/COFINS, imposto sobre exportação e imposto sobre produtos industrializados. Por esse motivo, a tributação sobre tais produtos é muito inferior àquela imposta sobre produtos manufaturados. Dessa forma, a principal forma de o Estado se apropriar de parte dos resultados financeiros é por meio da cobrança de royalties, porém esse é também muito baixo. O pagamento dos royalties no Brasil é de no máximo 3% do faturamento líquido, enquanto que em outros países, como Canadá, pode chegar a 13% da receita líquida.
IHU On-Line – Quais são as maiores contradições do Estado brasileiro em relação à mineração e à exploração dos recursos minerais?
Bruno Milanez – A política de apoio à mineração adotada pelo Estado brasileiro se insere no modelo “neoextrativista”, que vem sendo replicado por diferentes países da América Latina. A principal contradição dessa modelo é que, conforme comentei acima, a mineração gera uma série de impactos sociais negativos de âmbito local. Ao mesmo tempo, o Estado argumenta que precisa fazer caixa exatamente para reduzir os problemas sociais. Portanto, cria-se um círculo vicioso. Além disso, como a economia mineral é baseada em recursos não renováveis, se não houver a construção de uma economia pós-extrativista (que não se vê sendo proposta para o Brasil), uma vez esgotadas as reservas, a região mineradora pode entrar em um processo de depressão econômica.
IHU On-Line – Quais são as perspectivas do mercado mundial em relação à mineração?
Bruno Milanez – Considerando a demanda por minérios da China e, possivelmente, da Índia, a perspectiva é de manutenção de preços médios elevados para os minérios no mercado internacional. Entretanto, esse aumento de preço vem também acompanhando de um aumento de volatilidade. Essa característica tem como componente um aumento no risco tanto para as empresas como para as cidades e países que se especializem no fornecimento de minerais para o mercado internacional.

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FONTE : (Ecodebate, 11/10/2012) publicado pela IHU On-line, parceira estratégica do EcoDebate na socialização da informação.
[IHU On-line é publicada pelo Instituto Humanitas Unisinos - IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]

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