Nações Unidas, 18/9/2013 – Pela primeira vez, em seus 68 anos de história, a Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU) realizará uma reunião de líderes mundiais sobre um dos temas mais controversos de nosso tempo: o desarmamento nuclear. Porém, as expectativas sobre esse encontro são baixas, afirmou Jayantha Dhanapala, ex-subsecretário-geral da ONU para assuntos de desarmamento. A menos que o desarmamento se torne uma prioridade para os Estados que possuem estes arsenais, os discursos e as reuniões por si só não mudarão os graves perigos que representam estas armas de destruição em massa, afirmou à IPS.
“É essencial que se decida tornar ilegal as armas nucleares, do mesmo modo que as biológicas e químicas”, acrescentou Dhanapala, presidente das Conferências de Pugwash sobre Ciência e Assuntos Mundiais, que em conjunto ganharam o prêmio Nobel da Paz de 1995 por seus esforços em prol do desarmamento nuclear. “O tempo para iniciar as negociações sobre uma Convenção de Armas Nucleares não é amanhã, mas agora”, ressaltou. Espera-se que o secretário-geral da ONU, Ban Ki-moon, que afirma que o desarmamento atômico é uma de suas principais prioridades, chame por um “mundo livre de armas nucleares” na reunião programada para o dia 26 deste mês.
Consultado sobre suas expectativas quanto à reunião de alto nível, Alyn Ware, integrante do The World Future Council e consultor da Associação Internacional de Advogados Contra as Armas Nucleares, declarou à IPS que “poderá ser um exercício inútil se os governos, incluindo os não nucleares, não tratarem o tema com seriedade”. Ware acrescentou que os Estados não nucleares devem participar ao máximo nível com fortes declarações, assinalando que a segurança de todos no século 21 exige a abolição das armas atômicas, o que significa que é um “bem mundial de máxima ordem”.
Segundo Ware, também deveriam se comprometer a dedicar maiores recursos e tração política para desenvolver os componentes de um mundo livre de armas nucleares, por meio do Grupo de Trabalho de Composição Aberta, ao qual os Estados atômicos têm a obrigação de aderir. Atualmente, há cinco Estados declaradamente nucleares – Estados Unidos, Grã-Bretanha, Rússia, França e China –, todos membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU.
E também há três não declarados: Índia, Paquistão e Israel. Já a Coreia do Norte estaria avançando no desenvolvimento de armas nucleares, já tendo realizado três testes. As três potências atômicas não declaradas negam-se a assinar o Tratado sobre Não Proliferação das Armas Nucleares (TNP), em contraste com as cinco declaradas, que são partes desse documento.
Dhanapala pontuou que nove países (cinco dentro do NP e quatro de fora) possuem um total de 17.270 ogivas nucleares, 4.400 delas já instaladas em mísseis ou localizadas em bases, prontas para serem lançadas em minutos. Só os Estados Unidos e a Rússia têm 16.200 dessas ogivas, ressaltou. E, apesar dos horrores de Hiroxima e Nagasaki, os riscos de se voltar a usar bombas atômicas – de propósito ou acidentalmente, por Estados ou atores não estatais – são enormes, e “os resultados serão catastróficos para toda a humanidade”, alertou.
Ware sugeriu à IPS que se deveria criar uma zona livre de armas nucleares no nordeste da Ásia. Por sua vez, Washington poderia exercer uma diplomacia mais efetiva para levar os Estados árabes e Israel a participarem de boa fé na proposta Conferência das Nações Unidas sobre um Oriente Médio Livre de Armas Nucleares e Outras Armas de Destruição em Massa, destacou. Os países árabes, prosseguiu, reclamam condições que são inaceitáveis para Israel, por isso todos precisam adotar certa flexibilidade.
Os Estados não nucleares poderiam usar o Grupo de Trabalho de Composição Aberta, desde que seja renovado seu mandato, para iniciar os trabalhos preparatórios sobre as base de um mundo livre de bombas atômicas (baseado na Convenção Modelo sobre Armas Nucleares que o secretário-geral fez circular), independente de os Estados nucleares unirem-se ou não a esse grupo num futuro próximo.
Dhanapala lembrou à IPS que a primeira Sessão Especial da Assembleia Geral Dedicada ao Desarmamento aconteceu em 1978, como resultado direto da cúpula de líderes mundiais do Movimento dos Não Alinhados, realizada naquele ano em Colombo. Era um período de impasse na Guerra Fria e foi adotada uma Declaração Final de longo alcance. Nenhuma reunião multilateral esteve à altura desse destacável consenso sobre conceitos fundamentais conseguido há 35 anos, especialmente sobre a prioridade do desarmamento nuclear, enfatizou.
“Ainda hoje a máquina multilateral de desarmamento estabelecida pela primeira Sessão Especial está gravemente desorganizada”, segundo Dhanapala. O único órgão negociador multilateral, a Conferência sobre Desarmamento, não negociou nem adotou um programa de trabalho desde 1996, prosseguiu. A Comissão de Desarmamento se reúne a cada ano, sem que nos últimos 14 tenha conseguido acordar algum texto. E o Primeiro Comitê da ONU, que trata de temas de desarmamento, ainda está produzindo uma resolução após outra com pouco impacto, indicou.
Embora persista a miragem de um mundo livre de armas atômicas, “o Tratado de Proibição Completa dos Testes Nucleares não entrou em vigor, a prometida conferência sobre Oriente Médio como zona livre de armas nucleares não se realizou e as conversações bilaterais entre Estados Unidos e Rússia sobre desarmamento nem mesmo começaram”, lamentou Dhanapala.
Os países da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) reconheceram a necessidade de uma mudança radical, e seus partidários resistem às demandas do Movimento dos Não Alinhados a propósito de uma quarta sessão especial sobre desarmamento na Assembleia Geral das Nações Unidas. Para Dhanapala, a reunião do dia 26 deverá marcar o início de um processo de desarmamento nuclear. Envolverde/IPS
(IPS)
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