Foi em Yellowknife, localidade canadense em uma enseada do Great Slave Lake, que foi criada uma organização para decidir quais áreas do bosque proteger e quais poderiam se desenvolver. Seu fundador foi Stephen Kakfwi, então ministro da Natureza e do Desenvolvimento Econômico e, depois primeiro-ministro do Território Noroeste. O estopim foi a exploração de minas de diamantes, algumas em áreas de caça da tribo local, os dene.
O processo derivou na Estratégia de Áreas Protegidas. As tribos locais designaram áreas para a reprodução de animais ou para caça, bem como locais de significado espiritual, com apoio de cientistas. Após negociações com os mineradores, os governos provincial e federal declararam essas áreas como parques. “A Estratégia de Áreas Protegidas foi a primeira ferramenta para fazer todos trabalharem juntos”, disse Stephen, agora retirado da política, durante uma viagem pelo santuário de bisões de Mackenzie.
Ali, o bisão do bosque, maior mamífero terrestre da América do Norte, passou de menos de 200 exemplares para mais de dois mil. Muitos deles pastam à margem da estrada. Sob a Estratégia de Áreas Protegidas, o Território Noroeste está em fase de mais do que duplicar seus parques, de 10% para 23%. “A Estratégia abriu o caminho”, disse David De Launay, vice-ministro adjunto de Meio Ambiente na província de Ontário, em entrevista feita em Toronto.
O acordo de maio, entre três ambientalistas e três desmatadores, foi um novo capítulo no processo iniciado por Stephen há 16 anos, e no qual ambientalistas, governos autóctones, líderes políticos e empresas madeireiras canadenses trabalham para destinar terras à conservação em uma escala inédita no mundo. Os compromissos totalizam 1,6 milhões de quilômetros quadrados, o que equivale quase à superfície do Irã.
“Estes compromissos quintuplicam o sistema de parques nacionais dos Estados Unidos”, disse Steve Kallick, diretor da Campanha Internacional de Conservação Boreal, do Pew Environment Group, que teve um papel crucial nesse processo. Boa parte desta terra fica na pouco povoada zona florestal boreal do Canadá, que se estende entre a tundra e a quinta parte sul do país, onde vive a maioria de sua população.
“As ameaças às florestas boreais mais ao norte não parecem significativas no momento. Depois de tudo, apenas estamos desenvolvendo uma fração diminuta dos recursos ali existentes”, disse Nigel Roulet, da McGill University. “Mas estou convencido de que a pressão aumentará na medida em que o norte do Canadá ficar mais quente e for mais fácil operar ali. Também espero que nossos recursos sejam mais valiosos na medida em que outras fontes se esgotarem”, acrescentou.
Quando começou o processo de criação de uma rede de áreas protegidas no mundo, há uma década, o principal objetivo foi salvar o caribu da floresta e outras espécies. Nos últimos anos, isto ganhou força e legitimidade, quando novos estudos sobre a região mostraram que a floresta terá um papel fundamental nos futuros cenários da mudança climática.
Em julho de 2008, o primeiro-ministro de Ontário, Dalton McGuinty, anunciou que a província transformaria metade de sua região boreal em reservas naturais. Também nesse sentido, cientistas e povos originários canadenses – conhecidos como as Primeiras Nações – teriam um papel fundamental em determinar quais partes devem ser protegidas da mineração, do corte e da construção de represas. Na outra metade seria incentivado o desenvolvimento em algumas áreas e este não seria restringido em outros, levando em conta as implicações de qualquer projeto em matéria de carbono, disse Nigel, que assessora o governo dessa província.
Em 2009, o primeiro-ministro da província de Quebec, Jean Charest, assumiu compromisso similar para uma área quase três vezes maior, prometendo também proteger pelo menos a metade, designando novos parques, refúgios e reservas naturais, e garantindo que as novas construções na outra metade somente comecem se isso ocorrer dentro do contexto de um plano aprovado para o uso da terra.
Outra província, Manitoba, aprovou lei dispondo consultas com as Primeiras Nações para proteger 85 mil quilômetros quadrados. Enquanto isso, no plano federal, quando assumiram há quatro anos, os conservadores se comprometeram a duplicar a área destinada a parques nacionais para 183 mil quilômetros quadrados até 2012. “Este é nosso presente para as futuras gerações. Somos a última geração que pode fazer isso”, afirmou Alan Latourelle, presidente da Parks Canada.
Outra entusiasta é Avrim Lazar, presidente da Associação de Produtos Florestais do Canadá, que reúne madeireiras, fábricas de papel e outras empresas de produtos derivados da madeira. “A floresta boreal é um enorme tesouro natural e o plano de Ontário é um grande passo na direção correta. Cremos fortemente que cada melhoria na qualidade ambiental pode se traduzir em valor de mercado para nossos produtos”, afirmou.
Em maio, após dois anos de negociações, os 21 membros da Associação liderada por Avrim assinaram um acordo com nove organizações ambientalistas. Os membros concordaram em proteger cerca de 300 mil quilômetros quadrados de terras públicas cujo usufruto lhes cabe e aproveitar o restante segundo padrões amigáveis com a natureza definidos pelo Forest Stewardship Council (FSC).
Em troca, os ambientalistas concordaram em suspender suas campanhas dirigidas a compradores de produtos derivados da madeira. Em apenas cinco anos, a proporção do corte feito sob as normas do FSC multiplicou por oito, chegando a 350 mil metros quadrados. Entre essas regras, figuram reduzir o dano ambiental e garantir respeito aos direitos de indígenas e empregados.
“Espero que 80% do corte seja feitos dessa forma dentro de dez anos”, disse Antony Marcil, presidente do FSC, observando que nem todas as empresas de corte integram a Associação de Produtos Florestais. Justina Ray, bióloga especialista em caribus e diretora da Wildlife Conservation Society Canadá, acredita que ainda é cedo para determinar se as terras que serão protegidas serão as que mais necessitam desses animais, cuja população está em queda. “Pelo menos agora temos um modelo diferente para o norte do que usávamos no sul”, afirmou.
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FONTE : Christopher Pala, da IPS (Este artigo é parte de uma série de reportagens sobre biodiversidade produzida por IPS, CGIAR/Bioversity International, IFEJ e Pnuma/CDB, membros da Aliança de Comunicadores para o Desenvolvimento Sustentável : www.complusalliance.org)(IPS/Envolverde)
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