Tamale, Gana, 17/8/2012 – Para amenizar a má colheita deste ano, o agricultor ganês Adams Seidu implantou uma estratégia de sobrevivência que chama de “um-zero-um”, para as crianças, e “zero-zero-um”, para os adultos. A equação representa as três refeições diárias, em que um é comer e zero e não ingerir nada. Os filhos de Seidu comem pela manhã, não almoçam e depois só comem alguma coisa à noite. Ele e sua mulher o fazem apenas uma vez por dia, à noite. Seidu, que mora em Fuo, subúrbio de Tamale, capital da região de Gana Setentrional, sofre problemas com as colheitas dos últimos anos.
O mesmo fazem outras famílias deste país da África ocidental, e em especial das comunidades rurais desta região, onde a escassez de alimentos é preocupante. Uma pesquisa sobre nutrição, realizada em março pelo Serviço de Saúde de Gana, mostra que 32,2% das 208.742 crianças menores de cinco anos desta região sofrem desnutrição, o que gera atrasos no crescimento e no desenvolvimento. As regiões de Gana Setentrional, Alta Gana Ocidental e Alta Gana Oriental costumam ser grandes produtoras de cereais e tubérculos, entre as dez em que o país é dividido administrativamente.
No entanto, as consequências da mudança climática na savana ganesa incluíram escassez de chuvas, menores colheitas e a consequente insegurança alimentar. “A última temporada foi um dos períodos mais devastadores e as perdas foram enormes para muitos agricultores porque a falta de chuvas fez com que os cultivos apodrecessem antes de amadurecer”, contou Seidu, que planta milho, arroz e inhame.
Em 2000 caíram 1.495 milímetros de água no distrito de Nanumba Norte, em Gana Setentrional, durante a estação chuvosa (abril-setembro). Dez anos depois, as precipitações baixaram para 433 milímetros na mesma temporada. As consequências são dramáticas porque Gana Setentrional é a terceira região mais povoada do país e onde 80% de seus moradores vivem da agricultura, segundo o Censo Nacional de População e Moradia de 2010. Metade dos agricultores desta zona tem dificuldades para sobreviver por causa da redução em suas colheitas, segundo o Serviço de Estatísticas de Gana.
Seidu só conseguiu três sacas de 84 quilos em cada um dos dois acres que cultivou este ano. “Há dois anos colhi sete. Algumas das plantas não floresceram, e muito menos deram frutos”, explicou à IPS. Estatísticas do escritório de Gana Setentrional do Ministério da Agricultura e Alimentação revelam que a produção de milho nesta região caiu de 164.200 toneladas, em 1991, para 78.800 toneladas, em 2000, ano dos últimos dados disponíveis.
O responsável pela Agência Meteorológica de Gana, Kafui Quashiga, disse à IPS que as chuvas diminuíram drasticamente devido à mudança climática nos últimos dez anos. As precipitações ficaram abaixo da média de 6.550 milímetros, que eram comuns no começo do século, segundo estatísticas desse órgão. “Ao comparar dados das precipitações entre 1991 e 2010 em Wa, em Alta Gana Ocidental, Tamale, em Gana Setentrional, Navorongo, em Alta Gana Oriental, e Krachie, em Volta, observa-se uma queda pronunciada, e é provável que a tendência se mantenha”, afirmou a agência.
Pobreza, analfabetismo, doenças e desnutrição são males comuns nessas áreas. “Devido às más colheitas dos últimos anos, só consegui mandar dois dos meus filhos à escola”, lamentou Seidu. O agricultor Nindoo Salisu, de 60 anos, também só pôde enviar três de seus dez filhos à escola. “O que retirávamos da terra nos bastava, até que o clima decidiu nos abandonar e nos deixar na pobreza”, contou à IPS. “A situação dá medo. Quanto antes se fizer algo, melhor, pois há consequências negativas sobre nossa existência como seres humanos”, pontuou Quashiga.
Os projetos de adaptação aos efeitos da mudança climática não conseguiram reverter a situação. Abubakar Sadique Haruna, agricultor de Gana Setentrional, aluga um trator para os camponeses da região. Com ajuda do Programa de Desenvolvimento Agrícola e Melhoria da Cadeia de valor (Advance), Haruna oferece o serviço de arado para cerca de 400 agricultores. O Advance, projeto financiado pela Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (Usaid), começou a funcionar em 2011. A iniciativa permitiu que cerca de mil agricultores recebessem ajuda e se capacitassem no uso de melhores sementes, novas tecnologias e melhores práticas agrícolas.
Haruna detalhou à IPS que, para cada acre arado, os agricultores pagam US$ 4, que dão para 4,5 litros de combustível, ou uma saca de milho no final da colheita. Além disso, Haruna oferece sementes de melhor qualidade, agroquímicos e fertilizantes, e ainda ensina os produtores melhores práticas agrícolas para ajudá-los a aumentar sua produção. “O problema é que alguns agricultores não podem comprar os agroquímicos depois de pagarem o arado”, indicou. O ano passado não foi bom para os agricultores, pois cerca de 200 clientes não puderam pagar pela aragem de suas terras, acrescentou.
O responsável pela supervisão e avaliação do Ministério da Agricultura e Alimentação, Festus Aaron Langkuu, disse à IPS que em algumas áreas estão sendo testados novos métodos para coletar água. As represas de Golinga e Bontanga, em Gana Setentrional, foram recuperadas em 2010, dentro de um projeto relacionado aos Objetivos de Desenvolvimento do Milênio, e oferecem água a alguns agricultores, afirmou. “O governo ajuda alguns produtores com fertilizantes, mas se não chove não podem cultivar e o objetivo de reduzir a pobreza acaba desbaratado”, ressaltou.
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FONTE : Envolverde/IPS
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