Doha, Catar, 10 de dezembro de 2012 (Terramérica).- A conferência climática das Nações Unidas se estendeu por um dia, até o dia 8, na capital do Catar, e terminou sem maiores reduções da contaminação que esquenta a atmosfera e sem compromissos de financiamento para o período 2013-2015. Porém, os países em desenvolvimento conseguir manter à tona o Protocolo de Kyoto, único tratado internacional obrigatório para reduzir as emissões de gases causadores do efeito estufa.
“É um acordo incrivelmente fraco”, disse Samantha Smith, representante da Rede de Ação pelo Clima, uma coalizão de mais de 700 organizações não governamentais. “Os governos vieram sem mandato para atuar”, afirmou a ativista em uma entrevista coletiva pouco depois de encerrada a 18ª Conferência das Partes (COP 18) da Convenção Marco das Nações Unidas sobre Mudança Climática e após seus 194 Estados partes aprovarem um complexo pacote que chamaram de Portal Climático de Doha (Doha Climate Gateway).
Este acordo estabelece uma segunda fase de compromisso do Protocolo de Kyoto, para que as nações industrializadas reduzam suas emissões de gases-estufa entre 2013 e 2020, mas sem fixar os volumes dessas reduções. Tampouco foi comprometido apoio financeiro para a adaptação dos países mais vulneráveis à mudança climática, apenas um acordo para realizar mais reuniões a respeito no ano que vem. Também para 2013 foram fixadas conversações para criar um “mecanismo” destinado a medir danos e custos para os países afetados pelas manifestações da mudança climática.
Finalmente, o acordo inclui uma previsão de dois anos de negociações para um novo acordo climático internacional que entraria em vigor em 2020. “É impossível conseguir que todos deixem Doha com um sorriso no rosto… Também estou decepcionado”, disse o presidente da COP 18, o catariano Abdullah bin Hamad Al Attiyah. Ao Terramérica, Attiyah disse que se surpreendeu porque os países quiseram introduzir tantas mudanças nas duas semanas da Conferência, e até nas horas finais do encontro. Entretanto, este é um acordo “histórico”, destacou.
No entanto, a conferência de Doha não conseguiu nada para reduzir uma rota de contaminação que está levando o planeta a um aquecimento de quatro graus, ou mais. E oferece pouco para financiar os países mais pobres que devem suportar os efeitos da transformação do clima, alertou Smith. A ativista acusou os Estados Unidos e o Canadá de bloquearem avanços. O Canadá foi um dos piores, opinou. Enquanto se beneficia da exploração de suas extensas areias petrolíferas, foi “muito obstrucionista em questão de financiamento”, afirmou.
Os países industrializados haviam prometido destinar US$ 100 bilhões por ano ao Fundo Verde para o Clima a partir de 2020. Com o objetivo de preencher a lacuna até essa data, as nações em desenvolvimento pediram US$ 60 bilhões até 2015. Alemanha, Grã-Bretanha e mais um punhado de governos prometeram entregar US$ 6 bilhões, mas de forma voluntária. Em Doha, o acordo foi continuar discutindo o financiamento no próximo ano.
O debate sobre perdas e danos foi um dos mais intensos das sessões realizadas a portas fechadas. Os Estados Unidos enfrentaram Estados insulares como as Filipinas, que sofre severos danos por inclemências meteorológicas e pela elevação do nível do mar. Os delegados de Washington bloquearam todas as referências que implicaram compensações ou responsabilidade, admitindo abertamente que temiam represálias políticas domésticas, segundo uma fonte que não quis se identificar.
“As perdas e os danos são um assunto enorme para a América Central. Somos muito vulneráveis aos impactos da mudança climática”, disse Mónica López Baltodano, do Centro Humboldt da Nicarágua e observadora da sociedade civil nas conversações. “Honduras e Nicarágua figuram em primeiro e terceiro lugares entre os países mais vulneráveis do mundo, segundo o Índice Mundial de Risco Climático”, destacou ao Terramérica.
O Índice, elaborado pela entidade alemã Germanwatch, divulgado em Doha, indica que esses dois países centro-americanos foram os mais afetados em perdas de vidas e danos nas duas últimas décadas. Em 2011, Tailândia, Camboja, Paquistão e El Salvador foram os mais atingidos por eventos meteorológicos extremos. Na COP 16, realizada na cidade mexicana de Cancún em 2010, acordou-se buscar mecanismos para avaliar e reduzir os danos e as perdas causadas pelas manifestações do aquecimento, dos desastres meteorológicos a fenômenos de desenvolvimento lento, como a elevação do nível do mar, a acidificação dos oceanos, a perda de biodiversidade e a desertificação.
O mundo em desenvolvimento queria uma nova instituição e um contexto de ação para os danos e as perdas, mas os Estados Unidos se negaram a criar uma entidade. O pacto, então, é estabelecer “um novo mecanismo” em 2013. A segunda fase do Protocolo de Kyoto se estenderá de 2013 a 2020, um avanço muito importante para os países em desenvolvimento, pois suas metas de redução de emissões e seus métodos de emissão e de verificação têm força legal.
Porém, somente União Europeia, Austrália e mais uns poucos países estão comprometidos pelas obrigações de Kyoto, e representam, no total apenas 12% das emissões mundiais de gases-estufa. Os Estados Unidos não fazem parte deste tratado. Canadá e Japão optaram por se retirar da segunda fase, e as grandes potências emergentes – China, Índia, Brasil, etc. – tampouco fazem parte dele, por serem países em desenvolvimento. Além disso, nenhum dos Estados incluídos na segunda fase do Protocolo de Kyoto se comprometeu a novas reduções de suas emissões. Apenas aceitaram uma revisão obrigatória de seus compromissos de redução em 2014.
As nações ricas não obrigadas pelo Protocolo prometeram realizar reduções comparáveis, mas sem nenhum anúncio concreto em Doha. “O processo da COP é decepcionante”, lamentou Baltodano, que participou das três últimas conferências. “É evidente que os interesses econômicos nacionais dominam as negociações”, ressaltou. E os países estão cada vez mais influenciados pelo setor corporativo, enquanto a sociedade civil tem pouca interação e capacidade de incidência, segundo a ativista. “Há um espaço enorme ao qual não chegamos”, observou.
O resultado concreto de Doha coloca o mundo rumo a um aquecimento de três, quatro, ou mesmo cinco graus em relação às temperaturas pré-industriais, disse um delegado da Ilha de Nauru, no Oceano Pacífico, que falou na sessão plenária final em nome da Aliança de Pequenos Estados Insulares. “Não estamos falando de quanto os povos do mundo desenvolvido podem viver confortavelmente, mas sim se nossos povos poderão viver. É a vida de nossa gente que está na corda bamba”, concluiu.
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FONTE : Envolverde/Terramérica
* O autor é correspondente da IPS, enviado especial.
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