Nova Délhi, Índia, 4/12/2013 – Ativistas, que conseguiram suspender a introdução de uma berinjela geneticamente modificada na Índia, temem que seus esforços tenham sido em vão, porque o mesmo alimento transgênico será liberado na vizinha Bangladesh. “Os dois países compartilham uma fronteira extensa e permeável, e é fácil entrar com variedades transgênicas”, disse Suman Sahai, diretora da Gene Campaign, organização com sede em Nova Délhi que pesquisa e promove a conservação dos recursos genéticos e o conhecimento autóctone.
Essa variedade de berinjela contém o gene de uma bactéria do solo que a torna resistente a pragas e reduz a necessidade de fumigação com pesticidas. A corporação norte-americana Monsanto é proprietária da patente desta planta comestível e comercializa suas sementes por intermédio da Mahyco, sua filial na Índia. Embora as autoridades de Bangladesh tenham ordenado um rígido controle dos cultivos dessa variedade, há perigo real de as berinjelas indianas serem contaminadas pela polinização cruzada, advertiu Sahai à IPS.
O Instituto de Pesquisa Agrícola de Bangladesh anunciou, no dia 31 de outubro, que o cultivo de berinjela transgênica seria feito com supervisão oficial. Os agricultores serão capacitados em medidas de biossegurança e os produtos estarão claramente rotulados nos mercados. Entretanto, essas medidas são insuficientes, segundo a Coalizão por uma Índia Sem Transgênicos, que exige do governo indiano a garantia de que não aconteça uma transferência ilegal ou acidental de sementes ou de cultivos através da fronteira comum entre esses dois países do sul da Ásia.
“Exigimos a proibição da importação ou transferência de cultivos, frutos, sementes e alimentos de berinjela e espécies, gênero ou famílias afins, que tenham a mais remota possibilidade de contaminação direta ou indireta com a berinjela transgênica”, afirmou a coalizão em uma carta aberta dirigida, em outubro, ao ministro de Meio Ambiente e Florestas.
Para Chitra Devi, cientista do Escritório Nacional de Recursos Fitogenéticos da Índia, a estrutura da flor da berinjela favorece um processo rápido de polinização cruzada. “A contaminação com genes da bactéria incorporados à berinjela transgênica seria rápida e irreversível”, afirmou à IPS. Essas preocupações pautaram a suspensão adotada pela Índia em 2010 para o cultivo dessa variedade, que a princípio estava destinada a ser a primeira planta comestível do país geneticamente modificada.
As possibilidades do cultivo de alimentos transgênicos neste país diminuíram em julho, quando um comitê técnico nomeado pela Suprema Corte de Justiça recomendou suspensão de dez anos para os testes de campo para esse tipo de plantação. “Após o exame dos expedientes de segurança, é evidente que existem grandes lacunas no sistema de regulamentação”, informou o comitê ao tribunal, que continua recebendo argumentos a favor e contra a suspensão proposta. O comitê também recomendou proibir “a liberação de cultivos transgênicos de variedades das quais a Índia é um centro de origem ou diversidade”, como arroz, berinjela e mostarda.
Em agosto de 2012, o comitê parlamentar permanente de agricultura propôs a proibição total de cultivos transgênicos alimentícios. Os governos dos Estados de Himachal Pradesh, Bihar, Bengala Ocidental, Orissa, Madhya Pradesh, Karnataka, Andhra Pradesh e Kerala também se opuseram a esse tipo de plantação. Devinder Sharma, presidente do Fórum pela Biotecnologia e Segurança Alimentar, um coletivo independente com sede em Nova Délhi, acredita que não por acaso o Instituto de Pesquisa Agrícola de Bangladesh adotou a berinjela transgênica da Mahyco, a filial indiana da Monsanto.
“Estratégias semelhantes foram utilizadas na América Latina para criar um fato consumado ao liberar no ambiente, de maneira ilegal, variedades geneticamente modificadas”, afirmou Sharma à IPS. “Na verdade, essa foi a via para impor o algodão transgênico na Índia e superar a oposição de agricultores e ativistas que tentavam proteger a biodiversidade”, acrescentou. Os principais especialistas em segurança alimentar de Bangladesh também questionaram a pressa em liberar a berinjela transgênica.
Farida Ajtar, fundadora da Ubinig, uma organização não governamental que gerencia um dos maiores bancos comunitários de sementes do mundo, acredita que a pesquisa para obter essa berinjela modificada “não foi feita por necessidade”. Em entrevista via correio eletrônico à IPS, Ajtar afirmou que “nem os agricultores nem os funcionários têm conhecimento suficiente das medidas de biossegurança necessárias, nem de que possam existir consequências para a saúde e o meio ambiente”.
A ameaça não é apenas para o subcontinente indiano, mas também para Bangladesh, que possui mais de cem variedades de berinjela, agora em risco de contaminação por polinização cruzada, afirmou Ajtar. “Só a Ubinig conta com uma coleção de 41 variedades diferentes”, ressaltou. Segundo ela, “os agricultores de subsistência, que representam 84% das famílias rurais do país, são os guardiões das variedades locais de berinjela que agora sofrerão a contaminação biológica da berinjela transgênica. Também é possível que as pragas comecem a atacar de maneira seletiva as variedades naturais e as liquidem”. Envolverde/IPS
(IPS)
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