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sexta-feira, 22 de janeiro de 2016

Acordo deve se basear em emissões históricas


O chefe da delegação da Nicarágua na COP 21, Paul Oquist, explica em entrevista exclusiva à IPS porque seu país rejeita o Acordo de Paris com base nas contribuições universais, de todos os países, e pede que seja fundamentado nas responsabilidades históricas dos grandes emissores. Foto: Diego Arguedas Ortiz/IPS
O chefe da delegação da Nicarágua na COP 21, Paul Oquist, explica em entrevista exclusiva à IPS porque seu país rejeita o Acordo de Paris com base nas contribuições universais, de todos os países, e pede que seja fundamentado nas responsabilidades históricas dos grandes emissores. Foto: Diego Arguedas Ortiz/IPS
Por Diego Arguedas Ortiz, da IPS – 

Paris, França, 12/2015 – No começo da cúpula climática de Paris a Nicarágua anunciou que não apresentaria suas contribuições previstas e determinadas em nível nacional (INDC), sendo o primeiro país a rechaçar abertamente esse sistema para um acordo global em relação ao fenômeno. Dos 195 países signatários da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática (CMNUCC), 183 já apresentaram suas INDC, mecanismo acordado em 2013 como base para construir o tratado universal que deve sair da 21ª Conferência das Partes (COP 21), que acontece na capital francesa até o dia 11.
Paul Oquist, ministro-secretário privado de Políticas Públicas da Presidência nigaraguense e chefe da delegação de seu país, explicou, em entrevista exclusiva à IPS, que o processo está destinado a fracassar se não se conseguir reduzir o aquecimento global em dois graus Celsius, a meta acordada pela comunidade internacional, embora alguns, como a Nicarágua, rebaixem esse objetivo para 1,5 grau. Oquist propõe deixar de lado as INDC e construir um acordo unicamente com base nas emissões históricas.
Várias análises das INDC mostram que sua implantação resultaria em aumento da temperatura entre 2,7 e 3,5 graus Celsius até 2100, um avanço após o aumento esperado de 4,5 graus, mas ainda insuficiente para atingir a meta. Oquist falou à IPS sobre as razões da posição nicaraguense, no centro de convenções onde acontece a COP 21.
IPS: A América Latina e a América Central têm problemas comuns, mas os países se movem em ritmos diferentes e com grupos diferentes. A região perdeu a oportunidade de atuar em bloco?
PAUL OQUIST: Primeiro devemos entender onde estamos. Um dos principais temas desta COP 21 é o conceito da responsabilidade universal contra a responsabilidade histórica. A responsabilidade universal propõe que todos somos responsáveis, que todos devemos participar da solução do problema e que, se não encontrarmos solução para o problema, a culpa disse será de todos. Essas contribuições nacionais não funcionarão. A primeira evidência é que essa primeira rodada não conseguiu alcançar a meta de elevação da temperatura em 1,5 grau ou dois graus Celsius, que chegou a três graus. Isso é bastante sério. Três graus no mundo em desenvolvimento representam quatro graus. As INDC nos levarão a isso. Há uma proposta sobre como solucionar isso no Acordo de Paris, e é mediante a realização de outro exercício de INDC a cada cinco anos. Mas em cinco anos estaremos mais longe da meta de 1,5 grau do que agora. A Nicarágua não concorda com um acordo que condenará o mundo aos três graus.
IPS: A primeira rodada das INDC, dependendo de como se vê, nos levará a um aquecimento entre 2,7 e 3,5 graus Celsius. Isto pode melhorar em uma segunda rodada conforme as tecnologias fiquem mais baratas e aumente a ambição?
PO: Um quarto depende de financiamento. Não há financiamento, então um quarto deixa de contar e me surpreenderia muito ver os países desenvolvidos tomando as medidas sobre seu modelo de produção, consumo, finanças e estilo de vida que são necessárias para regressarmos ao nível de 1,5 grau. Temos uma alternativa, que é objetiva, possível de ser medida, verificável e transparente: a responsabilidade histórica, em lugar da universal. Devemos medir, desde 1750, qual a contribuição de cada país para a mudança climática. Também podem ser medidas contribuições atuais e se estabelecer um parâmetro que considere as contribuições tanto históricas como atuais e depois destine cotas a cada país com base nessas emissões. Esses países lucraram com a energia barata, a contaminação do ambiente, com seu desenvolvimento. Então, podem assumir responsabilidades para substituir o CO2 (dióxido de carbono) e reduzir o aumento da temperatura. Além disso, as responsabilidades históricas podem ser aplicadas a danos e perdas por meio de indenizações, que deveriam ir de forma direta e incondicional para os países que sofrem a mudança climática.
IPS: Quando a Nicarágua decidiu não apresentar suas INDC e que o processo era um fracasso?
PO: Sabemos desde o final de outubro que o processo é um fracasso. A Nicarágua decidiu há muito tempo que não apresentaria INDC porque a responsabilidade histórica é o caminho a seguir. Os três maiores emissores liberam 49,49% das emissões (China, Estados Unidos e União Europeia) e os dez maiores 72%, enquanto os cem países que menos o fazem liberam, no total, 3%. O único caminho para o objetivo de 1,5 grau a dois graus passa por esses dez grandes emissores. A única maneira de fazer isso é por meio dos grandes emissores historicamente responsáveis.
IPS: Isso significaria que emissores entre esses dez, como China, Índia e Brasil, também teriam que reduzir suas emissões significativamente, mais do que o proposto?
PO: Seriam todos nesse grupo: Estados Unidos, União Europeia, esses que mencionei, todos. A pergunta não é quais países, mas como solucionar esse problema. Esse é um problema da humanidade, da Mãe Terra e de todos nós. Então, estamos levando a sério tudo isso ou estamos fazendo jogos políticos? Esta não é uma negociação sobre cotas de café ou cacau, mas sobre o clima da Terra.
IPS: Mais de 180 países entregaram suas INDC, incluindo a maioria de seus sócios no grupo negociador dos Países em Desenvolvimento de Pensamento Afim (LMDC). Estão equivocados ao confiarem nesse processo?
PO: A posição que consideramos correta é a de responsabilidades históricas e esperamos que cada vez mais e mais países compreendam que as INDC vão falhar. Quando começaram esse processo, não sabíamos que ia falhar. Pensamos que não seria um fracasso porque a responsabilidade voluntária não funciona. Se não funcionou, vamos continuar seguindo esse caminho?
IPS: As condições podem mudar, a tecnologia ficar barata e as condições políticas e econômicas podem mudar…
PO: Maravilha, então façamos as mudanças quando isso ocorrer, não façamos as mudanças com base em suposições. Trabalhemos com base em fatos, agora em 2015. Isto é o que devemos fazer. Você me pergunta pelos 180 países. Houve um momento em que a França foi isolada e sob enorme pressão porque havia uma febre de guerra. A França disse não, pois era uma guerra agressiva que deixaria consequências desastrosas. Agora olhamos para trás e, dos que apoiaram a guerra no Iraque, alguns se sentem envergonhados, e os que se opuseram usam essa posição como credencial política de saber compreender melhor os processos políticos complexos e a posição francesa é bem vista. Odiaria pensar que o Acordo de Paris será lembrado no futuro como o acordo que nos condenou a um aumento da temperatura de três a quatro graus e suas consequências.
IPS: A Nicarágua quer conseguir um acordo em Paris, como os demais. Esta é uma maneira realista de conseguir isso? Com as INDC se conseguiu reduzir de 4,5 para 2,7 graus o aquecimento esperado…
PO: Um processo que falha em seu objetivo de 100% ou 50% não é um sucesso. Dizer isso apenas porque poderia ter sido pior é como uma “alegria de burro”. Nós definimos a meta. Os países desenvolvidos definiram a meta de dois graus e não a alcançamos em 100%. Estamos em três graus e isso não é um sucesso. Se depois aumentarmos para 3,5 ou quatro graus e a meta flutuar de maneira ascendente, não teremos êxito e também teremos um desastre.
IPS: O que acontece se, somadas as emissões atuais dos países historicamente responsáveis, ainda assim não for possível solucionar o problema? Há atualmente países em desenvolvimento que estão entre os grandes emissores.
PO: Essa é uma lógica diferente. Quem é responsável deve contribuir para a redução das emissões e para a indenização. Podemos ter dados objetivos baseados em ciência. Agora não temos nada. 2020? Quem disse que a mudança climática começará em 2020? Quem disse que US$ 100 bilhões é a quantia necessária para financiamento? Não está baseado em nenhum estudo. Comecemos a trabalhar com base em metas previsíveis.
IPS: Se o processo para o acordo continuar baseado nas INDC, a Nicarágua bloqueará as negociações?
PO: Veremos o que acontecerá. Esperamos que não sejam muitos os países que regressem para dizer aos seus agricultores, sua imprensa e seus políticos: perdão, mas o melhor que conseguimos em Paris foram três graus. Envolverde/IPS

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