Os efeitos nocivos do aquecimento global não são novidade para ninguém. O que poucos sabem, porém, é que o problema pode ser muito mais antigo do que se acredita, tendo início séculos antes da Revolução Industrial. Estudo do Instituto de Pesquisas Energéticas e Nucleares (Ipen), da Universidade de São Paulo (USP), indica que muito antes da construção da primeira fábrica alimentada por combustíveis fósseis, problemas climáticos já faziam vítimas.
A pesquisa, resultado da dissertação de mestrado da advogada Aretha Sanchez e intitulada Atividades humanas e mudanças climático-ambientais: uma relação inevitável, indica que algumas civilizações — como os maias, das Américas do Norte e Central; os mochicas, do Peru; e os acádios, do Oriente Médio — tiveram sua decadência e extinção relacionadas a mudanças climáticas nos ambientes em que viviam. “O homem, para se desenvolver, teve de remanejar e interferir no meio ambiente. Essa interferência ocorreu por meio do desenvolvimento da agricultura, da pecuária e do desflorestamento, o que liberou gases poluentes na atmosfera”, afirma Aretha. Reportagem no Correio Braziliense.
Embora em escala bem menor, essas civilizações utilizaram práticas comuns e difundidas nos dias de hoje, como o desmatamento e a alteração dos cursos de água. A superpopulação de certas áreas também contribuiu decisivamente para as alterações ambientais, que trouxeram consequências negativas no clima de suas regiões (veja quadro). Além disso, nos locais onde as três civilizações viveram, o solo é considerado pobre, o que estimulou a busca por novas áreas agricultáveis. “Na época das primeiras interferências, as populações não tinham consciência de que essas ações pudessem levá-las à extinção”, explica a estudiosa.
Estima-se que, devido à ação dessas e de outras civilizações, a temperatura média na Europa e na América do Norte tenha sofrido elevação de 4ºC. “Apesar de o aumento de temperatura ter sido regional, podemos falar que foi causado pela interferência do homem no meio ambiente. Evidentemente, trata-se de um ‘aquecimento global’ em escala menor, se comparado aos problemas climáticos atuais”, argumenta Aretha.
Cautela
A professora do departamento de História da Universidade de Brasília (UnB) Tânia Navarro-Swain ressalta que é preciso cautela ao analisar as causas do desaparecimento dessas culturas. “Sobre os maias, por exemplo, ainda sabemos muito pouco. Começamos agora a desvendar sua escrita, assim não é possível ter certeza de que as teorias que ligam o seu desaparecimento às questões ambientais estejam corretas”, pondera.
A historiadora lembra ainda que a maneira como eles se relacionavam com a natureza pode ser muito diferente da nossa. “Eles não tinham a agressividade no uso dos recursos naturais como hoje. Ainda há muito por estudar e descobrir antes de se chegar a alguma conclusão mais consistente”, afirma.
Mesmo que as teorias da pesquisadora do Ipen estejam corretas, isso não significa que a civilização atual esteja certamente condenada ao mesmo fim. “A grande vantagem da população atual é o conhecimento que existe sobre a interferência humana no meio ambiente e, consequentemente, no clima”, avalia Aretha. “Assim, mudanças de hábitos de consumo e a alteração da legislação ambiental são pontos que devem ser postos em prática, visando a um futuro sustentável”, completa.
Leia a íntegra do estudo de Aretha Sanchez
http://stat.correioweb.com.br/cbonline/2010_01/ArethaSanchez.pdf
» Três perguntas para Aretha Sanchez, pesquisadora
Algumas civilizações (Maias, Acádios, Mochicas) teriam entrado em colapso por causa de mudanças climáticas. Como isso teria acontecido?
As civilizações, para se desenvolverem, remanejaram o meio ambiente localmente. Na época, ocorreram mudanças climáticas regionais, que se acreditava terem sido ocasionadas por fatores naturais. No entanto, determinadas mudanças ocorreram em momentos específicos de desenvolvimento do homem. Os maias, os mochicas e os acádios, entre outros, desapareceram exatamente quando o clima local foi alterado. Como os problemas enfrentados eram regionais, essas alterações não foram levadas, até o momento, em consideração.
A senhora acredita que, diferentemente dessas civilizações, podemos nos desenvolver e, ao mesmo tempo, preservar o meio ambiente?
A civilização atual tem o conhecimento de que nossas atitudes podem contribuir com alterações climáticas catastróficas. Então, acredito que mudanças de hábitos buscando um futuro melhor, como a redução do consumo e do uso de água e energia elétrica, poderemos continuar nos desenvolvendo. Os governantes têm de tomar consciência de que, se não houver mudanças na forma como vivemos, a Terra pode entrar em colapso.
Na opinião da senhora, o conhecimento que temos atualmente pode influenciar positivamente para a diminuição dos efeitos das mudanças climáticas?
A grande vantagem da população atual é o conhecimento que temos sobre a interferência humana no meio ambiente e, consequentemente, no clima. Assim, mudanças de hábitos de consumo individual, alteração da legislação ambiental, controle dos abusos contra o meio ambiente, educação ambiental, política ambiental, entre outros, são pontos que devem ser pensados e desenvolvidos visando a um futuro sustentável.
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FONTE : EcoDebate, 25/01/2010
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