"... o Município de Florianópolis aterrorizou a população moradora da Lagoa da Conceição sem nenhuma necessidade, tentando atribuir ao Poder Judiciário a responsabilidade pelo descumprimento de uma decisão judicial transitada em julgado."- Juiz Marcelo Krás Borges
Ontem, dia 29 de julho de 2014, o MM. Juiz da 6ª Vara Federal de Florianópolis, Marcelo Krás Borges, REJEITOU o apelo da prefeitura
e condenou o Município a uma multa de R$ 1 milhão por litigância de má-fé.
Eis os melhores trechos desta citada decisão judicial:
"não vislumbro falta de liquidez do título judicial. O dispositivo da sentença foi bastante claro ao 'determinar o total cumprimento, por seus órgãos e agentes, da legislação federal e estadual sobre a faixa de proteção ao redor do elemento hídrico, bem como providenciar o levantamento de todas as ocupações em faixa de marinha, no entorno da Lagoa da Conceição, identificando os responsáveis, indicando quais obtiveram alvarás e qual a data dos mesmos e adotando as providências cabíveis na faixa definida pelo Código de Águas e pela Lei do Plano Diretor dos Balneários (15 metros)'.
Ora, a mera leitura do dispositivo acima citado é suficiente, não havendo necessidade de provar outros fatos. Com efeito, o Município deveria ter providenciado a relação dos proprietários em tal faixa ciliar da Lagoa da Conceição em 2003, quando foi deferido o pedido liminar.
Assim, o Município teve mais de dez anos para providenciar a relação dos proprietários em situação de irregularidade e informar que medidas seriam tomadas para a proteção do elemento hídrico e para garantir o acesso público no seu entorno.
(...)
Por conseguinte, o Município de Florianópolis há mais de dez anos está a desobedecer ao Poder Judiciário, deixando de informar quais os munícipes que estão em situação irregular e deixando de tomar quaisquer medidas para evitar as ocupações irregulares que poluem a Lagoa da Conceição e impedem o uso da área de seu entorno (praia) pela população em geral.
Neste sentido, o Município de Florianópolis não pode alegar a teoria do fato consumado, eis que, se inúmeras construções irregulares foram realizadas pelos particulares, tal fato se deu porque o Município se recusou a obedecer à determinação contida na decisão liminar, ou seja, se recusou a fiscalizar e autuar os proprietários das casas irregulares existentes na faixa ciliar da Lagoa.
Desta forma, entendo que existe evidente má-fé processual na alegação do fato consumado, pois foi o próprio Município que contribuiu decisivamente para a ocorrência de construções irregulares à beira da Lagoa, ao deixar de fiscalizar e proteger o elemento hídrico.
Com efeito, o Superior Tribunal de Justiça já pacificou o entendimento de que não existe direito adquirido a degradar o meio ambiente, não podendo ser alegado a Teoria do Fato Consumado, como ensina a ilustre Ministra Eliana Calmon:
AMBIENTAL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. OCUPAÇÃO E EDIFICAÇÃO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE-APP. CASAS DE VERANEIO. MARGENS DO RIO IVINHEMA/MS. SUPRESSÃO DE MATA CILIAR. DESCABIMENTO. ART. 8º DA LEI 12.651/2012. NÃO ENQUADRAMENTO. DIREITO ADQUIRIDO AO POLUIDOR. FATO CONSUMADO. DESCABIMENTO. DESAPROPRIAÇÃO NÃO CONFIGURADA. LIMITAÇÃO ADMINISTRATIVA. DANO AMBIENTAL E NEXO DE CAUSALIDADE CONFIGURADOS. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. 1. Descabida a supressão de vegetação em Área de Preservação Permanente - APP que não se enquadra nas hipóteses previstas no art. 8º do Código Florestal (utilidade pública, interesse social e baixo impacto ambiental). 2. Conquanto não se possa conferir ao direito fundamental do meio ambiente equilibrado a característica de direito absoluto, certo é que ele se insere entre os direitos indisponíveis, devendo-se acentuar a imprescritibilidade de sua reparação, e a sua inalienabilidade, já que se trata de bem de uso comum do povo (art. 225, caput, da CF/1988). 3. Em tema de direito ambiental, não se cogita em direito adquirido à devastação, nem se admite a incidência da teoria do fato consumado. Precedentes do STJ e STF. 4. A proteção legal às áreas de preservação permanente não importa em vedação absoluta ao direito de propriedade e, por consequência, não resulta em hipótese de desapropriação, mas configura mera limitação administrativa. Precedente do STJ. 5. Violado o art. 14, § 1º, da Lei 6.938/1981, pois o Tribunal de origem reconheceu a ocorrência do dano ambiental e o nexo causal (ligação entre a sua ocorrência e a fonte poluidora), mas afastou o dever de promover a recuperação da área afetada e indenizar eventuais danos remanescentes. 6. Em que pese ao loteamento em questão haver sido concedido licenciamento ambiental, tal fato, por si só, não elide a responsabilidade pela reparação do dano causado ao meio ambiente, uma vez afastada a legalidade da autorização administrativa. 7. É inadmissível o recurso especial quanto a questão não decidida pelo Tribunal de origem, por falta de prequestionamento (Súmula 211/STJ). 8. Recurso especial parcialmente conhecido e provido. ..EMEN:(RESP 201302271641, ELIANA CALMON, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:18/10/2013 ..DTPB:.)
No entanto, as edificações mais antigas e os prédios públicos não poderão ser demolidos, eis que a legislação ambiental não poderá retroagir para atingir situações pretéritas. Fica garantido, assim, o Princípio da Segurança Jurídica, que consiste na impossibilidade de retroação de qualquer lei para atingir situações pretéritas. Os prédios públicos, tais como escolas e postos de saúde, estão expressamente autorizados pelo Código Florestal, podendo ocupar áreas de preservação permanente.
Assim sendo, o Município de Florianópolis aterrorizou a população moradora da Lagoa da Conceição sem nenhuma necessidade, tentando atribuir ao Poder Judiciário a responsabilidade pelo descumprimento de uma decisão judicial transitada em julgado.
Desta forma, a má-fé do Município de Florianópolis fica bem evidente, eis que, além de se recusar a obedecer a uma ordem judicial, tentou atribuir ao Poder Judiciário uma falta cometida por ele próprio, ou seja, a ausência de fiscalização da Lagoa da Conceição.
Isto posto, rejeito a exceção de pré-executividade e condeno o Município de Florianópolis por litigância de má-fé, com fundamento no artigo 14, incisos I, II e III, IV, VI, VI e VII, eis que:
I) deduziu pretensão ou defesa contra texto expresso de lei, ou seja, contra o Código Florestal e o Código de Processo Civil;
II) tentou alterar a verdade dos fatos, atribuindo ao Poder Judiciário a responsabilidade pela ausência de fiscalização da Lagoa da Conceição;
III) usou do processo para conseguir um objetivo ilegal, ou seja, usou da exceção de pré-executividade para tentar desobedecer a uma ordem judicial transitada em julgado;
IV) opôs resistência injustificada ao andamento do processo, ao criar um incidente totalmente infundado, aterrorizando a população da Lagoa da Conceição, ao invés de tentar cumprir a decisão judicial;
V) procedeu de modo temerário, criando uma comoção social através de prestação de informações falsas à imprensa local, que teria noticiado que todos os imóveis da Lagoa da Conceição seriam demolidos, o que não é verdade; VI) provocou um incidente manifestamente infundado, eis que não existe previsão legal para a oposição de exceção de pré-executividade para sentenças transitadas em julgado; e
VII) interpôs um recurso ou expediente processual com intuito nitidamente protelatório, ou seja, apenas com o propósito de manipular a opinião pública e atrasar o cumprimento da ordem judicial transitada em julgado.
Em face da intensa gravidade dos fatos acima descritos, condeno o Município de Florianópolis a pagar multa fixada no valor de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais).
Mantenho a audiência de conciliação para o dia 13 de agosto de 2014, às 16 horas, quando deverá comparecer o Prefeito Municipal para apresentar um cronograma de atividades que possibilitem o cumprimento do título transitado em julgado.
Intimem-se, inclusive pessoalmente o Prefeito Municipal."
Ora, a mera leitura do dispositivo acima citado é suficiente, não havendo necessidade de provar outros fatos. Com efeito, o Município deveria ter providenciado a relação dos proprietários em tal faixa ciliar da Lagoa da Conceição em 2003, quando foi deferido o pedido liminar.
Assim, o Município teve mais de dez anos para providenciar a relação dos proprietários em situação de irregularidade e informar que medidas seriam tomadas para a proteção do elemento hídrico e para garantir o acesso público no seu entorno.
(...)
Por conseguinte, o Município de Florianópolis há mais de dez anos está a desobedecer ao Poder Judiciário, deixando de informar quais os munícipes que estão em situação irregular e deixando de tomar quaisquer medidas para evitar as ocupações irregulares que poluem a Lagoa da Conceição e impedem o uso da área de seu entorno (praia) pela população em geral.
Neste sentido, o Município de Florianópolis não pode alegar a teoria do fato consumado, eis que, se inúmeras construções irregulares foram realizadas pelos particulares, tal fato se deu porque o Município se recusou a obedecer à determinação contida na decisão liminar, ou seja, se recusou a fiscalizar e autuar os proprietários das casas irregulares existentes na faixa ciliar da Lagoa.
Desta forma, entendo que existe evidente má-fé processual na alegação do fato consumado, pois foi o próprio Município que contribuiu decisivamente para a ocorrência de construções irregulares à beira da Lagoa, ao deixar de fiscalizar e proteger o elemento hídrico.
Com efeito, o Superior Tribunal de Justiça já pacificou o entendimento de que não existe direito adquirido a degradar o meio ambiente, não podendo ser alegado a Teoria do Fato Consumado, como ensina a ilustre Ministra Eliana Calmon:
AMBIENTAL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. OCUPAÇÃO E EDIFICAÇÃO EM ÁREA DE PRESERVAÇÃO PERMANENTE-APP. CASAS DE VERANEIO. MARGENS DO RIO IVINHEMA/MS. SUPRESSÃO DE MATA CILIAR. DESCABIMENTO. ART. 8º DA LEI 12.651/2012. NÃO ENQUADRAMENTO. DIREITO ADQUIRIDO AO POLUIDOR. FATO CONSUMADO. DESCABIMENTO. DESAPROPRIAÇÃO NÃO CONFIGURADA. LIMITAÇÃO ADMINISTRATIVA. DANO AMBIENTAL E NEXO DE CAUSALIDADE CONFIGURADOS. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. SÚMULA 211/STJ. 1. Descabida a supressão de vegetação em Área de Preservação Permanente - APP que não se enquadra nas hipóteses previstas no art. 8º do Código Florestal (utilidade pública, interesse social e baixo impacto ambiental). 2. Conquanto não se possa conferir ao direito fundamental do meio ambiente equilibrado a característica de direito absoluto, certo é que ele se insere entre os direitos indisponíveis, devendo-se acentuar a imprescritibilidade de sua reparação, e a sua inalienabilidade, já que se trata de bem de uso comum do povo (art. 225, caput, da CF/1988). 3. Em tema de direito ambiental, não se cogita em direito adquirido à devastação, nem se admite a incidência da teoria do fato consumado. Precedentes do STJ e STF. 4. A proteção legal às áreas de preservação permanente não importa em vedação absoluta ao direito de propriedade e, por consequência, não resulta em hipótese de desapropriação, mas configura mera limitação administrativa. Precedente do STJ. 5. Violado o art. 14, § 1º, da Lei 6.938/1981, pois o Tribunal de origem reconheceu a ocorrência do dano ambiental e o nexo causal (ligação entre a sua ocorrência e a fonte poluidora), mas afastou o dever de promover a recuperação da área afetada e indenizar eventuais danos remanescentes. 6. Em que pese ao loteamento em questão haver sido concedido licenciamento ambiental, tal fato, por si só, não elide a responsabilidade pela reparação do dano causado ao meio ambiente, uma vez afastada a legalidade da autorização administrativa. 7. É inadmissível o recurso especial quanto a questão não decidida pelo Tribunal de origem, por falta de prequestionamento (Súmula 211/STJ). 8. Recurso especial parcialmente conhecido e provido. ..EMEN:(RESP 201302271641, ELIANA CALMON, STJ - SEGUNDA TURMA, DJE DATA:18/10/2013 ..DTPB:.)
No entanto, as edificações mais antigas e os prédios públicos não poderão ser demolidos, eis que a legislação ambiental não poderá retroagir para atingir situações pretéritas. Fica garantido, assim, o Princípio da Segurança Jurídica, que consiste na impossibilidade de retroação de qualquer lei para atingir situações pretéritas. Os prédios públicos, tais como escolas e postos de saúde, estão expressamente autorizados pelo Código Florestal, podendo ocupar áreas de preservação permanente.
Assim sendo, o Município de Florianópolis aterrorizou a população moradora da Lagoa da Conceição sem nenhuma necessidade, tentando atribuir ao Poder Judiciário a responsabilidade pelo descumprimento de uma decisão judicial transitada em julgado.
Desta forma, a má-fé do Município de Florianópolis fica bem evidente, eis que, além de se recusar a obedecer a uma ordem judicial, tentou atribuir ao Poder Judiciário uma falta cometida por ele próprio, ou seja, a ausência de fiscalização da Lagoa da Conceição.
Isto posto, rejeito a exceção de pré-executividade e condeno o Município de Florianópolis por litigância de má-fé, com fundamento no artigo 14, incisos I, II e III, IV, VI, VI e VII, eis que:
I) deduziu pretensão ou defesa contra texto expresso de lei, ou seja, contra o Código Florestal e o Código de Processo Civil;
II) tentou alterar a verdade dos fatos, atribuindo ao Poder Judiciário a responsabilidade pela ausência de fiscalização da Lagoa da Conceição;
III) usou do processo para conseguir um objetivo ilegal, ou seja, usou da exceção de pré-executividade para tentar desobedecer a uma ordem judicial transitada em julgado;
IV) opôs resistência injustificada ao andamento do processo, ao criar um incidente totalmente infundado, aterrorizando a população da Lagoa da Conceição, ao invés de tentar cumprir a decisão judicial;
V) procedeu de modo temerário, criando uma comoção social através de prestação de informações falsas à imprensa local, que teria noticiado que todos os imóveis da Lagoa da Conceição seriam demolidos, o que não é verdade; VI) provocou um incidente manifestamente infundado, eis que não existe previsão legal para a oposição de exceção de pré-executividade para sentenças transitadas em julgado; e
VII) interpôs um recurso ou expediente processual com intuito nitidamente protelatório, ou seja, apenas com o propósito de manipular a opinião pública e atrasar o cumprimento da ordem judicial transitada em julgado.
Em face da intensa gravidade dos fatos acima descritos, condeno o Município de Florianópolis a pagar multa fixada no valor de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais).
Mantenho a audiência de conciliação para o dia 13 de agosto de 2014, às 16 horas, quando deverá comparecer o Prefeito Municipal para apresentar um cronograma de atividades que possibilitem o cumprimento do título transitado em julgado.
Intimem-se, inclusive pessoalmente o Prefeito Municipal."
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