1. O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SANTA CATARINA, representado pelo Promotor de Justiça em exercício nesta Vara, no uso das atribuições que lhe conferem o art. 129, I, da Constituição da República, e o art. 25, III, da Lei 8.635/93, ofereceu Denúncia baseada em Inquérito Policial, nos termos do art. 100, § 1º, do CP e dos arts. 24 e 41, do CPP, contra JULIO CESAR DO PRADO, já qualificado, como incurso nas sanções do art. 67 e 68, da Lei 9.605/98, por duas vezes, pela prática dos fatos delituosos assim descritos na peça acusatória:
No dia 2 de março de 2004, em vistoria realizada no imóvel da FUNOESC, os agentes da Polícia Ambiental constataram que na Rua José Firmo Bernardi, no Bairro Flor da Serra, mais precisamente entre as coordenadas geográficas S27º09'40.3"W051º31'22.5" e S27º09'32.8 W051º31'17.5", a Universidade do Oeste de Santa Catarina, por seus dirigentes e prepostos, haviam iniciado a preparação do terreno com roçadas, movimentação de terras e destruição da mata ciliar, tudo sem licença ambiental. (Vide, a propósito, o boletim, conjunto de fotografias, croqui e relatório inclusos). O projeto e memorial descritivo do empreendimento, catalogado como atividade potencialmente poluidora, encontram-se a fls. 16/30, consistindo na construção de 2 (duas) quadras de voleibol, 2 (duas) quadras de tênis de campo, 1 (um) campo de futebol suíço, canchas de bocha, vestiários coletivos, churrasqueiras, estacionamentos, açudes e trilha ecológica. Assim foi que, autuados por prática de infração ambiental, no dia 3 de março de 2004, a UNOESC, por intermédio de seu representante legal, requereu a Licença Ambiental Prévia – LAP (fls. 72/90). No dia seguinte, protocolou o pedido de expedição das Licenças Ambientais de Instalação e de Operação (LAI e LAO) – fls. 91/92. Em função desses requerimentos, no dia 4 de março de 2004, o Engenheiro Florestal lotado na Coordenadoria Regional do Meio Ambiente vistoriou o local dos fatos, atestando ao seu Diretor-Regional que houve a execução de obras de terraplenagem, da qual derivou a derrubada de espécies nativas, inclusive em área de preservação permanente (Parecer técnico de fl. 112. Sugeriu, pois, a expedição da licença ambiental para terraplanagem fosse condicionada à prévia apresentação de projeto de recuperação da área degradada. Malgrado ciente da consumação do dano ambiental relatado no estudo técnico apresentado pelo seu agente florestal, no dia 5 de março de 2004 o denunciado expediu a Licença Ambiental Prévia – LAP n. 0201/2004 (fl. 101), dispensando o empreendedor da Licença Ambiental de Instalação LAI para atividade de terraplanagem, em desacordo com as normas ambientais previstas no art. 38,39,50, primeira parte, 66,67 e 68 da Lei n. 9.605/98 e o art. 1º e par. Ùnico do Decreto n. 750/93. No dia 5 de abril de 2004, contrariando o parecer técnico de seu agente fiscal e as normas ambientais acima citadas, e deixando de cumprir obrigação de seu relevante interesse ambiental inerente ao seu cargo e ofício, previstos no art. 6º da Lei n. 6.938/81, art. 17 Decreto Federal n. 99.274/90, na Lei Estadual n. 3.572/98, ou seja, o de lavrar Termo de Embargo, autuar ou mandar autuar os infratores por prática de delito ambiental, o denunciado expediu a Licença Ambiental Prévia n. 0347/2004 (fl. 113), declarando a viabilidade do Parque Universitário, catalogado no item 71.70.10, da Portaria Intersetorial n. 01/2004 como atividade potencialmente causadora de degradação ambiental. Com tal conduta o denunciado procurou legitimar o dano ambiental já consumado. Note-se que o denunciado agiu com vontade e consciência de cometer crimes contra a administração ambiental, pois que sabia de antemão que a expedição das licenças acarretaria dano ao meio ambiente natural. É que, de posse das licenças, no dia 20 de maio de 2004 a FUNOESC, por seus prepostos, foi novamente flagrada no imóvel acima descriminado, promovendo roçada de vegetação nativa e destruindo a mata ciliar em área que, por força do disposto no art. 3º, do Decreto Federal n. 750/93, é considerada Mata Atlântica.
Requereu o recebimento da peça acusatória, com a instauração da competente Ação Penal; a citação do denunciado para interrogatório e demais atos do processo penal, bem como a inquirição das testemunhas que arrolou, para que ao final fosse julgada procedente a Denúncia, condenando o réu às penas dos crimes do art. 67 e 68 da Lei n.º 9.605/98, com todos os seus consectários legais, especialmente a perda do cargo e função pública prevista no art. 92, I, letra "a", do Código Penal.
Recebida a denúncia, foi designado, desde logo, o dia para interrogatório do acusado.
Devidamente citado, o acusado compareceu a audiência, sendo então interrogado às fls. 291-292, tendo seu defensor constituído apresentado defesa prévia às fls. 293-294.
Na instrução, foram inquiridas 3 (três) testemunhas arroladas na denúncia e 1 (um) testemunha de defesa, dando-se por encerrada a instrução do feito.
Em alegações finais, o representante do Ministério Público pugnou pela condenação do acusado nos termos da peça acusatória, bem como pela aplicação de multa na forma prevista no art. 18 da Lei n. 9.605/98, ao passo que a defesa postulou pela sua absolvição, sob argumento de que não há prova da existência do crime, uma vez que não demonstrado pelo Ministério Público que as licenças ambientais foram expedidas contrariando normas legais.
Por derradeiro, o acusado juntou aos autos cópia da sentença prolatada nos autos da Ação Civil Pública n.º 037.05.003542-4, onde o réu foi absolvido de imputações de improbidade, decorrentes dos mesmos fatos descritos na inicial, sendo um dos argumentos o fato do dano ambiental acobertado pelos atos administrativos do réu também o terem sido pelas condições da suspensão condicional do processo oferecidas pelo próprio Ministério Público com base nos estudos aceitos pelos réu dentro do processo de licenciamento na FATMA (sentença de improcedência de ACP, proposta pelo Promotor de Justiça MIGUEL LUÍS GNIGLER, às fls. 352/362, sem notícia de recurso do Ministério Público).
Vieram os autos conclusos e etiquetados com a expressão "prescreve em 4: 07/07/09", após inicialmente dados como não encontrados.
É o relatório.
DECIDO.
2. Dispõem os arts. 67 e 68 da Lei n. 9.605/98:
Art. 67. Conceder o funcionário público licença, autorização ou permissão em desacordo com as normas ambientais, para as atividades, obras ou serviços cuja realização depende de ato autorizativo do Poder Público:
Pena - detenção, de um a três anos, e multa.
Parágrafo único. Se o crime é culposo, a pena é de três meses a um ano de detenção, sem prejuízo da multa.
Art. 68. Deixar, aquele que tiver o dever legal ou contratual de fazê-lo, de cumprir obrigação de relevante interesse ambiental:
Pena - detenção, de um a três anos, e multa.
Parágrafo único. Se o crime é culposo, a pena é de três meses a um ano, sem prejuízo da multa.
Comentando o art. 67 da Lei n. 9.605/98, LUIZ REGIS PRADO menciona que o "O núcleo do tipo é o verbo conceder, que significa dar, outorgar. Incrimina-se a concessão, pelo funcionário público (cf art. 327, CP), de licença, autorização ou permissão "em desacordo com as normas ambientais que disciplinam a matéria" (elemento normativo do tipo, relativo à ausência de causa de justificação), para a realização de atividades, obras ou serviços cuja realização depende de ato autorizativo (licença, autorização ou permissão) do Poder Público (federal, estadual ou municipal)." (Direito Penal do Ambiente. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 535-536)
Já sobre o delito previsto no art. 68, aduz que "o núcleo do tipo é o verbo deixar, que aqui adquire o sentido de abster-se de algo, omitir-se do cumprimento (realização, prática) de obrigação de relevante interesse ambiental – expressão por demais genérica. A obrigação deve, pois, revestir-se de importância para o normal andamento da administração ambiental."
Tais crimes só podem ser praticados por funcionário público, condição esta que restou demonstrada nos autos, uma vez que o acusado à época ocupava o cargo comissionado de Coordenador Regional da Fundação do Meio Ambiente – FATMA.
No que concerne aos crimes praticados por funcionários públicos descritos na Lei n. 9.605/98, esclarece VICENTE GOMES DA SILVA: Como se pode ver nos arts. 66, 67, 68 e 69, da Lei de Crimes Ambientais, o legislador introduziu crime contra a administração ambiental, isto é, o funcionário que fizer afirmação falsa ou enganosa, omitir a verdade, sonegar informações ou dados técnico-científicos em procedimentos de autorização ou de licenciamento ambiental, conceder licença, autorização ou permissão em desacordo com as normas, deixar de cumprir as obrigações de relevante interesse ambiental e obstar ou dificultar a ação fiscalizadora (Legislação Ambiental Comentada. 2. ed., Belo Horizonte: Fórum, 2004. p. 140).
3. Dito isto, passemos a análise dos fatos narrados na denúncia.
Do crime previsto no art. 67 da Lei n. 9.605/98 - Apesar dos argumentos da douta da defesa, e da respeitável sentença cível nos autos, tenho que a materialidade, bem como a autoria delitiva, estão estampadas, pois as Licenças Ambientais Prévias de fls. 222 e 270, expedidas pelo réu, o foram em dissonância das normas ambientais vigentes, e até mesmo do parecer exarado pelo Engenheiro Florestal da FATMA, de fl. 116.
Consigno, incialmente, que o delito ora analisado não leva em conta se o dano ambiental já fora ou não praticado, uma vez que a conduta delituosa consiste na concessão de licença em descordo com as normas ambientais.
Sobre o objeto da Licença Ambiental Prévia – LAP, preceitua o art. 8º, I, da Resolução n.º 237/1997, do Conselho Nacional do Meio Ambiente - CONAMA, vejamos:
Art. 8º - O Poder Público, no exercício de sua competência de controle, expedirá as seguintes licenças:
I - Licença Prévia (LP) concedida na fase preliminar do planejamento do empreendimento ou atividade aprovando sua localização e concepção, atestando a viabilidade ambiental e estabelecendo os requisitos básicos e condicionantes a serem atendidos nas próximas fases de sua implementação; (...)
Segundo ensina AMÉRICO LUÍS MARTINS DA SILVA "A Licença Prévia – LP deve ser fundamentada em informações formalmente prestadas pelo interessado, específica as condições básicas a serem atendidas durante a instalação e funcionamento do equipamento ou atividade poluidora. Sua concessão implica compromisso da entidade poluidora de manter o projeto final compatível com as condições do deferimento." (Direito do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 628)
Em consulta ao site da FATMA, no link licenciamento ambiental, observa-se que "a LAP não autoriza a construção da obra, apenas atesta sua viabilidade naquele local." (Disponível em:
Portanto, se a licença expedida não possuía o condão de permitir o início da construção do empreendimento, tampouco a continuidade das obras interditadas de terraplanagem, uma vez que tais obras condicionadas à autorização da FATMA só poderiam ter início após a expedição da licença ambiental de instalação – LAI, e do levantamento formal da interdição.
Sobre a necessidade de expedição de licença ambiental, dispõe o art. 10 da Lei 6.938/81:
Art. 10 - A construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimentos e atividades utilizadoras de recursos ambientais, considerados efetiva e potencialmente poluidores, bem como os capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental, dependerão de prévio licenciamento de órgão estadual competente, integrante do Sistema Nacional do Meio Ambiente - SISNAMA, e do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis - IBAMA, em caráter supletivo, sem prejuízo de outras licenças exigíveis.
Consta no verso da LAI de fl. 222 que a Licença Ambiental de Instalação foi dispensada. Porém, não há fundamento legal que permita tamanha desconsideração com o meio ambiente, haja vista possuírem objetos distintos, pois a LAI permite o início dos trabalhos de construção ao passo que a LAP, tão-somente, atesta a viabilidade do empreendimento. Como se vê, uma é requisito da outra, pois possuem análise diferenciada em função das peculiaridades que cada etapa acarreta, não podendo a Licença Ambiental Prévia exceder sua competência e permitir o início das atividades de construção.
No caso em apreço, verifica-se que os trabalhos de terraplanagem já haviam se iniciado antes mesmo da expedição da Licença Ambiental Prévia, tendo o réu mencionado que esta poderia dispensar a Licença Ambiental de Instalação, o que se presume tenha feito em razão da consolidação dos serviços realizados.
Contudo, quando da expedição da segunda Licença Ambiental Prévia (fl. 270) que deveria somente "viabilizar" o empreendimento da FUNOESC, observa-se que as obras ainda não haviam sido iniciadas, não possuindo o réu o mesmo motivo para dispensar a Licença Ambiental de Instalação, o que demonstra sua intenção em viabilizar e legalizar no menor tempo possível as obras a serem realizadas pela FUNOESC.
Conforme constava na então vigente Portaria Estadual Intersetorial SDS/FATMA n.º 1/04, publicada do DOSC em 24/03/04, várias das atividades realizadas pela FUNOESC para a implementação do empreendimento de vulto podiam ser enquadradas como atividades potencialmente causadoras de degradação ambiental em mais de um item, especialmente o 71.70.10, de maneira que a inafastável exigência da expedição da licença deveria ter sido cercada de cuidados e rigores que assegurassem a preservação do meio ambiente, observando os princípios que regem não só o Direito Ambiental, mas o Direito Administrativo.
Frise-se, ainda, que os autos tratam da degradação de uma expressiva área constituída de mata fechada, com áreas de preservação permanente em função de curso d'água, essa na qual se deram as obras encampadas ilegalmente pelo réu, à margem da sujeição à legislação, tanto que por isso interditada pela Polícia Ambiental. Infrações promovidas justamente por uma instituição de ensino superior, cujos quadros não podiam alegar desconhecimento, incapacidade técnica etc., e que certamente desrespeitaram a interdição e ainda alcançaram o "licenciamento" em função de seu prestígio na sociedade joaçabense.
Ora, a necessidade do licenciamento, da intervenção prévia da FATMA, do Estado, em tempos onde os jornais noticiam fenômenos climáticos catastróficos contra o homem oriundos da devastação ao meio ambiente já é de compreensão comum a todos.
Sobre a supremacia da manutenção do meio ambiente equilibrado em face dos interesses menores, como os da FUNOESC no caso do autos, assim se manifestou o STJ: "(...) O confronto entre o direito ao desenvolvimento e os princípios do direito ambiental deve receber solução em prol do último, haja vista a finalidade que este tem de preservar a qualidade da vida humana na face da terra. O seu objetivo central é proteger patrimônio pertencente às presentes e futuras gerações." (STJ, Resp. 588022/SC, Min. JOSÉ DELGADO, DJ de 17.2.04)
Diante da necessidade da efetiva proteção do meio ambiente, cabia e cabe permanentemente ainda aos órgãos públicos adotar conduta compatível com as atividades poluidoras implementadas, coibindo de forma efetiva a degradação ambiental, inicialmente, pelo licenciamento ambiental, não resumindo suas atividades à expedição apressada de papéis padronizados, que encerram em uma única folha A4 previsões genéricas, metas abstratas, meras promessas patéticas de preservação de árvores, matas etc, quando o próprio documento serve justamente para condicionar sua exploração, o que somente estudos concatenados lógica e cronologicamente podem fixar os modos no tempo e no espaço atendendo ao escopo do licenciamento.
O licenciamento ambiental é um processo administrativo, composto por diversos atos, mais complexo porque científico, impossível de ser realizado em poucos dias, como o fora por obra do réu. É um processo que não se destina a uma autorização ou uma desautorização sumária, mas sim à fixação de limites, de espaços, de montantes, de métodos e soluções prevencionistas.
Disso decorre, conceitualmente, que pelo fato do licença ter sido expedida com a rapidez como que se deu, que há um indício seguro da prática dos crimes descritos na denúncia.
Sobre os documentos exigidos para a expedição de licenças, preceitua o art. 3º da Resolução 237/1997 alhures mencionada:
Art. 3º - A licença ambiental para empreendimentos e atividades consideradas efetiva ou potencialmente causadoras de significativa degradação do meio dependerá de prévio estudo de impacto ambiental e respectivo relatório de impacto sobre o meio ambiente (EIA/RIMA), ao qual dar-se-á publicidade, garantida a realização de audiências públicas, quando couber, de acordo com a regulamentação (...)
No mesmo sentido, o artigo 2º da Resolução n. 01/86 do CONAMA, já estabelecia que "dependerá de elaboração de estudo de impacto ambiental e respectivo relatório de impacto ambiental – RIMA, a serem submetidos à aprovação do órgão estadual competente, e do IBAMA em caráter supletivo, o licenciamento de atividades modificadoras do meio ambiente [...]."
Ensina ÁLVARO LUIZ VALERY MIRRA, que "o EIA é condição para o licenciamento de obras e atividades potencialmente causadoras de 'significativa degradação do meio ambiente' e não de qualquer empreendimento degradador. Toda atividade ou obra sujeita a estudo de impacto ambiental está também sujeita a licenciamento ambiental." (Impacto Ambiental aspectos da Legislação brasileira. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2002. p. 33)
Portanto, verificada que a atividade a ser realizada enquadrava-se naquelas tidas como potencialmente causadora de degradação ambiental, cabia ao réu exigir do empreendedor a apresentação do EIA, bem como o RIMA, para então, verificada a viabilidade, expedir a necessária LAP.
Segundo AMÉRICO LUÍS MARTINS DA SILVA os requisitos para a obtenção da LAP são: "1. Apresentação de requerimento de Licença Prévia – LP, em formulário de "Pedido de Licença"; 2.Cópia da publicação de pedido de Licença Prévia, (...). 3. apresentação de estudos ambientais (Estudo de Impacto Ambiental – EIA/Relatório de Impacto Ambiental – RIMA)." (Direito do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 628)
Corroborando este entendimento lecionam CELSO ANTONIO PACHECO FIORILLO e MARCELO ABELHA RODRIGUES:
b) Sendo a atividade de significativa impactação ao meio ambiente, então o EIA/RIMA é obrigatório, pois assim determina a CF; como se é feito o EIA/RIMA e este se mostra totalmente favorável, há o direito do empreendedor de ter a licença ambiental e, portanto desenvolver a sua atividade d) Se é feito o EIA/RIMA e este se mostra desfavorável, totalmente ou em parte, então caberá à Administração Pública sopesar segundo critérios de conveniência e oportunidade, se será ou não concedida a licença (Manual de Direito Ambiental. 2ª ed.. São Paulo: Max Limonad, 1999. p. 213).
A definição de EIA e RIMA, encontra-se descrita no próprio sítio da FATMA na internet:
Quando analisa as solicitações de Licença Ambiental Prévia - LAP, a Fatma pode verificar que a atividade a ser licenciada está inserida na Relação de Atividades Potencialmente Poluidoras, emitida pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente. Se isto ocorrer, será exigido do empreendedor a apresentação dos:
- Estudos de Impacto Ambiental - EIA
O EIA é um diagnóstico detalhado das condições ambientais da área de influência do projeto antes de sua implantação. Deve considerar o solo, o subsolo, o ar, as águas, o clima, as formas de vida, os ecossistemas naturais e o meio sócio-econômico. A análise das consequências de sua implantação e de sua não implantação. Os impactos positivos e negativos, as medidas amenizadoras desses impactos e suas formas de acompanhamento e monitoramento.
- Relatório de Impacto sobre o Meio Ambiente - RIMA
O RIMA deverá conter as conclusões do estudo, demonstrando em linguagem acessível à toda a comunidade todas as vantagens e desvantagens, ambientais, sociais e econômicas. Deve-se valer de quadros, tabelas, audiovisuais e simulações que facilitem a sua compreensão. Como norma, ficarão à disposição das pessoas interessadas, tanto na Biblioteca da Fatma, quanto na Biblioteca Pública da região.
Desta forma, para que uma licença ambiental seja expedida, necessário que os requisitos acima mencionados estejam cumpridos.
Fazendo uma análise dos fatos ocorridos, verifica-se a obra de terraplanagem que ensejou a licença ambiental de fl. 33, datada de 05/03/2004, foi embargada no dia 02/03/2004, pois verificada a destruição de floresta nativa em área de preservação permanente, conforme faz prova a notícia de infração penal ambiental de fls. 13-14. Já no dia seguinte ao embargo, o Vice-reitor da UNOESC, ARISTIDES CIMADON apresentou requerimento para obtenção de licença para atividade de terraplanagem, tendo o Engenheiro Florestal da FATMA, ORLANDO COVOLAN JÚNIOR, em incomum celeridade, mormente quando não recolhidas as taxas necessárias, efetuado a verificação do local. Segundo se infere da averiguação "in loco", a licença postulada estava condicionada "(...) a apresentação imediata de projeto de recuperação de área degradada, com prazos definidos e ressalvas de sanções caso não haja o cumprimento do estabelecido." (fl. 217 ). Somente dia 5/03/2004 foi enviado à FUNOESC o bloqueto de cobrança para expedição da aludida LAP.
Demonstrando ainda mais a ilegalidade cometida pelo réu, verifica-se que no verso da primeira licença expedida (fl. 222v) há um campo para que sejam descritos os documento anexos à licença, no qual segundo consta no próprio documento, são parte integrante do mesmo. E conforme consignou o Engenheiro Florestal da FATMA, ORLANDO COVOLAN em seu parecer de fl. 116, a expedição da licença ambiental prévia estava condicionada a imediata apresentação de projeto de recuperação da área degradada, fato este que não se verificou, pois consta da referida LAP, no campo "documentos anexos": "NADA CONSTA"!
Desta forma, em que pese o projeto de recuperação da área degradada não substituir o Estudo de Impacto Ambiental e o Relatório de Impacto Sobre o Meio Ambiente, o que se observa é um total descaso em relação ao meio ambiente, uma vez que o réu deveria exigir, no mínimo, quando da expedição da licença, o respectivo projeto de recuperação mencionado.
Porém, somente no dia 1º/04/04, ou seja, decorrido quase um mês da expedição da licença, é que foi apresentado um projeto de arborização, demonstrando claramente não só a ilegalidade cometida pelo réu, mas a circunstância de que ele, bem como os empreendedores do parque agiam de forma coordenada entre si.
A propósito da necessidade do projeto de recuperação, a testemunha ORLANDO COVOLAN JUNIOR em seu depoimento assim mencionou, vejamos:
... que subscreveu o documento de fl. 222 porque a "LAP" trata-se de uma licença em uma área, genérica, dizendo que existe viabilidade, desde que apresentados os projetos necessários. Que os documentos necessários para expedição da licença mencionada certamente deveriam estar protocolados junto à FATMA, caso contrário a mesma não seria expedida.
Manifesta é a ilegalidade cometida, pois é inconcebível que o empreendedor de uma obra de grande dimensão, como a do presente caso, consiga providenciar um efetivo EIA e apresentar um RIMA, contendo o diagnóstico detalhado das condições ambientais da área de influência do projeto, e as conseqüências de sua implantação, em apenas dois dias contados do requerimento e que nesta mesma data tal estudo seja vistoriado, analisado e aprovado pela FATMA sem o recolhimento da taxa prévia.
Não bastasse isso, abstraída a questão da celeridade nesse processo, uma leitura dos documentos apresentados pela FUNOESC à FATMA – independentemente deles terem sido apresentados antes ou depois da licença ou da instalação do empreendimento – denotam ainda que somente o plano de arborização se orientou por algum critério científico.
Ora, a licença ambiental não deve ser um documento carente de efetividade, deve ser precedido de projetos e estudos aptos a assegurar a preservação e a conservação do meio ambiente, e para tanto, é necessário que do estudo resultem condições e novos estudos, que por sua vez este eventualmente podem levar ao estabelecimento da solução técnica a ser eleita pela autoridade administrativa ambiental, quando não ao indeferimento da licença.
Sobre a conduta a ser adotada pelo expedidor da respectiva licença, AMÉRICO LUÍS MARTINS DA SILVA discorre que "o órgão licenciador deve providenciar o seguinte: a) elaborar o termo de referência para a realização dos estudos ambientais (Estudo de Impacto Ambiental – EIA/ Relatório de Impacto Ambiental RIMA); c) analisar os estudos ambientais; d) vistoriar o local do empreendimento; e) promover a audiência pública (quando couber)." (Direito do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004. p. 632).
Outrossim, tendo em vista que a matéria envolve toda a coletividade, também era relevante que fosse dada a devida publicidade, para que os interessados pudessem ter ciência dos efeitos degradantes do empreendimento, discutindo ou até mesmo intervindo nas das ações da FUNOESC, a qual tenho como uma instituição de Direito Público – sem olvidar a prevalência da orientação contrária.
No sentido da necessária publicidade do licenciamento, preceitua o §1º do art. 10 da Lei n. 6.938/81: §1º Os pedidos de licenciamento, sua renovação e a respectiva concessão serão publicados no jornal oficial do Estado, bem como em um periódico regional ou local de grande circulação.
Logo, não tendo o empreendedor apresentado o EIA e o RIMA, documentos estes imprescindíveis para a legalidade do licenciamento, tudo sem publicidade alguma, era defeso ao réu expedir qualquer tipo de licença, uma vez que tal ato não observaria os ditames legais e contrariaria o parecer técnico resultante da vistoria.
Nesse sentido, a jurisprudência já se manifestou:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ESTUDO DE IMPACTO AMBIENTAL PARA LICENCIAMENTO DE OBRA EM ZONA COSTEIRA. 1. A autoridade administrativa não pode prescindir da elaboração de prévio Estudo de Impacto Ambiental (EIA) e da apresentação de seu respectivo relatório (RIMA) aprovado pelo órgão competente para o licenciamento de obra em zona costeira, louvando-se, apenas, em pareceres de seus técnicos, que não têm o alcance e a complexidade do EIA-RIMA. 2. Em se tratando de obra em zona costeira, a lei presume a existência de possibilidade de dano ao meio ambiente e exige o respectivo estudo de impacto ambiental. 3. Agravo de instrumento ao qual se dá parcial provimento (TRF 1ª Região, AI n. 01000108012/BA, Des. MARIA ISABEL GALLOTTI RODRIGUES, DJ 19.5.03).
Ademais, não consta nos autos que o projeto de recuperação apresentado qualquer que seja a época pela FUNOESC foi aprovado pelo órgão responsável, carecendo, portanto, de legitimidade qualquer tese defensiva no sentido da convalidação dos atos, uma vez que a aprovação dos projetos da FUNOESC deveria ser ainda fundamentada e motivada administrativamente, e não tão-somente previamente, conforme preceitua o art. 17 do Decreto Federal n. 99.274/90:
Art. 17. A construção, instalação, ampliação e funcionamento de estabelecimento de atividades utilizadoras de recursos ambientais, consideradas efetiva ou potencialmente poluidoras, bem assim os empreendimentos capazes, sob qualquer forma, de causar degradação ambiental, dependerão de prévio licenciamento do órgão estadual competente integrante do Sisnama, sem prejuízo de outras licenças legalmente exigíveis.
No mesmo sentido, dispõe a Lei Estadual n. 5.793/80:
Art. 11. A aprovação de planos e projetos submetidos ao órgãos, entidades e agências governamentais, que devam se realizar em áreas de proteção especial, será condicionada à verificação da sua conformidade com as diretrizes emanadas dos órgãos federais e da presente Lei.
Ao ser inquirido em juízo (fls. 29-30) o acusado mencionou ter expedido a licença conforme os laudos técnicos apresentados, vejamos:
...Que, efetivamente o interrogando expediu a licença com base nos laudos técnicos fornecidos pelo engenheiro funcionário da FATMA, de acordo com orientação expedida deste.
Temos, conforme já demonstrado, que esta versão não se coaduna com a verdade, haja vista que a licença ambiental prévia não foi exarada em consonância as normas ambientais, mas às pressas, sem rigor algum.
Em nova ilegalidade, o réu expediu nova licença ambiental prévia (fl. 270), para a realização dos empreendimentos desportivos, recreativos, turísticos ou de lazer a serem instituídos pela FUNOESC, estes sim potencialmente ainda mais poluidores e danosos ao meio ambiente, quando projetados e instalados ao bel prazer dos engenheiros, à margem das normas e padrões do CONAMA, como infelizmente sói acontecer.
Novamente, conforme antes mencionado, tenho que não foi apresentado nenhum documento que pudesse viabilizar as atividades a serem realizadas, fator este que é essencial para a expedição da competente licença, o que demonstra novamente a conduta dolosa do acusado em expedir documento em desacordo as normas ambientais a fim de favorecer a FUNOESC.
Não se olvida que argumenta o réu que o Ministério Público por meio da suspensão condicional do processo, formulada à fl. 156. Abstraído eventual erro, em que possa incidir a atuação do MP, tendo viabilizado o empreendimento, basta nestes autos dizer que o delito se consumou no momento em que o funcionário público expediu a licença ambiental prévia sem observar as normas ambientais, remanescendo a circunstância invocada como fato para a dosimetria, porquanto era razoável exigir do réu a conduta sinalizada pela lei ambiental e pelos princípios da probidade e da moralidade, e não outra, a que perpetrou dolosamente, jamais vista antes em prol de homens do campo à beira da miséria lutando pela sobrevivência, os quais o próprio Ministério Público também nem sempre hesita em denunciar por pequenos delitos.
Outrossim, verifica-se que o acusado incidiu, por duas vezes, no crime previsto no art. 67 da Lei n. 9.605/98.
Do crime previsto no art. 68, da Lei n. 9.605/98:
A materialidade e a autoria do delito em apreço, de igual maneira, restaram demonstrados pelo fato do réu ter emitido as respectivas licenças ambientais não só em desacordo as normais ambientais, mas também violando os deveres do cargo ao privilegiar sem razão a FUNOESC, já em situação de flagrância de crimes ambientais graves, deixando, conseqüentemente, de cumprir obrigação de relevante interesse ambiental.
De fato, a legalidade e a correta formulação das licenças ambientais são condições necessárias para obras de relevante interesse ambiental. As licenças ambientais de qualquer natureza devem preencher requisitos indispensáveis para sua validade. Omitindo-se de observar estes requisitos legais o expedidor ora acusado deixou de cumprir obrigação de relevante interesse ambiental, conforme tipificado no art. 68 da Lei n. 9.605/98.
Todavia, fica evidenciado um conflito aparente de normas, haja vista que o delito previsto no art. 68 constitui meio necessário para a execução do crime previsto no art. 67 do mesmo diploma, uma vez que ao conceder licença ambiental em desacordo com as normas ambientais o réu deixou de cumprir mais de uma obrigação de relevante interesse ambiental.
Desta forma, imperiosa se faz a aplicação do princípio da consunção ou absorção. DAMÁSIO EVANGELISTA DE JESUS menciona que "ocorre a relação consuntiva, ou de absorção, quando um fato definido por uma norma incriminadora é meio necessário ou normal fase de preparação ou execução de outro crime, bem como quando constitui conduta anterior ou posterior do agente, cometida com a mesma finalidade prática atinente àquele crime" (Direito penal: parte geral. 20 ed.. São Paulo: Saraiva, 1997. p. 112).
Fazendo uma análise do tipo penal insculpido no art. 68 da Lei n. 9.605/98, verifica-se que a conduta abrange qualquer ato desrespeitoso à obrigação de relevante interesse ambiental que não esteja prevista em outro tipo penal. Da doutrina outro não é o entendimento: “(...) o enquadramento da conduta do sujeito em outro crime ambiental implica o afastamento da incidência do tipo em foco. A prática de um delito dessa natureza necessariamente significa deixar de cumprir obrigação de relevante interesse ambiental, qual seja defender e preservar o meio ambiente ecologicamente equilibrado ‘para as presentes e futuras gerações’, na dicção do art. 225 da Constituição Federal” (CASTRO E COSTA NETO, NICOLAO DINO; BELLO FILHO, NEY DE BARROS; CASTRO E COSTA, FLÁVIO DINO DE. Crimes e infrações administrativas ambientais. 2. ed. Brasília: Brasília Jurídica, 2001. p. 371/372).
Portanto, deve o crime do art. 68 da Lei dos Crimes Ambientais ser considerado absorvido pela prática dos dois delitos do art. 67 da mesma lei.
4. Passo à dosimetria da pena.
Para o primeiro crime previsto no art. 67 da Lei n. 9.605/98, examinando atentamente as circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do CP, bem como as do art. 6º da Lei Ambiental, verifico que a culpabilidade do réu se apresenta exacerbada porquanto a rapidez com que os crimes foram praticados é mais uma prova do dolo intenso do agente.
Não registra antecedentes criminais, bem como a personalidade se presume boa, na falta de prova em contrário, mormente as psicológicas, embora quanto à conduta social, e os antecedentes ambientais (frise-se que o art. 6, II, da Lei n.º 9.605/98 não fala em "criminais"), não se possa ignorar a certidão à fl. 364 que indica que o popular réu em função de sua atuação política-partidária joaçabense, pela tão-só passagem pela titularidade FATMA, responde a outras cinco ações penais por crime ambiental com denúncia recebida, mais um inquérito policial por crime ambiental com conflito de competência entre Justiça Federal e Estadual suscitado (Operação Araucária, da Polícia Federal), mais uma ação penal sem menção de recebimento de denúncia, e por fim, pela certidão à fl. 366, a uma ação civil pública por atos improbidade praticados na FATMA, cujo valor dado à causa sabe-se ser de R$1.325.597.856,80 (um bilhão, trezentos e vinte e cinco milhões, quinhentos e noventa e sete mil, oitocentos e cinqüenta e seis reais e oitenta centavos).
As circunstâncias do crime também são desfavoráveis, porquanto a licença do réu acobertou justamente degradação de área de preservação permanente, a fim de proteger interesses de uma prestigiada instituição de ensino superior agindo em absoluta clandestinidade, de forma coordenada com os representantes desta, que também responderam criminalmente em juízo. Outra circunstância desabonadora que indica a gravidade do que foi perpetrado, ainda, é o fato das várias condutas terem absorvido o crime do art. 68 da Lei dos Crimes Ambientais. As conseqüências do crime são normais ao tipo e sua pena, pois permitiu a degradação do meio ambiente sem a correta recuperação da área degradada, em dissonância ao licenciamento protegido pela norma penal. A vítima, no caso a sociedade, em nada contribuiu para a conduta do réu.
Assim, analisadas as circunstâncias judiciais do art. 59 do CP e 6º da Lei n. 9.605/98, considerando que entre a pena mínima e máxima há vinte e 24 meses, para pelo menos quatro circunstâncias desfavoráveis, destacando-se a extensa lista de processos ambientais (às portas da prescrição), sem circunstância que lhe seja favorável, fixo a pena-base próxima de seu termo médio, em 2 (dois) anos e 2 (dois) meses de detenção e 190 dias-multa.
Acerca da possibilidade dessa majoração decorrente da própria existência do art. 59 do CP, podemos citar: "A nenhum acusado é conferido o direito subjetivo à estipulação da pena-base em seu grau mínimo, podendo o magistrado, diante das diretrizes do art. 59, caput, do CP, aumentá-la para alcançar os objetivos da sanção (prevenir e reprimir o crime)" (Revisão Criminal n.º 00.009720-9, rel. o Eminente Des. SOLON D'EÇA NEVES, j. em 29/11/2000). Na mesma senda, podemos citar o julgamento da Apelação Criminal n.º 2008.011277-0, rel. o Eminente Des. MOACYR DE MORAES LIMA FILHO, em 18/06/2008, que por sua vez invocou o seguinte excerto do acórdão da lavra do Des. JARBAS MAZZONI no TJSP: "Se a pena mínima existe para ser usada aos primários, de bons antecedentes, sem qualquer especial circunstância que agrave a reprimenda, é natural que a pena máxima deva ser utilizada quando o caso o recomende", pois, "se não fosse assim, seria inútil individualizar a reprimenda, já que a pena máxima nunca seria aplicada" (Revisão Criminal n. 282.549-3/4, j. em, 11/12/2000).
Não há circunstâncias agravantes ou atenuantes, razão pela qual torno definitiva a pena-base de 2 (dois) anos e 2 (dois) meses de detenção e 190 dias-multa, por não haver quaisquer causas de especial aumento ou diminuição de pena.
Para o segundo crime previsto no art. 67, da Lei n. 9.605/98, examinando atentamente as circunstâncias judiciais previstas no art. 59 do CP, bem como as do art. 6º da Lei Ambiental, verifico que a culpabilidade do réu se apresenta desfavorável porquanto a inexistência de qualquer rigor científico nos estudos prévios, ou publicidade, gerando verdadeira simulação, no processo de licenciamento, é prova do dolo intenso do agente, como já visto.
Não registra antecedentes criminais, e a personalidade se presume boa, embora quanto os antecedentes ambientais (art. 6ª, II, da Lei n.º 9.605/98) não se possa ignorar a certidão à fl. 364 que indica que o réu responde a outras seis ações penais por crime ambiental, um inquérito policial (Operação Araucária, da Polícia Federal), bem como, pela certidão à fl. 366, a uma ação civil pública por atos improbidade praticados na FATMA, como já mencionado.
As circunstâncias do crime também são desfavoráveis, porquanto a licença do réu acobertou empreendimento já em andamento que estava a causar degradação de área de preservação permanente, a fim de proteger interesses de uma prestigiada instituição de ensino superior, agindo o réu coordenadamente com os representantes da FUNOESC, que também responderam a processos-crime. Tal conduta complexa se percebe grave, ainda, pelo fato de ter absorvido o crime do art. 68 da Lei dos Crimes Ambientais, com já visto, mas a segunda licença deve se entender uma decorrência da primeira cujo objeto era a terraplanagem, isto em benefício do réu. As conseqüências do crime são normais ao tipo e sua pena, pois permitiu a degradação do meio ambiente sem a correta prevenção dos riscos à coletividade. A vítima, no caso a sociedade, em nada contribuiu para a conduta do réu.
Assim, analisadas as circunstâncias judiciais do art. 59 do CP e 6º da Lei n. 9.605/98, considerando que entre a pena mínima e máxima há vinte e 24 meses, para quatro circunstâncias desfavoráveis, com a circunstância favorável antes mencionada, fixo a pena-base próxima de seu termo médio, em 2 (dois) anos de detenção, pois, como já mencionado: "A nenhum acusado é conferido o direito subjetivo à estipulação da pena-base em seu grau mínimo, podendo o magistrado, diante das diretrizes do art. 59, caput, do CP, aumentá-la para alcançar os objetivos da sanção (prevenir e reprimir o crime)" (Revisão Criminal n.º 00.009720-9, rel. o Eminente Des. SOLON D'EÇA NEVES, j. em 29/11/2000).
Não há circunstâncias agravantes ou atenuantes, razão pela qual torno em definitiva a pena-base de 2 (dois) anos de detenção e 180 dias-multa, por não haver quaisquer causas de especial aumento ou diminuição de pena.
Tendo em vista a ocorrência do concurso material entre os delitos, cometidos com desígnios autônomos, se faz necessária a soma das penas privativas de liberdade aplicadas ao réu, bem como das penas pecuniárias (art. 69, caput, e art. 72, do Código Penal).
Sendo assim, a pena a ser aplicada em definitivo é de 4 (quatro) anos e 2 (dois) meses de detenção e 370 (trezentos e setenta) dias-multa com valor unitário que fixo em 1/10 do salário mínimo, diante da situação econômica favorável do réu.
A pena reclusiva ora imposta será cumprida inicialmente em regime semi-aberto do art. 33, § 2º, 'b', do CP por força das circunstâncias referidas no §3º do mesmo artigo, no caso desfavoráveis.
Ante os termos do art. 7º, I e II, da Lei n. 9.605/98, deixo de substituir a pena privativa de liberdade restritivas de direitos porquanto acima de quatro anos, e bem porque a culpabilidade, a conduta social do réu, e as circunstâncias dos crimes estão a exigir maior prevenção, deixando também de conceder sursis, pois a a pena é superior a três anos nos termos do art. 16 da Lei dos Crimes Ambientais.
6. Ante o exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a denúncia de fls. 02/05 para CONDENAR JÚLIO CESAR DO PRADO ao cumprimento da pena privativa de liberdade de 4 (quatro) anos e 2 (dois) meses de detenção, em regime semi-aberto, e ao pagamento de 370 (trezentos e setenta) dias-multa, por infração ao art. 67 da Lei n. 9.605/98, por duas vezes, em concurso material.
Concedo ao réu o direito de recorrer em liberdade.
JUNTE-SE CÓPIA DA PRESENTE NOS AUTOS N.º 037.05.003542-4.
Custas pelo réu, nos termos do art. 804 do CPP.
Transitada em julgado a condenação:
a) oficie-se à Justiça Eleitoral, para fins do art. 15, inc. III, da Constituição da República;
b) lance-se o nome do réu no rol dos culpados;
c) providencie-se a atualização dos dados sobre antecedentes na base de dados da Corregedoria-Geral da Justiça;
d) forme-se o PEC.
P.R.I.
23 de junho de 2009.
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