“Florestas, ao menos em parte, são responsáveis pelo volume de água das chuvas. Se o regime hidrológico for alterado, o funcionamento das hidrelétricas ficará comprometido. É um tiro no pé.” - Enrico Bernard. Na foto, Rio Tapajós
93 parques nacionais e outras unidades de conservação sofreram redução de área ou tiveram seu status de proteção relaxado. Os principais motivos são projetos de hidrelétricas, pressão do agronegócio e urbanização.
Não é só na motosserra que o Brasil perde florestas. O país perdeu 5,2 milhões de hectares nos últimos 33 anos por decreto – é algo equivalente ao Rio Grande do Norte. Neste período, 93 parques nacionais e outras unidades de conservação sofreram redução de área ou tiveram seu status de proteção relaxado, ameaçando a biodiversidade. Quase 75% desta perda aconteceu na Amazônia entre 2008 e 2012. Os principais motivos são projetos de hidrelétricas, pressão do agronegócio e urbanização.
Entre 1981 a 2012 “o Brasil deixou de proteger uma área maior que a Costa Rica”, diz o biólogo Enrico Bernard, responsável pelo laboratório de ciência aplicada à conservação da biodiversidade do departamento de zoologia da Universidade Federal de Pernambuco. Ele coordenou o estudo “Redução, Declassificação e Reclassificação de Unidades de Conservação no Brasil” que analisou o ato de políticos que afetaram as áreas protegidas em todo o país.
A perda de florestas na caneta das autoridades pode ficar ainda mais grave. Projetos de lei no Congresso, se aprovados, afetarão outras áreas protegidas em Rondônia e no Pará. Mais 2,1 milhões de hectares estão sob risco, segundo Bernard. O estudo não incluiu áreas indígenas e quilombolas.
Nas últimas décadas, florestas foram afetadas em 16 Estados desta forma. Foram atingidas 69 áreas de proteção integral – estações ecológicas, reservas biológicas e parques nacionais, os tipos de unidades de conservação onde a biodiversidade é mais protegida. O mesmo aconteceu com 24 unidades de uso sustentável, onde podem, por exemplo, viver populações tradicionais.
“Começamos a observar um movimento no Brasil de mudança sistemática dos limites de parques e reservas”, diz Bernard. “Alguns tiveram seu status de proteção relaxado, outros perderam área ao terem seus limites alterados e teve até os que deixaram de existir.”
Esta dinâmica ficou estável de 1981 (data do início do estudo), até 2000. Foi quando entrou em vigor o Sistema Nacional de Unidades de Conservação. Conhecida como “lei do SNUC”, classificou as unidades de conservação criando duas categorias – as de proteção integral e as de uso sustentável. Dentro delas há uma dúzia de tipos que vão desde as reservas biológicas (onde só pesquisadores estão liberados) até as áreas de proteção ambiental, as APAs, menos restritivas e que permitem ocupação humana e até indústrias.
Um ano depois de a lei do SNUC vigorar ocorreu um grande movimento de reclassificação das unidades de conservação, no esforço de adequá-las à nova lei. Esse fato Bernard considera positivo. Bem ao contrário do que aconteceu a partir de 2008, no segundo mandato do governo Lula. De 2008 a 2012, início da gestão Dilma Rousseff, unidades de conservação perderam área, outras foram reclassificadas e encaixadas em tipos onde se permite mais atividade econômica, ou sumiram do mapa. Isso ocorreu, por exemplo, com o Parque Estadual Corumbiara, em Rondônia, que deixou de existir como área protegida em 2010.
Bernard relaciona a recente perda de florestas à publicação, em 2007, da Matriz Energética Brasileira – 2030. “Ali se lê que para atender a uma demanda maior de energia elétrica anual até 2030, todos os grandes rios amazônicos terão que ser barrados e abrigar hidrelétricas”, diz o pesquisador.
Como a lei do SNUC não permite que empreendimentos avancem sobre unidades de conservação, o governo federal promulgou o Decreto 7154/2010 permitindo estudos de potencial hidrelétrico em caso de interesse público. O decreto, na interpretação de Bernard, teve como efeito collateral o estrago nas florestas protegidas.
De 2010 a 2012 foram 21 unidades de conservação a ter seus limites afetados na Amazônia. O governo Dilma agiu desta forma em 2012, por exemplo, para viabilizar o complexo das usinas do Tapajós. “Nas áreas estaduais o processo é mais grave ainda porque não passa pela mídia ou pela sociedade”, diz o coordenador do estudo.
“A maioria dos grandes rios brasileiros nasce dentro de unidades de conservação”, diz Bernard. “Florestas, ao menos em parte, são responsáveis pelo volume de água das chuvas. Se o regime hidrológico for alterado, o funcionamento das hidrelétricas ficará comprometido. É um tiro no pé.”
O Brasil tem 886 unidades de conservação federais, 729 estaduais e 147 municipais. As de uso sustentável são 1214 – quase 70% do total. É o maior sistema de unidades de proteção do mundo.
Por: Daniela Chiaretti
Fonte: Valor Econômico
Fonte: Valor Econômico
Fonte: Amazônia.
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