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sábado, 14 de agosto de 2010

Mais de 400 milhões de litros de petróleo vazaram no Golfo do México causando um prejuízo incalculável. Empresa responsável gastou mais de U$ 3 bilhões, mas o problema ainda não foi resolvido.

No dia 20 abril, a plataforma petrolífera Deepwater Horizon, administrada pela empresa British Petroleum (BP), explodiu matando 11 funcionários e dando início ao que se tornou uma das maiores catástrofes ambientais da América do Norte. Segundo estimativa do governo norte-americano, de 35 a 60 mil barris de petróleo vazaram no Golfo do México por 85 dias. No último dia 15 de julho, a BP anunciou que conseguiu conter o vazamento, mas, na melhor das hipóteses, mais de 5 milhões de litros de óleo foram despejados no mar diariamente por quase três meses.

Como se não bastasse, a temporada de furacões começou na região e, segundo a agência federal norte-americana Administração Nacional Oceânica e Atmosférica – NOAA (sigla em inglês), ela será uma das mais ativas já registradas com a provável formação de 14 a 23 tempestades tropicais. As fortes ondas e a ventania provocadas pelo furacão Alex comprometeram a coleta e a queima do óleo na superfície, impedindo o sobrevoo de aviões para espalhar dispersantes químicos e a instalação de barreiras para conter o óleo.

A culpa é de quem? – A Deepwater Horizon era propriedade de uma empresa chamada Transocean, mas estava arrendada à BP até 2013. Uma terceira companhia está envolvida, a Halliburton, responsável pela perfuração do poço. De acordo com Lucas de Oliveira, doutorando do Programa de Pós-graduação em Ciência Política da UFRGS, esse serviço sempre é terceirizado: “Há empresas muito especializadas, como a Halliburton, que só perfuram e não exploram o petróleo”. Na sua opinião, isso não exime a companhia britânica, que é quem tem a concessão para explorar a área.

Uma averiguação interna está sendo realizada para apurar quais foram as causas do acidente, mas a BP ainda não apresentou os resultados oficiais. Sabatinado por congressistas norte-americanos, o executivo-chefe da empresa, Tony Hayward, se esquivou de qualquer afirmação conclusiva: “Entendo que as pessoas queiram uma resposta simples sobre por que isso ocorreu e quem é o responsável. A verdade, no entanto, é que este é um acidente complexo, causado por uma combinação de falhas sem precedentes”.

Talvez tenha sido um pouco mais simples. O professor da Engenharia Metalúrgica da UFRGS Telmo Strohaecker explica que na boca de todo poço é instalada a chamada “Árvore de Natal”, nome fantasia para as válvulas de segurança capazes de interromper o fluxo do material: “Elas conectam a saída do poço com os dutos para extração de óleo e gás, e seu fechamento pode ser acionado da plataforma para impedir qualquer vazamento”.

De acordo com uma comissão do Congresso dos EUA, o acidente estaria relacionado a graves irregularidades no projeto dessas válvulas. O congressista democrata Bart Stupak afirmou que esse equipamento possuía um vazamento e não teria força suficiente para cortar o fluxo de óleo antes que o acidente ocorresse. A comissão apontou ainda que as válvulas apresentaram modificações inesperadas, além de estarem com a bateria gasta.

O legislativo norte-americano afirmou que há indícios de que a colocação de cimento no poço (usado para impedir o escape de gases explosivos) da Deepwater Horizon não tenha sido realizada de maneira apropriada. A BP sustenta que a responsabilidade por esse serviço é da Halliburton, que, por sua vez, disse não ter havido problema algum no processo.

Em entrevista à rede de notícias BBC, o ex-funcionário da BP Tony Benton confirmou a acusação dos congressistas norte-americanos de que as válvulas de segurança estariam com vazamentos. Segundo ele, tanto a BP quanto a Transocean foram alertadas sobre o problema. Apesar de essas empresas não terem se posicionado a respeito das denúncias, o biólogo e diretor-técnico do Instituto Sea Shepherd Brasil, Wendell Estol, é categórico: “Foi um erro humano. Claro, a BP não fincou pé nessa posição, mas tudo indica que foi isso o que aconteceu”.

Impacto ambiental – A mancha negra, que continua se espalhando, já atingiu a costa de quatro estados norte-americanos: Louisiana, Mississipi, Alabama e o norte da Florida. Bolas de piche (petróleo degradado e solidificado) foram encontradas no estado do Texas, a mais de 600 km do local do vazamento. Equipes de voluntários e órgãos governamentais correm contra o tempo para tentar salvar um número crescente de animais que aparecem no litoral cobertos de óleo. Estima-se que 400 espécies já tenham sido afetadas. Agências ambientais dos EUA coletaram até o momento mais de 2.000 animais mortos e 1.000 feridos ou debilitados na região atingida pelo acidente. A maioria aves, mas um cachalote, que está em extinção, foi encontrado morto. Além disso, o Golfo do México é a única área de reprodução de uma espécie de tartaruga marinha cujo ciclo de vida se dá no Atlântico Norte.

O petróleo contém substâncias tóxicas e cancerígenas. Wendell Estol explica que as aves sofrem mais porque o óleo que adere às penas as impede de voar e manter a temperatura do corpo, além de causar queimaduras na pele e em todo trato respiratório e digestivo, anemia, úlceras e edema pulmonar. “Se ocorrer em período reprodutivo, pior ainda; toda reprodução é perdida”, afirma. No caso dos lobos e leões marinhos, o que mais acontece é a queima das vias respiratórias, porque eles apenas colocam o focinho para fora da água para respirar, justamente onde está o óleo, e acabam inalando os gases voláteis que sobem do petróleo.

Esses são os efeitos agudos da contaminação. O biólogo Marcio Martins, do Instituto de Biociências da UFRGS, explica que existem os efeitos subletais: “É quando o animal não morre, mas pode ficar envenenado, com câncer ou fisicamente debilitado, e na natureza um animal assim está em grande desvantagem”. Segundo Marcio, é muito difícil medir os efeitos da intoxicação, que tendem a afetar o ecossistema como um todo a longo prazo. Wendell Estol explica que quem está no topo da cadeia alimentar concentra as substâncias contaminantes, efeito chamado de “bioacumulação”. O que pode acabar afetando inclusive os seres humanos, que se alimentam dos peixes.

Especialistas afirmam que o número real de mortes em decorrência do vazamento provavelmente é maior do que apontam as estimativas, já que muitos animais contaminados podem ter afundado depois de mortos. Outro problema são as algas do gênero Sargassum, que aderem ao petróleo e atraem predadores, como tartarugas e peixes, para a área afetada.

Estol explica que, no caso dos mamíferos marinhos, o efeito se dá mais na população como um todo do que nos indivíduos. Por exemplo, golfinhos e baleias fogem dos locais onde há petróleo. O problema disso é que onde eles se concentravam havia comida, era onde se reproduziam. Eles não sabem quando vão encontrar outro local nem se, quando o encontrarem, haverá animais usando aquele espaço. “Então, a pirâmide etária é achatada. Sem golfinhos velhos e jovens, sobram só os adultos, que são mais resistentes. Por conta do estresse, as defesas do seu organismo cai, e aí aparecem diversas doenças oportunistas por vírus e bactérias.”

Perigo à vista - A chegada do petróleo à costa põe em risco reservas biológicas, e os estados preparam um plano de contenção. No Mississipi, áreas de mangue podem ser atingidas. Wendell explica que até hoje existe a dúvida, quando ocorre um derrame em área de manguezal, se é melhor limpar ou deixar como está: “Para limpar aquela rede de raízes, é preciso pisotear toda a camada de lama, que é onde vive uma enormidade de animais. Vale a pena botar 300 pessoas pisoteando aquilo para lavar com jato de água quente as raízes? Será que esse impacto não é maior que o próprio petróleo?”, questiona.

O biólogo Ignacio Moreno, também da UFRGS, explica que outra preocupação é com a possibilidade de o petróleo chegar à Península da Flórida, 500 km a leste do acidente, onde há formação de corais. Nesse caso, o impacto ambiental seria maior ainda e a limpeza, assim como no caso dos mangues, muito difícil. Ele compara com o acidente do petroleiro Exxon Valdez, ocorrido próximo à costa do Alasca em 1989: “Uma coisa é limpar pedras, como naquele caso, mas onde há formações coralíneas isso pode acabar matando vários organismos”.

Com o impacto ao ambiente, as populações humanas acabam sendo prejudicadas também. Os estoques pesqueiros, contaminados, começam a diminuir. Praias sujas de óleo são fechadas. Os pescadores sofrem prejuízos, assim como o setor de turismo. A BP já pagou 150 milhões de dólares só em compensações a pessoas afetadas. O biólogo Marcio Martins critica: “As consequências imediatas a empresa paga, mas alguns desses efeitos precisam de muito tempo pra ser resolvidos, e quem acaba arcando com isso são agências governamentais e não governamentais”.

Se já existe um impacto social nos EUA, que dirá se o óleo chegar a um país totalmente dependente do turismo como Cuba, a 150 km da Flórida? Prevendo isso, foi para lá que Wendell Estol e Sebastian Diano, diretor da ONG Instituto Litoral Sul, embarcaram no dia 2 de julho com o objetivo de treinar 100 voluntários para a limpeza de animais atingidos por petróleo.

Resolver como? – Uma vez que o estrago já está feito, a prioridade era estancar o vazamento. Depois que a solução óbvia de fechar as válvulas “manualmente”, com a ajuda de robôs, se mostrou inviável, a BP passou a utilizar métodos mais complexos.

“Tentaram largar uma espécie de sino sobre o poço para conter o vazamento. Só que o solo oceânico não é fofo, é rocha dura, então o equipamento só bateu e não enterrou no fundo”, comenta o professor do Instituto de Geociências da UFRGS Eduardo Barboza. “Tentaram entupir o duto injetando detritos, como bolas de golfe e pedaços de corda e pneu, mas não conseguiram porque a pressão do óleo que sai é muito alta”, avalia o professor Telmo Strohaecker. Algo parecido com uma escumadeira gigante foi testado para filtrar a água contaminada pelo óleo, mas também não funcionou, devido às condições climáticas adversas, atribuídas em parte ao furacão Alex.

O óleo só parou de jorrar quando uma tampa de contenção foi colocada sobre a boca do poço. Porém, a solução é temporária. Segundo a BP, o problema só será resolvido de fato quando dois poços forem perfurados perto de onde ocorreu o acidente para que a pressão seja aliviada e o óleo consiga ser extraído por esses locais de forma controlada. “O problema é que vai demorar mais uns meses para conseguirem fazer isso”, afirma Telmo. De acordo com estimativa da BP, eles ficarão prontos em agosto.
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FONTE : Alunos de jornalismo da Faculdade de Biblioteconomia e Comunicação Social (Fabico) da UFRGS. (Matéria publicada originalmente no Jornal da UFRGS). (Jornal da UFRGS/EcoAgência)

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