Para Montanarella, a degradação da superfície terrestre é um problema que precisa ser resolvido localmente, mas em um contexto global. Na avaliação de Scholes, os subsídios oferecidos pelos governos aos produtores rurais tendem a promover uma expansão não sustentável da produção, pois permitem que corram mais riscos.
“É possível aumentar a produção sem avançar sobre áreas naturais e sem abusar de produtos químicos. Intensificação é uma grande parte da resposta, mas por meio de uma melhora das práticas de manejo da terra, promovendo a ciclagem de nutrientes, por exemplo”, afirmou.
Para Scholes, o Brasil está em uma posição favorável para lidar com essas questões por ter fortalecido ao longo dos últimos anos sua capacidade de realizar pesquisas científicas e por ter especialistas capazes de orientar soluções.
“Há um clamor político pelo fim do desmatamento e da destruição de áreas alagáveis. Temos uma oportunidade de começar a fazer as coisas de um jeito melhor. Há espaço no mercado para isso. As pessoas cada vez mais vão se questionar se os produtos que compram do Brasil são bons ou ruins [do ponto de vista ambiental]”, disse Scholes.
Watson reconhece que a produção de biocombustíveis, soja e carne é hoje a base da economia brasileira e afirma ser valiosa para muitos outros países. “O desafio é produzir esses bens de maneira mais sustentável. Avançar em direção das boas práticas. Há um jeito mais esperto de fazer isso e seria uma grande contribuição do Brasil.”
Três faces do mesmo problema
De acordo com o relatório da IPBES, os processos de degradação da terra já comprometem o bem-estar de dois quintos da humanidade – 3,2 bilhões de pessoas. Isso tem sido uma das principais causas de migração humana – o que, por sua vez, está relacionado com a intensificação de conflitos entre os povos e empobrecimento de populações, na avaliação de Watson.
“A degradação da superfície terrestre está nos conduzindo para a sexta extinção em massa de espécies”, alertou Scholes.
Para os autores do relatório, processos de degradação, perda de biodiversidade e mudanças climáticas são três faces de um mesmo problema – um fator intensifica o outro e não pode ser combatido isoladamente.
Segundo o documento, os processos de degradação contribuem fortemente para a mudança climática, tanto pelas emissões de gases-estufa resultantes do desmatamento como pela liberação do carbono anteriormente armazenado no solo. Foram liberados 4,4 bilhões de toneladas de CO2 somente entre os anos de 2000 e 2009, segundo a IPBES.
“Dada a importância da função de sequestro e armazenamento de carbono pelo solo, reduzir e reverter os processos de degradação da terra podem oferecer mais de um terço das atividades de mitigação da emissão de gases estufa necessárias até 2030 para manter a elevação da temperatura média da Terra abaixo de 2 oC, como propõe o Acordo de Paris, além de aumentar a segurança alimentar, hídrica e reduzir conflitos relacionados à migração”, disseram os cientistas.
Outro objetivo do relatório temático foi avaliar processos de restauração de terras degradadas já concluídos ou em andamento. Como explicou Scholes, foi definida como restauração qualquer iniciativa intencional de acelerar a recuperação de ecossistemas degradados.
“Fizemos uma diferenciação entre restauração e reabilitação. Esta última corresponde a iniciativas voltadas a recuperar algumas das funções críticas da terra e criar condições para que talvez ela seja recuperada. Mas retornar ao que era antes da degradação pode não ser possível em muitos lugares”, explicou.
Segundo Scholes, a restauração de áreas agrícolas degradadas, por exemplo, pode significar devolver ao solo sua qualidade original – bem como promover a integração de culturas agrícolas, criação de animais e silvicultura.
Iniciativas bem-sucedidas em áreas alagáveis incluem controle de fontes poluidoras e reinundação de áreas úmidas danificadas por drenagem. Para áreas urbanas as opções são planejamento espacial, replantio de espécies nativas, desenvolvimento de “infraestrutura verde” (parques e rios), remediação de solos contaminados e cobertos (sob asfalto, por exemplo), tratamento de águas residuais e restauração de canais fluviais.
Para os cientistas, a solução do problema requer a integração das agendas agrícola, florestal, energética, hídrica e de infraestrutura e serviços. Isso, por sua vez, necessita de políticas coordenadas entre os diferentes ministérios para, simultaneamente, incentivar práticas mais sustentáveis de produção e de consumo de commodities.
Os benefícios obtidos por meio da restauração de áreas degradadas excedem em mais de 10 vezes o custo dessas iniciativas, segundo a IPBES.
“Implementar as ações adequadas pode transformar a vida de milhões de pessoas no planeta, porém, quanto mais demoramos para agir mais difícil e cara se torna a reversão do problema”, afirmou Watson.
De acordo com Carlos Alfredo Joly, coordenador do Programa BIOTA-FAPESP e da Plataforma Brasileira de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (BPBES), a degradação está presente em todos os biomas e regiões brasileiras. É mais intensa, porém, em áreas onde a ocupação humana é mais antiga, como é o caso da Mata Atlântica.
Segundo dados do Departamento de Florestas do Ministério do Meio Ambiente (MMA), o Brasil tem 200 milhões de hectares de áreas degradadas.Fonte Fapesp (#Envolverde)
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