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sexta-feira, 6 de fevereiro de 2015

Precisando de água de forma contínua e equilibrada? Então vamos reformar a Construção Civil, artigo de Luiz Fernando Badejo Carvalho


artigo

[EcoDebate] O Estado de São Paulo é o exemplo, na verdade, parece que todo o sudeste, sem as árvores e sem as florestas, não existe água superficial suficiente. Os motivos para tamanha devastação da Mata Atlântica são diversas, mas agora o que importa? A sentença é sem árvores sem água. Então pode ser dito, “vamos reflorestar intensamente”, e é uma atitude realmente a ser executada, mas continuar consumindo madeira impedirá a intensidade. Então o que fazer? Vamos diminuir o uso deste bem ambiental, e podemos começar pela atividade que mais emprega madeira de forma diversificada, a Construção Civil. E a boa notícia é que existe tecnologia inteiramente nacional para esta empreitada, e vamos vê-la a seguir.
Mas antes de apresentar tal tecnologia, vamos ver o tamanho do estrago que está em andamento em nossas florestas.
Para começar, parte deste desmatamento sem fim promovido pelas construções começa nas olarias. Segundo a ANICER – Associação Nacional da Indústria Cerâmica metade das quase sete mil olarias no país operam a base de lenha.
Como em 2008 o IBGE estimou uma produção total de 63 bilhões de peças produzidas pelas olarias, sendo 75% destas peças nos formatos de tijolos e blocos, pondera-se que seja razoável admitir que ao menos em 2007 tenham sido produzidos 47,25 milhões de milheiros de tijolos e blocos, pois o sindicato do segmento cerâmico alega estarem em atividade 11.000 olarias, ao invés de 6.900 reconhecidas pela ANICER.
Mas supondo que estes números representem a realidade, quanto se consome de lenha para sinterizar uma única peça? VALE em 2009 identificou em uma olaria no Estado do Piauí a utilização de 31m³ de lenha para a queima de 55 milheiros. Ou seja, com a densidade da maioria das árvores nacionais variando entre 600 a 800 kg o metro cúbico, e cada m³ de lenha seca pesando a metade descontando-se a umidade, assim a estimativa média é de 197 gramas de lenha queimada por tijolo.
Efetuando a conta obtém-se 4.654.125.000 kg de lenha seca queimada para a produção de metade dos tijolos e blocos estimados somente para o ano de 2007. E este volume se a lenha estiver realmente seca, senão a quantidade de madeira necessária para a sinterização aumenta.
Como ainda não há um inventário das florestas brasileiras, deste modo pode-se ponderar de modo razoável que cada árvore adulta apresente 7 m³ de madeira seca, cada m³ pesando 350 kg, chega-se a 1.899.642 árvores cortadas em um único ano somente para queimar tijolos. Esta quantidade em termos de floresta com a expectativa de 500 árvores a cada hectare seriam então 3.799 hectares/ ano. E isto considerando que as produções são enxutas, sem perdas e estritamente levando em conta que no arrasto das árvores derrubadas somente elas foram transformadas em cinzas, nenhuma outra mais, ou seja, quando uma árvore que é cortada cai, não arrasa nenhuma outra ao lado.
Continuando a conta de nossas perdas florestais soma-se a madeira utilizada uma única vez nas construções verticais.
Sobre este segmento que faz parte da Construção Civil como um todo, e que é o que mais consome materiais primários e energias, a Fundação IMAZON citada por DUARTE et al (2006) afirma que somente no ano de 2000 a construção vertical no Estado de São Paulo absorveu 605 mil m³ de madeira, sendo que 80% destas, ou seja, 484 mil m³ são madeiras denominadas “descartáveis”. Isto é, a madeira é utilizada de diversas formas em usos temporários, como: fôrmas para concreto, andaimes e escoramentos. O restante, ou seja, 121 mil m³, ou 20% utilizados de forma definitiva nas estruturas de cobertura, nas esquadrias (portas e janelas), nos forros e pisos.
E como o desenvolvimento no Estado de São Paulo pode servir como referência para os outros estados da União, compreendendo que este Estado segundo DUARTE et al (2006) consome 20% de toda a madeira extraída no país, é cabível compreender que o volume de madeiras descartáveis na Construção Civil em todo o território nacional seja na ordem de 2.420 mil m³.
Relembrando que cada árvore razoavelmente apresenta 7 m³ de madeira seca, pondera-se que como a Mata Atlântica já não oferece o volume requerido de matéria-prima, é da Amazônia, segundo a Fundação IMAZON, conforme citação de DUARTE et al (2006), a fonte de madeira em intenso uso pela Construção Civil, ao menos no Estado de São Paulo, mas que outra fonte importante temos no país?
Desta forma o estimado volume de madeira descartável utilizado em um único ano no país é equivalente a 345.700 árvores, ou a 691,7 hectares dizimados para serem utilizadas uma única vez.
Assim nos últimos dez anos, 44.904 hectares de florestas foram devastados para queimar tijolos ou serem empregadas uma única vez.
Uma Alternativa – Tijolos e Blocos Ecológicos para ReAtivar a Estratosfera
Então qual é a abordagem construtiva, qual a tecnologia ambientalmente amigável que pode apoiar a geração de água de forma contínua e equilibrada?
A resposta está na construção ecológica.
Mas não só no modelo pouco difundido e existente no Brasil há mais de 50 anos, há uma nova abordagem, há um incremento nesta tecnologia, há a reciclagem.
Reciclagem de resíduos sólidos que estabelece um padrão de eficiência na gestão do principal descarte, os resíduos sólidos orgânicos, que nada mais são do que uma apresentação diferenciada dos naturais elementos químicos denominados micro e macro nutrientes.
O método incremental do sistema solo-cimento é o Processo KONLIX de Reciclagens, que utiliza como matérias-primas os resíduos sólidos orgânicos e também os inorgânicos descartados diariamente.
Para definir o desenvolvimento deste processo de reciclagens, segue abaixo um quadro demonstrativo do teor percentual de uso de resíduos na fabricação de tijolos/ blocos ecológicos em relação a massa total de cada peça.

Tipos de resíduos orgânicos
Teor % de resíduo reciclado por peça
RSU de aterros e/ ou lixões
70 % (cinquenta por cento)
Compostagem
70 % (cinquenta por cento)
Lodos de ETE
45 % (quarenta e cinco por cento)
Tipos de resíduos inorgânicos
Teor % de resíduo reciclado por peça
Entulhos da Construção Civil (em geral)
77 % (setenta e sete por cento)
Partes velhas de gesso [*]
67 % (sessenta e sete por cento)
Protótipos
Teor % de resíduo reciclado por peça
Papel moeda – algodão
Entre 35 e 40 %
Madeira em pó
33 % (trinta e três por cento)

[*] Observação:
Embora a literatura pertinente aponte para a impossibilidade de estabilização do gesso velho, devido a ação expansiva/ desestruturante deste resíduo, há peças estabilizadas há mais de quinze meses, inclusive sob períodos de imersão, onde não foram observados nenhum tipo de distorção dimensional.
Esta tecnologia inteiramente brasileira tem eficiência técnica e econômica para estabilizar na forma de tijolos vazados ou blocos maciços todos os resíduos sólidos orgânicos que são descartados diariamente. Deste modo, cada tijolo vazado que apresenta maior resistência mecânica e durabilidade que tijolos da Cerâmica Vermelha, e isto por imposição da ABNT, além de não sofrer nenhum tratamento térmico, isto é, não há nenhum tipo de queima na produção, somente prensagem, é capaz de fixar carbono em sua massa, e simultaneamente por utilizar resíduos originários de aterro, evita a emissão de gases do efeito estufa (GEEs) devido a neutralização e confinamento duplo destes materiais, uma vez pelo processo e uma segunda vez no formato construtivo.
A exemplo, um único tijolo vazado com dimensões de 25 x 12,5 x 6,25 (comp., larg., alt.) equivale a não emissão de 8,7 Kg de CO2eq (dióxido de carbono equivalente). Extrapolando para as dimensões de uma residência com 100 m² de área construída, cada uma destas unidades concentra mais de 95 toneladas de CO2eq não emitidos (por média dos pressupostos de AUGENSTEIN (1990) e BINGEMER & CRUTZEN (1987) apud PEER et al (1993), citado por CARVALHO, 2010).
Em outros termos, cada m² de alvenaria com tijolos realmente ecológicos produzidos através do Processo KONLIX, equivale ao carbono fixado por 5,7 árvores adultas. Com esta característica uma residência como a citada conterá o equivalente a 969 árvores adultas em sua estrutura.
A questão de construir ecologicamente por este processo fomenta:
  • A eliminação de lixões transformando passivos ambientais em ativos da Construção;
  • Promove a manutenção de florestas devido a redução do uso de madeiras que serão descartadas; e
  • Principalmente reduz o uso de materiais primários na Construção Civil em virtude da reinserção de materiais residuais reciclados.
Algumas Considerações
A título de ilustrar a capacidade do Processo KONLIX de Reciclagens, todos os resíduos sólidos orgânicos de origem doméstica coletados diariamente na Cidade do Rio de Janeiro, aproximadamente 5 (cinco) mil toneladas, podem deixar de ser destinados a aterro e serem transformados na alvenaria ecológica que edifica 100 unidades residências com 100 m², diariamente. O que equivale também a 7,7 mil toneladas de CO2eq não emitidos por dia, ou 2,8 milhões de toneladas de CO2eq não emitidos a cada ano.
A utilização dos resíduos sólidos orgânicos/ inorgânicos reciclados pelo Processo e que originariamente estão em aterros e lixões reduz inexoravelmente os custos municipais de administração destes locais de destinação final, além da redução de custos relativos a recuperação de áreas / solos contaminados pelos subprodutos destes locais, a exemplo o chorume emitido e vetores.
O montante de resíduos sólidos domésticos coletados e armazenados em aterros nas 260 maiores cidades brasileiras (municípios com mais de 100 habitantes) entre 1999 e 2011 é suficiente para a construção de 10 milhões de residências com 100 m², o que estabelece um giro exponencial na economia, pois todos os segmentos industriais estão envolvidos nesta reforma habitacional, onde o conforto socioambiental é paradigma.
ESTIMATIVA DA COMPOSIÇÃO GRAVIMÉTRICA ARMAZENADA ENTRE 1999 E 2011 (CARVALHO, 2013)
PERCENTUAL
TIPO DE MATERIAL RESIDUAL
EM TONELADAS
3 %
TECIDOS
7.495.230.000
5 %
VIDROS E METAIS
12.492.049.000
25 %
PLÁSTICOS MOLES E DUROS
62.460.250.000
65 %
ORGANO-TERROSOS
162.396.653.000
2 %
OUTROS
4.996.819.000
100 %
249.841.001.000
Nesta possível condição de reciclagem segundo o Processo, considerando que a cada ano sejam erguidas um milhão de residências com a dimensões sugeridas, e em conjunto, evitar outro desmatamento de 449 km² provocada pela Construção Civil tradicional para quase nada, obtém-se mais de 56 milhões de toneladas de CO2eq não ativadas na estratosfera.
E há outras possibilidades de uso do Processo Konlix na Engenharia Civil. Se não somente residências forem construídas, há tecnologia para empregabilidade em contenção de encostas, reforço de subleito e sub-base de vias rodoviárias rígidas, ou ainda em segmentos de menor expressão em termos de volume, como em placas para conforto térmico e acústico, o uso é amplo.
Concluindo para Motivar
Quanto custa não ter água?
Veiculado por jornais televisivos em fevereiro de 2014, segundo um estudo da COPPE/ UFRJ sobre a novíssima hidrelétrica de Belo Monte (PA), afirma que este empreendimento que nem iniciou sua operação, não poderá alcançar o potencial de geração, pois os índices pluviométricos que serviram de base para este cálculo tiveram como base décadas passadas, e não estão ocorrendo mais.
Havendo uma curiosidade de motivos para se evitar desmatamentos, há um estudo excelente e bem atual produzido pelo Professor Antonio Donato Nobre – O Futuro Climático da Amazônia, que está disponível no site: http://www.ccst.inpe.br/wp-content/uploads/2014/10/Futuro-Climatico-da-Amazonia.pdf
Que Deus nos abençoe com muita sabedoria.
Luiz Fernando Badejo Carvalho tem formação em Administração de Empresas e é Mestre em Tecnologia. Desenvolve processos de gestão e reciclagem de resíduos sólidos tais como o Processo KONLIX de Reciclagens.
luiz_badejo@yahoo.com.br
REFERÊNCIAS:
Associação Nacional da Indústria Cerâmica – ANICER.
Disponível em: . Acesso em: jan/ 2014.
CARVALHO, L.F.B.. Processo Konlix de Reciclagens e O Potencial Financeiro do Item “Reciclagem” Constante na Política Nacional de Resíduos Sólidos – PL 203/ 1991. Palestra na VI PIFIC – AMBIENTE E SUSTENTABILIDADE NA CONSTRUÇÃO CIVIL INOVAÇÕES QUE FAZEM A DIFERENÇA – Curitiba, Brasil, 2010.
CARVALHO, L.F.B., I Conferência Municipal de Meio Ambiente de Mangaratiba.Palestra PRODUÇÃO E CONSUMO SUSTENTÁVEL – Processo Konlix de Reciclagens, Mangaratiba, Rio de Janeiro, Brasil. Agosto de 2013.
DUARTE, D., GONÇALVES, J.C.S., MULFARTH, R.. O Mercado de Madeira e a Construção Civil. Depto. de Arquitetura, Ambiente e Desenvolvimento Sustentável da USP, 2006. Disponível em: . Acesso em: jan/ 2014.
PESQUISA ANUAL DA INDÚSTRIA DA CONSTRUÇÃO, IBGE, 2008, Publicada em 2010. Disponível em: . Acesso em: jan/ 2014.
PROGRAMA NACIONAL DE FLORESTAS – PNF. Decreto nº 3.420/ 2000. Disponível em: . Acesso em: jan/ 2014.
VALE, M.M, CERÂMICA CANAÃ: propostas para o uso racional da energia.Universidade Federal de Lavras, Especialização em Formas Alternativas de Energia, TCC, Lavras, MG, 2009.

Publicado no Portal EcoDebate, 06/02/2015
Para citar este artigo: "Precisando de água de forma contínua e equilibrada? Então vamos reformar a Construção Civil, artigo de Luiz Fernando Badejo Carvalho," in Portal EcoDebate, 6/02/2015, http://www.ecodebate.com.br/2015/02/06/precisando-de-agua-de-forma-continua-e-equilibrada-entao-vamos-reformar-a-construcao-civil-artigo-de-luiz-fernando-badejo-carvalho/.

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