Eis uma discussão que a sociedade brasileira ainda precisa fazer com seriedade: qual é o papel da propaganda nos nossos hábitos e valores?
De acordo com reportagem publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo no dia 30 de maio, uma pesquisa encomendada pela ONG Instituto Alana mostra que quase 80% dos pais considera a propaganda de alimentos prejudicial a seus filhos. O levantamento foi realizado pelo Instituto Datafolha, que entrevistou 596 pessoas em todo o país.
Os resultados mostram também que, na opinião dos pais entrevistados, a propaganda de alimentos, principalmente de fast food e doces, dificulta os esforços para ensinar aos filhos uma alimentação saudável (76%). E que as crianças são levadas a amolar os pais para que comprem os produtos anunciados (78%).
Para a pesquisa, alimentos não saudáveis são aqueles ricos em sódio, gordura ou açúcar. O Instituto Alana concluiu, pelos resultados verificados, que os pais estão pedindo ajuda para enfrentar o que a ONG chamou de “bombardeio” de propaganda de alimentos pobres em nutrientes. Eis uma discussão que a sociedade brasileira ainda precisa fazer com seriedade: qual é o papel da propaganda nos nossos hábitos e valores?
O Brasil vive uma epidemia de obesidade, inclusive infantil. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), quase metade da população brasileira com mais de 20 anos está com excesso de peso. Entre as crianças, a situação não é melhor. Uma em cada três das que têm entre cinco e nove anos de idade apresenta sobrepeso, e 15% delas já são obesas.
O problema atinge qualquer faixa de renda, gênero e raça. E a principal causa apontada é a alimentação rica em calorias e pobre em nutrientes, cujo cardápio contém a maioria dos produtos anunciados em todos os meios de comunicação do país: bolachas, biscoitos, balas, refrigerantes, fast food, etc.
Desde 2006, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) discute a regulamentação da publicidade de alimentos não saudáveis. No ano passado, a Agência publicou uma resolução determinando alertas sobre possíveis riscos à saúde nesse tipo de propaganda. Uma liminar na Justiça em favor da Associação Brasileira de Alimentos (Abia) suspendeu a regra. A Abia considera que regulamentar publicidade de alimentos é coisa do passado. A indústria está trabalhando em alimentos mais saudáveis. E aponta 2020 como o ano em que será possível atingir-se um grau adequado de “saudabilidade” dos alimentos.
Mesmo assim, em agosto de 2009, as 24 maiores empresas de alimentos do país firmaram um compromisso público de limitar a publicidade dirigida às crianças. Segundo o Instituto Alana, até o fim do ano passado, 12 das 24 empresas envolvidas no acordo haviam detalhado o compromisso e, destas, apenas oito especificaram os critérios nutricionais que serviriam de base para determinar um alimento saudável.
Então, como ficam as crianças? E os cidadãos em geral?
É questão central da responsabilidade social das empresas refletir sobre o que está divulgando para a sociedade por meio da sua propaganda. A propaganda cria desejos que, às vezes, leva uma pessoa – principalmente uma criança – a consumir o que não precisa e, no limite, até em detrimento do que precisa.
No caso da propaganda de alimentos, enquanto estes não apresentarem o grau de “saudabilidade” necessário para uma alimentação equilibrada, estarão de fato promovendo uma vida não saudável, com sérias consequências para os consumidores e para a sociedade. A obesidade é o exemplo mais visível e alarmante desse processo.
A propaganda também cria valores na sociedade. Se a empresa divulga sem critério ou aviso determinado produto que sabidamente faz mal à saúde, que tipo de valor vai disseminar? E se, ao contrário, os anúncios fossem instrumento para promover a equidade de gênero ou de raça, por exemplo?
As empresas de alimentos já poderiam ter dado um passo enorme na gestão responsável se tivessem cumprido o compromisso que elas mesmas assumiram de limitar a publicidade de alimentos não saudáveis para crianças. Ao não cumprirem, prestaram um desserviço à sociedade e ao movimento de responsabilidade social, porque desvalorizaram um dos instrumentos mais importantes que o mercado tem – a autorregulamentação – e desqualificaram a participação da sociedade no processo.
A propaganda é fundamental para a nova sociedade que precisamos construir, desde que também se baseie nos critérios de sustentabilidade que vão direcionar os negócios: justiça social, equilíbrio ambiental e crescimento econômico.
* Paulo Itacarambi é vice-presidente executivo do Instituto Ethos.
** Publicado originalmente no site Instituto Ethos.
(Instituto Ethos)
De acordo com reportagem publicada pelo jornal O Estado de S. Paulo no dia 30 de maio, uma pesquisa encomendada pela ONG Instituto Alana mostra que quase 80% dos pais considera a propaganda de alimentos prejudicial a seus filhos. O levantamento foi realizado pelo Instituto Datafolha, que entrevistou 596 pessoas em todo o país.
Os resultados mostram também que, na opinião dos pais entrevistados, a propaganda de alimentos, principalmente de fast food e doces, dificulta os esforços para ensinar aos filhos uma alimentação saudável (76%). E que as crianças são levadas a amolar os pais para que comprem os produtos anunciados (78%).
Para a pesquisa, alimentos não saudáveis são aqueles ricos em sódio, gordura ou açúcar. O Instituto Alana concluiu, pelos resultados verificados, que os pais estão pedindo ajuda para enfrentar o que a ONG chamou de “bombardeio” de propaganda de alimentos pobres em nutrientes. Eis uma discussão que a sociedade brasileira ainda precisa fazer com seriedade: qual é o papel da propaganda nos nossos hábitos e valores?
O Brasil vive uma epidemia de obesidade, inclusive infantil. De acordo com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), quase metade da população brasileira com mais de 20 anos está com excesso de peso. Entre as crianças, a situação não é melhor. Uma em cada três das que têm entre cinco e nove anos de idade apresenta sobrepeso, e 15% delas já são obesas.
O problema atinge qualquer faixa de renda, gênero e raça. E a principal causa apontada é a alimentação rica em calorias e pobre em nutrientes, cujo cardápio contém a maioria dos produtos anunciados em todos os meios de comunicação do país: bolachas, biscoitos, balas, refrigerantes, fast food, etc.
Desde 2006, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) discute a regulamentação da publicidade de alimentos não saudáveis. No ano passado, a Agência publicou uma resolução determinando alertas sobre possíveis riscos à saúde nesse tipo de propaganda. Uma liminar na Justiça em favor da Associação Brasileira de Alimentos (Abia) suspendeu a regra. A Abia considera que regulamentar publicidade de alimentos é coisa do passado. A indústria está trabalhando em alimentos mais saudáveis. E aponta 2020 como o ano em que será possível atingir-se um grau adequado de “saudabilidade” dos alimentos.
Mesmo assim, em agosto de 2009, as 24 maiores empresas de alimentos do país firmaram um compromisso público de limitar a publicidade dirigida às crianças. Segundo o Instituto Alana, até o fim do ano passado, 12 das 24 empresas envolvidas no acordo haviam detalhado o compromisso e, destas, apenas oito especificaram os critérios nutricionais que serviriam de base para determinar um alimento saudável.
Então, como ficam as crianças? E os cidadãos em geral?
É questão central da responsabilidade social das empresas refletir sobre o que está divulgando para a sociedade por meio da sua propaganda. A propaganda cria desejos que, às vezes, leva uma pessoa – principalmente uma criança – a consumir o que não precisa e, no limite, até em detrimento do que precisa.
No caso da propaganda de alimentos, enquanto estes não apresentarem o grau de “saudabilidade” necessário para uma alimentação equilibrada, estarão de fato promovendo uma vida não saudável, com sérias consequências para os consumidores e para a sociedade. A obesidade é o exemplo mais visível e alarmante desse processo.
A propaganda também cria valores na sociedade. Se a empresa divulga sem critério ou aviso determinado produto que sabidamente faz mal à saúde, que tipo de valor vai disseminar? E se, ao contrário, os anúncios fossem instrumento para promover a equidade de gênero ou de raça, por exemplo?
As empresas de alimentos já poderiam ter dado um passo enorme na gestão responsável se tivessem cumprido o compromisso que elas mesmas assumiram de limitar a publicidade de alimentos não saudáveis para crianças. Ao não cumprirem, prestaram um desserviço à sociedade e ao movimento de responsabilidade social, porque desvalorizaram um dos instrumentos mais importantes que o mercado tem – a autorregulamentação – e desqualificaram a participação da sociedade no processo.
A propaganda é fundamental para a nova sociedade que precisamos construir, desde que também se baseie nos critérios de sustentabilidade que vão direcionar os negócios: justiça social, equilíbrio ambiental e crescimento econômico.
* Paulo Itacarambi é vice-presidente executivo do Instituto Ethos.
** Publicado originalmente no site Instituto Ethos.
(Instituto Ethos)
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