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quarta-feira, 19 de agosto de 2009
Desenvolvimento: o saneamento requer informação
“Não creio que se possa alcançar o Objetivo de Desenvolvimento do Milênio da ONU sobre saneamento”, disse à IPS Duncan Mara, professora de engenharia civil na Universidade de Leeds (Grã-Bretanha). “A situação não será mais fácil nas próximas décadas, já que quase todo o aumento da população mundial nesse período será nas áreas urbanas pobres dos países em desenvolvimento”, acrescentou.
Um dos oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, definidos em 2000 pela Assembléia Geral da Organização das Nações Unidas, é assegurar a sustentabilidade ambiental. Isto inclui “reduzir pela metade, até 2015, a proporção de pessoas sem acesso sustentável à água potável e a serviços básicos de saneamento”.
Duncan Mara trabalha desde meados da década de 70 no desenvolvimento de saneamento de baixo custo e em tratamento e reciclagem de esgoto em países em desenvolvimento. Em 2007, recebeu o prêmio “Fazendo um Mundo de Diferença”, concedido pela Chartered Institution of Water and Environmental Management (instituição britânica colegiada de gestão hidrológica e ambiental).
IPS- Existe algum modelo sustentável, barato e adequado de sistemas de saneamento que possa atender as necessidades dos 2,5 bilhões de pessoas que carecem inclusive de alguma forma elementar de privada e esgoto?
DM- Não há realmente um “modelo”. O que é absolutamente crucial é transmitir os conhecimentos que já temos aos que mais necessitam deles: os engenheiros e planejadores dos países em desenvolvimento, tanto no plano local quanto estadual e do governo central. Se os engenheiros não conhecem a tecnologia X de saneamento, muito menos saberão como adaptá-la às necessidades locais, então, que certeza terão de estar recomendando a melhor opção para este lugar? Além disso, na realidade, não será somente a tecnologia X, mas tecnologias X, Y e Z.
Falamos de uma dezena de técnicas, no máximo, mas, precisamos que os conhecimentos sobre elas estejam disponíveis para todos os profissionais que dela necessitam. A Internet ajuda muito, mas nem todos têm uma boa conexão, e em todo caso a maioria da informação está disponível apenas em inglês. Naturalmente que parte também em francês, espanhol e português; e pouca – caso exista – em tamil ou chinês. São necessários cursos sobre gerenciamento dados via Internet, e não apenas referentes às tecnologias, mas também aos aspectos econômico-financeiros e institucionais, que as organizações não-governamentais com boas conexões à Internet podem baixar e distribuir localmente em CDs. O mundo precisa de profissionais altamente capacitados em saneamento, e precisa agora.
IPS- Por que a comunidade internacional se centra mais na água e menos no saneamento? Não são igualmente importantes, em particular para alcançar os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio?
DM- Agora se dá muito mais ênfase ao saneamento porque 2008 foi o ano Internacional do Saneamento, o que fez este tema subir muito na escala política. Naturalmente, todas as belas palavras ditas pelos ministros em várias conferências regionais têm de se traduzir em ações, e nós simplesmente teremos de esperar e ver os resultados. Devemos ser otimistas, não cínicos nem pessimistas, embora a história recente possa nos dizer o contrário.
Trata-se, definitivamente, de impedir que os pobres dos países em desenvolvimento defequem em si mesmos até morrerem, e temos que dizer aos governos dos países em desenvolvimento que se não investirem em saneamento estarão permitindo a morte prematura de pessoas. Anualmente, a falta de higiene e saneamento, mais a água de má qualidade matam mais pessoas do que a AIDS, e os governos têm de compreender isto. De uma perspectiva puramente sanitária, as latrinas e os esgotos são mais importantes do que a água, mas, na realidade, para uma boa saúde, deve haver bom saneamento, boas condições de higiene e água de boa qualidade, tudo junto.
IPS- Como um dos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, em que parte da lista se situa o saneamento em termos dos avanços alcançados até agora?
DM- O saneamento está muito atrasado em relação à água: 2,5 bilhões de pessoas carecem de acesso a um saneamento melhorado, enquanto menos de um bilhão não têm água potável. O preocupante é que destes 2,5 bilhões de pessoas, cerca de 1,2 bilhão não conta com nenhum tipo de privada. Essas pessoas defecam ao ar livre, e quase 60% vivem em um país: Índia. Portanto, pode-se argumentar que se queremos conseguir um impacto real na saúde mundial, devemos nos concentrar em dar acesso a um bom saneamento para esse 1,2 bilhão de pessoas que defecam ao ar livre.
Nisto é crucial a iniciativa de saneamento total liderado pela comunidade. Isto é, conseguir que comunidades se dêem conta de até que ponto não ter nenhuma instalação de latrinas é ruim para a saúde, mas, também para sua dignidade, e, no caso das mulheres e meninas, para sua segurança. E então conseguir que sejam instaladas latrinas apropriadas e adequadas a cada lugar.
IPS- Qual o papel das organizações não-governamentais na promoção do saneamento e da higiene em todo o mundo?
DM- Há algumas que são realmente excelentes, com WalterAid e Sparc, sigla em inglês de uma entidade indiana que promove o desenvolvimento de latrinas administradas pelas comunidades de assentamentos urbanos, cujos habitantes são extremamente pobres para terem banheiros e privadas em cada casa. As organizações não-governamentais, especialmente as locais e quando apoiadas pelas internacionais, têm um papel real a cumprir, podem trabalhar com as comunidades e falar em seu nome às agências governamentais locais e também nacionais.
Entretanto, o papel mais importante das organizações não-governamentais, especialmente as internacionais e as grandes nacionais, é mostrar às agências com muito mais dinheiro qual é a melhor maneira de gastá-lo. As agências maiores podem copiar os êxitos de entidades menores, mas em uma escala muito maior.
IPS- Estas organizações não-governamentais são apoiadas por seus governos e pela comunidade internacional?
DM- Algumas são outras não. Alguns governos parecem estar adotando o ponto de vista de que, como há algumas organizações locais, e também talvez uma internacional, atuando na área do saneamento, eles não precisam fazer mais. A comunidade internacional tem um desempenho melhor, em muitos casos apoia o trabalho de entidades não-governamentais locais e internacionais, mas esta pode ser outra razão para os governos nada fazerem.
As grandes agências, por exemplo, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) e o Banco Mundial, mas também agências bilaterais de assistência, deveriam dizer às nações em desenvolvimento que não estão investindo em melhoria da higiene, do saneamento e da água para suas populações urbana e rural pobres: “Vocês não podem ter X milhões de dólares para este projeto enquanto não começarem a fazer algo sensato para melhorar a higiene para seus pobres”
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FONTE : Nergui Manalsuren, da IPS (IPS/Envolverde)
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