Conhecimentos climáticos tradicionais em três dimensões
por Peter Richards, da IPS
“Nossas comunidades, especialmente as que estão na costa, estão presenciando e se adaptando aos efeitos da mudança climática”, destacou Barriteau. E o fazem, por exemplo, por intermédio do P3DM, siglas em inglês de modelo participativo tridimensional, que funde sistemas convencionais de informação espacial com os “mapas mentais” das pessoas. Seu objetivo é produzir modelos de alívio em escala que possam ser usados junto com os aparelhos de Sistema de Posicionamento Global (GPS) e Sistemas de Informação Geográfica (GIS).
Os modelos participativos em três dimensões são manufaturados no âmbito das aldeias, utilizando papel e papelão em camadas. Com base em seus conhecimentos pessoais da área, os informantes mostram o uso da terra e outras características no modelo, mediante o uso de lápis, marcadores, fios e/ou pintura. Uma vez completado o modelo, é aplicado sobre ele um quadriculado em escala para transpor os dados espaciais e as referencias geográficas no GIS. Por exemplo, os modelos podem unir as comunidades em torno de áreas prioritárias como zonas inundadas, preocupações por secas, populações de peixes e proteção de mangues.
Os mapas também são uma ferramenta educativa para jovens e crianças. Abdon White, professor de geografia na escola secundária da Ilha União, a mais meridional das Granadinas, contou à IPS que “uma das primeiras tarefas que tivemos foi traçar as linhas do contorno e isso nos permitiu, de fato, criar o modelo P3DM da Ilha União”. No programa do Conselho de Exames do Caribe, há uma seção dedicada à leitura de mapas, e se trabalha com contornos e distâncias, o que contribui para uma melhor compreensão por parte dos alunos, acrescentou.
Em termos gerais, Barriteau disse que o P3DM leva “uma sensação de consciência da mudança climática a estas comunidades, com a esperança de que se empoderem para tomar decisões sobre o clima”, que depois sirvam para tomar decisões políticas informadas. A SusGren, em colaboração com o holandês Centro Técnico para a Cooperação Agrícola e Rural e com a The Nature Conservancy, reuniu membros de comunidades locais e organizações regionais e internacionais na Ilha União, para realizar um exercício de mapeamento participativo tridimensional, que começou em 28 de fevereiro e terminará amanhã.
Não é segredo algum que os pequenos Estados insulares em desenvolvimento, com São Vicente e Granadinas, Granada e outras ilhas do Caribe, são especialmente suscetíveis aos impactos da mudança climática e a eventos climáticos extremos, como furacões e inundações. “A estimativa é que os impactos da mudança climática no Caribe incluam aumento do nível do mar, aquecimento do oceano e mudanças nos padrões de chuvas”, afirmaram os organizações em um documento que circulou durante o painel. “Espera-se que estes tenham um impacto econômico e social significativo”, afirmaram.
“As ameaças da mudança climática e os eventos climáticos extremos são exacerbados pelos atuais problemas causados pelo desenvolvimento humano, incluídos um inadequado uso da terra e o desenvolvimento físico mal planejado, inadequadas práticas agrícolas em ladeiras de montes, fontes de contaminação pontual ou difusa, incluída a inadequada eliminação de dejetos sólidos”, acrescentaram. A The Nature Conservancy realiza um projeto centrado em ajudar os pequenos Estados insulares a potencializarem sua resiliência à mudança climática, recuperando e manejando de modo efetivo seus ecossistemas marinhos e costeiros, além de fortalecer a capacidade de adaptação local.
A nova tecnologia de mapeamento ajudará este projeto, criando capacidade local, nacional e regional para apoiar a adaptação baseada na ecologia, no empoderamento das comunidades dos locais-piloto em Granada e na Ilha União, e desenvolvendo a capacidade de organizações não governamentais e comunitárias em matéria de comunicações. Ao final do painel, espera-se que os participantes estejam em condições de discutir sobre o valor do conhecimento espacial e tradicional local, além de descrever como se pode usar o P3DM para documentar, fazer referência geográfica e visualizar esse conhecimento.
O modelo, de 1,2 x 2,4 metros, pertencerá à comunidade. “Toda pessoa que quiser usá-lo primeiro deverá pedir permissão à comunidade. A Sustainable Grenadines, que lidera a iniciativa na Ilha União, estará trabalhando com a comunidade local para desenvolver soluções baseadas no ecossistema, a fim de abordar os efeitos da mudança climática”, informou Barriteau. Ele acrescentou que, da iniciativa do P3DM, surgirá uma série de estratégias concretas de adaptação à mudança climática, e que espera que isto não seja visto apenas como outra “artimanha” abertamente técnica, carregada de jargões, que confunda em lugar de esclarecer.
“Esperamos que o P3DM coloque as comunidades na primeira linha dos assuntos da mudança climática”, enfatizou Barriteau, destacando que “um estudo da Caribsave Climate Change estima que até 2050 o aumento do nível do mar custará US$ 489 milhões a Granada. A mudança climática não será apenas custosa, mas também poderá paralisar as pequenas economias insulares”.
Tyrone Hall, consultor de comunicações no Centro de Mudança Climática da Comunidade do Caribe (Caricom), com sede em Belize, disse à IPS que o mapeamento tridimensional é feito em pequena escala em países do ACP (África, Caribe e Pacífico). Assim, “compartilhar nossas experiências por meio de novos meios como as redes sociais nos permite tornar público de um modo acessível nossa experiência e as lições aprendidas”, ressaltou.
Granada será o próximo país do Caribe a realizar o exercício P3DM, em abril. Segundo os organizadores, o problema principal que o projeto enfrentará é que as políticas para abordar os impactos da mudança climática foram criadas, majoritariamente, sem a participação efetiva das comunidades locais. “O efeito é que as respostas políticas no Caribe se produziram amplamente no plano das políticas gerais, com poucas políticas específicas”, afirmaram. “Não foram levadas em conta as considerações setoriais ou o conhecimento tradicional, os diferentes atores não participaram efetivamente, e no terreno pouco se agiu para criar resiliência”, ressaltaram. Envolverde/IPS
Nenhum comentário:
Postar um comentário