Em um estudo divulgado no verão boreal, a Desertec previu que um sistema de energia integrado para Europa, Oriente Médio e norte da África permitiria à Europa reduzir suas emissões de dióxido de carbono (CO2) em 95%, importando 20% de eletricidade do Magreb e economizando 33 bilhões de euros (US$ 43,2 bilhões) por ano.
A iniciativa permitiria aos países do Oriente Médio e do norte da África cobrirem suas necessidades energéticas, graças à abundância de recursos como sol e vento, e reduzir as emissões de CO2 em 50%, apesar do grande aumento da demanda. A região se beneficiaria de uma indústria de exportação que chegaria a 63 bilhões de euros (US$ 82,4 bilhões) ao ano.
Entretanto, três anos depois do anúncio, o sonho Desertec continua sem se concretizar. A euforia se transformou em duras críticas, que vão de acusações de incompetência até carências na governança corporativa. Nas pautas do projeto, a Desertec Industrial Initiative (DII) diz: “O potencial econômico de longo prazo da energia renovável da Eumena (Europa, Oriente Médio e do norte da África, em inglês) supera de longe a demanda atual, e o potencial de energia solar apequena todas” as outras alternativas.
Baseando-se em dados de institutos de pesquisa alemães e do Clube de Roma, o estudo estima que, “para cada quilômetro quadrado de deserto, pode-se obter 250 gigawatts de eletricidade ao ano com a tecnologia que concentra a energia termossolar”. De fato, cada quilômetro quadrado de terra no Oriente Médio e no norte África da “recebe uma quantidade de energia solar equivalente a 1,5 milhão de barris de petróleo. Uma central termossolar do tamanho do Lago Nasser, no Egito, de seis mil quilômetros quadrados, poderia gerar tanta energia quanto a atual produção de petróleo do Oriente Médio”.
Marrocos, onde começaria o projeto-piloto, tem particular interesse em que se concretize a empresa, devido ao enorme impacto que terá na economia local, especialmente na criação de emprego no setor de energias renováveis. A confirmação das dificuldades foram comunicadas aos especialistas no dia 7 de novembro, em Berlim, durante a apresentação oficial das primeiras centrais termossolar, fotovoltaica e eólica, que seriam instaladas na província marroquina de Uarzazate, e que, se previa, estaria gerando eletricidade em 2014.
Os planos de construção teoricamente foram acordados, mas dependem da aprovação da Espanha, principal sócio do projeto, para que a eletricidade gerada seja transportada para a Europa. Madri, atribulada com a grave crise econômica, não pôde confirmar seu apoio, uma situação que pouco provavelmente mude, já que a Espanha é um exportador de eletricidade para o Marrocos, e não desejará reverter isso, segundo especialistas ouvidos pela IPS. A aliança DII compreende o alemão Deutsch Bank e a operadora e transportadora espanhola TSO Red Eléctrica.
“O negócio para um projeto de referência da Desertec, preparado por nós e pela agência solar marroquina Masen, foi amplamente discutido nos últimos dois anos com empresas espanholas, a TSO Red Eléctrica e a Comissão Europeia, e foi declarado factível”, afirmou, na apresentação de Berlim, Paul van Son, diretor-geral da DII.
O primeiro projeto no Marrocos, encabeçado pela gigante alemã do setor energético RWE, terá capacidade instalada de 100 megawatts de energia fotovoltaica e eólica. Um segundo projeto, de energia termossolar, será supervisionado pela ACWA Power International, da Arábia Saudita, e terá capacidade instalada de 160 MW. A previsão é de que os dois projetos estejam operando em 2014.
“Foram encontrados investidores, os subsídios iniciais estão disponíveis e a indústria quer participar”, confirmou Son. No entanto, a Espanha se negou a enviar representantes a Berlim e ainda não assinou o projeto do Marrocos. Son está convencido de que “os outros sócios, do Marrocos e da União Europeia, poderão convencer a Espanha”, já que o próprio governo deste país se beneficiará com esta iniciativa.
Outra dificuldade deste projeto apareceu no final de outubro, quando a Siemens, gigante alemã do setor eletrônico, anunciou sua retirada da aliança, embora seja um membro contribuinte da DII desde 2009. O fato foi interpretado por muitos como uma prova de que a Desertec é um fracasso.
Para Friedrich Fuehr, membro fundador da junta de diretores da Fundação Desertec, a DII “segue uma estratégia equivocada”. Fuehr, advogado alemão e consultor de negócios, disse à IPS que a principal responsabilidade, desde 2009, era conceber um mapa do caminho para superar todas as dificuldades de coordenação internacional e resolver questões como a forma de implementar subsídios e impostos.
“Uma coalizão de companhias privadas tão poderosas e capazes como Deutsch Bank, UniCredit, RWE e SCHOTT Solar deveriam em três anos poder formular um marco político necessário para que a Desertec funcione”, acrescentou Fuehr, lamentando, porém, que “ainda estamos esperando por isso. Por outro lado, a DII se concentrou em lançar um único projeto-modelo”, em Uarzazate. Fuehr também afirmou que a revolução energética que o mundo precisa para enfrentar a realidade do aquecimento global “está ocorrendo sem a participação da Desertec”.
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FONTE : Envolverde/IPS
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