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sexta-feira, 24 de agosto de 2012
A demografia do decrescimento, artigo de José Eustáquio Diniz Alves
[EcoDebate] Durante 200 mil anos, desde o surgimento do homo sapiens, houve crescimento do número de habitantes do mundo. Pode ter havido recuos em alguns lugares e até civilizações locais podem ter desaparecido, mas nas contas globais, o crescimento foi contínuo e passou a ser exponencial nos últimos 250 anos. Por conta disto, a demografia é uma ciência que se acostumou com o crescimento.
A pirâmide populacional (formato egípicio) tinha cada grupo etário quinquenal inferior maior do que o imediatamente superior. A estrutura etária jovem fazia com que as políticas públicas se preocupassem somente com a expansão das suas metas. Vale dizer: maior número de maternidades e pediatrias, mais escolas, mais moradias, mais empregos, mais estradas, mais consumo, etc.
Porém, depois de 200 anos de crescimento econômico e populacional exponencial, o mundo já ultrapassou as fronteiras planetárias e os limites da biocapacidade. A pegada ecológica já é maior do que a capacidade regenerativa da Terra. A humanidade já chegou a um ponto que só se mantém devido aos recursos fósseis ou a riqueza acumulada nos oceanos, terras, florestas, etc. Mas na taxa atual de uso, estas riquezas estão sendo sobrexploradas e degradadas. Desta forma, a possíbilidade de um colapso ambiental global é cada vez mais real.
Os economistas clássicos sabiam que era impossível manter indefinidamente o crescimento econômico e populacional. Por isto falavam em Estado Estacionário. Mas tudo indica que as fronteiras planetárias vão ser superadas e depois de um pico populacional e econômico deve haver um decrescimento.
Se a população se estabilizar e depois iniciar uma fase de declínio, então os estudos populacionais deixarão de ser uma disciplina orientada para a análise das situações de crescimento e surgirá uma demografia do decrescimento. Pode ser, de maneira forçada, o começo de um mundo com menos consumo e menos lixo.
Ao invés de planejar cada vez mais maternidades, escolas e empregos haverá o planejamento de menos nascimentos, menos estudantes e menos trabalhadores entrando na força de trabalho. O déficit habitacional dará lugar à ociosidade dos domicílios, com reaproveitamento de prédios e novas formas de uso das moradias.
Mas uma das tarefas mais difíceis será lidar com o sistema de repartição simples da previdência social, pois este sistema pressupõe que haja um fluxo crescente de pessoas em idade de trabalhar para sustentar o fluxo crescente de pessoas idosas e em condições de inatividade econômica. Para manter o mesmo padrão de vida, o grupo de idoso precisa ser sustentado pelo grupo de adultos produtivos. Se estes últimos diminuirem, a única forma de manter o padrão de vida dos idosos é um grande aumento da produtividade do trabalho.
Todavia, a produtividade, em geral, depende da expansão da economia. Produzir mais com menos fica cada vez mais comprometido quando há uma população em declínio e uma carga maior de dependência provocada pelo envelhecimento populacional.
Portanto, a demografia do decrescimento vai ter um grande desafio prático e teórico pela frente. Mas é bom começar a pensar nisto, pois o envelhecimento populacional só será inevitável se alguém descobrir o “elixir da longa vida” (isto é, conseguir manter um crescimento infinito). Quanto mais rápido for o envelhecimento – decorrente de uma maior queda das taxas de fecundidade – maior vai ser o decrescimento futuro da população.
A demografia do decrescimento será o estudo da pirâmide populacional invertida. Isto vai dar o que pensar, assim com será preciso pensar novos objetivos para as políticas públicas, que não seja só crescimento. O mundo, provavelmente, em breve vai virar de cabeça para baixo.
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FONTE : José Eustáquio Diniz Alves, Colunista do Portal EcoDebate, Doutor em demografia e professor titular do mestrado em Estudos Populacionais e Pesquisas Sociais da Escola Nacional de Ciências Estatísticas – ENCE/IBGE; Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br
EcoDebate, 21/08/2012
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