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quarta-feira, 25 de fevereiro de 2009

FATMA : PARECER JURÍDICO SOBRE A RECATEGORIZAÇÃO DO PARQUE ESTADUAL SERRA DO TABULEIRO


FUNDAÇÃO DO MEIO AMBIENTE - FATMA
PROCURADORIA JURÍDICA - PROJUR
Rua Felipe Schmidt, n° 485 – Centro – 88010-970
Florianópolis – SC
Fone: (48) 3216.1776 Fax: (48) 3216.1798
www.fatma.sc.gov.br
PARECER JURÍDICO


De: PROJUR Data: 07/04/2006
Assunto: Proposta de recategorização do Parque Estadual Serra do Tabuleiro
Ementa:Desanexação ou Recategorização de Parque Estadual. Necessidade de Estudo
Técnico motivador e posterior previsão legal. Criação de APA no entorno de Parque
Estadual. Possibilidade Jurídica, sob a forma de mosaico. Necessidade de Estudo
Técnico também.


I – RELATÓRIO:


Foi remetido pela Presidência da FATMA à esta Procuradoria Jurídica documentação
encadernada proposta pelo “Movimento pela recategorização das Áreas Costeiras do PEST”,
denominada “minuta de Projeto de Lei para a recategorização das Áreas Costeiras do
Parque Estadual da Serra do Tabuleiro e implantação da APA Costeira do Maciambu”.
O caderno é composto de uma minuta de um projeto de lei (PL), além de um parecer
jurídico e demais documentos técnicos elaborados pela empresa POLAR – Engenharia &
Meio Ambiente.
No âmbito de competência desta PROJUR, a análise ficará restrita à minuta do PL e o
Parecer Jurídico que procura embasá-lo.
Da mencionada minuta, com 18 artigos, extrai-se a seguinte proposição:
a) “Criação” do Parque Estadual da Serra do Tabuleiro com automática redução
da área total do Parque Estadual da Serra do Tabuleiro tal como existe hoje, precisamente
com a exclusão da faixa litorânea, com superfície de 78.853,00 hectares;
b) criação de uma nova Unidade de Conservação, incorporando as áreas excluídas do
Parque, categoria Área de Proteção Ambiental, do grupo Uso Sustentável, a qual designam por
“APA Costeira do Maciambu”; com superfície de 8.551,40 hectares;




2
c) dispõe sobre a titularidade das terras; visitação pública, pesquisa científica, limites
do parque em coordenadas geográficas e os da APA em Coordenadas UTM; gestão das UC´s,
elaboração de plano de manejo, regularização fundiária e determina os critérios de aplicação
dos recursos obtidos pela respectiva UC;
d) passa a administração das unidades de conservação à “Secretaria Estadual do Meio
Ambiente”;
e) cria e dispõe sobre o FPA – Fundo de Preservação Ambiental, o qual seria
administrado pela “Secretaria Estadual de Meio Ambiente” ou por organizações da sociedade
civil de interesse público ou ainda pelos Conselhos das unidades de conservação (UC)C, cujos
recursos seriam destinados exclusivamente à implantação, gestão e manutenção das UC de que
tratam o PL.
g) impõe a regulamentação da lei, no prazo de 180 dias;
h) revoga os decretos estaduais que criaram o Parque Estadual da Serra do Tabuleiro e
o declarou de utilidade pública para fins de desapropriação.

O parecer jurídico acostado no caderno, de 10 laudas, de lavra da Sra. Andréa Flores
Vieira, Subchefe Jurídica da Casa Civil do Gabinete do Governador do Estado do Rio Grande
do Sul, tem a missiva de responder “à consulta formulada pela Prefeitura de Palhoça - SC”,
sob a seguinte justificativa: “dada a experiência existente em matéria similar naquele Estado,
poderia haver uma orientação prévia ao início dos trabalhos de recategorização do Parque
Estadual da Serra do Tabuleiro”.

Ao final, dito Parecer Jurídico concluiu que “há respaldo legal para mediante
encaminhamento de Projeto de Lei pelo Chefe do Poder Executivo do Estado de Santa
Catarina aquele Parlamento, no sentido de criar a Área de Proteção Ambiental – APA, onde
hoje está definido o Parque Estadual da Serra do Tabuleiro, o que viabilizaria a
regularização do “Parque” e sua conformidade com às diretrizes da Lei Federal n.º
9.985/2000”.

Em apertada síntese, é o relatório.



II - ANÁLISE:

2.1 DA CRIAÇÃO DO PARQUE ESTADUAL DA SERRA DO TABULEIRO E DA
APA DE MACIAMBU.

2.1.1 DO PARQUE

Dispõe a mencionada minuta de PL que ficam criadas, simultaneamente, duas UC, uma
consistente no Parque Estadual da Serra do Tabuleiro e outra, na APA de Maciambu.
Preliminarmente, convém ressaltar que o Parque já restou criado por meio de Decreto
Estadual
1
, de modo que não poderá ser criado “novamente”. Caso contrário, o caso seria de
pressupor a nulidade de todos os atos praticados em razão da existência do Parque.
No entanto, o que de fato a proposta pretende é promover a desanexação da área
litorânea do mencionado Parque, ou seja, promover a redução de seu território, cujas
áreas excluídas integrarão a referida APA. Esta possibilidade de desanexação, em tese,
juridicamente é viável, porém obedece a alguns critérios, sob pena de nulidade:
a) que seja feita por lei;
b) seja precedida do competente estudo técnico.

Dispõe o art. 22 da Lei 9985/20002
(Lei do Sistema Nacional de Unidades de
Conservação – SNUC) que:

“Art. 22. As unidades de conservação são criadas por ato do Poder Público.
§ 1o (VETADO)
§ 2o A criação de uma unidade de conservação deve ser precedida de
estudos técnicos e de consulta pública que permitam identificar a

1
Conforme admitido no próprio art. 18 da minuta do projeto de lei, que cita todos os decretos que criaram o
Parque Estadual da Serra do Tabuleiro, bem como aqueles que modificaram seus limites e decretaram de
utilidade pública suas terras para fins de desapropriação.
2
Regulamenta o art. 225, § 1o, incisos I, II, III e VII da Constituição Federal, institui o Sistema Nacional de

localização, a dimensão e os limites mais adequados para a unidade,
conforme se dispuser em regulamento.
§ 3o No processo de consulta de que trata o § 2o, o Poder Público é
obrigado a fornecer informações adequadas e inteligíveis à população local e a
outras partes interessadas.
§ 4o Na criação de Estação Ecológica ou Reserva Biológica não é
obrigatória a consulta de que trata o § 2o deste artigo.
§ 5o As unidades de conservação do grupo de Uso Sustentável podem ser
transformadas total ou parcialmente em unidades do grupo de Proteção
Integral, por instrumento normativo do mesmo nível hierárquico do que criou a
unidade, desde que obedecidos os procedimentos de consulta estabelecidos no
§ 2o deste artigo.
§ 6o A ampliação dos limites de uma unidade de conservação, sem
modificação dos seus limites originais, exceto pelo acréscimo proposto, pode
ser feita por instrumento normativo do mesmo nível hierárquico do que criou a
unidade, desde que obedecidos os procedimentos de consulta estabelecidos no
§ 2o deste artigo.
§ 7o A desafetação ou redução dos limites de uma unidade de
conservação só pode ser feita mediante lei específica”.

Numa interpretação teleológica do mencionado dispositivo, considerando o conjunto
das diretrizes fixadas pela lei do SNUC3
, tem-se que estes estudos técnicos são,

3
Art. 5o O SNUC será regido por diretrizes que:
I - assegurem que no conjunto das unidades de conservação estejam representadas amostras significativas e
ecologicamente viáveis das diferentes populações, habitats e ecossistemas do território nacional e das águas
jurisdicionais, salvaguardando o patrimônio biológico existente;
II - assegurem os mecanismos e procedimentos necessários ao envolvimento da sociedade no
estabelecimento e na revisão da política nacional de unidades de conservação;
III - assegurem a participação efetiva das populações locais na criação, implantação e gestão das unidades de
conservação;
IV - busquem o apoio e a cooperação de organizações não-governamentais, de organizações privadas e
pessoas físicas para o desenvolvimento de estudos, pesquisas científicas, práticas de educação ambiental,
atividades de lazer e de turismo ecológico, monitoramento, manutenção e outras atividades de gestão das
unidades de conservação;
V - incentivem as populações locais e as organizações privadas a estabelecerem e administrarem unidades
de conservação dentro do sistema nacional;
VI - assegurem, nos casos possíveis, a sustentabilidade econômica das unidades de conservação;
VII - permitam o uso das unidades de conservação para a conservação in situ de populações das variantes
genéticas selvagens dos animais e plantas domesticados e recursos genéticos silvestres;
VIII - assegurem que o processo de criação e a gestão das unidades de conservação sejam feitos de forma
integrada com as políticas de administração das terras e águas circundantes, considerando as condições e
necessidades sociais e econômicas locais;
IX - considerem as condições e necessidades das populações locais no desenvolvimento e adaptação de
métodos e técnicas de uso sustentável dos recursos naturais;
X - garantam às populações tradicionais cuja subsistência dependa da utilização de recursos naturais
existentes no interior das unidades de conservação meios de subsistência alternativos ou a justa indenização pelos
recursos perdidos;

necessariamente, justificadores do ato legiferante. Estes estudos técnicos dizem respeito não
só a mera criação de unidades de conservação, mas também à sua ampliação ou redução, bem
como ao seu enquadramento – se de proteção integral ou se de uso sustentável, bem como à
modalidade para a qual possui maior vocação.
Interessante notar que a Lei do SNUC já dá as diretrizes para cada situação, de modo
que um estudo técnico adequado reduz a discricionariedade do Poder Público.
Das diversas reuniões técnicas da qual esta PROJUR participou, obteve-se a
informação de que as razões à existência do Parque Estadual da Serra do Tabuleiro restaram
confirmadas pelos próprios documentos trazidos pelo aludido “Movimento Pró-
Recategorização”. Todavia, inexiste subsídio técnico para fins de desanexação do Parque e
conseqüente transformação destas áreas excluídas em APA.
Se o Parque sob comento não pode ser “recriado”, como dito, a hipótese jurídica é a de
desanexação. Então, há que se perguntar: DESANEXAR PARA QUE? Do documento
apresentado pelo “movimento” diversos argumentos foram apresentados, tais como
democratização na gestão da UC, conflitos na área de entorno, etc. Ocorre que tais fatos não
encontram na recategorização uma solução, ainda mais porque boa parte da área proposta para
exclusão do parque é de preservação permanente, cujo uso – ainda que “sustentável”,
permanece inadmissível.
Em suma, além da previsão por meio de uma lei, a desanexação de uma unidade de
conservação somente poderia ocorrer se um estudo técnico coordenado pelo órgão gestor
apontasse que isto se coaduna com as diretrizes previstas pela Lei do SNUC e que não macula
os objetivos que ensejaram a criação da UC.





XI - garantam uma alocação adequada dos recursos financeiros necessários para que, uma vez criadas, as
unidades de conservação possam ser geridas de forma eficaz e atender aos seus objetivos;
XII - busquem conferir às unidades de conservação, nos casos possíveis e respeitadas as conveniências da
administração, autonomia administrativa e financeira; e
XIII - busquem proteger grandes áreas por meio de um conjunto integrado de unidades de conservação de
diferentes categorias, próximas ou contíguas, e suas respectivas zonas de amortecimento e corredores ecológicos,
integrando as diferentes atividades de preservação da natureza, uso sustentável dos recursos naturais e
restauração e recuperação dos ecossistemas.

2.1.2 DA APA

Com as áreas excluídas do Parque, o “Movimento” propõe a composição e criação de
uma UC contígua, da categoria uso sustentável, da modalidade APA, com superfície 9,22
vezes menor que a área do Parque. Em tese, uma APA de pequena dimensão não se coaduna
com as prescrições d SNUC, o qual define APA do seguinte modo:

“Art. 15 - A Área de Proteção Ambiental é uma área em geral extensa, com um certo
grau de ocupação humana, dotada de atributos abióticos, bióticos, estéticos ou
culturais especialmente importantes para a qualidade de vida e o bem-estar das
populações humanas, e tem como objetivos básicos proteger a diversidade biológica,
disciplinar o processo de ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos
naturais” (grifa-se).


Igual definição traz o artigo 17 do Sistema Estadual de Unidades de Conservação, in
verbis:

“Art. 17 - A Área de Proteção Ambiental é uma área em geral extensa, com um certo
grau de ocupação humana, podendo compreender ampla gama de paisagens naturais,
seminaturais ou alteradas, dotada de atributos abióticos, bióticos, estéticos ou
culturais especialmente importantes para a qualidade de vida e o bem-estar das
populações humanas, e tem como objetivos básicos proteger a diversidade biológica,
disciplinar o processo desocupação, proteger e/ou recuperar paisagens, atributos
naturais e/ou culturais e assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos
naturais”(grifa-se).

Afora os problemas inerentes à desanexação do Parque, nada impede que seja criada
uma APA no seu entorno. Todavia, o ato de criação não necessariamente precisa ser uma lei e
tampouco que a APA seja Estadual. Frisa-se, contudo, que dois aspectos precisam ser
considerados:
a) prévio estudo técnico que justifique a possibilidade de criação de uma APA;
b) constituição de um mosaico, na forma do art. 26 da Lei do SNUC:


“Art. 26. Quando existir um conjunto de unidades de conservação de categorias
diferentes ou não, próximas, justapostas ou sobrepostas, e outras áreas protegidas
públicas ou privadas, constituindo um mosaico, a gestão do conjunto deverá ser feita
de forma integrada e participativa, considerando-se os seus distintos objetivos de
conservação, de forma a compatibilizar a presença da biodiversidade, a valorização
da sociodiversidade e o desenvolvimento sustentável no contexto regional.

Parágrafo único. O regulamento desta Lei disporá sobre a forma de gestão
integrada do conjunto das unidades”.

Assim, entende-se pela possibilidade jurídica de criação de uma APA nas áreas
litorâneas que estão no entorno do Parque, tais como Praia da Pinheira e a Praia do Sonho,
desde que haja indicação técnica e consulta pública para tal criação, a ser feita pelo Poder
Público interessado (Federal, Estadual ou Municipal). Para tal mister é desnecessária a
proposição de um projeto de lei, bastando um Decreto do Chefe do Poder Executivo. O
documento apresentado não se presta para isso, seja porque envolve áreas já pertencentes ao
Parque, seja porque apresenta outras deficiências que precisam ser sanadas, conforme será
exposto mais adiante.


2.2 DO ENQUADRAMENTO DO PARQUE DA SERRA DO TABULEIRO.

Um dos argumentos suscitados para fins de justificar a “recategorização” do
Parque em questão é o de sua “adequação” à lei do SNUC.

Inicialmente, é de se destacar que a lei do SNUC, em seu art. 7.o. prevê dois
grupos de Unidades de Conservação, a saber

I - Unidades de Proteção Integral;
II - Unidades de Uso Sustentável.
Dentro do grupo das UC’s de Proteção Integral encontramos a categoria Parque
Nacional, em seu art. 8º, III, in verbis:
“Art. 8º - O grupo das Unidades de Proteção Integral é composto pelas seguintes
categorias de unidade de conservação:
(...)
III - Parque Nacional”;

“Art. 11 - O Parque Nacional tem como objetivo básico a preservação de ecossistemas
naturais de grande relevância ecológica e beleza cênica, possibilitando a realização de
pesquisas científicas e o desenvolvimento de atividades de educação e interpretação
ambiental, de recreação em contato com a natureza e de turismo ecológico.
(...)
§ 4º - As unidades dessa categoria, quando criadas pelo Estado ou Município, serão
denominadas, respectivamente, Parque Estadual e Parque Natural Municipal”.

A exemplo da legislação Federal, o Sistema Estadual de Unidades de Conservação –
SEUC, Lei Estadual n. 11.986, de 12 de novembro de 2.001, dispõe em seu art. 9º, III:

“Art. 9º - Compõem o Grupo das Unidades de Proteção Integral as seguintes:
III - Parque Estadual”;

“Art. 12º - O Parque Estadual tem como objetivo básico a preservação de ecossistemas
naturais de grande relevância ecológica e beleza cênica, possibilitando a realização de
pesquisas científicas e o desenvolvimento de atividades de educação e interpretação
ambiental, na recreação em contato com a natureza e ecoturismo”.

Quanto à regra de transição, visando a compatibilizar as UC criadas antes da lei do
SNUC, tem-se que:

“Art. 55 - As unidades de conservação e áreas protegidas criadas com base nas
legislações anteriores e que não pertençam às categorias previstas nesta Lei serão
reavaliadas, no todo ou em parte, no prazo de até dois anos, com o objetivo de definir
sua destinação com base na categoria e função para as quais foram criadas, conforme
o disposto no regulamento desta Lei” (grifa-se).

A exemplo do SNUC, o SEUC dispõe:

“Art. 55 - As Unidades de Conservação e demais áreas protegidas com base nas legislações
anteriores e que não pertençam às categorias previstas nesta Lei serão reavaliadas, no todo
ou em parte, no prazo de até dois anos da data da publicação desta Lei, com o objetivo de
definir sua destinação com base na categoria e função para as quais foram criadas,
adequando-as ao disposto nesta Lei e seus respectivos regulamentos”.

Desde sua criação, o Parque do Tabuleiro foi considerado de proteção integral, cujos
limites e possibilidades então previstos guardam compatibilidade com aqueles insculpidos na
lei do SNUC e SEUC. Verifica-se assim, que o mencionado Parque é unidade de conservação

de categoria prevista no SNUC e SEUC, plenamente recepcionado pela legislação nova, não
necessitando ser reavaliado.

2.3 MATÉRIA JÁ REGULADA.

Na mencionada minuta de projeto de lei, tem-se dispositivos regulando sobre a
titularidade das terras; visitação pública, pesquisa científica, gestão das UC, elaboração
de plano de manejo e regularização fundiária.
Data vênia, tais aspectos não podem constar de um projeto de lei que cria unidades de
conservação, vez que não corresponde ao locus jurídico apropriado para tal mister. Ademais, a
norma que dispõe sobre todos os aspectos citados já existe, tanto no âmbito federal (Lei
Federal n. 9.985/2000 que institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação – SNUC),
inclusive com decreto regulamentador, como no âmbito estadual (Lei Estadual n. 11.986/2001
que institui o Sistema Estadual de Unidades de Conservação – SEUC). Diz-se tratar de norma
especial que tem prevalência sobre outras normas mais genéricas, exatamente pelo critério da
especialidade.
Assim, ao abranger tais matérias no seu texto, a minuta sob comento foi absolutamente
infeliz, vez que tratou de matéria regulada e contraria a boa técnica jurídica legiferante, cuja
tautologia não deve merecer guarida pelo parlamento catarinense.
Ademais, quando tratou de definir a titularidade das terras, além de não esclarecer nada,
confundiu. Disse que as terras do Parque somente poderão ser terras públicas, o que vem a
ocorrer com o decreto de desapropriação de utilidade pública. Do modo como está redigido
permite várias interpretações: somente pertencerão ao Parque aquelas terras que já forem
públicas; ou pelo efeito da lei o Estado reconhece que todos os imóveis inseridos na poligonal
do parque são públicas e não indenizáveis, ou ainda, que as terras serão públicas e passíveis de
indenização se por ventura pertencerem a privados.
Em igual erro a minuta referida incorreu ao tratar de regularização fundiária e
populações tradicionais. Estas questões, dada as peculiaridades, devem ser tratadas de acordo
com a realidade, tanto que a FATMA já baixou Portaria regulando a ocupação da área do

Parque do Tabuleiro que ainda não foi indenizada. Regras gerais, como dito, já existem com
abrangência suficiente para amparar tanto a Administração quanto aos administrados. O artigo
12, por exemplo, contraria o SNUC e SEUC, quando em seu parágrafo 4º, diz que não será
tolerada qualquer invasão das áreas das Unidades de Conservação, porquanto “legaliza” ou ao
menos “tolera” as anteriores invasões nas áreas do Parque.

2.4 MEMORIAL DESCRITIVO DAS UC.

Aspecto relevante que foi negligenciado na minuta do projeto de lei diz respeito
a apresentação das delimitações de cada UC, apresentadas nos artigos 3º , 4º, 6.º e 7º, os quais
não trazem o adequado memorial descritivo, impossibilitando a correta localização da área.


2.5 ADMINISTRAÇÃO DAS UC.

Referente à Administração das UC’s, o artigo 8º da minuta do PL remete a
atribuição de gestão à Secretaria Estadual do Meio Ambiente, retirando da FATMA sua
competência institucional que tem início com sua fundação.
Preliminarmente, é de se esclarecer que em nosso Estado inexiste Secretaria do
Meio Ambiente, mas Secretaria de Estado do Desenvolvimento Sustentável, à qual a FATMA é vinculada.
Mais uma vez, a minuta do PL tratou de matéria já regulada por lei
complementar estadual, a qual definiu as atribuições de cada órgão, incluindo aí a Secretaria e a autarquia sob comento. Neste item, a proposição é ineficaz, vez que além de tratar matéria
estranha, não tem a possibilidade de suspender a eficácia de lei hierarquicamente superior.
Por fim, cumpre frisar que as legislações especiais sobre a matéria assim
qualificaram os órgãos e suas atribuições:

“Art. 6º O SNUC será gerido pelos seguintes órgãos, com as respectivas
atribuições:
I - Órgão consultivo e deliberativo: o Conselho Nacional do Meio Ambiente -
Conama, com as atribuições de acompanhar a implementação do Sistema;
II - Órgão central: o Ministério do Meio Ambiente, com a finalidade de coordenar
o Sistema; e
III - Órgãos executores: o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos
Recursos Naturais Renováveis - Ibama, os órgãos estaduais e municipais, com a
função de implementar o SNUC, subsidiar as propostas de criação e administrar as
unidades de conservação federais, estaduais e municipais, nas respectivas esferas
de atuação”.

Como visto, por disposição de lei federal, é a OEMA (organização estadual de meio
ambiente) e não a Secretaria o órgão executor do SNUC e, conseqüentemente, o órgão
responsável pela Administração das unidades de conservação estaduais.
Tentar burlar a lógica do sistema de unidades e conservação é, além de antijurídico, impedir a gestão das UC estaduais.

2.6 CRIAÇÃO DO FUNDO DE PRESERVAÇÃO AMBIENTAL.

Em seu artigo 14, a minuta do PL “cria o Fundo de Preservação Ambiental –
FPA”. Entretanto, criar um “fundo” por meio de uma lei que cria uma ou duas unidades de
conservação é de péssima técnica. A criação de fundo é matéria orçamentária, razão pela qual deve ser criada por lei específica.
Até o presente momento não há certeza administrativa quanto á necessidade de um
fundo para receber os recursos destinados às UC estaduais. É questão que deve ser examinada com mais propriedade. Ademais, a legislação atual já consagra o poder-dever do órgão gestor em administrar os recursos, consoante extrai-se da Lei do SNUC:

Art. 34. Os órgãos responsáveis pela administração das unidades de
conservação podem receber recursos ou doações de qualquer natureza, nacionais ou
internacionais, com ou sem encargos, provenientes de organizações privadas ou
públicas ou de pessoas físicas que desejarem colaborar com a sua conservação.

Parágrafo único. A administração dos recursos obtidos cabe ao órgão gestor da unidade, e estes serão utilizados exclusivamente na sua implantação, gestão e
manutenção.


Art. 35. Os recursos obtidos pelas unidades de conservação do Grupo de
Proteção Integral mediante a cobrança de taxa de visitação e outras rendas
decorrentes de arrecadação, serviços e atividades da própria unidade serão aplicados
de acordo com os seguintes critérios:

I - até cinqüenta por cento, e não menos que vinte e cinco por cento, na
implementação, manutenção e gestão da própria unidade;
II - até cinqüenta por cento, e não menos que vinte e cinco por cento, na
regularização fundiária das unidades de conservação do Grupo;
III - até cinqüenta por cento, e não menos que quinze por cento, na
implementação, manutenção e gestão de outras unidades de conservação do Grupo de
Proteção Integral.


Art. 36. Nos casos de licenciamento ambiental de empreendimentos de
significativo impacto ambiental, assim considerado pelo órgão ambiental competente,
com fundamento em estudo de impacto ambiental e respectivo relatório - EIA/RIMA, o
empreendedor é obrigado a apoiar a implantação e manutenção de unidade de
conservação do Grupo de Proteção Integral, de acordo com o disposto neste artigo e
no regulamento desta Lei”.

2.7 DEFICIÊNCIAS DE REDAÇÃO.

Dentre as diversas deficiências de redação, uma delas chama atenção pela
confusão que gera. O artigo primeiro da minuta do PL “cria” a APA Costeira do Maciambú, porém no parágrafo único do artigo 6º, refere-se a APA – Estadual Serra do Tabuleiro, ambas até agora inexistentes. Seriam criadas duas APAS’ pelo PL: Costeira do Maciambú e Serra do Tabuleiro???.

2.8 DO PARECER JURÍDICO.

Anexo ao Projeto de Lei, consta parecer jurídico emitido pela Subchefia Jurídica da
Casa Civil do Gabinete do Governador do Estado do Rio Grande do Sul.
Primeiramente, causa estranheza um parecer desta envergadura ser solicitado ao
governo do Rio Grande do Sul pelo Município de Palhoça-SC e não ao setor competente do Estado de Santa Catarina. Mais estranheza ainda há quando o Estado vizinho responde à consulta formulada. Afora este aspecto de não somenos importância administrativa, há que se verficar utilidade do mencionado parecer. Inicialmente, não se verifica razão especial para mencionado parecer figure como subsídio á proposta do “Movimento” pró-recategorização. Nem mesmo a alegação de que naquele Estado houve a experiência similar no ano de 2.004 justificam essa consulta. Lá, quando da criação do Parque Estadual do Delta do Jacuí, pelo Decreto estadual n. 24.385/76, não houve decreto declarando-o de utilidade pública e interesse social, condição esta sine qua non para que ele passasse para a propriedade e domínio do Estado.
Já o Parque Estadual Serra do Tabuleiro, ato contínuo a assinatura de sua criação,
obteve o Decreto Estadual n. 1.261, declarando-o de utilidade pública e interesse social, para fins de desapropriação, área de terra destinada ao Parque Estadual Serra do Tabuleiro.
Comparativamente, além de no Rs a área encontrar-se antropizada, havia vícios na
concepção do Parque, fato que corroborou para a sua recategorização. Todavia, este problema inexiste no Parque Estadual Serra do Tabuleiro, que foi criado obedecendo os ditames legais existentes à época.
O parecer em apreço bem coloca que a Lei n. 9.985/2000 não cria Unidades de
Conservação, somente estabelece medidas para a sua criação por ato do poder Público. Frise-se que o artigo 55 do SNUC (e 55 do SEUC) prevê a reavaliação das Unidades de
Conservação criadas anteriormente a ela, somente para os casos em que a categoria anterior não estiver contemplada pelo SNUC, in verbis:
Art. 55 - As unidades de conservação e áreas protegidas criadas com base nas
legislações anteriores e que não pertençam às categorias previstas nesta Lei serão
reavaliadas, no todo ou em parte, no prazo de até dois anos, com o objetivo de definir sua destinação com base na categoria e função para as quais foram criadas, conforme o disposto no regulamento desta Lei.

O que não ocorre in casu, vez que a categoria Parque permaneceu inalterada,
atendendo os preceitos da legislação federal e estadual vigente, dispensando qualquer espécie de reavaliação. Todavia, extrai-se do parecer mencionado um desconhecimento de sua autora, que às fls. 116, afirma que o ‘como categoria “parque” está desconforme à Lei Federal, porquanto “parque” pressupõe que toda a área seja pública, isso significa desapropriação e a correspondente indenização dos expropriados, bem como o cumprimento à regra do art. 42 que se refere às populações tradicionais residentes nas unidades de conservação....’

Tal afirmação reforça o total desconhecimento quanto a situação do Parque Estadual
Serra do Tabuleiro, onde inexiste população tradicional propriamente dita e cujo processo de desapropriação encontra-se em andamento.
Outra afirmação leviana do parecer, às fls. 117, é de que “Na hipótese em apreço
parece ser a melhor solução a transformação do Parque Estadual da Serra do Tabuleiro em Unidade de Conservação do tipo Área de Proteção Ambiental”.
Conforme já analisado nos itens anteriores, para que se chegue a uma conclusão de
desanexação, ainda que sob a forma de “recategorização”, são necessários estudos técnicos que façam a indicação. Fatos como “conflitos no interior ou entorno” da UC, ausência de indenização, omissões do Estado, etc, não são razões suficientes, per si, para fins de autorizar a diminuição de um parque. Logo, a conclusão acima transcrita foi açodada e desamparada de base legal.
No mais, o parecer mostrou-se inútil para fins de fundamentar a minuta do Pl em
questão, vez que s cingiu a repetir dispositivo jurídicos amplamente conhecidos.

III - CONCLUSÕES:

Ante o exposto, conclui-se que juridicamente, é inviável a desanexação ou mesmo
recategorização do Parque Estadual da Serra do Tabuleiro sem um estudo técnico que indique por esta possibilidade. Por conseguinte, qualquer estudo somente merecerá ser iniciado, vez que implica gastos públicos, se houver, no entendimento do órgão ambiental gestor, indícios justificadores.

Conclui-se ainda que:
a) poderá ser criada uma unidade de conservação contígua ao parque, inclusive uma
APA (municipal, estadual ou federal), a qual comporá um mosaico, desde que os preceitos previstos na lei do SNUC e SEUC seja observados;
b) que a minuta de projeto de lei apresentada pelo “Movimento Pró-Recategorização
do Parque Estadual da Serra do Tabuleiro” é absolutamente inviável, até mesmo para criar uma APA no entorno do Parque, vez que eivado de vícios e deficiências.

É o parecer.

RODE ANÉLIA MARTINS MARISTELA APARECIDA SILVA
OAB/SC 12.735 OAB/SC – 10.208

Um comentário:

Anônimo disse...

ESTOU TOTALMENTE ABISMADA QUE MESMO COM TODAS AS INDICAÇÕES ERRADAS QUE O ÓRGÃO SUPOSTAMENTE COMPETENTE TENHA DETECTADO NO DOCUMENTO QUE DEFENDE A RECATEGORIZAÇÃO, MESMO ASSIM OS SENHORES DEPUTADOS APROVARAM NA VOTAÇÃO DE QUARTA-FEIRA. PRECISAMOS URGENTEMENTE MUDAR NOSSA MANEIRA DE ELEGER ESSES INCOMPETENTES QUE VOTAM DE MANEIRA TÃO IRRESPONSÁVEL NUMA COISA DE SUMA IMPORTÂNCIA PARA NOSSO FUTURO.