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sábado, 3 de abril de 2010

A morte consentida da Prainha do Farol - Ana Echevenguá, Florianópolis

Participei da reunião, promovida pela comunidade de Prainha do Farol, para discutir a falta de tratamento de esgoto local. João Batista Andrade, da ong Rasgamar, mostrou as imagens do problema que eles enfrentam.

Em Laguna, a Prainha do Farol – que faz parte da APA da Baleia Franca2 - possui 2.500 moradores nativos. E uma faixa de areia de 200 metros que recebe o despejo de 3 córregos fluviais, utilizados simetricamente para escoamento de esgoto. Um no canto das pedras; outro, no canto da igreja; e o terceiro, na guarita do salva-vidas.

Histórico do problema

A falta de saneamento básico no local é história antiga. Alguns moradores possuem fossa; mas o solo – de argila e pedra – dificulta a infiltração.

Em 1997, o problema foi levado ao conhecimento do Ministério Público Federal e à mídia, chamando a atenção de algumas empresas de saneamento.

Em 2006, a Prefeitura instalou 2 estações de tratamento de esgoto à base de bambu. Não deu certo: veio um temporal e levou tudo.

Por isso, o uso dos 3 córregos para escoar o esgoto; “é mais fácil porque evita que estoure no banheiro dos caras”, argumenta Batista.

Mas, este ano foi um caos. Quem presenciou a última temporada na Prainha percebeu que a questão é grave. Segundo Carolina Gomez da Silva, no auge da temporada, toda a faixa de areia ficou preta; o esgoto empoçou; a areia está contaminada.

Em fevereiro de 2010, uma comissão de moradores foi à Procuradoria da República alertar para a omissão. O procurador Celso Três sugeriu uma reunião para apresentar a situação atual do esgotamento sanitário. E buscar soluções (projetos da CASAN3, propostas alternativas inclusive da UNESC4, entidade bem atuante na região, ...).

O problema não é só de saúde pública. É financeiro também. Batista falou da necessidade de uma solução urgente, “até pra melhorar a imagem de Laguna. Nossos comércios não são mais sustentáveis, devido ao problema do saneamento. Estamos empobrecendo: começamos a temporada no vermelho e terminamos no vermelho. Nós temos uma praia, mas nossos filhos não podem usá-la”.

O representante da Associação dos Comerciantes do Farol confirmou: “O pessoal está deixando a Prainha e procurando a praia do lado; queremos uma praia pro ano que vem de novo”.

Flavio Alves, da Pousada Vida Farol, foi enfático: “ou nós acabamos com o esgoto ou ele acaba conosco”.

Há vários projetos alternativos de tratamento de esgoto. Mas a implantação destes carece de anuência da CASAN, atual concessionária dos serviços de água e esgoto do município.

Na CASAN, não há projeto previsto para a Praia do Farol. Principalmente porque os investimentos necessários para uma ETE - Estação de Tratamento de Esgoto (para 2.500 pessoas) são altos: gira em torno de 1 milhão e meio de reais. Pra quê gastar tanto dinheiro com pouca gente?

E isso não evitará os problemas da alta temporada de verão. Uma ETE pode comportar o dobro de sua capacidade. No caso, suportaria, no máximo, tratar o esgoto de 5.000 pessoas. Mas nunca será eficiente para atender à população flutuante (que chega a 15 mil pessoas por mês): o sistema entra em colapso.

Apesar da ausência do prefeito, dos Ministérios Públicos e do não-sei-de-nada e não-to-nem-aí da CASAN, a reunião foi muito importante. Deixou clara a necessidade de mobilização para a busca de soluções. Para facilitar a comunicação, a comunidade criou um blog – www.sosfaroldesantamarta.blogspot.com.

E surgiu uma proposta paliativa: num desespero, concentrar esforços para ligar todo o esgoto produzido num só córrego, o do canto das pedras; para safar o restante da faixa de areia. Paralelo a isso, num segundo passo, tratar os 3 córregos que desembocam na praia.

A proposta que eu lancei, de levar o caso ao conhecimento do Poder Judiciário, e pedir a responsabilização civil e criminal dos envolvidos, não foi aceita. Citei o exemplo do prefeito de Torres, “acusado de não ter implantado sistema eficaz de tratamento de esgoto na cidade nem ter eliminado ligações clandestinas que despejam dejetos na beira da praia”5.

Enquanto isso, as areias da Prainha do Farol continuarão recebendo, diariamente, o esgoto in natura. Sob os olhos e o nariz de todos. Contrariando a promessa do presidente Lula6, em 27/08/2007, à época do lançamento dos recursos do PAC do saneamento: “A gente vai poder ver no Brasil as crianças brincando na rua sem ter esgoto a céu aberto”.

1 – http://guiadolitoral.uol.com.br/faroldesantamarta-sc.html

2 - http://apadabaleiafranca.blogspot.com/2009/07/fundacion-cepa-foro-internacional.html

3 - Companhia Catarinense de Águas e Saneamento

4 - Universidade do Extremo Sul Catarinense

5 - http://zerohora.clicrbs.com.br/zerohora/jsp/default.jsp?uf=1&local=1§ion=Pol%C3%ADtica&newsID=a2846067.xml

6 - http://www.abin.gov.br/modules/articles/print.php?id=872
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FONTE : Ana Echevenguá, advogada ambientalista, coordenadora do programa Eco&Ação, presidente do Instituto Eco&Ação e da Academia Livre das Água, e-mail: ana@ecoeacao.com.br, website: www.ecoeacao.com.br.

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