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quarta-feira, 16 de abril de 2014
Ribeirinhos da Amazônia apostam na pesca sustentável e no manejo florestal
Não basta dar o peixe ou a vara. Também não basta ensinar a pescar. Um dos grandes desafios pelos quais passam diversas comunidades ribeirinhas da Amazônia tem sido o de pescar de forma sustentável. E, assim, evitar que a fartura de um ano resulte em escassez de pescado no ano seguinte. O princípio pode ser aplicado a várias outras atividades típicas desenvolvidas pelos ribeirinhos da Amazônia. Entre elas, o manejo florestal – utilização racional e ambientalmente adequada dos recursos da floresta.
“Para que qualquer atividade seja considerada sustentável, ela precisa ser ecologicamente correta, economicamente viável e socialmente justa”, resume o técnico florestal do Instituto Mamirauá, Ronaldo Carneiro.
É seguindo esse princípio que o instituto tem ajudado comunidades amazonenses da Reserva Mamirauá, localizada a 600 km a oeste de Manaus, região do curso médio do Rio Solimões. Com 1,124 milhão de hectares, essa é a primeira reserva de desenvolvimento sustentável do país.
O Instituto Mamirauá é uma organização social fomentada e supervisionada pelo Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) que atua, também, como unidade de pesquisa.
Uma das principais fontes de renda das comunidades da reserva é a pesca sustentável do Pirarucu. A cada ano, são dois meses de atividade e dez meses de vigilância contra a pesca irregular na região. Para evitar problemas, algumas regras têm de ser seguidas. Uma delas é a contagem de peixes adultos, quando boiam na superfície – feita por contadores capacitados e certificados pelo instituto, antes do início da temporada de pesca.
“Já tivemos baixas significativas da população de peixes em decorrência de o contador ter falseado dados. No ano seguinte, com a queda no número de pescado, a comunidade sentiu na pele o problema”, disse à Agência Brasil Francilvânia Martins de Oliveira, 24 anos. Segundo a ribeirinha, que tem vários pescadores na família, a venda de peixes é o que mais movimenta a economia da comunidade Boca do Mamirauá.
Para ter sucesso nessa e em outras empreitadas, o instituto já promoveu mais de 120 cursos de capacitação nas comunidades da região, bem como ações nas áreas de agricultura, abastecimento de água, gestão comunitária, turismo, manejo florestal e pesca.
Responsável por estudos de mercado que identificam a viabilidade no manejo florestal, o economista Leonardo Apel, integrante do Grupo de Pesquisa e Organização Social, diz que a técnica aplicada “é eficiente e promove a regeneração de espécies no local”. O manejo é uma atividade econômica oposta ao desmatamento, pois não há remoção total da floresta e, mesmo após o uso, o local manterá sua estrutura florestal.
O pesquisador explica que a técnica de manejo desenvolvida pelo instituto e aplicada nas comunidades tem mais de 40 anos. “Ela era adotada em empresas e agora está sendo direcionada ao manejo comunitário. A diferença entre as aplicações está ligada à capacidade de planejamento. No caso da extração feita pela comunidade, ela não é tão voltada para o mercado. É de pequena escala, visando à subsistência e, só em alguns casos, à venda.”
Segundo Apel, a madeira extraída de forma legal atinge preços de mercado “muito mais interessantes” do que a obtida ilegalmente. “A ilegal não tem viabilidade econômica porque o risco de apreensão faz seu preço de mercado cair vertiginosamente. Quem faz isso acaba tendo de pagar para trabalhar”, disse. “Por isso, acredito que o manejo de madeira seja a melhor alternativa não só para a Amazônia, mas para o mundo todo”, acrescentou.
O princípio do manejo é simples: não se pode derrubar em quantidade maior do que a capacidade de recuperação da floresta – em geral, até três espécies por hectare na região. Responsável por capacitar as comunidades para o manejo, o técnico florestal Elinei Castro responde, atualmente, pelo levantamento de estoques e pelo inventário da Comunidade São Francisco, uma das áreas visitadas pela Agência Brasil.
“As árvores com pelo menos 1,2 metro de diâmetro já foram marcadas”, disse. “Nessa área aqui, de 17 hectares, foram marcadas e autorizadas [a extração de] 46 delas, mas as regras permitiriam a derrubada de até 51 árvores. Em toda a região, há 60 hectares, dos quais podem ser extraídas 180 árvores em um ciclo de 25 anos, que é o tempo que leva para elas atingirem a fase adulta”, explicou.
Segundo o líder eleito pela comunidade de São Francisco, Raimundo Ribeiro da Silva, com o manejo é possível chegar a uma renda média de R$ 300 por mês para cada família. “Mas o dinheiro só vai para quem trabalha”, acrescentou Elinei, enquanto acompanhava o corte de uma assacu – árvore de grande resistência e durabilidade na água, muito usada na estrutura de casas flutuantes – com três metros de diâmetro na base.
Sócio da comunidade nas atividades de manejo desde 2001, Erinaldo Chagas, 32 anos, diz ter um “sentimento controverso” ao derrubar árvores. “A gente sente tristeza. Mas também sente alegria, porque a madeira beneficia a gente e dá o que comer para nossas famílias. Além disso, quando se tira uma árvore de grande porte, nós damos condições para que outras árvores surjam, com a entrada da luz que até então estava bloqueada”, destacou.
Reportagem de Pedro Peduzzi, da Agência Brasil, publicada pelo EcoDebate, 16/04/2014
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