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quarta-feira, 26 de agosto de 2009

É hora de tomar atitudes


Lideranças empresariais e governo debateram compromissos e propostas do Brasil para as discussões da Conferência de Copenhague, em dezembro. E lançaram a "Carta Aberta ao Brasil sobre Mudanças Climáticas".

O Fórum Amazônia Sustentável (FAS), o Instituto Ethos e a Vale vêm liderando um esforço para definir um posicionamento conjunto, representativo do setor privado brasileiro, tendo em vista as discussões que ocorrerão em dezembro, em Copenhague, durante a 15ª edição da Conferência das Partes (COP 15) da Convenção das Nações Unidas sobre Mudança do Clima, quando representantes dos setores público e privado dos países desenvolvidos e em desenvolvimento terão o desafio de firmar novos compromissos e incentivos para a redução das emissões de gases de efeito estufa.

Como parte das atividades desse grupo de representantes empresariais, foi realizado em São Paulo, nesta terça-feira, o seminário “Brasil e as Mudanças Climáticas: Oportunidades para uma Economia de Baixo Carbono”, organizado pelo jornal Valor Econômico e pela Globonews, com apoio do Instituto Ethos.

Falando no evento, o presidente do Ethos, Ricardo Young, disse que vem se abrindo atualmente um novo nicho para as empresas que estão na vanguarda de projetos sociais. De acordo com Young, "a visão da sociedade está mudando e vem exigindo mais responsabilidade social dos empresários, principalmente na questão das mudanças climáticas”. Para ele, as empresas precisam agir rápido para se enquadrar no novo modelo que surge.

Young salientou que governo e empresariado devem ser os protagonistas na busca pelo desenvolvimento sustentável. Na opinião do presidente do Ethos, embora "a questão seja essencial, está longe de ser resolvida”, citando, como exemplo, as comemorações em torno do potencial do pré-sal brasileiro “num momento em que precisamos reduzir emissões de gases efeito estufa”.

Para Ricardo Young, a exploração do pré-sal deve ser condicionada à destinação de parte de seus lucros para investimentos em tecnologias mitigatórias e adaptativas. "É mais que justo, especialmente porque o país tem avançado muito em aplicação de ações sustentáveis, entre elas as dos setores elétrico e bancário", explicou.

O presidente do Ethos lembrou também que em poucos anos a competitividade entre as empresas estará muito mais acirrada, "colocando anos-luz na frente aquelas que estiverem agindo de maneira a proteger os recursos naturais e amenizar o aquecimento global". Para ele, o melhor caminho a trilhar é o de uma sociedade mais igualitária.

Falando também no seminário, o copresidente do conselho administrativo da Natura, Guilherme Leal, foi mais longe, enfatizando que o modelo de produção e consumo do século 20 já está esgotado e que a sociedade, empresários e governo precisam, juntos, construir uma nova realidade. "Não há mais tempo para pensar. É preciso tomar atitudes já e o posicionamento do governo é essencial, pois o processo de mudança é complexo, cheio de dúvidas e incertezas", disse.

Leal acredita que a crise econômica internacional foi uma oportunidade para que todos os setores da economia parassem para pensar: "Estamos de ressaca e agora é hora de melhorar, não de tomar outro porre fazendo tudo igual", disse.

O Brasil tem avançado muito, principalmente o setor privado, no que diz respeito à sustentabilidade, apesar de algumas falhas, apontou Guilherme Leal, destacando que a postura tomada até 2020 será decisiva para o futuro do ser humano. "A sustentabilidade já entrou na agenda política mundial, por isso as empresas estão assumindo esse compromisso público com o governo federal", afirmou.

Wilson Ferreira Junior, presidente da CPFL, uma empresa do setor elétrico com atuação em vários Estados brasileiros, disse no encontro que as ações do consumidor também fazem parte de um plano de economia de baixo carbono: "O consumo consciente é uma das ferramentas mais importantes para a diminuição de emissões e utilização dos recursos naturais. Não há mais espaço para esse estilo de comportamento que considera o consumo desenfreado como sinônimo de qualidade de vida".

Outro ponto defendido por Ferreira Junior foi a pressão da sociedade para que os governos sejam mais arrojados em seus planos relacionados às mudanças climáticas. "A população deve cobrar de seus políticos mais ações sustentáveis", disse.

O papel do governo federal

Questionado sobre metas e idéias que o país levará para Copenhague em dezembro, o ministro do Meio Ambiente, Carlos Minc, afirmou que o Brasil avançou, em relação a políticas passadas, instituindo metas voluntárias, lançando o Plano Nacional de Mudanças Climáticas (PNMC) e o Fundo Amazonas. "Durante a COP 14, na Polônia, nossas ideias foram elogiadas, inclusive pela ONU", destacou.

Ainda de acordo com Minc, uma meta mais audaciosa depende de vários fatores, principalmente da participação popular. "Em junho de 2010, iremos revisar o PNMC e quem sabe conseguiremos apoio para metas ousadas. Para isso contamos com o apoio de todos os setores, inclusive dos mais reticentes, como o da pecuária", disse.

O último inventário sobre emissões de CO2 no Brasil é de 1994, o que sempre foi criticado pelas instituições ambientalistas. Mas, de acordo com o ministro da Ciência e Tecnologia, Sérgio Rezende, um novo inventário, com dados de 2004, está a caminho e será apresentado em Copenhague. "Um inventário depende de uma série de dados muitas vezes difíceis de apurar e por isso demora um pouco para ficar pronto", ressaltou, já adiantando que o seguinte, com dados até 2009, deverá ser concluído em 2011, em uma parceria com a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). "Hoje já temos tecnologia para apressarmos a seleção desses dados, o que demonstra a vontade do governo brasileiro em melhorar suas ações diante das mudanças climáticas", disse.

Para o embaixador Luiz Figueiredo Machado, o principal negociador brasileiro para a discussão das mudanças climáticas nos eventos da ONU, essa crise requer uma resposta imediata não apenas do Brasil, mas de todo o mundo, principalmente dos países desenvolvidos. "É preciso lembrar que o Protocolo de Kyoto não acaba em Copenhague, como muitos dizem. Além disso, o Brasil chega à COP 15 com muitas idéias e exige o mesmo dos outros países", enfatizou.

O presidente da Vale, Roger Agnelli, disse que, apesar de ser difícil convencer alguns empresários a mudar de atitude em relação à sustentabilidade, é evidente que o planeta está partindo para uma economia verde. "O consumidor tem exigido isso e o setor que não se adaptar será expulso da economia em vários países", falou.

Agnelli destacou que o passivo ambiental não é algo que desaparece. "Ele fica para a vida toda e traz lembranças. Em sua opinião, “o mundo está mudando e é hora de todos, independentemente da camada da sociedade em que se inserem, agirem e assumirem compromissos", finalizou.

Carta aberta

Ao final do evento, foi lida e entregue aos representantes do governo federal presentes a Carta Aberta ao Brasil sobre Mudanças Climáticas, assinada por 22 empresas. Uma iniciativa da Vale, juntamente com o Fórum Amazônia Sustentável e o Instituto Ethos, o documento traz uma série de compromissos voluntários das empresas signatárias com os esforços para a redução dos impactos das mudanças climáticas. Apresenta também várias propostas ao governo federal relacionadas à sua posição na COP 15 e ao estabelecimento, em âmbito nacional, de “um sistema estável e previsível de governança para as questões de mudanças climáticas”.

Veja a seguir a íntegra do documento:

CARTA ABERTA AO BRASIL SOBRE MUDANÇAS CLIMÁTICAS

Nossa visão

As mudanças climáticas constituem um dos maiores desafios de nosso tempo. O 4o. relatório do IPCC (Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas) indica que um aumento de temperatura acima de 2o C em relação ao início da era industrial traria consequências desastrosas para a economia dos países e o bem-estar da humanidade, em termos de saúde, segurança alimentar, habitabilidade e meio ambiente, comprometendo de forma irreversível o desenvolvimento sustentável.

No Brasil, um aumento de temperatura desta magnitude traria graves reflexos sobre a produção agrícola, a integridade das florestas e da biodiversidade, a segurança das zonas costeiras e a disponibilidade hídrica, e energética. Implicaria, portanto, em retrocesso no combate à pobreza e na qualidade de vida da sociedade.

Reduzir as emissões globais de gases de efeito estufa (GEE) representa um grande desafio. Para que o aumento da temperatura se estabilize abaixo de 2o C, o IPCC aponta a necessidade de limitar a concentração de CO2e na atmosfera em até 450 ppm (partes por milhão). Para isso, a emissão total de GEE durante este século não deve ultrapassar, em média, cerca de 18 Gt CO2e/ano (bilhões de toneladas de GEE expressos em CO2 equivalente por ano). As emissões globais atualmente ultrapassam 40 Gt CO2e/ano. Mesmo que os países desenvolvidos reduzissem imediatamente a zero suas emissões, não seria possível alcançar a meta global de redução sem uma participação das economias emergentes, entre elas o Brasil.

Vivemos uma oportunidade única de construir um novo modelo de desenvolvimento, baseado numa economia de baixo carbono, que deverá mobilizar empresas, governos e a sociedade civil. Acreditamos que o Brasil, mais do que qualquer outro país no mundo, reúne as condições de liderar a agenda desta nova economia. A meta de redução do desmatamento em 80% até 2020, preconizada pelo Plano Nacional de Mudanças Climáticas, dará significativa contribuição para a redução das emissões globais. O país tem experiências positivas em outros setores, a exemplo da produção de biocombustíveis, que demonstram a nossa capacidade de atingir esse objetivo.

Estamos certos de que as empresas brasileiras podem dar uma contribuição decisiva para que o país lidere a transição para uma economia de baixo carbono, aproveite novas oportunidades de negócios e aumente sua competitividade. Nesta Carta ao governo e à sociedade brasileira, assumimos compromissos em relação à agenda de mudanças climáticas e propomos ações para o poder público.

Nossos compromissos

Como contribuição aos esforços globais de redução dos impactos das mudanças climáticas, nos comprometemos a:
A. Publicar anualmente o inventário das emissões de gases de efeito estufa (GEE) de nossas empresas, bem como as ações para mitigação de emissões e adaptação às mudanças climáticas.
B. Incluir como orientação estratégica no processo decisório de investimentos a escolha de opções que promovam a redução das emissões de GEE nos nossos processos, produtos e serviços.
C. Buscar a redução contínua de emissões específicas de GEE e do balanço líquido de emissões de CO2 de nossas empresas por meio de ações de redução direta das emissões em nossos processos de produção, investimentos em captura e sequestro de carbono e/ou apoio às ações de redução de emissões por desmatamento e degradação.
D. Atuar junto à cadeia de suprimentos, visando a redução de emissões de fornecedores e clientes.
E. Engajar-nos junto ao governo, à sociedade civil e aos nossos setores de atuação, no esforço de compreensão dos impactos das mudanças climáticas nas regiões onde atuamos e das respectivas ações de adaptação.

Propostas ao governo brasileiro

Em dezembro deste ano, em Copenhague, ocorrerá a COP 15 – a 15ª Conferência das Partes da Convenção das Nações Unidas sobre Mudança do Clima. Na oportunidade serão discutidos por representantes de cerca de 200 países novos compromissos e incentivos para a redução das emissões de GEE, para a adaptação aos efeitos das emissões históricas e para o desenvolvimento, o financiamento e a cooperação tecnológica que promovam a redução das emissões globais e a estabilidade climática.

Para que o Brasil possa avançar na agenda da economia de baixo carbono e seja possível às empresas se planejarem para atuar neste novo contexto, é fundamental que se estruture um sistema previsível e estável de governança para as questões de mudanças climáticas. Para tanto, sugerimos ao Governo, no âmbito da participação do Brasil na COP-15:
A. Assumir posição de liderança nas negociações para a definição de metas claras de redução global das emissões de GEE, garantindo a aplicação do princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas.
B. Defender a simplificação e a agilidade da implementação do MDL, passando a ter como critério central de elegibilidade a sua comprovada redução de emissões, eliminando os conceitos de adicionalidade financeira e regulatória, e a caracterização dos créditos florestais como temporários.
C. Apoiar a criação de um mecanismo de incentivos para a redução das emissões por desmatamento e degradação florestal (REDD), incluindo a conservação e o manejo florestal sustentável. Tal mecanismo deve considerar recursos de diferentes fontes, incluindo contribuições voluntárias, como o Fundo Amazônia, e outras formas de captação advindas de instrumentos de mercado.

E, no âmbito nacional:
D. Produzir e publicar Estimativas Anuais de Emissões de GEE no Brasil e, a cada três anos, o Inventário Brasileiro de Emissões de GEE.
E. Estabelecer um Sistema Nacional de Controle de Emissões, incluindo mecanismos de consulta e participação da sociedade, e a definição de uma instância reguladora independente para o tema.
F. Priorizar a redução das emissões de GEE nas políticas e investimentos públicos, para consolidar o posicionamento do país numa economia de baixo carbono.
G. Promover a simplificação do processo de avaliação de projetos MDL no Brasil.
H. Definir e implementar uma política de apoio aos povos da floresta, produtores rurais, empresas e instituições, para as ações de conservação e manejo sustentável das florestas que promovam a redução das emissões de desmatamento e degradação florestal (REDD).
I. Estabelecer e implantar uma estratégia de adaptação do país às mudanças climáticas.

Signatárias:
Vale
Grupo Pão de Açúcar – Companhia Brasileira de Distribuição
Suzano Papel e Celulose
Votorantim Industrial
Aracruz Celulose
Votorantim Celulose e Papel
Light
Natura Cosméticos
CPFL Energia
Camargo Corrêa
Andrade Gutierrez
Construtora OAS
Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração (CBMM)
Coamo Agroindustrial Cooperativa
Polimix Concreto
Aflopar Participações
Estre Ambiental
Odebrecht Engenharia e Construção
Grupo Orsa
Samarco Mineração
Nutrimental
União da Indústria de Cana-de-Açúcar (Unica)

Apoio:
Instituto Ethos de Empresas e Responsabilidade Social
Fórum Amazônia Sustentável
Sindicato da Indústria Mineral do Estado de Minas Gerais (SindiExtra)
Federação das Indústrias do Estado do Paraná (Fiep)
Wal-Mart Brasil


Legenda da foto: Da esquerda para a direita, Luiz Figueiredo Machado, do Ministério das Relações Exteriores, ministro Carlos Minc, do Meio Ambiente, jornalista Daniela Chiaretti, do Valor Econômico, ministro Sérgio Rezende, da Ciência e Tecnologia, e Roger Agnelli, presidente da Vale.
Crédito da imagem: Betina Sarue


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Marina Silva comenta o evento

Por Betina Sarue, do Instituto Ethos

A senadora pelo Acre Marina Silva estava na plateia e, na saída, comentou alguns pontos do debate. A ex-ministra afirmou que as empresas estão se colocando à frente do governo, algo que a academia e os movimentos sociais há muito tempo já fizeram. Ela critica justamente a ausência de uma afirmação do governo, colocando-se como líder do processo interna e externamente.

Para ela, “a sustentabilidade ambiental é o desafio deste século, e não uma discussão de verde pelo verde, como dizem aqueles mais desinformados. É discutir a economia, que se traduz na agricultura, no transporte, na geração de energia, na saúde, na educação, no conhecimento, na inovação tecnológica. Isso leva a novas oportunidades de emprego e a uma nova economia”.

A senadora observou que, ao assumir metas, as empresas se colocam à frente do governo. E acha que ainda mais importante é que essas metas passem a ser tomadas em níveis setoriais. “Espero que os setores se comprometam com metas. Estes que estão se colocando aqui estão fazendo, inclusive, algo muito racional e pragmático. Estão se posicionando em termos de mercado. Já existe um mapa do caminho para a economia verde e as pessoas estão se antecipando. Agora quem precisa se antecipar são os líderes, o Congresso, que está atrasado anos-luz em relação a este debate. Lá as pessoas estão discutindo como retroceder na legislação ambiental, quando, na verdade, o que precisamos é nos posicionar estrategicamente com a vantagem diferencial que temos.”

Marina Silva anunciou que no próximo domingo (30/08) haverá a sua transição oficial para o PV, após afirmar que o partido está criando mecanismos importantes para viabilizar sua revisão programática e reestruturação. Ela comentou sobre sua primeira reunião no partido, na qual afirmou que houve um avanço significativo na agenda de transição.

A ex-ministra do Meio Ambiente declarou que o seu discurso é compatível com os anseios da sociedade e com as necessidades do planeta, e que o PV está sendo pioneiro em reelaborar o seu programa à luz dessas questões estratégicas. A senadora afirmou que, em lugar de criar esse embate dentro do PT, optou por fazer o encontro com aqueles que se dispõem a realizar essas mudanças.
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FONTE : Fabrício Ângelo, da Envolverde - especial para o Instituto Ethos

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