Beit Hanoun, Palestina, 9/12/2010 – “Cultivamos em nosso telhado porque somos agricultores sem terra”, disse Moatassan Hamad, de 21 anos, morador nesta localidade do norte da faixa de Gaza. “Nossa família é grande e por sorte podemos nos alimentar com o que plantamos”, disse. Eles cultivam uma variedade de verduras. “Repolho e berinjela no inverno, e endochriyya (uma planta usada para fazer sopa), alho e cebola no verão. E também outras coisas que podemos vender, como flores”, explicou.
Os Hamad vivem em uma típica casa construída com blocos de cimento, em meio a um acampamento de refugiados palestinos. “Nos acampamentos não há espaço, nem árvores, nem parques públicos”, afirmou Moatassan. As exuberantes vegetações e o colorido de seu jardim contrasta com o cinza que domina sua casa e as vizinhas. Em grandes contêineres de plástico azul crescem tâmara, laranja e palmeiras, salsinha, cactos e pimentas. “Nossos amigos gostam de vir se sentar aqui porque a maioria deles não tem nada parecido”, contou.
O diretor do Centro Palestino para o Desenvolvimento da Juventude, Hussein Shabat, orienta as famílias que trabalham em projetos de hortas no telhado, às vezes com ajuda de doadores estrangeiros. “Beit Hanoun é um lugar importante para estas hortas. Está perto da fronteira com Israel e boa parte da terra agrícola foi destruída reiteradamente pelo exército israelense”, afirmou. Segundo o Comitê Palestino de Alívio Agrícola, até 7.500 hectares de terra agrícola de qualidade foram destruídos pelas máquinas e pelos bombardeios israelenses. “Também há muitos agricultores que não podem ter acesso às suas terras por causa dos israelenses”, disse Hussein.
A imposição israelense de uma “zona de exclusão” ao longo das fronteiras de Gaza engole pelo menos um terço das terras agrícolas da Faixa, tornando letal qualquer área fronteiriça à qual os produtores queiram chegar. Antes, estas terras produziam trigo, cevada e uma variedade de frutas. Era o celeiro da Gaza. “Muitas pessoas abandonaram suas casas e terras perto das áreas de fronteira por medo dos constantes disparos e ataques com explosivos por parte dos israelenses”, contou Hussein. Agora, na paisagem de Beit Hanoun não há água nem árvores.
No telhado achatado e quadrado de cimento de outra casa do lugar, Ahed Shabat, de 42 anos, cuida das plantas e verduras que crescem em cubas e recipientes de cimento, em meio à roupa no varal e recipientes com água. “Cultivamos produtos que possamos usar o ano todo, como alho e cebola”, disse. “Mas todas as plantas da estação, como espinafre, salsinha, rabanete, berinjela, milho. Também plantamos flores e ervas para fazer chá, como menta, merremea e zaatar”, acrescentou.
As últimas duas ervas, que em geral crescem silvestres nas colinas da ocupada Cisjordânia, são ingredientes básicos para a maior parte do chá dos palestinos, e possuem propriedades medicinais. O telhado ajuda a manter sua família de seis membros, e é uma ilha de calma. “Esta horta se destina mais ao consumo de nossa família, e serve para economizarmos dinheiro”, afirmou Ahed. “Minha família desfruta de se sentar aqui entre as plantas, porque a maior parte da vida vegetal de Beit Hanoun foi destruída”, acrescentou.
Projetos de cultivo doméstico de alimentos, como os desenvolvidos em hortas de telhado, bem como a criação de coelhos e frangos nos tetos, ajudam a combater a grave pobreza de 80% da população de Gaza que dependem da assistência alimentar. Os que vivem em lotados acampamentos de refugiados ou superpovoadas localidades, mas têm acesso a um telhado, podem manter longe a desnutrição e, ao mesmo tempo, gerar uma pequena renda.
“Gosto de criar aves”, disse Abu Jehad, de 17 anos, no telhado de sua cooperativa de apartamentos do centro de Gaza, onde cria cerca de 100 frangos e 20 pombas. “Aprendi sobre os frangos olhando como meu amigo trabalhava em sua cooperativa. O único lugar que tinha para cria frango era nosso telhado”, contou. Seu empreendimento agrícola consiste em uma área de 1,5 por 3 metros de pedaços de madeira, metal e rede que abre diariamente para deixar os animais correrem e ciscarem por todo o local. “Comecei com nove frangos que meu amigo me deu, e comprei outros dez com dinheiro que tinha guardado. Minha família me deu um pouco mais para ajudar, e assim comprei outros 30”, explicou.
O negócio não é fácil. “Nesta primavera teve vento frio pela manhã. Eu só tinha material básico para uma jaula simples, que estava muito exposta. Alguns frangos morreram por causa do vento e da exposição ao sol intenso”, disse. Outros ficaram doentes. “Os remédios são muito caros devido ao sítio, e para mim já era um esforço lhes trazer comida. Mas agora comprei os remédios, porque do contrário todos morreriam. Agora tenho 50 casais e diferentes tipos de frango”, acrescentou Abu.
Os ovos e a carne são de melhor qualidade do que dos animais criados em granjas, graças aos alimentos naturais que lhes dou, afirmou. “Não uso alimento com esteróides nem produtos químicos, apenas cascas de verduras, pão seco e sementes e deixo que circulem pelo telhado todos os dias”, assegurou.
Algumas organizações não governamentais em Gaza dão ajuda a projetos como este, mas Abu começou por conta própria. “Gastei muito dinheiro para começar, sem nada ganhar por muito tempo. Quando tive mais frangos comecei a ganhar um pouco de dinheiro. Se minha família não precisava do dinheiro da venda dos ovos, usava para comprar alimento para os frangos”, disse. O que começou como um projeto nascido da fascinação se converteu em meio relativamente lucrativo de ajudar a satisfazer as necessidades familiares.
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FONTE : Eva Bartlett, da IPS (Envolverde/IPS).
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