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quarta-feira, 10 de junho de 2009
SEDUZIDOS PELA QUÍMICA - Montserrat Martins
"Fazemos cada vez mais cesáreas e menos partos naturais, nas cólicas dos bebês damos remédios derivados do ópio ao invés de massagens, temos cada vez menos tempo para o contato pessoal, enquanto a indústria farmacêutica já é a segunda maior do mundo... São sintomas de uma sociedade voltada para o prazer imediato, sem usar a razão e a sabedoria, que recorre cada vez mais a substâncias e dedica menos tempo para os relacionamentos".
(Renato Termignoni, Professor de Pediatria da UFGRS, em palestra aberta ao público)
Há uma "química" da paixão, as emoções despertam reações intensas em todo o nosso organismo. O corpo humano é uma fantástica "fábrica química" das mais diversas substâncias, produzindo desde adrenalina em momentos de estresse até endorfina em situações saudáveis. Mas a mesma ciência que desvenda - e mostra como é poderosa - a nossa "química natural", também nos oferece inúmeras substâncias, sintetizadas em laboratório, para lidarmos com essas mesmas emoções.
A sensação de prazer é sempre sedutora, seja produzida por meios naturais ou artificiais. Grandes mestres da Medcina, como Mário Rigatto, já apontavam no século passado que o progresso científico conduzia às mais diversas tentativas de "calote na natureza", tais como comer e não engordar, ter saúde sem exercícios, sermos felizes sem maior esforço. E a "pílula da felicidade" é uma fantasia eterna da humanidade, como é o caso do "soma" que todos tomam em "Admirável Mundo Novo", de Aldous Huxley.
Não são os usuários de crack, portanto, os primeiros a sucumbir à sedução das drogas, em troca de momentos de prazer. A busca de soluções "mágicas e instantâneas" para a infelicidade, ou para o vazio existencial, acompanha a história das civilizações e de suas culturas. No século XIX, grande parte da população chinesa foi dominada pelo ópio, motivo de duas guerras com os britânicos. A própria cocaína, de onde deriva o crack, foi refinada pela primeira vez em 1857, por uma indústria farmacêutica alemã. Freud, entre outros médicos da época, tinha grandes esperanças nela como anestésico e ela foi usada como tratamento antidepressivo, antes de ser proibida por seus efeitos nocivos.
Há correlação, ainda (comprovada por pesquisas) entre o uso de drogas e a ausência paterna. O que implica também numa questão cultural, pois nossa sociedade tem aceitado, passivamente, que das relações desfeitas os filhos fiquem sob a responsabilidade só das mães. Diga-se, de passagem, que isso faz parte de um "arranjo cultural" que não se deve só ao abandono por parte do pai, mas também ao apego por parte da mãe, pois já se conhece hoje o mecanismo da chamada "alienação parental", onde com frequencia a genitora se sente mais livre para o exercício de sua maternidade com o afastamento do genitor, sem perceber o prejuízo emocional para os filhos.
Questões afetivas e familiares (como a exemplificada acima) são como um "vespeiro" em que evitamos mexer. Nós, os médicos, também fazemos parte dessa cultura: nos sentimos capazes e úteis quando fazemos diagnósticos precisos cada vez mais precoces, de que uma criança é "hiperativa" ou até mesmo "bipolar", para prescrevermos psicofármacos eficazes. Os próprios pacientes nos pedem soluções químicas para suas vidas e nessa área somos autoridades competentes para resolver seus problemas. Também somos "seduzidos pela química".
O despertar da sociedade contra a tragédia das drogas - a começar pela conscientização contra o álcool no trânsito e agora, na oportuna campanha contra o crack - pode nos levar a aproveitar, quem sabe, a sabedoria de grandes mestres da Medicina, que nos ensinaram as melhores potencialidades do nosso corpo e das nossas emoções para que, um dia, quando pensarmos que estamos "seduzidos pela química", estivermos falando de casais de namorados.
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Autor : Montserrat Martins, médico psiquiatra, PORTO ALEGRE,RS
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Um comentário:
From: "Montserrat Antônio de Vasconcelos Martins"
Sent: Wednesday, June 10, 2009 11:44 AM
To: jamespizarro@hotmail.com>
Subject: COMPORTAMENTO - Seduzidos pela química
Ao prof. James Pizarro,
Encaminho a coluna Comportamento desta semana (abaixo)
colocando-a à disposição para os seus blogs
www.antesqueanaturezamorra.blogspot.com
e www.professorpizarro.blogspot.com
Abraços fraternos,
Montserrat
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