a22 TERRAMÉRICA   Municípios unidos frente à mudança climática
Os resíduos orgânicos são armazenados para elaboração de compostagem, que depois é distribuída entre os moradores. Foto: Cortesia da Rede Argentina de Municípios Frente à Mudança Climática
Com medidas cotidianas, como evitar o uso de produtos descartáveis e a separação de resíduos, comunidades do interior da Argentina se juntam para aplicar políticas ambientais mais eficazes.
Buenos Aires, Argentina, 29 de outubro de 2012 (Terramérica).- Trinta municípios pequenos e médios da Argentina articulam políticas de adaptação e mitigação diante da mudança climática. A ideia é conscientizar e agir em conjunto para colocar essas comunidades em sintonia com o problema global, explicam os promotores da iniciativa. “Os municípios grandes têm equipes técnicas. O problema está nos distritos com dez mil a 50 mil habitantes, que também estão isolados, disse ao Terramérica o coordenador da Rede Argentina de Municípios frente à Mudança Climática, Ricardo Bertolino.
“Sem pares com os quais discutir, sempre aparecem outras prioridades”, acrescentou Bertolino, que também é subsecretário do Meio Ambiente de Rosário, na província de Santa Fé, embora esta cidade, uma das mais importantes da Argentina, não faça parte da rede. Esta unidade de ação permite aos representantes dos municípios se capacitar e trocar experiências sobre energias renováveis, manejo de resíduos ou turismo sustentável, além de se comprometer com os temas que afetam suas comunidades. “Ser parte do projeto e participar de um encontro mensal os mantêm envolvidos. Saem com ideias novas sobre projetos sustentáveis em pequena escala que podem aplicar em seus municípios”, afirmou Bertolino.
A Rede, lançada em 2010, na localidade de Monte Caseros, província de Corrientes, surgiu devido às recomendações das organizações internacionais sobre mudança climática para reduzir emissões que causam o aquecimento global e para mitigar o impacto desse fenômeno. Até agora, aderiram ao projeto 34 municípios pequenos e médios de nove províncias, embora a maioria seja de Santa Fé, Corrientes e Buenos Aires, a mais populosa do país. Cada um paga a cota mensal de cem pesos (US$ 21).
“Ninguém está lucrando nem temos financiamento. A cota é para manter o site. O que se busca, quixotescamente, é colocar a questão da mudança climática nos pequenos municípios”, sintetizou Bertolino. Nas reuniões com representantes municipais “não damos aula”, mas são apresentadas “experiências de sucesso” de algum município para compartilhar os conhecimentos e tentar somar a maior quantidade de funcionários, empresas e a própria sociedade civil. “Precisamos que os diferentes setores se articulem e que esteja presente alguém deles com possibilidade de tomar decisões”, destacou.
Entre os mais ativos da Rede estão Emilia, distrito de mil habitantes no leste da província de Santa Fé, e Llambi Campbell, com três mil habitantes, ambos rodeados por explorações pecuárias, especialmente de cultivos de soja, principal produto de exportação da Argentina atualmente. O representante do primeiro, o engenheiro agrônomo Eduardo Paviotti, disse ao Terramérica que Emilia separa resíduos na origem para alimentar o biodigestor que funciona na Escola Agrotécnica 2050 Monsenhor Vicente Zazpe, onde ele mesmo trabalha como professor.
Quanto a Llambi Campbell, também representado por Paviotti, os dejetos orgânicos são aproveitados na elaboração de compostagem para reparti-la entre os moradores. Além disto, são separados materiais plásticos e vidros, junto com papéis e papelão, para reciclagem, enquanto as baterias usadas são colocadas em tambores plásticos selados com concreto. Esta comunidade dá especial atenção à economia de energia elétrica e à redução de emissões contaminantes.
“Como aqui os automóveis são muito usados, lançamos o projeto De Bicicleta para a Escola, para promover o uso desse transporte entre os menores”, pontuou Paviotti. O Terramérica perguntou ao engenheiro se não acredita que o trabalho do município é uma gota no oceano, já que os dois municípios são ilhas nos grandes campos cobertos de soja transgênica, que arrasa a biodiversidade e é resistente à fumigação com glifosato, um agroquímico que, segundo sua manipulação, pode ser daninho para o solo, o ar e a água.
“Como técnicos, acreditamos que é possível cultivar a soja sem contaminar, mas as empresas que operam os agroquímicos deveriam produzir uma linha menos tóxica. O problema é que o poderio econômico destas firmas é muito grande” para se conseguir influir, acrescentou Paviotti. De todo modo, contou que trabalha junto com os produtores rurais para melhorar a limpeza das embalagens de glifosato que contaminam a área urbana. Na região são reutilizados para transporte de água, apesar de sua toxicidade.
“Recomendamos a tríplice lavagem, que consiste em enxaguar a embalagem com água limpa três vezes, agitar e jogar o conteúdo dentro da máquina pulverizadora para lançar sobre o cultivo e não no povoado”, explicou Paviotti. Especializado em educação ambiental, o representante garantiu que nos municípios se tenta ser “coerente com o cuidado dos recursos”, mas admitiu que “não é fácil dizer não à soja”. Assegurou que os moradores, em geral respondem bem à separação de resíduos e ao confisco de baterias.
Contudo, reconheceu que é difícil comprometer os produtores do campo com um manejo melhor do glifosato. “É difícil a conscientização. Por exemplo, com isto das embalagens, sempre estão ocupados, e o prejuízo econômico de aproveitar o tempo de uso das máquinas prevalece sobre o custo ambiental”, lamentou. Apesar das dificuldades, a ideia da Rede chamou a atenção de outros municípios da América Latina, que estão pedindo assessoria para replicar a experiência. Bertolino já deu um curso de capacitação no Equador e agora os pedidos são de Brasil e Venezuela.

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FONTE : Envolverde/Terramérica
* A autora é correspondente da IPS.