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sábado, 14 de novembro de 2009

SANTA CATARINA : AMBIENTE X DESENVOLVIMENTO

Por que a relação entre órgãos ambientais e empresários dispostos a investir no Estado é tão complicada

Em 1994, o empresário Bassan Hanna fez a primeira tentativa de conseguir autorização para construir um condomínio diferenciado, com área residencial e hotéis abastecidos por águas termais, em Santo Amaro da Imperatriz. A história dele ilustra a delicada e nem sempre amistosa relação de forças entre órgãos ambientais preocupados em reduzir o impacto no meio ambiente e empreendedores dispostos a garantir a viabilidade econômica dos novos negócios.

O último documento exigido pela Fundação do Meio Ambiente (Fatma) foi entregue por Bassan no ano passado. Passados 14 anos, ele recebeu a Licença Ambiental de Operação (LAO). Em 2009, as primeiras obras começaram a despontar nas Termas do Tabuleiro. Apenas para conseguir todas as licenças junto aos órgãos ambientais, foram 10 anos, conta o Bassan, sócio do empreendimento de capital árabe.

– Os setores de energia, infraestrutura e turismo são os principais interesses de empresários árabes, que estudam a construção de uma marina, de um hotel cinco estrelas na Capital e de um complexo turístico na Lagoa da Conceição. Mas há dificuldades. Esbarramos na insegurança jurídica e na demora para conseguir as licenças. Alguns empresários desistiram.

Segundo Bassan, na saga que foi conseguir liberar o Termas do Tabuleiro, cada vez que mudava o técnico nas vistorias, outro tipo de documentação era exigida. O que demandava mais tempo para fazer estudos e conseguir o documento. O último entrave foi um sistema de esgoto, que teve que ser refeito.

– Os órgãos ambientais exigiram 22% de área de preservação. Nós mantivemos 60% da área preservada dos 400 mil metros quadrados.

Fase de construção é muito mais rápida

O investimento de R$ 90 milhões já está com grande parte das unidades comercializadas. A previsão para a conclusão de todo o projeto é de três anos, quase cinco vezes menos tempo do que o período que levou para ser aprovado.

– Depois da Moeda Verde (operação da Polícia Federal que apurou supostas irregularidades na concessão de licenças ambientais), ninguém mais quer ficar responsável pela assinatura – avalia Bassan.

Um dos envolvidos na operação Moeda Verde, o empresário Fernando Marcondes de Mattos, dono de diversos equipamentos turísticos no Estado, entre eles o Costão do Santinho Resort, teve prejuízos milionários por conta de um embargo.

– Sem qualquer sustentação técnica, o Costão Golf foi embargado e isso me custou R$ 10 milhões. O maior prejuízo é a insegurança jurídica. Porque o projeto foi aprovado e, de repente, alguém surgiu com uma ação pública que o Ministério Público (MP) aceitou e parou todo o projeto – alerta.

Segundo Marcondes, os empresários precisam de regras claras: um plano diretor objetivo e gerenciamento costeiro como diretrizes para nortear o desenvolvimento sustentável.

– É preciso que as regras sejam para todos. O MP foca somente nos grandes empreendimentos, enquanto favelas se multiplicam em áreas de mangue, numa ocupação desordenada contra a qual ninguém faz nada.

Outro empreendimento bilionário aguarda as licenças ambientais para iniciar a implantação. Um grupo espanhol espera investir R$ 2,5 bilhões em Governador Celso Ramos, no Quinta dos Ganchos, um residencial turístico de 1,2 mil hectares.

Investidores desistiram de detalhes do projeto

– Nós demos entrada no termo de referência em 2007, mas tivemos que pedir autorização ao ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade) por causa da proximidade com as ilhas do Arvoredo e Anhatomirim, duas Áreas de Preservação Permanente (APPs) – explica o administrador geral do empreendimento, Enrico Luiz Soffiatti.

O Estudo de Impacto Ambiental (EIA) foi concluído em outubro de 2008 e protocolado na Fatma. Um ano depois saiu a autorização do ICMBio.

– A licença mais difícil é a LAP (licença ambiental prévia), porque dá a viabilidade do projeto. Depois, basta cumprir as determinações. Eu acho que demora porque falta pessoal na Fatma, os técnicos estão desmotivados, com receio de responder pelos seus atos – avalia Soffiatti.

Se a LAP for concedida ainda este ano, como o empresário espera, a licença para instalação deve sair até julho do ano que vem, e o projeto, concluído em 2014. Mas os investidores tiveram que abrir mão de detalhes.

– A marina foi reduzida em 25%, de 1 mil para 750 vagas, e desistimos de fazer uma praia, porque só 10% do aterro previsto foi permitido.

Fatma promete agilidade

Depois da Operação Moeda Verde, que derrubou tanto a credibilidade da Fatma com a opinião pública quanto a autoestima dos funcionários, o presidente da fundação, Murilo Flores, prepara uma reestruturação que promete dar mais agilidade e transparência ao licenciamento ambiental no Estado.

Flores faz questão de esclarecer que licença ambiental não é um ato burocrático como a concessão de um alvará, embora seja simples em alguns casos. A demora ocorre, explica ele, por causa dos estudos mais detalhados que são necessários para garantir a integridade do meio ambiente.

– Muitas vezes, precisamos fazer cálculos, simulações matemáticas, avaliar o comportamento das correntes marítimas, nos casos de marinas, observar os efeitos na fauna e na flora. É um processo que envolve observação orgânica e requer grande aprofundamento – explica.

Além de precisar da anuência de outros órgãos ambientais, como o Ibama, o ICMBio e o Iphan, a Fatma depende também dos próprios empresários.

– Temos problemas internos, precisamos de mais gente e estamos contratando. Serão 78 novos funcionários, entre biólogos, geólogos e engenheiros de alto nível técnico. Mas também ocorre displicência por parte dos interessados, que trazem estudos incompletos e demoram até dois anos para entregar um documento solicitado. Em 99% dos casos de demoras excessivas, a responsabilidade é do empreendedor – justifica.

Atualmente, a Fatma tem apenas 280 funcionários efetivos e um total de 500 pessoas, com os profissionais cedidos e terceirizados. Mas o contingente é insuficiente para atender a uma demanda crescente.

– Nós licenciamos desde postos de gasolina até empreendimentos de US$ 1 bilhão, como o estaleiro de Biguaçu, do Eike Batista – argumenta.

Sistema online irá elevar a transparência

Flores promete para o início de 2010 a implantação de novo rito de licenciamento, que está em processo de informatização. Ele prevê o monitoramento online de todas as etapas.

– O empreendedor vai poder acompanhar pela internet em que fase o processo está. No momento da entrada, vai disparar um cronômetro. Cada vez que a Fatma pedir um documento, o cronômetro será interrompido. E só volta a andar quando a documentação for entregue. Desta maneira, todos saberão a responsabilidade da demora.

A própria Fatma terá prazos máximos para cumprir. O sistema prevê a emissão de relatórios que devem melhorar o trabalho dos técnicos.

– A Fatma é parte dos problemas, mas não é culpada por tudo. Alguns processos, pela complexidade, realmente demoram. Temos que lidar também com suspensões judiciais.

Um exemplo é a fábrica de fosfato da Bunge em parceria com noruegueses, a IFC, em Anitápolis, cuja Licença Ambiental Prévia (LAP) demorou quatro anos. E quando foi concedida, a ONG Montanha Viva conseguiu paralisar o processo na Justiça.

Apenas processos de pequenas centrais hidrelétricas, a Fatma tem 200, que estão sendo avaliados por ordem de entrada. Projetos de interesse público não entram na fila, como obras de saneamento da Capital ou desassoreamento do Rio Itajaí.

– Mas obras importantes de Florianópolis, como a Via Expressa Sul e a Beira-Mar Continental estão liberados. Já a duplicação do acesso ao aeroporto é mais complicada porque entra no mangue, reserva federal que depende do ICMBio.

Sapiens Parque quer se tornar referência

Para não incorrer na máxima “em casa de ferreiro o espeto é de pau”, o Sapiens Parque, empreendimento que rebecerá iniciativas inovadoras no Norte da Ilha e cujas diretrizes são justamente sustentabilidade e desenvolvimento, adotou uma estratégia de implantação segmentada. Para cada fase de instalação foi feito um pedido de licença ambiental.

O diretor executivo do projeto, José Eduardo Fiates, explica que o licenciamento, entre o Relatório de Impacto ao Meio Ambiente (EIA-Rima) e a Licença Ambiental Prévia (LAP), demorou três anos e meio. Mas isso foi uma questão de opção.

– O Sapiens quer seguir todas as diretrizes dos órgãos ambientais. Precisamos de licenças do Ibama, anuência dos ministérios públicos federal e estadual. Fizemos mais de 40 audiências públicas com a comunidade no processo do estudo ambiental – conta ele.

O masterplan, plano básico do projeto, foi modificado sempre que necessário e a proposta final acabou beneficiando o parque.

– Foi um tempo muito bem investido. Não é tempo perdido, já que vamos evitar problemas futuros na fase de implantação, afinal é uma área de 4,5 milhões de metros quadrados, com potencial total construtivo de 1,3 milhão de metros quadrados.

Na fase zero, que já possui licenciamento para instalação, foram construídos 15 mil metros quadrados, ou seja, algo como 0,1% do potencial. Na fase 1, que ainda precisa de licença prévia, serão mais 155 mil metros quadrados.

O projeto atende a todas as condicionantes, como acesso, infraestrutura, asfalto, energia e urbanismo na área em que está se implantando. A ideia é que o impacto seja apenas positivo no ambiente onde o Sapiens está se inserindo.

– Chegamos à Fatma com um estudo completo para não termos problemas e para facilitar o trabalho dos técnicos. O objetivo do Sapiens Parque é ser referência em tecnologia e práticas sustentáveis. Temos que dar o exemplo – resume.
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FONTE : Diário Catarinense, edição de 15 de novembro de 2009.

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