Sundarbans, Índia, 9/1/2015 – A propriedade de meio hectare que Sukomal Mandal tem na maior floresta de mangue do mundo é um oásis de prosperidade, apesar de o mar estar tragando lentamente a terra. Mandal, de 50 anos, e sua família vivem na localidade indiana de Biswanathpur, em Sundarbans, a floresta de mangue de dez mil quilômetros quadrados que Índia e Bangladesh compartilham no delta da baía de Bengala.
Neste ponto álgido de biodiversidade, declarado Patrimônio da Humanidade pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), não restam dúvidas sobre o impacto da elevação do nível do mar em razão do aquecimento global. Os estudos mostram que a região perdeu anualmente cerca de 5,5 quilômetros quadrados entre 2001 e 2009, em comparação com os quatro quilômetros quadrados perdidos por ano nas quatro décadas anteriores.
A população local, de aproximadamente quatro milhões de pessoas, sofre inúmeras crises, entre elas a falta de água potável, uma das necessidades mais urgentes das comunidades de subsistência que vivem e trabalham há gerações na rede de ilhas que compõem Sundarbans.
A invasão do mar, bem como ciclones, tempestades, terras de cultivo prejudicadas pela erosão e perdas nas costas das ilhas, inundações fluviais devido às chuvas concentradas, água salobra que escorre pela terra e o aumento da salinidade do solo aprofundaram a pobreza desses povos, onde três em cada dez pessoas vivem abaixo da linha da pobreza.
Os habitantes, como Mandal e sua mulher Alpana, tiveram que inovar para se manterem vivos. E para isso adotaram métodos novos, como a agricultura integrada, para enfrentar a mudança climática.
Um estudo realizado em novembro de 2014 pela União Internacional para a Conservação da Natureza alerta que a escassez de água doce está chegando ao ponto crítico na parte indiana de Sundarbans, que ocupa uma grande parte do Estado de Bengala Ocidental. Segundo Sugata Hazra, oceanógrafo e especialista em mudança climática da Universidade de Jadavpur, em Kolkata, a região precisa com urgência de uma injeção de 507 metros cúbicos de água doce por dia para manter seus ecossistemas e meios de vida.
O aumento da salinidade prejudicou as terras de cultivo em 52 das cerca de 102 ilhas habitadas no lado indiano da floresta. Um observatório na ilha de Sagar, a maior delas, que sofre a pior parte das consequências climáticas, registrou elevação média do nível do mar de 17,8 milímetros por ano entre 2001 e 2009, bem mais do que os 3,14 milímetros anuais na década anterior. Não é fácil chegar ao fim do mês nessas condições.
Vários grupos de agricultores do bloco administrativo Patharpratima, no distrito Sul 24-Parganas, disseram à IPS que cada família tem pelo menos um integrante que emigrou, cujo dinheiro que enviam é cada vez mais necessário. Outros, como Sukomal e sua mulher, recorrem a métodos de agricultura integrada.
“O sistema de agricultura integrada praticamente reproduz a natureza”, explicou Debabrata Guchhait, um capacitador da Sociedade de Bem-Estar Srijan Indraprastha (ISWS), que trabalha pela segurança alimentar da comunidade. A técnica “integra a fazenda e a casa”, por isso os resíduos de um âmbito da vida se transformam em insumo para o outro. Os cultivos básicos se mesclam com outras variedades de plantas e hortaliças, enquanto o gado, patos e galinhas fazem parte do ciclo autossustentável.
O processo “reduz os custos e riscos da exploração agrícola ao recorrer ao orgânico e à diversificação das fontes de rendimento e renda, ao mesmo tempo em que garante a nutrição”, ressaltou Guchhait à IPS. As galinhas se alimentam de folhas verdes, grãos quebrados e milho. Seus resíduos são usados como adubo orgânico junto com esterco das três vacas e duas cabras de Mandal. O resto dos dejetos das aves é drenado para um tanque onde alimenta os peixes.
A escavação do pequeno tanque para coletar água durante a monção anual, que normalmente proporciona cerca de 1.700 milímetros de chuva, foi de grande ajuda para a família. Na superfície de uma “bigha”, uma unidade de medida equivalente a 0,133 hectare, Mandal colhe 480 quilos de arroz com casca, 70 quilos a mais do que antes, e suficientes para cobrir o consumo mensal de sua família.
Agora que tem água fresca suficiente, Mandal consegue duas colheitas de arroz anualmente, com um total de 900 quilos em um ano sem desastres naturais. Depois de atender as necessidades alimentares da família, ganha cerca de US$ 400 com a venda do que sobra. Com as hortaliças que cultiva na mesma superfície ganha o dobro, já que planta um cultivo misto de mais de 25 variedades ao longo do ano. Com o uso de cada centímetro de espaço livre, a família aumentou sua capacidade de recuperação diante da mudança climática e dos padrões climáticos.
E o transbordamento da lagoa também tem seus benefícios. “Nossa família de quatro pessoas consome três quilos de pescado por semana e vende alguns”, disse Alpana à IPS. “De nossos 890 membros em 17 aldeias, apenas 15 adotaram a agricultura integrada”, afirmou Palash Sinha, que dirige a ISWS no bloco Patharpratima. “Uma das principais razões é o alto custo de 12 mil rúpias”, cerca de US$ 200, que “custam as áreas agrícolas integradas”, acrescentou.
Apesar da assistência técnica e do apoio monetário que recebem de organizações da comunidade, muitos agricultores resistem a fazer empréstimo de cinco mil rúpias para esse fim. “Para que as parcelas funcionem com eficácia é necessário ao menos 0,072 hectares”, ou 720 metros quadrados, pontuou Sinha. “Muitos agricultores nem mesmo possuem essa quantidade de terra”, destacou.
Outros associam o método integrado com um trabalho mais árduo. “Em um bom ano, a renda das fazendas integradas podem ser 200% maiores do que a das convencionais, mas o fator trabalho é 700% superior”, apontou Samiran Jana, um agricultor integrado no povoado de Indrapastha.
A ajuda estatal aos agricultores marginais que esperam transformar suas pequenas áreas é extremamente baixa, afirmam os especialistas. Por exemplo, o Plano de Ação de Bengala Ocidental para a Mudança Climática, que inclui a promessa de reforçar a assistência, ainda não foi implantado.
Os especialistas recomendam que neste país, onde 56% da população ativa se dedica à agricultura e onde 80% são pequenos produtores ou camponeses sem terras, sejam feitos esforços concertados em nível federal para proteger os milhões de pessoas cujos meios de vida estão ligados aos padrões mutantes do clima. Envolverde/IPS
(IPS)
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