Código do Consumidor e meio ambiente
Jean Marc Sasson* - Após vinte e dois
anos de sua elaboração, o Código do Consumidor modificou profundamente a relação
entre consumidores e empresas. Sem dúvidas, hoje os consumidores vêm seus
direitos mais respeitados e protegidos dos abusos das corporações.
Esse código, à época de sua elaboração, estava tão à frente de seu tempo que países como Itália e outros países latinos recentemente buscaram inspiração para comporem os seus. Perceberam que o Código brasileiro serviria de base para aprofundarem esta temática em seus territórios.
Em projeto de lei elaborado neste ano, buscou-se atualizar o CDC, justificadamente, em relação à regulação do comércio eletrônico que nos últimos anos cresce vertiginosamente. No entanto, nesta atualização, a proteção ambiental sequer foi cogitada.
A meu ver, a proteção ambiental hoje é infimamente prevista no código, o que deveria ser objeto de grande preocupação dos ambientalistas, principalmente na era do chamado consumo consciente.
Apesar dos direitos consumerista e ambiental possuírem a mesma natureza jurídica de direito difuso e coletivo, verifica-se que o CDC trata os aspectos ambientais escassamente, senão vejamos algumas previsões:
Primeiro, em seu art. 4º, III, quando determina que a Política Nacional de Relações de Consumo seja harmonizada com os interesses dos participantes da relação de consumo segundo os princípios da ordem econômica (art. 170, CF).
Verifica-se que um dos princípios previstos neste artigo é a proteção do Meio Ambiente no inciso VI, obrigando os produtos e serviços preverem seus impactos ambientais.
Segundo, no art.6º, I quando diz que são direitos básicos do consumidor a proteção à vida, à saúde e à segurança contra os riscos oriundos de produtos e serviços. Direito à vida e à saúde são inerentes à preservação do Meio Ambiente. Caso produtos e serviços não vislumbrem a preservação ambiental, a saúde humana restará em perigo.
Terceiro, de forma indireta, no art. 6º, II na previsão ao direito à educação para o consumo. É óbvio que não está expresso o direito à educação ambiental, o que se pode cogitar de forma implícita. A meu ver, gira nesta questão a maior necessidade de reforma do código. Apesar de termos a política nacional de educação ambiental, necessitamos de uma integração maior entre a política nacional e a lei consumerista. Necessita de uma vinculação expressa como forma de ganhar musculatura o incentivo à educação ambiental.
Quarto, já de forma expressa, prevê no art. 37, §2º que a publicidade abusiva é aquela que desrespeita, entre outros aspectos, os valores ambientais. Por exemplo, quando uma empresa a fim de divulgar sua marca distribui livremente panfletos pela rua, a meu ver, traduz de forma cristalina esta idéia de abusividade dos valores ambientais.
Quinto, no art. 51, XIV, o CDC estipula que serão nulas de pleno direito as cláusulas contratuais relativas a serviços e produtos que desrespeitem normas ambientais, podendo invocar a invalidade do contrato. Neste sentido, temos como exemplo a contratação de serviço de coleta seletiva que realiza o despejo inadequado dos resíduos. A invalidade deste contrato poderá ser invocada a qualquer tempo, a partir do conhecimento deste fato.
Devo mencionar ainda que no art.12, há previsão de responsabilização do fabricante, do produtor, do construtor, nacional ou estrangeiro, e do importador que independentemente de culpa, respondem pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos. E a responsabilidade pós-consumo?
Apesar da Política Nacional dos Resíduos Sólidos prever atualmente esta possibilidade, nosso código também deveria dispor desta hipótese. Hoje se analisa o ciclo de vida do produto do “berço ao berço”. O código apenas prevê do berço ao acondicionamento do produto. Nem o descarte é cogitado.
Assim, com apenas cinco passagens correspondentes à proteção ambiental, sendo algumas delas de forma indireta, percebemos que o Código do Consumidor, assumidamente de vanguarda, não observa valores indispensáveis à valorização da vida dos consumidores.
Creio que nossos parlamentares deveriam atentar-se para este fato e propor uma reforma mais ampla do código consumerista, incentivando o consumidor a tornar-se mais consciente.
*******************************
FONTE : *Jean Marc Sasson é advogado com especialização em gestão ambiental pela COPPE/UFRJ e colunista do Portal Ambiente Energia. Ele também é editor do blog Verdejando (www.verdejeando.blogspot.com)
Esse código, à época de sua elaboração, estava tão à frente de seu tempo que países como Itália e outros países latinos recentemente buscaram inspiração para comporem os seus. Perceberam que o Código brasileiro serviria de base para aprofundarem esta temática em seus territórios.
Em projeto de lei elaborado neste ano, buscou-se atualizar o CDC, justificadamente, em relação à regulação do comércio eletrônico que nos últimos anos cresce vertiginosamente. No entanto, nesta atualização, a proteção ambiental sequer foi cogitada.
A meu ver, a proteção ambiental hoje é infimamente prevista no código, o que deveria ser objeto de grande preocupação dos ambientalistas, principalmente na era do chamado consumo consciente.
Apesar dos direitos consumerista e ambiental possuírem a mesma natureza jurídica de direito difuso e coletivo, verifica-se que o CDC trata os aspectos ambientais escassamente, senão vejamos algumas previsões:
Primeiro, em seu art. 4º, III, quando determina que a Política Nacional de Relações de Consumo seja harmonizada com os interesses dos participantes da relação de consumo segundo os princípios da ordem econômica (art. 170, CF).
Verifica-se que um dos princípios previstos neste artigo é a proteção do Meio Ambiente no inciso VI, obrigando os produtos e serviços preverem seus impactos ambientais.
Segundo, no art.6º, I quando diz que são direitos básicos do consumidor a proteção à vida, à saúde e à segurança contra os riscos oriundos de produtos e serviços. Direito à vida e à saúde são inerentes à preservação do Meio Ambiente. Caso produtos e serviços não vislumbrem a preservação ambiental, a saúde humana restará em perigo.
Terceiro, de forma indireta, no art. 6º, II na previsão ao direito à educação para o consumo. É óbvio que não está expresso o direito à educação ambiental, o que se pode cogitar de forma implícita. A meu ver, gira nesta questão a maior necessidade de reforma do código. Apesar de termos a política nacional de educação ambiental, necessitamos de uma integração maior entre a política nacional e a lei consumerista. Necessita de uma vinculação expressa como forma de ganhar musculatura o incentivo à educação ambiental.
Quarto, já de forma expressa, prevê no art. 37, §2º que a publicidade abusiva é aquela que desrespeita, entre outros aspectos, os valores ambientais. Por exemplo, quando uma empresa a fim de divulgar sua marca distribui livremente panfletos pela rua, a meu ver, traduz de forma cristalina esta idéia de abusividade dos valores ambientais.
Quinto, no art. 51, XIV, o CDC estipula que serão nulas de pleno direito as cláusulas contratuais relativas a serviços e produtos que desrespeitem normas ambientais, podendo invocar a invalidade do contrato. Neste sentido, temos como exemplo a contratação de serviço de coleta seletiva que realiza o despejo inadequado dos resíduos. A invalidade deste contrato poderá ser invocada a qualquer tempo, a partir do conhecimento deste fato.
Devo mencionar ainda que no art.12, há previsão de responsabilização do fabricante, do produtor, do construtor, nacional ou estrangeiro, e do importador que independentemente de culpa, respondem pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos. E a responsabilidade pós-consumo?
Apesar da Política Nacional dos Resíduos Sólidos prever atualmente esta possibilidade, nosso código também deveria dispor desta hipótese. Hoje se analisa o ciclo de vida do produto do “berço ao berço”. O código apenas prevê do berço ao acondicionamento do produto. Nem o descarte é cogitado.
Assim, com apenas cinco passagens correspondentes à proteção ambiental, sendo algumas delas de forma indireta, percebemos que o Código do Consumidor, assumidamente de vanguarda, não observa valores indispensáveis à valorização da vida dos consumidores.
Creio que nossos parlamentares deveriam atentar-se para este fato e propor uma reforma mais ampla do código consumerista, incentivando o consumidor a tornar-se mais consciente.
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FONTE : *Jean Marc Sasson é advogado com especialização em gestão ambiental pela COPPE/UFRJ e colunista do Portal Ambiente Energia. Ele também é editor do blog Verdejando (www.verdejeando.blogspot.com)
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