shutterstockjovens 1024x682 Em Prol da Sustentabilidade
Estão destruindo o futuro do Brasil e as condições de vida e sobrevivência dos nossos descendentes. É preciso pensar nisso na hora de votar. Foto: http://www.shutterstock.com/
No momento em que se agrava a crise ambiental no Brasil e em todo o mundo, viemos a público alertar os eleitores brasileiros para a necessidade de incorporar princípios de sustentabilidade nas políticas públicas do futuro governo.
Na visão dos governantes, a prioridade é sempre concedida ao crescimento econômico visto em termos quantitativos. Após décadas de dominação neoliberal, o desenvolvimentismo hoje predominante no país insiste em considerar o meio ambiente como entrave ao desenvolvimento.
Os protestos que explodiram no Brasil em Junho de 2013 reivindicavam melhoria na qualidade de vida: transporte, saúde, educação, segurança, enfim, serviços públicos de melhor qualidade. Mas não se observou nenhuma mudança de paradigma e o discurso oficial continua enfatizando o modelo consumista de crescimento.
Poluição, degradação ambiental, sobre-exploração de recursos naturais, aquecimento global, desastres naturais por eventos climáticos extremos, afetam muito mais os pobres do que os ricos. Entretanto, na visão oficial, o desenvolvimento é associado exclusivamente ao aumento do consumo material e não à melhoria na qualidade de vida. O caso do automóvel é um bom exemplo de como o aumento do consumo graças à política míope de incentivos fiscais piorou a qualidade de vida nas grandes cidades. Só em São Paulo os engarrafamentos já superam 300 km de lentidão e calcula-se que a poluição atmosférica provocada por veículos e fontes fixas provoquem a morte de 4.000 pessoas a cada ano.
O Brasil tem cerca de 20% da biodiversidade de todo o Planeta. Entre 2003 e 2008, foi o país que mais criou Áreas Protegidas (Unidades de Conservação). No atual Governo, nenhuma foi criada. As Unidades de Conservação (Parques Nacionais e Estaduais) e as Terras Indígenas vêm sendo criticadas, principalmente pelo agronegócio, por serem protegidas e estarem fora do mercado.
Existem cerca de 400 projetos no Congresso Nacional propondo a “desafetação”, isto é, a retirada de áreas importantes dessas terras protegidas. Entre estes, um dos mais danosos é o que pretende tirar do executivo a atribuição de demarcar e homologar terras indígenas. Se for aprovado, seria esse Congresso, com predominância do agronegócio e das mineradoras, quem passaria a dar a palavra final.
O desmatamento, que vinha diminuindo, recrudesceu. Na Mata Atlântica, o desmatamento aumentou 9% de Julho de 2012 a Junho de 2013. A Amazônia, que já perdeu 14,6% de sua cobertura original, teve redução significativa de desmatamento até 2012. Em 2013, porém, observou-se um aumento do desmatamento da ordem de 28%. O Brasil está destruindo seus recursos naturais para exportação de produtos primários, sem agregação de valor. Sabe-se hoje que a floresta em pé tem mais valor do que abatida. Mesmo que estivesse agregando valor, não se justificaria a destruição. Recursos renováveis precisam de tempo para se renovar. E a destruição da floresta não é só destruição de madeira, mas de fauna, ecossistemas e populações que dela vivem.
Segundo o Relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas da ONU (IPCC) de Março de 2014, durante o Século XXI os impactos das mudanças climáticas deverão reduzir o crescimento econômico, tornar mais difícil a redução da pobreza, agravar a insegurança alimentar com o aumento no preço dos alimentos, e criar novas “armadilhas” de pobreza, principalmente em áreas urbanas e regiões castigadas pela fome.
Em sua reunião em Berlim, de 7 a 12 de Abril de 2014, o Grupo de Trabalho III do IPCC, dedicado a propor medidas de mitigação das mudanças climáticas, alertou o mundo que, para evitar aumento de temperatura acima de 2°C, será necessário reduzir imediatamente a dependência de combustíveis fósseis e iniciar uma “mudança massiva” para energias renováveis.
No Brasil, as emissões são principalmente provenientes da mudança do uso da terra, em especial a conversão de florestas para uso da agropecuária. O Relatório do Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas, divulgado em Setembro de 2013, prevê um aumento de 6 graus Celsius na temperatura até 2070, com queda na produção agrícola. A agricultura brasileira pode sofrer prejuízo anual de R$ 7 bilhões. E uma das maiores fontes das emissões se deve ao sistema de transporte motorizado.
A agricultura e o setor de energia do Brasil poderão ser fortemente impactados, sob risco de queda brusca do Produto Interno Bruto (PIB) e constantes crises que envolvem o abastecimento energético e segurança alimentar.
Tendo em vista a contribuição da geração hidrelétrica, é comum ouvir que o Brasil tem uma matriz energética relativamente “limpa”, com baixos níveis de emissões de gases de Efeito Estufa por unidade de energia produzida ou consumida. A insistência em alegar que a energia hidrelétrica seria “limpa” porque emitiria poucos gases de Efeito Estufa, ignora os impactos socioambientais dessas mega obras, destruindo grandes extensões de floresta, afetando o regime dos rios e a reprodução da ictiofauna, deslocando e inviabilizando o modo de vida das populações ribeirinhas e indígenas e provocando aumento populacional súbito das cidades próximas, sem que lhes sejam ampliados os equipamentos urbanos como hospitais, escolas e saneamento básico. E tudo isso se faz sem consulta ou repartição de benefícios com populações indígenas e comunidades locais no desenvolvimento dos projetos. Madeira, Xingu e Tapajós, por exemplo, são rios cujas comunidades ribeirinhas e indígenas são grandemente prejudicadas.
Além de garantir o direito à consulta e à repartição de benefícios, uma política de energia sustentável deveria partir da redefinição das prioridades em matéria de demanda energética, visando a redução desse consumo até o ponto em que a produção da energia consumida no país pudesse se dar em bases ambientalmente sustentáveis. Ou seja, inverter os termos da discussão, partindo do questionamento da demanda e não tratando de resolver o problema da oferta para uma demanda que se impõe à margem de um debate sobre o interesse público.
Além disso, a ênfase na construção de mega usinas hidroelétricas oculta a realidade de que a repotencialização das hidrelétricas existentes e o combate às perdas na distribuição reduziriam a necessidade de implantar novas mega usinas, com alto impacto ambiental e social, e eliminariam a utilização das usinas termoelétricas, altamente poluentes.
As termoelétricas, que ocupam atualmente mais de 70 por cento da sua capacidade instalada, já respondem por entre 20 e 30 por cento da geração de energia no Brasil. Mesmo fazendo isso, não se pode abrir mão de combater a oferta de energia para esse produtivismo econômico. Mas há outros aspectos importantes também a serem considerados em uma política energética ambiental, como a sua descentralização e a eficiência energética.
A situação do saneamento básico também não mostra avanços significativos. O Brasil ocupa hoje o 112o lugar entre 200 países. Mesmo que o abastecimento de água alcance 90 por cento da população brasileira, menos da metade dela conta com tratamento de esgoto.
O destino inadequado de lixo, principalmente em lixões, ainda é a realidade para praticamente um terço dos municípios brasileiros. E continua baixo o percentual de coleta seletiva e reciclagem de resíduos, apesar da nova Lei da Política Nacional de Resíduos Sólidos.
Triplicou em nosso país o consumo de agrotóxicos na última década e hoje o Brasil já responde por cerca de 20 por cento do mercado mundial de agrotóxicos e ocupa o primeiro lugar entre os países importadores. Pesquisa recente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) revela altos índices de contaminação em 90 por cento das amostras de coletas de produtos de consumo diário como arroz, alface, mamão, pepino, uva e pimentão. E, além disso, aumenta o consumo de alimentos transgênicos, quando pesquisas independentes vêm mostrando que eles podem afetar seriamente a saúde humana e animal.
O Brasil é o terceiro país do mundo em matéria de conflitos ambientais e em menos de um quinto dos casos as soluções encontradas favorecem as comunidades, enquanto a ampla maioria dos casos favorece os interesses econômicos das grandes empresas.
Em resumo, estão destruindo o futuro do Brasil e as condições de vida e sobrevivência dos nossos descendentes. Pense nisso na hora de votar.
* Liszt Vieira é Doutor em Sociologia; Marijane Lisboa é Doutora em Sociologia e Roberto Guimarães é Doutor em Ciência Política.
** Publicado originalmente no site Eco21.
(Eco21)