Kuala Lumpur, Malásia, 25/7/2013 – Como podem devorar tudo o que encontram pela frente quando fogem ao controle, os incêndios são considerados algo muito perigoso em todo o mundo. Porém, na Indonésia são o método preferido para desmatar grandes áreas e dar lugar a cultivos comerciais. Na primeira metade de 2013, foram registrados 8.343 incêndios florestais, um número muito maior do que em anos anteriores.
Ainda que alguns tenham acontecido de forma natural nos meses de verão, especialistas asseguram que a maioria foi provocada de forma deliberada por várias companhias privadas e, em menor medida, pelas comunidades locais, para desocupar milhões de hectares de florestas e usar a terra para plantar palmeiras oleaginosas. Segundo o Centro para a Pesquisa Florestal Internacional (Cifor), as plantações de palma “cobriam 7,8 milhões de hectares” da Indonésia em 2011, e produziram cerca de 23,5 milhões de toneladas de óleo nesse ano.
A forma mais barata e fácil de limpar extensões de terra tão grandes é iniciar um fogo e deixar que o vento faça o resto. Os incêndios também reduzem a acidez do solo de turfa, uma matéria orgânica e pastosa que impede o cultivo de palmeiras. Isto explica o fato de que dois terços dos incêndios florestais na Indonésia ocorram em terras turfosas. Contudo, este tipo de solo fica extremamente tóxico em altas temperaturas, porque emite gases-estufa e cria grandes nuvens de fumaça. O fogo pode arder por semanas, ou meses, sobre a turfa, colocando em perigo a vida selvagem e as comunidades humanas até em áreas distantes do lugar de origem do fogo.
Há muitos anos as companhias de óleo da Indonésia e da Malásia, que juntas respondem por 85% da produção anual de óleo de palmeira, são alvo de fortes críticas de ativistas e cientistas, os quais alertam que o método de causar incêndios traz grandes riscos ambientais e sanitários para toda a região. Embora a maioria dos incêndios tenha origem na ilha indonésia de Sumatra, mudanças na direção do vento fazem a fumaça chegar a países vizinhos.
No mês passado, os incêndios na Indonésia afetaram gravemente várias partes de Cingapura e Malásia. As nuvens de fumaça foram tão grandes que Kuala Lumpur declarou estado de emergência em várias partes do país, onde os índices de poluição do ar chegaram a 750 pontos no dia 23 de junho, muito acima do nível de perigo de 300 pontos. O governo da Malásia aconselhou os cidadãos a ficarem dentro de casa, enquanto as autoridades de Cingapura cancelaram as atividades de verão ao ar livre, depois que a população entrou em pânico e de esgotadas as máscaras de proteção.
O índice médio de poluição do ar na Malásia e em Cingapura agora é superior a cem, um drástico aumento em relação à década passada, o que “contribui para a mudança climática e age seriamente em detrimento da saúde da população da região”, afirmou à IPS o ambientalista malaio Gurmit Singh. O público acusa os governos, as corporações e inclusive as comunidades locais, mas a pressão não é suficiente para promover ações concretas.
Os ministros de Meio Ambiente da Associação de Nações do Sudeste Asiático (Asean) se reuniram na capital da Malásia na semana passada para encontrar uma solução ao que já constitui uma crise recorrente. Mas as conversações terminaram no dia 17 sem que chegassem a um acordo. Os ministros de Brunei, Indonésia, Malásia, Cingapura e Tailândia apenas aprovaram uma exortação para que o parlamento indonésio ratifique, antes de 2014, o Acordo da Asean sobre Contaminação Transfronteiriça com Neblina, de 2002.
O resultado do encontro ministerial não surpreendeu T. Jayabalan, conselheiro de saúde pública e assessor do escritório na Malásia da organização Amigos da Terra. “Por quase 20 anos esses governos adotaram uma atitude displicente para o problema”, disse Jayabalan à IPS. Este especialista duvida que sejam adotadas medidas concretas que possam afetar o lucro das empresas de óleo de palmeira.
Um rápido olhar sobre o que está em jogo apoia a opinião de Jayabalan: segundo o Cifor, a produção de óleo de palmeira representou para a Indonésia divisas no valor de US$ 12,4 bilhões em 2008, enquanto o governo arrecadou outro US$ 1 bilhão em impostos com a exportação desse produto. O setor emprega cerca de 3,2 milhões de pessoas a cada ano, algo significativo em um país onde 30 milhões vivem abaixo da linha de pobreza.
No começo deste ano, a Associação Indonésia de Produtores de Óleo de Palmeira apresentou um ambicioso plano para conseguir crescimento de 5,4% do setor até 2020, acrescentando mais quatro milhões de hectares para plantar palmeiras. Diante desses projetos, são necessárias medidas concretas, “em lugar de continuar falando e adiando decisões cruciais”, alertou Jayabalan. Ele e outros especialistas acreditam que o primeiro passo é reconhecer o papel das companhias de óleo de palmeira nos incêndios.
Informação divulgada no mês passado pelo World Research Institute (WRI), com sede em Washington, indica que o número de incêndios florestais por hectare é “três ou quatro vezes maior” nas terras concedidas a essas empresas do que fora delas. A investigação também indica que há significativas discrepâncias entre os mapas elaborados pelo Ministério de Silvicultura e os realizados pelas companhias de óleo. “Isto cria confusão sobre a responsabilidade pelos incêndios”, apontou o WRI.
Como são esperados mais incêndios para agosto e outubro, ambientalistas exortam o governo a enfrentar o “problema antes que a população sofra com a poluição” originada pela fumaça, pontuou Singh. Vários estudos demonstram que a contaminação pelas nuvens de fumaça aumenta os casos de infecções nas vias respiratórias superiores, de asma e rinite. Envolverde/IPS
(IPS)
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