Os organismos asseguram a sobrevivência de suas espécies adaptando-se geneticamente ao ambiente. Mas, se as condições ambientais mudarem muito rapidamente, a extinção de uma espécie pode ser a consequência.
Uma estratégia para enfrentar esse desafio com sucesso é a geração de uma descendência variável, capaz de sobreviver em ambientes diferentes. Desse modo, mesmo que uma parte dos descendentes deixe de existir, a permanência da espécie como um todo estará garantida.
Pela primeira vez, cientistas observaram a evolução dessa estratégia em laboratório. Uma linhagem de bactérias exposta a condições ambientais que se modificavam rapidamente desenvolveu a capacidade de gerar descendência variável sem mutações adicionais. A estratégia assegurou a sobrevivência da linhagem. Os resultados ganharam a capa da nova edição da revista Nature, publicada nesta quinta-feira (5/11).
Um provérbio popular recomenda “não colocar todos os ovos em um cesto” para, em caso de algum imprevisto, não acabar sem um único. Na biologia, tal estratégia é conhecida como bet-hedging e tem como objetivo distribuir o risco de mortalidade, ampliando as chances de sobrevivência.
Mas, no curso da evolução, essa estratégia não é o modo habitual de se adaptar ao ambiente. O comum é que os portadores de mutações vantajosas prevaleçam em relação a indivíduos que não apresentam tais mutações.
No bet-hedging, uma geração produz descendentes que são geneticamente idênticos, mas que diferem na capacidade de prosperar em condições ambientais específicas. Algumas crias são adaptadas ao ambiente presente, enquanto outras preferem condições totalmente diferentes. No caso de mudanças rápidas e drásticas no ambiente, a vantagem fica com as segundas, que garantem a permanência da espécie.
A vantagem evolutiva da estratégia aumenta quanto mais imprevisível e drasticamente mudarem as condições ambientais. Tais mecanismos de aumento de riscos são usados pelas bactérias patogênicas: ao variar a superfície celular, organismos geneticamente idênticos conseguem escapar do sistema imunológico humano. Também são conhecidos exemplos de bet-hedging entre plantas e animais.
No novo estudo, um grupo de pesquisadores da Alemanha, Holanda e Nova Zelândia estudou bactérias da espécie Pseudomonas fluorescens. Devido ao seu tempo de geração curto (as células se dividem cada 52 minutos), essas bactérias são particularmente propícias para estudo evolucionário em laboratório. Além disso, o genoma relativamente pequeno desses organismos facilita a detecção de novas mutações.
Os cientistas expuseram linhagens de bactérias alternadamente a meios de cultura não sacudidos ou sacudidos. Devido a mutações benéficas no genoma, novas variantes emergiram nos dois ambientes, com vantagens para o ambiente sacudido ou para o não sacudido. Uma vez emergida, cada nova variante superava todos os outros representantes da linhagem ancestral que não sofreram mutações.
A partir da suposição de que uma variante que se diferenciou na sua aparência exterior de seu antecessor (por exemplo, com superfície lisa e não áspera) também deve ter suplantado a geração paterna, o representante mais frequente dessa nova variante foi escolhido e transferido para o outro ambiente.
As mutações que tinham vantagens nos meios sacudidos ficaram em desvantagem em ambientes não sacudidos, e vice-versa. Como consequência, novas mutações – e novas variantes – se desenvolveram para compensar essa desvantagem. Assim que as bactérias se adaptaram a um ambiente, foram forçadas a se readaptar ao outro.
As modificações constantes entre meios sacudidos e não sacudidos logo resultaram no desenvolvimento de tipos com a mesma constituição genética (genótipos), que sempre produziam duas variantes diferentes. Uma vez surgida, essa foi a estratégia de sobrevivência final para as bactérias, uma vez que todos os outros genótipos que produziram novas variantes por meio apenas da mutação não tinham possibilidade de prevalecer contra as variantes bet-hedging.
Solução evolutiva
A análise genética mostrou que ambas as variantes eram absolutamente idênticas no nível genético. Posteriormente, o genótipo bet-hedging se diferenciou por nove mutações da linhagem inicial do experimento. Além disso, a mutação final na série foi causal para bet-hedging.
“Nossos experimentos fornecem evidência de que a extensão do risco é uma estratégia muito bem-sucedida para adaptar-se rapidamente a ambientes que se modificam. Se o mesmo genótipo gerar diversas variantes ao mesmo tempo, ele poderá sobreviver a grandes modificações ambientais”, disse Christian Kost, do Instituto Max Planck de Ecologia Química, na Alemanha, um dos autores do estudo.
“A evolução rápida e repetida do bet-hedging durante o nosso estudo sugere que essa estratégia pode ter sido uma das primeiras soluções evolutivas para a vida em ambientes que se modificam constantemente”, disse Paul Rainey, do Centro de Evolução e Ecologia Molecular na Universidade Massey, na Nova Zelândia, outro autor do trabalho.
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FONTE : (Envolverde/Agência Fapesp)
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