Todos os dias, ao defrontar-se na comunicação com o noticiário do País sobre a administração, o mundo da política, o andamento dos negócios públicos, o cidadão (inclusive o autor destas linhas) com certeza se sente perplexo e desorientado, perguntando-se o que pode e deve fazer para que mude tal quadro. Mas não encontra respostas fáceis nem imediatas.
Pode-se começar pelo Executivo federal, no qual tudo parece semiparalisado (na melhor das hipóteses), pois nada anda se não houver acordo entre as diversas forças – partidos, alas e grupos – que compõem a aliança majoritária no governo e no Congresso Nacional. E como as divergências a respeito de tudo são a regra, não se avança, para não perder o apoio dos que se sentirem descontentes. Parece melhor até manter no cargo um ministro sobre quem pesam acusações, ou nomear outro que já sobe flechado por numerosas suspeitas, do que correr o risco de perder a maioria em votações.
E com isso as grandes questões nacionais nem sequer chegam à pauta. Como a de se discutir que modelo de gestão convém: o do crescimento puro e simples dos indicadores econômicos, passando por cima das graves questões ambientais, da discussão sobre a matriz energética, da possibilidade de o Brasil ser uma potência ambiental, rica em recursos, no momento em que os economistas começam a dizer com clareza que já estamos confrontados pela finitude de recursos? Ou seguir pelos caminhos tradicionais, ditados pelos países industrializados, que deles se beneficiam há séculos, transferindo para os demais os custos ambientais e sociais?
Como na prática a última opção parece evidente, seguimos perplexos com decisões no comércio exterior, na política financeira, na área energética que precisam ser rediscutidas com urgência. E deixamos de lado questões avassaladoras, como a de metade da população não contar com rede coletora de esgotos, metade do lixo urbano continuar indo para lixões, ou o sistema de saúde estar em frangalhos em quase toda parte, o panorama da educação/analfabetismo/analfabetismo funcional causar arrepios, a inovação tecnológica quase não sair do terreno da ficção, muito menos políticas eficientes para os dramas das metrópoles, para a insegurança coletiva. Muito mais poderia ser enumerado, mas nem é preciso – embora se deva lembrar que o quadro é praticamente o mesmo na imensa maioria dos Estados e municípios.
Chega-se ao Legislativo, em Brasília, e se verifica que o tema central é o do acordo ou desacordo entre as forças majoritárias e a semiparalisia reinante, com projetos vitais esquecidos há anos, até décadas. Quem ouve falar em apressar a reforma fiscal, embora as políticas localizadas em Estados e municípios tendam a levar quase todos eles à falência e à inércia, concedendo incentivos fiscais que teriam – só na letra da lei – de ser aprovados pelo Conselho de Secretários da Fazenda? Na falta do acordo, as receitas estaduais ou municipais se tornam insuficientes para cobrir as despesas necessárias nos setores vitais – embora a carga geral de impostos no País, em tese, seja muito alta.
Não bastasse tudo isso, acordos abertos ou velados permitem mudar no Legislativo projetos como o da Lei da Ficha Limpa, para, trocando uma palavra, dificultar a identificação de quem é ou não inelegível. E ainda sem o Senado retornar o projeto à Câmara dos Deputados, como seria obrigatório, diante da modificação no texto. Esperteza repetida no projeto de lei da Política Nacional de Resíduos Sólidos, ao excluir do texto aprovado na Câmara que a incineração de lixo (inconveniente, inadequada e cara) só seria admitida na impossibilidade de qualquer outra solução.
Vai-se ao Judiciário, para constatar que processos vitais para a sociedade e o avanço das instituições estão há anos à espera de decisões – como o caso do “mensalão”. Que milhares e milhares de pessoas esperam há décadas que se cumpram precatórios em casos já apreciados em última instância pelo Judiciário – e estes cidadãos ainda são felizes, porque o acúmulo de processos nas várias instâncias torna a lentidão marca característica desse Poder fundamental da República, que impede milhões de processos de chegarem à fase decisória – até por insuficiência mesma das estruturas. Mas também porque em quase toda parte muita gente está mais empenhada em obter vantagens pecuniárias pessoais do que recursos para que o Poder funcione melhor. E ainda se revoltando quando uma voz no Conselho Nacional de Justiça apregoa aos quatro ventos certas coisas.
Mas que fará o cidadão? Que pode fazer a sociedade? Parece não fazer parte das nossas tradições a organização de novos movimentos, capazes de discutir todas essas questões e depois levar suas propostas para o campo político. Os cidadãos sentem-se limitados às possibilidades, aos caminhos, já colocados sobre a mesa, e que não os atraem. Repetindo escolhas que os desiludem ao cabo de pouco tempo. É um laissez passer ineficaz e até perigoso. Estamos vendo a cada dia surgirem no mundo movimentos contestatórios que, sem propostas políticas claras e exequíveis, abrem caminhos para mudanças tempestuosas que, tempos depois, levam a novas contestações violentas.
Este início de Quaresma é um bom tempo para uma meditação mais aprofundada a respeito dos nossos impasses. E lembrando que cabe à comunicação em geral um papel decisivo – que abra portas a novas discussões; deixe claro que estamos diante de tempos novos, em que é preciso rediscutir mesmo o próprio padrão civilizatório – e encontrar soluções adequadas para esses desafios que já estão no horizonte.
Não será pelos velhos caminhos da política fundada na troca de favores entre grupos e pessoas que encontraremos nossas possibilidades reais, como país ou como cidadãos. Precisamos, todos, dar à política muito mais do que temos feito.
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FONTE : Washington Novaes, jornalista.
Artigo originalmente publicado em O Estado de S.Paulo.
EcoDebate, 27/02/2012
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segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012
Cientistas chamam atenção para futuro dos oceanos
A conferência anual da Associação Americana para o Progresso da Ciência (AAAS) foi realizada de 16 a 20 de fevereiro em Vancouver, cidade à beira-mar no Canadá. Não por acaso, diversos relatos de pesquisas relevantes sobre a vida e o futuro dos oceanos foram apresentados durante o encontro e chamaram a atenção do público em geral e especialmente da comunidade local.
Uma das exposições de grande repercussão foi a de James Hansen, do Instituto Goddard para Estudos Espaciais da Nasa, a agência espacial norte-americana. Segundo Hansen, o uso intensivo de combustíveis fósseis e o consequente aumento das temperaturas médias dos oceanos (já bastante superiores às do Holoceno) podem levar, entre outras consequências, a elevações de vários metros do nível dos oceanos e à extinção de entre 20% e 50% das espécies do planeta.
A elevação do nível dos mares coloca em risco a própria existência física de cidades em áreas costeiras de baixa altitude, como é o caso de Vancouver, entre muitas outras. O fenômeno é intensificado pelo derretimento de parte das calotas polares, também decorrente do aquecimento global, especialmente em regiões mais próximos dos polos, como também é o caso da cidade canadense.
O alerta de Hansen, uma das grandes estrelas da reunião da AAAS, teve, portanto, grande impacto na opinião pública da cidade anfitriã da conferência, inclusive porque suas autoridades públicas tomaram recentes decisões que seguem na contramão das advertências do cientista.
Por exemplo, há planos para dobrar a produção de carvão metalúrgico e fazer crescer significativamente a de gás natural liquefeito, não só para atender à demanda local por energia, mas também para exportação.
Menos célebre do que Hansen, mas também muito respeitado na comunidade científica internacional, Villy Christensen, professor da Universidade da Colúmbia Britânica, apresentou resultados iniciais, mas impressionantes, de seu projeto Nereus, cujo nome homenageia o deus grego que previa o futuro e morava no mar Egeu.
Segundo Christensen, as melhores estimativas atuais são de que há nos oceanos cerca de 2 bilhões de toneladas de peixe, ou seja, cerca de 300 quilos para cada habitante do planeta. No entanto, pelo menos metade disso está em zonas muito profundas dos mares, é constituída de espécies pequenas demais em tamanho e, por isso, é inviável para exploração comercial e consumo humano.
E na outra metade, de peixes que medem pelo menos 90 centímetros e são apropriados para alimentação de pessoas, houve um declínio da biomassa de 55% de 1970 até agora. “É uma mudança dramática e global”, disse.
Christensen defendeu que se invista mais em pesquisa sobre a vida marinha e especialmente sobre o impacto do aquecimento global sobre ela para que decisões políticas apropriadas possam ser tomadas, mas – apesar da necessidade de mais estudos – ele acha que o que já se sabe é suficiente para muita preocupação com o futuro.
Por exemplo, há a previsão de que o aumento da temperatura das águas vai fazer com que muitas espécies de animais marinhos procurem as águas mais frias das regiões mais próximas dos polos, o que poderia beneficiar os habitantes dessas áreas.
Mas William Cheung, que trabalha no mesmo projeto Nereus, argumenta que essa conclusão otimista pode ser apressada e errada: diferenças de quantidade de oxigênio em águas frias e quente e a crescente acidificação dos oceanos, outra consequência das mudanças climáticas, também comprometem negativamente a produtividade marítima.
Lisa Levin, do Instituto de Oceanografia Scripps, da Califórnia, em outra atividade da conferência da AAAS, corroborou indiretamente a fala de Cheung. Levin mostrou conclusões de sua pesquisa, segundo as quais o aquecimento dos oceanos produzidos pelas mudanças climáticas está causando a expansão de zonas submarinas de baixo oxigênio, o que afeta negativamente a produção pesqueira de diversas regiões, inclusive as da costa da Colúmbia Britânica.
Levin chama o fenômeno de “compressão de habitat” e disse que ele afeta áreas que se estendem por mais de 150 mil quilômetros em torno das beiradas dos oceanos. Segundo suas previsões, até o ano de 2050, peixes que habitam nessas regiões podem perder 50% na variação da profundidade em que vivem.
Os canadenses são bastante sensíveis para este tipo de problema por já terem visto como podem ser socialmente dramáticos os seus efeitos. Há cerca de 20 anos, a escassez da produção de bacalhau na região de Newfoudland, na costa leste do país, provocou o fim de 40 mil empregos. Diversas espécies de peixe – como o do bacalhau atlântico daquela cidade – estão sendo consideradas como ameaçadas de extinção e sua pesca está sendo restringida ou totalmente proibida.
Patentes genéticas
Os efeitos dos problemas dos oceanos são percebidos em vários países. O professor Rashid Sumaila, também da Universidade da Colúmbia Britânica, apresentou aos participantes da conferência da AAAS estudos que conduziu no México que apontam redução de até 20% em poucos anos na produção de pesca de diversas espécies de peixes e moluscos.
Os efeitos de mudanças nos oceanos na vida do planeta discutidos na reunião da AAAS em Vancouver não se limitaram aos atuais e aos do futuro.
Peter DeMonocal, biólogo marinho da Universidade Columbia de Nova York, mostrou sua pesquisa, de acordo com a qual grandes diferenças de temperatura nos oceanos Índico e Pacífico que ocorreram há 2 milhões de anos foram responsáveis por alterações de padrões de chuva na África oriental que desertificaram vastas áreas daquele pedaço do mundo.
Mesmo quando as notícias sobre a exploração, a atividade e as mudanças nos oceanos apresentadas no encontro da AAAS são inegavelmente positivas, elas não deixaram de trazer junto com elas algum tipo de preocupação.
Por exemplo, Carlos Duarte, diretor do Instituto de Oceanos da Universidade da Austrália Ocidental, relatou como um grande tesouro de recursos genéticos está sendo descoberto e permitirá aplicações em diversos setores da economia, como medicamentos para combater dores, câncer, regenerar tecidos e ossos ou para gerar biocombustíveis.
De acordo com Duarte, desde 2009 cerca de 5 mil patentes genéticas de organismos marinhos foram requeridas e é previsto um aumento de 12% ao ano desta quantidade. Duarte também afirmou que a vida marinha tem uma diversidade muito superior à da terrestre e que pode levar até mil anos para que todas as suas espécies sejam descobertas e catalogadas.
Tudo isso pode ser ótimo, mas também pode provocar ainda mais problemas se não houver uma regulamentação bem concebida e cumprida rigorosamente para evitar excessos na pesquisa e exploração desses recursos, que agravariam ainda mais os efeitos das mudanças climáticas.
Além disso, há a questão de quem vai usufruir materialmente dessas descobertas. Apenas dez países têm 90% dos pedidos de patentes genéticas de organismos marinhos e três deles (Estados Unidos, Alemanha e Japão) têm 70%.
Isso pode fazer com que o fosso entre países ricos e pobres aumente ainda mais, com as inevitáveis tensões sociais decorrentes, e causar atritos diplomáticos capazes de prejudicar eventuais compromissos em decisões sobre problemas críticos, como os das mudanças climáticas.
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FONTE : Reportagem de Carlos Eduardo Lins da Silva, da Agência FAPESP, publicada pelo EcoDebate, 27/02/2012
Uma das exposições de grande repercussão foi a de James Hansen, do Instituto Goddard para Estudos Espaciais da Nasa, a agência espacial norte-americana. Segundo Hansen, o uso intensivo de combustíveis fósseis e o consequente aumento das temperaturas médias dos oceanos (já bastante superiores às do Holoceno) podem levar, entre outras consequências, a elevações de vários metros do nível dos oceanos e à extinção de entre 20% e 50% das espécies do planeta.
A elevação do nível dos mares coloca em risco a própria existência física de cidades em áreas costeiras de baixa altitude, como é o caso de Vancouver, entre muitas outras. O fenômeno é intensificado pelo derretimento de parte das calotas polares, também decorrente do aquecimento global, especialmente em regiões mais próximos dos polos, como também é o caso da cidade canadense.
O alerta de Hansen, uma das grandes estrelas da reunião da AAAS, teve, portanto, grande impacto na opinião pública da cidade anfitriã da conferência, inclusive porque suas autoridades públicas tomaram recentes decisões que seguem na contramão das advertências do cientista.
Por exemplo, há planos para dobrar a produção de carvão metalúrgico e fazer crescer significativamente a de gás natural liquefeito, não só para atender à demanda local por energia, mas também para exportação.
Menos célebre do que Hansen, mas também muito respeitado na comunidade científica internacional, Villy Christensen, professor da Universidade da Colúmbia Britânica, apresentou resultados iniciais, mas impressionantes, de seu projeto Nereus, cujo nome homenageia o deus grego que previa o futuro e morava no mar Egeu.
Segundo Christensen, as melhores estimativas atuais são de que há nos oceanos cerca de 2 bilhões de toneladas de peixe, ou seja, cerca de 300 quilos para cada habitante do planeta. No entanto, pelo menos metade disso está em zonas muito profundas dos mares, é constituída de espécies pequenas demais em tamanho e, por isso, é inviável para exploração comercial e consumo humano.
E na outra metade, de peixes que medem pelo menos 90 centímetros e são apropriados para alimentação de pessoas, houve um declínio da biomassa de 55% de 1970 até agora. “É uma mudança dramática e global”, disse.
Christensen defendeu que se invista mais em pesquisa sobre a vida marinha e especialmente sobre o impacto do aquecimento global sobre ela para que decisões políticas apropriadas possam ser tomadas, mas – apesar da necessidade de mais estudos – ele acha que o que já se sabe é suficiente para muita preocupação com o futuro.
Por exemplo, há a previsão de que o aumento da temperatura das águas vai fazer com que muitas espécies de animais marinhos procurem as águas mais frias das regiões mais próximas dos polos, o que poderia beneficiar os habitantes dessas áreas.
Mas William Cheung, que trabalha no mesmo projeto Nereus, argumenta que essa conclusão otimista pode ser apressada e errada: diferenças de quantidade de oxigênio em águas frias e quente e a crescente acidificação dos oceanos, outra consequência das mudanças climáticas, também comprometem negativamente a produtividade marítima.
Lisa Levin, do Instituto de Oceanografia Scripps, da Califórnia, em outra atividade da conferência da AAAS, corroborou indiretamente a fala de Cheung. Levin mostrou conclusões de sua pesquisa, segundo as quais o aquecimento dos oceanos produzidos pelas mudanças climáticas está causando a expansão de zonas submarinas de baixo oxigênio, o que afeta negativamente a produção pesqueira de diversas regiões, inclusive as da costa da Colúmbia Britânica.
Levin chama o fenômeno de “compressão de habitat” e disse que ele afeta áreas que se estendem por mais de 150 mil quilômetros em torno das beiradas dos oceanos. Segundo suas previsões, até o ano de 2050, peixes que habitam nessas regiões podem perder 50% na variação da profundidade em que vivem.
Os canadenses são bastante sensíveis para este tipo de problema por já terem visto como podem ser socialmente dramáticos os seus efeitos. Há cerca de 20 anos, a escassez da produção de bacalhau na região de Newfoudland, na costa leste do país, provocou o fim de 40 mil empregos. Diversas espécies de peixe – como o do bacalhau atlântico daquela cidade – estão sendo consideradas como ameaçadas de extinção e sua pesca está sendo restringida ou totalmente proibida.
Patentes genéticas
Os efeitos dos problemas dos oceanos são percebidos em vários países. O professor Rashid Sumaila, também da Universidade da Colúmbia Britânica, apresentou aos participantes da conferência da AAAS estudos que conduziu no México que apontam redução de até 20% em poucos anos na produção de pesca de diversas espécies de peixes e moluscos.
Os efeitos de mudanças nos oceanos na vida do planeta discutidos na reunião da AAAS em Vancouver não se limitaram aos atuais e aos do futuro.
Peter DeMonocal, biólogo marinho da Universidade Columbia de Nova York, mostrou sua pesquisa, de acordo com a qual grandes diferenças de temperatura nos oceanos Índico e Pacífico que ocorreram há 2 milhões de anos foram responsáveis por alterações de padrões de chuva na África oriental que desertificaram vastas áreas daquele pedaço do mundo.
Mesmo quando as notícias sobre a exploração, a atividade e as mudanças nos oceanos apresentadas no encontro da AAAS são inegavelmente positivas, elas não deixaram de trazer junto com elas algum tipo de preocupação.
Por exemplo, Carlos Duarte, diretor do Instituto de Oceanos da Universidade da Austrália Ocidental, relatou como um grande tesouro de recursos genéticos está sendo descoberto e permitirá aplicações em diversos setores da economia, como medicamentos para combater dores, câncer, regenerar tecidos e ossos ou para gerar biocombustíveis.
De acordo com Duarte, desde 2009 cerca de 5 mil patentes genéticas de organismos marinhos foram requeridas e é previsto um aumento de 12% ao ano desta quantidade. Duarte também afirmou que a vida marinha tem uma diversidade muito superior à da terrestre e que pode levar até mil anos para que todas as suas espécies sejam descobertas e catalogadas.
Tudo isso pode ser ótimo, mas também pode provocar ainda mais problemas se não houver uma regulamentação bem concebida e cumprida rigorosamente para evitar excessos na pesquisa e exploração desses recursos, que agravariam ainda mais os efeitos das mudanças climáticas.
Além disso, há a questão de quem vai usufruir materialmente dessas descobertas. Apenas dez países têm 90% dos pedidos de patentes genéticas de organismos marinhos e três deles (Estados Unidos, Alemanha e Japão) têm 70%.
Isso pode fazer com que o fosso entre países ricos e pobres aumente ainda mais, com as inevitáveis tensões sociais decorrentes, e causar atritos diplomáticos capazes de prejudicar eventuais compromissos em decisões sobre problemas críticos, como os das mudanças climáticas.
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FONTE : Reportagem de Carlos Eduardo Lins da Silva, da Agência FAPESP, publicada pelo EcoDebate, 27/02/2012
Imazon: Amazônia perdeu pelo menos 33 Km2 de floresta em janeiro
A Amazônia perdeu pelo menos 33 quilômetros quadrados (km²) de floresta em janeiro, segundo dados divulgados, no dia 24/2, pelo Instituto do Homem e do Meio Ambiente da Amazônia (Imazon), que faz um monitoramento, paralelo ao do governo, do desmatamento da região. O número pode estar subestimado porque, no período, 88% da floresta estava encoberta por nuvens, o que impede a visualização da área pelos satélites.
Apesar da cobertura variável de nuvens, a derrubada de vegetação acumulada entre agosto de 2011 a janeiro de 2012 (primeiros seis meses do calendário oficial de desmatamento), de 600 km², é 30% menor que a soma do período anterior (agosto de 2010 a janeiro de 2011), o que pode indicar a manutenção da tendência de queda do desmatamento na região.
Segundo o Imazon, o Pará liderou o desmatamento em janeiro, com 15 km² de novos desmatamentos identificados. Em seguida, aparecem Rondônia, com 11km² de derrubadas, Mato Grosso, com 4 km², Amazonas com 3 km² e o Acre, com 300 metros quadrados de floresta derrubada no período.
Além do corte raso (desmatamento total de uma área), o monitoramento do Imazom também registra a degradação florestal, que inclui florestas intensamente exploradas pela atividade madeireira ou queimadas. Em janeiro, a degradação avançou por 54 km², a maioria no Pará e em Mato Grosso.
O desmatamento no período foi responsável pela emissão de 3,2 milhões de toneladas de CO² equivalente (dióxido de carbono, principal gás do efeito estufa).
O monitoramento oficial do desmatamento na Amazônia é feito pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que ainda não divulgou os números de janeiro. Nos meses da estação chuvosa na Amazônia, o instituto agrupa os alertas em uma base bimestral ou trimestral, para melhorar a qualidade da amostragem.
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FONTE : Reportagem de Luana Lourenço, da Agência Brasil, publicada pelo EcoDebate, 27/02/2012
Apesar da cobertura variável de nuvens, a derrubada de vegetação acumulada entre agosto de 2011 a janeiro de 2012 (primeiros seis meses do calendário oficial de desmatamento), de 600 km², é 30% menor que a soma do período anterior (agosto de 2010 a janeiro de 2011), o que pode indicar a manutenção da tendência de queda do desmatamento na região.
Segundo o Imazon, o Pará liderou o desmatamento em janeiro, com 15 km² de novos desmatamentos identificados. Em seguida, aparecem Rondônia, com 11km² de derrubadas, Mato Grosso, com 4 km², Amazonas com 3 km² e o Acre, com 300 metros quadrados de floresta derrubada no período.
Além do corte raso (desmatamento total de uma área), o monitoramento do Imazom também registra a degradação florestal, que inclui florestas intensamente exploradas pela atividade madeireira ou queimadas. Em janeiro, a degradação avançou por 54 km², a maioria no Pará e em Mato Grosso.
O desmatamento no período foi responsável pela emissão de 3,2 milhões de toneladas de CO² equivalente (dióxido de carbono, principal gás do efeito estufa).
O monitoramento oficial do desmatamento na Amazônia é feito pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), que ainda não divulgou os números de janeiro. Nos meses da estação chuvosa na Amazônia, o instituto agrupa os alertas em uma base bimestral ou trimestral, para melhorar a qualidade da amostragem.
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FONTE : Reportagem de Luana Lourenço, da Agência Brasil, publicada pelo EcoDebate, 27/02/2012
sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012
Rio+20 e o futuro que queremos, artigo de José Goldemberg
Finalmente começa a tomar forma a conferência da Organização das Nações Unidas (ONU) para marcar o 20.º aniversário da grande conferência sobre o meio ambiente e o desenvolvimento que reuniu mais de 120 chefes de Estado em 1992, no Rio de Janeiro, e adotou a Convenção do Clima, a Convenção da Biodiversidade e a Agenda 21.
A conferência deste ano – que será realizada de 20 a 22 de junho – recebeu o apropriado nome de Rio+20 e seu objetivo é fazer um balanço do que se conseguiu realizar nos últimos 20 anos na direção de um desenvolvimento sustentável e, eventualmente, propor novos caminhos e novas ações. As perspectivas de seu sucesso são ainda incertas e mais esforço é necessário, por parte do governo brasileiro, para evitar que ela se torne apenas um palco para declarações retóricas e politicamente corretas.
A razão para um certo pessimismo tem origem no documento preparado pelas Nações Unidas em janeiro e que deverá ser discutido e, provavelmente, adotado pelos países em junho. Esse documento, com o sugestivo título O Futuro que Queremos, tem 128 parágrafos, a grande maioria dos quais não passa de exortações aos países-membros da ONU para que façam mais na direção do desenvolvimento sustentável, mas não delineia planos de ação para torná-los realidade. As palavras “reafirmar”, “reconhecer”, “encorajar” e “apelar” aparecem em 118 dos 128 parágrafos.
A Conferência do Rio em 1992 foi precedida de intensivas negociações e preparação das convenções que foram assinadas. Depois dela foram necessários cinco anos, até 1997, para a adoção do Protocolo de Kyoto, que fixou metas para a redução das emissões de gases responsáveis pelo aquecimento da Terra e um calendário para cumpri-las. O protocolo só entrou em vigor em 2005 e, mesmo assim, os Estados Unidos se mantiveram fora dele.
Os progressos alcançados desde 1992 foram modestos, o que não significa que nada tenha sido feito, apesar de os Estados Unidos não terem aderido ao Protocolo de Kyoto. Os países da União Europeia cumpriram razoavelmente bem os seus compromissos. Muitos municípios e até Estados de países federativos seguiram as recomendações da Agenda 21 e alguns adotaram metas para a redução de emissões, como o Estado da Califórnia, nos Estados Unidos, e o de São Paulo, no Brasil.
O que se esperava, portanto, da Rio+20 é que a ocasião fosse aproveitada para aprofundar os compromissos adotados em 1992 e assumir novos. Não é o que transparece do documento preparado pela ONU, que está em consideração pelos Estados-membros. De concreto mesmo, o que ele propõe é:
Transformar o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) numa agência da ONU, como a Organização Mundial da Saúde ou a Organização Mundial do Comércio, o que lhe daria mais poderes e recursos. Essa é uma boa ideia, mas de caráter burocrático;
Criar, até 2015, indicadores para medir os progressos feitos. Há sugestões de criar um indicador de desenvolvimento que leve em consideração, além do GDP (produto interno bruto, na sigla em inglês), os custos causados ao meio ambiente por um desenvolvimento predatório.
O documento também faz propostas na área de energia, o que não ocorreu na Agenda 21. Endossa a proposta do secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, de dobrar, até 2030, a eficiência com que a energia é usada e, o que é mais importante, duplicar no mesmo prazo a fração de energia renovável na matriz energética mundial. Reconhecer a importância da energia como fator fundamental para o desenvolvimento sustentável não é mais do que reconhecer a realidade, porém sua inclusão nas resoluções da Rio-92 foi vetada, na ocasião, pelos países produtores de petróleo.
Infelizmente, 2030 está longe e até a Conferência de Durban (COP 17 – 2011) foi mais ambiciosa ao acertar que até 2020 deverá entrar em vigor um acordo internacional que substitua o Protocolo de Kyoto e fixe os compromissos mandatórios de todos os países de reduzir suas emissões de gases de efeito estufa – as emissões da China já superam as dos Estados Unidos.
Para “salvar” a Rio+20 seria preciso a adoção de protocolos e de prazos para cumpri-los por meio de instrumentos legais. É isso que não ocorreu até agora para a conferência deste ano. Até a presença de um grande número de chefes de Estado ainda é incerta.
Em última análise, quem terá de assumir ações concretas são os países-membros ou as associações de países, como fez a União Europeia em relação às emissões de gases de efeito estufa. Por essa razão o Brasil tem excelentes condições de assumir a liderança desse processo, juntamente com a África do Sul, a China e a Índia, com programas que já adotou e tiveram sucesso, como o Luz para Todos ou a produção de etanol da cana-de-açúcar. Outros países têm excelentes programas de energia eólica, como a Espanha, a Dinamarca e até os Estados Unidos.
Os problemas que a humanidade enfrenta hoje são sérios e comprometem efetivamente as gerações futuras. A exploração predatória dos recursos naturais está levando à exaustão dos combustíveis fósseis e da biodiversidade dos ecossistemas que são essenciais para garantir a continuidade da produção de alimentos. A euforia com descobertas de petróleo no pré-sal, no Brasil, não muda o fato de que as reservas mundiais de petróleo e de gás não deverão durar muitos anos e de que seu uso é a principal fonte da poluição urbana e também da poluição global que enfrentamos.
A percepção de que preocupações com a proteção ambiental são um obstáculo ao desenvolvimento econômico é equivocada e precisa ser desmitificada. A Rio+20 oferece uma oportunidade para fazê-lo.
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FONTE : JOSÉ GOLDEMBERG, PROFESSOR EMÉRITO DA USP; FOI SECRETÁRIO ESPECIAL DO MEIO AMBIENTE DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA EM 1992.
Artigo originalmente publicado em O Estado de S.Paulo.
EcoDebate, 24/02/2012
A conferência deste ano – que será realizada de 20 a 22 de junho – recebeu o apropriado nome de Rio+20 e seu objetivo é fazer um balanço do que se conseguiu realizar nos últimos 20 anos na direção de um desenvolvimento sustentável e, eventualmente, propor novos caminhos e novas ações. As perspectivas de seu sucesso são ainda incertas e mais esforço é necessário, por parte do governo brasileiro, para evitar que ela se torne apenas um palco para declarações retóricas e politicamente corretas.
A razão para um certo pessimismo tem origem no documento preparado pelas Nações Unidas em janeiro e que deverá ser discutido e, provavelmente, adotado pelos países em junho. Esse documento, com o sugestivo título O Futuro que Queremos, tem 128 parágrafos, a grande maioria dos quais não passa de exortações aos países-membros da ONU para que façam mais na direção do desenvolvimento sustentável, mas não delineia planos de ação para torná-los realidade. As palavras “reafirmar”, “reconhecer”, “encorajar” e “apelar” aparecem em 118 dos 128 parágrafos.
A Conferência do Rio em 1992 foi precedida de intensivas negociações e preparação das convenções que foram assinadas. Depois dela foram necessários cinco anos, até 1997, para a adoção do Protocolo de Kyoto, que fixou metas para a redução das emissões de gases responsáveis pelo aquecimento da Terra e um calendário para cumpri-las. O protocolo só entrou em vigor em 2005 e, mesmo assim, os Estados Unidos se mantiveram fora dele.
Os progressos alcançados desde 1992 foram modestos, o que não significa que nada tenha sido feito, apesar de os Estados Unidos não terem aderido ao Protocolo de Kyoto. Os países da União Europeia cumpriram razoavelmente bem os seus compromissos. Muitos municípios e até Estados de países federativos seguiram as recomendações da Agenda 21 e alguns adotaram metas para a redução de emissões, como o Estado da Califórnia, nos Estados Unidos, e o de São Paulo, no Brasil.
O que se esperava, portanto, da Rio+20 é que a ocasião fosse aproveitada para aprofundar os compromissos adotados em 1992 e assumir novos. Não é o que transparece do documento preparado pela ONU, que está em consideração pelos Estados-membros. De concreto mesmo, o que ele propõe é:
Transformar o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) numa agência da ONU, como a Organização Mundial da Saúde ou a Organização Mundial do Comércio, o que lhe daria mais poderes e recursos. Essa é uma boa ideia, mas de caráter burocrático;
Criar, até 2015, indicadores para medir os progressos feitos. Há sugestões de criar um indicador de desenvolvimento que leve em consideração, além do GDP (produto interno bruto, na sigla em inglês), os custos causados ao meio ambiente por um desenvolvimento predatório.
O documento também faz propostas na área de energia, o que não ocorreu na Agenda 21. Endossa a proposta do secretário-geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, de dobrar, até 2030, a eficiência com que a energia é usada e, o que é mais importante, duplicar no mesmo prazo a fração de energia renovável na matriz energética mundial. Reconhecer a importância da energia como fator fundamental para o desenvolvimento sustentável não é mais do que reconhecer a realidade, porém sua inclusão nas resoluções da Rio-92 foi vetada, na ocasião, pelos países produtores de petróleo.
Infelizmente, 2030 está longe e até a Conferência de Durban (COP 17 – 2011) foi mais ambiciosa ao acertar que até 2020 deverá entrar em vigor um acordo internacional que substitua o Protocolo de Kyoto e fixe os compromissos mandatórios de todos os países de reduzir suas emissões de gases de efeito estufa – as emissões da China já superam as dos Estados Unidos.
Para “salvar” a Rio+20 seria preciso a adoção de protocolos e de prazos para cumpri-los por meio de instrumentos legais. É isso que não ocorreu até agora para a conferência deste ano. Até a presença de um grande número de chefes de Estado ainda é incerta.
Em última análise, quem terá de assumir ações concretas são os países-membros ou as associações de países, como fez a União Europeia em relação às emissões de gases de efeito estufa. Por essa razão o Brasil tem excelentes condições de assumir a liderança desse processo, juntamente com a África do Sul, a China e a Índia, com programas que já adotou e tiveram sucesso, como o Luz para Todos ou a produção de etanol da cana-de-açúcar. Outros países têm excelentes programas de energia eólica, como a Espanha, a Dinamarca e até os Estados Unidos.
Os problemas que a humanidade enfrenta hoje são sérios e comprometem efetivamente as gerações futuras. A exploração predatória dos recursos naturais está levando à exaustão dos combustíveis fósseis e da biodiversidade dos ecossistemas que são essenciais para garantir a continuidade da produção de alimentos. A euforia com descobertas de petróleo no pré-sal, no Brasil, não muda o fato de que as reservas mundiais de petróleo e de gás não deverão durar muitos anos e de que seu uso é a principal fonte da poluição urbana e também da poluição global que enfrentamos.
A percepção de que preocupações com a proteção ambiental são um obstáculo ao desenvolvimento econômico é equivocada e precisa ser desmitificada. A Rio+20 oferece uma oportunidade para fazê-lo.
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FONTE : JOSÉ GOLDEMBERG, PROFESSOR EMÉRITO DA USP; FOI SECRETÁRIO ESPECIAL DO MEIO AMBIENTE DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA EM 1992.
Artigo originalmente publicado em O Estado de S.Paulo.
EcoDebate, 24/02/2012
Brasil acanhado frente à Rio+20, artigo de José Eli da Veiga
Muito se contradisse o negociador-chefe do Brasil para a Rio+20, embaixador André Corrêa do Lago, ao responder às excelentes perguntas da repórter especial do Valor Daniela Chiaretti (16/2, p. A13). Ele ressaltou que há 20 anos ninguém podia imaginar que a Convenção do Clima se tornaria a principal negociação econômica no mundo. Mesmo assim, rechaçou a hipótese de que a cúpula de junho tenha ênfase ambiental. Pior: serviu-se da conhecida parábola dos “três pilares” contra o terceiro princípio da Declaração do Rio: o de equidade entre necessidades desenvolvimentistas e ambientais.
Se ele mesmo diz que um tema eminentemente ambiental, como é a questão climática, acabou por gerar a principal negociação econômica do mundo, não deveria ao menos enxergar vasos comunicantes entre supostos “três pilares”?
Quando John Elkington lançou essa metáfora para sensibilizar executivos de multinacionais, ele se referia a lucro, gente e planeta, termos que em sua língua começam pela letra “p”: “profit”, “people” e “planet” (ver resenha do clássico de Elkington no Valor de 27/09/2011, p. D10). Não tinha como imaginar que, quinze anos depois, seu insight seria usado para se vender a ladainha de que as sociedades se apoiariam em três pilares distanciados e paralelos.
Muito antes da emergência do ideal da sustentabilidade, já se mostrava impossível separar o econômico do social e vice-versa. Além disso, quando se evoca o processo de desenvolvimento, não é possível ignorar a importância crucial de ao menos três outras esferas: política, cultural e psicológica. Boa pedagogia faz com que sejam evitadas em treinamentos empresariais, já que seu objeto não é o conjunto da sociedade. E se o truque for rebater tal crítica com a chicana de que todas as outras esferas seriam partes da dimensão social, então fica muito mais grave o problema da conexão que a economia mantém com a biosfera (ambiente), ambas reagindo a uma incomensurável imensidão que seria o “social”. Enfim, por ser todo o alicerce do desenvolvimento humano, o ambiente não pode ser retoricamente rebaixado a mero fator de um trinômio.
Mesmo supondo-se que as dimensões do desenvolvimento sustentável pudessem ser reduzidas aos três pilares dos negócios, eles não seriam assimiláveis a pilotis de um prédio. Nesse reducionismo, a metáfora precisaria realçar o caráter poroso das intersecções. Afinal, os supostos “pilares” da sociedade são atravessados por fluxos que permanentemente se misturam. Uma osmose que torna a integração dos vetores de desenvolvimento o nó górdio do processo.
Ora, é exatamente essa integração que deveria demover o Brasil de assumir na preparação da Rio+20 o positivismo dos “três pilares”. Essencialmente porque é o combate às desigualdades – tanto entre as nações (eufemisticamente chamadas de “assimetrias”), quanto nacionais (principalmente, mas não apenas de renda) – que dá a liga do desenvolvimento sustentável, seja quantos forem seus imaginários “pilares”. Como as mais cruciais desigualdades são reproduzidas antes de tudo por razões ideológicas, o Brasil não deveria enfiar essa viola no saco.
Mas há outra revelação igualmente chocante na entrevista de nosso “sherpa”: explícita afinidade com comportamento dos EUA, em contraposição ao da Europa, alvo de sistemática e repetida desqualificação.
Não é razoável que, quatro meses antes da abertura de tão relevante conferência, o governo anfitrião se mostre alinhado a algum dos polos, por mais direito que tenha em discordar de outros. Ainda mais deplorável, neste caso, é se aceitar que o tema da “governança internacional do desenvolvimento sustentável” se restrinja ao conflito norte-transatlântico sobre a eventual criação de mais uma agência especializada da ONU (a 16ª!) e de uma reforma de seu Conselho Econômico Social (Ecosoc).
Falando sério: poderá haver governança do desenvolvimento sustentável se ela não for assumida pelo G-20 (que inclui o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial)? Sem isso, será que ela poderia chegar à OMC e a poderosas instâncias do sistema das Nações Unidas que não respondem ao Ecosoc? Ou será que o desenvolvimento sustentável seria capaz de adquirir governança global sem engajamento da Corte Internacional de Justiça e, sobretudo, dos órgãos subsidiários do Conselho de Segurança?
Com certeza no final de junho sairá do Rio algum tipo de “upgrade” da sustentabilidade na hierarquia da ONU. Mas isso será, na melhor das hipóteses, um modestíssimo avanço na direção de sua efetiva governança global. Em tais circunstâncias, seria bem melhor se o Brasil aproveitasse a incomparável oportunidade histórica de ser o anfitrião de uma cúpula voltada a “repensar o desenvolvimento do mundo” (sic), para reerguer a bandeira branca da igualdade, em vez de se deixar levar a reboque em disputas sobre Ecosoc e programa ambiental (Pnuma). Mais: se mantivesse a altivez de não aderir ao polo que mais tem resistido à bandeira da sustentabilidade, nem rejeitar justamente o polo que mais se mostra disposto a levá-la a sério.
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FONTE : José Eli da Veiga é professor dos programas de pós-graduação do Instituto de Relações Internacionais da USP (IRI/USP) e do Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPÊ).
Artigo originalmente publicado no Valor Econômico e socializado pelo ClippingMP
EcoDebate, 24/02/2012
Se ele mesmo diz que um tema eminentemente ambiental, como é a questão climática, acabou por gerar a principal negociação econômica do mundo, não deveria ao menos enxergar vasos comunicantes entre supostos “três pilares”?
Quando John Elkington lançou essa metáfora para sensibilizar executivos de multinacionais, ele se referia a lucro, gente e planeta, termos que em sua língua começam pela letra “p”: “profit”, “people” e “planet” (ver resenha do clássico de Elkington no Valor de 27/09/2011, p. D10). Não tinha como imaginar que, quinze anos depois, seu insight seria usado para se vender a ladainha de que as sociedades se apoiariam em três pilares distanciados e paralelos.
Muito antes da emergência do ideal da sustentabilidade, já se mostrava impossível separar o econômico do social e vice-versa. Além disso, quando se evoca o processo de desenvolvimento, não é possível ignorar a importância crucial de ao menos três outras esferas: política, cultural e psicológica. Boa pedagogia faz com que sejam evitadas em treinamentos empresariais, já que seu objeto não é o conjunto da sociedade. E se o truque for rebater tal crítica com a chicana de que todas as outras esferas seriam partes da dimensão social, então fica muito mais grave o problema da conexão que a economia mantém com a biosfera (ambiente), ambas reagindo a uma incomensurável imensidão que seria o “social”. Enfim, por ser todo o alicerce do desenvolvimento humano, o ambiente não pode ser retoricamente rebaixado a mero fator de um trinômio.
Mesmo supondo-se que as dimensões do desenvolvimento sustentável pudessem ser reduzidas aos três pilares dos negócios, eles não seriam assimiláveis a pilotis de um prédio. Nesse reducionismo, a metáfora precisaria realçar o caráter poroso das intersecções. Afinal, os supostos “pilares” da sociedade são atravessados por fluxos que permanentemente se misturam. Uma osmose que torna a integração dos vetores de desenvolvimento o nó górdio do processo.
Ora, é exatamente essa integração que deveria demover o Brasil de assumir na preparação da Rio+20 o positivismo dos “três pilares”. Essencialmente porque é o combate às desigualdades – tanto entre as nações (eufemisticamente chamadas de “assimetrias”), quanto nacionais (principalmente, mas não apenas de renda) – que dá a liga do desenvolvimento sustentável, seja quantos forem seus imaginários “pilares”. Como as mais cruciais desigualdades são reproduzidas antes de tudo por razões ideológicas, o Brasil não deveria enfiar essa viola no saco.
Mas há outra revelação igualmente chocante na entrevista de nosso “sherpa”: explícita afinidade com comportamento dos EUA, em contraposição ao da Europa, alvo de sistemática e repetida desqualificação.
Não é razoável que, quatro meses antes da abertura de tão relevante conferência, o governo anfitrião se mostre alinhado a algum dos polos, por mais direito que tenha em discordar de outros. Ainda mais deplorável, neste caso, é se aceitar que o tema da “governança internacional do desenvolvimento sustentável” se restrinja ao conflito norte-transatlântico sobre a eventual criação de mais uma agência especializada da ONU (a 16ª!) e de uma reforma de seu Conselho Econômico Social (Ecosoc).
Falando sério: poderá haver governança do desenvolvimento sustentável se ela não for assumida pelo G-20 (que inclui o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial)? Sem isso, será que ela poderia chegar à OMC e a poderosas instâncias do sistema das Nações Unidas que não respondem ao Ecosoc? Ou será que o desenvolvimento sustentável seria capaz de adquirir governança global sem engajamento da Corte Internacional de Justiça e, sobretudo, dos órgãos subsidiários do Conselho de Segurança?
Com certeza no final de junho sairá do Rio algum tipo de “upgrade” da sustentabilidade na hierarquia da ONU. Mas isso será, na melhor das hipóteses, um modestíssimo avanço na direção de sua efetiva governança global. Em tais circunstâncias, seria bem melhor se o Brasil aproveitasse a incomparável oportunidade histórica de ser o anfitrião de uma cúpula voltada a “repensar o desenvolvimento do mundo” (sic), para reerguer a bandeira branca da igualdade, em vez de se deixar levar a reboque em disputas sobre Ecosoc e programa ambiental (Pnuma). Mais: se mantivesse a altivez de não aderir ao polo que mais tem resistido à bandeira da sustentabilidade, nem rejeitar justamente o polo que mais se mostra disposto a levá-la a sério.
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FONTE : José Eli da Veiga é professor dos programas de pós-graduação do Instituto de Relações Internacionais da USP (IRI/USP) e do Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPÊ).
Artigo originalmente publicado no Valor Econômico e socializado pelo ClippingMP
EcoDebate, 24/02/2012
quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012
Oceanos cada vez mais ácidos ameaçam 30% das espécies marinhas
Processo de acidificação dos oceanos
Os cientistas examinaram a água abaixo dos vulcões, nas quais o dióxido de carbono ocorre naturalmente, para verificar como a vida marinha lida com a água mais ácida. Segundo os pesquisadores, nos próximos anos a água marinha começará a afetar alguns organismos e alguns tipos de corais não conseguirão sobreviver.
O trabalho foi apresentado pelo cientista britânico Jason Hall-Spencer, que estudou as aberturas vulcânicas no oceano. Segundo ele, a conclusão da pesquisa é um “aviso” sobre o futuro dos ecossistemas marítimos. O trabalho foi apresentado por ele durante conferência em Vancouver, no Canadá.
Hall-Spencer disse que examina as aberturas vulcânicas como uma máquina do tempo. “Nem todas as espécies estão calcificadas. Há conchas e esqueletos rígidos e existem outros organismos com corpos macios que também deixam o mar [em busca de qualidade de vida]”, explicou.
O cientista ressaltou que há 55 milhões de anos aconteceu situação semelhante à identificada na pesquisa, que leva cerca de 10 mil anos para ocorrer. Segundo Hall-Spencer, os oceanos precisam de aproximadamente 125 mil anos para se recuperar e obter de volta a “química normal”.
“[Ou seja], o que fizermos ao longo dos próximos 100 anos ou 200 anos pode ter influência nos ecossistemas oceânicos de dezenas de milhares a milhões de anos. Essa é a implicação do que estamos fazendo com os oceanos agora”, destacou Hall-Spencer.
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FONTE : *Com informações da BBC Brasil//Edição: Graça Adjuto
Reportagem de Renata Giraldi*, da Agência Brasil, publicada pelo EcoDebate, 21/02/2012
Nas mãos de poucos, escassez de sementes preocupa agricultores
Com o avanço da demanda, empresas responsáveis pela comercialização estão cancelando os pedidos e oferecendo produtos de qualidade inferior para não deixar o produtor na mão.
Produtores de milho em Mato Grosso temem atraso no plantio ou perda de produtividade em decorrência da falta de sementes. Com o avanço da demanda, empresas responsáveis pela comercialização estão cancelando os pedidos e oferecendo produtos de qualidade inferior para não deixar o produtor na mão.
A reportagem foi publicada pelo MT Agora, 12-02-2012 e reproduzida pelo boletim da AS-PTA.
Presidente da Associação do Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja/MT), Carlos Henrique Fávaro, explica que houve aumento até abusivo no preço da sementes, mas que isso é consequência natural do mercado devido ao crescimento na demanda. Segundo ele o que preocupa, na verdade, é o não cumprimento dos compromissos na entrega das encomendas e possível atraso.
“Até mesmo os levantamentos de safra estão incertos porque os produtores estão de pendendo das sementeiras. Preocupação é se as entregas serão ou não feitas a tempo”. Data recomendável para semear o milho é 20 de fevereiro, mas o analista da CONAB, Petrônio Sobrinho acredita que esta data será ultrapassada, mesmo que os agricultores corram riscos de perder na produtividade.
Gerente do sindicato rural de Campo Novo do Parecis (a 384 km de Cuiabá), Antônio de La Bandeira, explica que os produtores estão reclamando principalmente da troca na hora de entregar os pedidos. “Como estão esgotando as sementes de primeira linha, as empresas oferecem produtos de qualidade inferior para garantir a venda e os produtores aceitam para não perder tudo”.
Fávaro revela que, como se prepararam para o plantio, com a compra de insumos e planejamento, os produtores não podem perder o investimento e aceitam a semente, mesmo que não seja a que foi pedida. De acordo com a Agroceres Sementes [comprada pela Monsanto], que atende o Estado, os clientes e distribuidores estão sendo abastecidos conforme o cronograma, sendo que o planejamento é feito com pelo menos 1 ano de antecedência. Segundo a assessoria, a região de Mato Grosso registrou aumento no volume de sementes em cerca de 30% em relação à safra passada e a empresa desconhece a falta dos híbridos.
***************************
FONTE : (Ecodebate, 21/02/2012) publicado pela IHU On-line, parceiro estratégico do EcoDebate na socialização da informação.
[IHU On-line é publicada pelo Instituto Humanitas Unisinos - IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]
Produtores de milho em Mato Grosso temem atraso no plantio ou perda de produtividade em decorrência da falta de sementes. Com o avanço da demanda, empresas responsáveis pela comercialização estão cancelando os pedidos e oferecendo produtos de qualidade inferior para não deixar o produtor na mão.
A reportagem foi publicada pelo MT Agora, 12-02-2012 e reproduzida pelo boletim da AS-PTA.
Presidente da Associação do Produtores de Soja e Milho de Mato Grosso (Aprosoja/MT), Carlos Henrique Fávaro, explica que houve aumento até abusivo no preço da sementes, mas que isso é consequência natural do mercado devido ao crescimento na demanda. Segundo ele o que preocupa, na verdade, é o não cumprimento dos compromissos na entrega das encomendas e possível atraso.
“Até mesmo os levantamentos de safra estão incertos porque os produtores estão de pendendo das sementeiras. Preocupação é se as entregas serão ou não feitas a tempo”. Data recomendável para semear o milho é 20 de fevereiro, mas o analista da CONAB, Petrônio Sobrinho acredita que esta data será ultrapassada, mesmo que os agricultores corram riscos de perder na produtividade.
Gerente do sindicato rural de Campo Novo do Parecis (a 384 km de Cuiabá), Antônio de La Bandeira, explica que os produtores estão reclamando principalmente da troca na hora de entregar os pedidos. “Como estão esgotando as sementes de primeira linha, as empresas oferecem produtos de qualidade inferior para garantir a venda e os produtores aceitam para não perder tudo”.
Fávaro revela que, como se prepararam para o plantio, com a compra de insumos e planejamento, os produtores não podem perder o investimento e aceitam a semente, mesmo que não seja a que foi pedida. De acordo com a Agroceres Sementes [comprada pela Monsanto], que atende o Estado, os clientes e distribuidores estão sendo abastecidos conforme o cronograma, sendo que o planejamento é feito com pelo menos 1 ano de antecedência. Segundo a assessoria, a região de Mato Grosso registrou aumento no volume de sementes em cerca de 30% em relação à safra passada e a empresa desconhece a falta dos híbridos.
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FONTE : (Ecodebate, 21/02/2012) publicado pela IHU On-line, parceiro estratégico do EcoDebate na socialização da informação.
[IHU On-line é publicada pelo Instituto Humanitas Unisinos - IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]
domingo, 19 de fevereiro de 2012
Carta enviada ao Diário Catarinense - Florianópolis - SC
Ao editor,
Provàvelmente parte do que escrevo abaixo será "cortado" devido a economia de espaço, mas o que transmito não é só o meu pensamento, mas sim o pensamento da maioria dos habitantes desta ilha, aonde sòmente cerca de 30% do esgoto é tratada antes de ser "deitada" ao mar.
Dr. Fernando Bihari
Provàvelmente parte do que escrevo abaixo será "cortado" devido a economia de espaço, mas o que transmito não é só o meu pensamento, mas sim o pensamento da maioria dos habitantes desta ilha, aonde sòmente cerca de 30% do esgoto é tratada antes de ser "deitada" ao mar.
Dr. Fernando Bihari
Canasvieiras - Florianopolis (SC)
3204-9398
Lamento
É uma vergonha monstruosa fatos que vem acontecendo na bela e aprazivel cidade de Florianopolis, centro turístico de soberba importância não só ao estado de Santa Catarina mas e até principalmente ao Brasil.
A começar pela bela e maravilhosa orla marinha que circunda a ilha de Santa Catarina, aonde encontramos recantos de beleza até estonteantes amealhadas de pontos nos quais o prazer de se quedar por longos momentos de paz e tranquilidade, ao sabor do doce barulho do mar e da brisa que dele vem bafejando o corpo e a alma. Porém basta um só dia de chuva, alguns minutos ou horas de chuva, para que tudo se torne em uma pocilga indescritivel eivando a todos de bactérias e virus que transformam consultórios médicos e hospitais em abrigos de seres diarréicos, desidratados e que a cada respirada um vomito se segue, tudo por que após séculos de colonização e de crescimento populacional as tais autoridades “constituídas” em seus discursos imemoravéis cheios de promessas e de falsas realizações até o dia de hoje, em pleno século XXI, não aproveitaram os rios de dinheiros arrecadados através de impostos e taxas acharcantes um sistema de esgoto digno do nome. Porém não só deles cabe a culpa deste descalabro ambiental, cabe a uma grande parcela da população que também deveria gritar o “mea culpa” por deitarem nos rios e sistemas pluviais clandestinas bocas de esgoto e toneladas de lixo, além, lògico, por desinformação, ignorância ou irresponsabilidade continuarem votando em políticos inescrupulosos, corruptos, desonestos, canhestros, falcatrueiros e deslavadamente sujos cujo o único interesse e se manterem em seus cargos ou funções, completamente inoperantes e jactosos de feitos irrealizados ou simplesmentes menores face aos problemas que afligem a todos que nesta ilha habitam.
O mesmo teor de críticas podemos lançar quanto ao sistema de saúde pública, começando pelo serviço de urgência, a falta de verdadeiros hospitais de emergência, vulgo pronto-socorros, equipados para tôdas as possivéis emergências, desde salas de cirurgia para especialidades como cirurgia geral pediátricas ou não, obstetrícia, neurocirurgia e ortopedia, principais áreas em casos de urgência devido a acidentes e entidades médicas diversas, e lògicamente Centro de Terapia Intensiva. Qualquer acidente ou incidente, seja em via pública ou doméstica, espera-se por minutos e até horas infindavéis para o surgimento de uma ambulância ou para a remoção aérea. Não basta ter sòmente um hospital geral no centro da cidade (Hospital Celso Ramos) são necessários, pelo menos mais dois, um no norte da ilha e outro no sul da ilha, todos com equipes em 24 horas de plantão, com equipes médicas com pelo menos 15 médicos de diversas especialidades, mais internos e residentes fora as demais especialidades profissionais necessárias para o funcionamento pleno e eficiente de um hospital de emergência.
Não me venham com desculpas de faltas de verbas, pois elas existem, tanto existem que a turma do executivo e do legislativo votam fàcilmente para aumento de seus "vencimentos" fora todos os benefícios e as diversas "comissões" recebidas em licitações programadas e direcionadas conforme interesses proprios.
Mas qual o que... para os diversos administradores que por aqui passaram e passam, em discursos tudo estava lá e por incrivel que pareça proclamam até já existirem tôdas estas condições acima descritas, mas na prática e na realidade nada disto se vê...
Lamento e espero que tais fatos sejam urgentemente solucionados pois o grande afluxo de turistas um dia irá acabar e uma vergonhosa faixa poderá ser até estendida no aeroporto (outro ponto falho) ou na rodoviária (também) com os seguintes dizeres: ILHA FECHADA A ACESSO DE SERES HUMANOS DEVIDO À INSULABRIDADE – RISCO DE VIDA.
sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012
O Antropoceno: o ser humano como o grande agressor, artigo de Leonardo Boff
Ultimamente ouvimos mais e mais vozes de economistas, geralmente, os mais renitentes face às questões ecológicas, referindo-se aos limites físicos da Terra. Nenhuma solução da atual crise econômico-financeira, dizem, pode ignorar este dado. Efetivamente, o sistema do capital que vive de uma dupla exploração, da natureza e da força de trabalho, está sentindo dificuldades em se auto-reproduzir.
As crises clássicas conhecidas, como por exemplo a de 1929, afetaram profundamente todas as sociedades. A crise atual é mais radical, pois está atacando o nosso modus essendi: as bases da vida e de nossa civilização. Antes, dava-se por descontado que a Terra estava aí, intacta e com recursos inesgotáveis. Agora não podemos mais contar com a Terra sã e abundante em bens e serviços. Ela é finita, degradada e com febre, não suportando mais um projeto infinito de progresso/crescimento como o busca obstinadamente o governo brasileiro mediante o PAC.
A presente crise desnuda a enganosa compreensão dominante sobre a história, a natureza e a Terra. Ela colocava o ser humano fora e acima da natureza com a excepcionalidade de sua missão, a de submetê-la e dominá-la. Perdemos a noção, comum a todos os povos originários, de que pertencemos à natureza e de que somos sua parte e parcela. Hoje diríamos, somos parte do sistema solar, de nossa galáxia que, por sua vez, é parte do universo. Todos surgimos ao longo de um imenso processo evolucionário que já dura 13,7 bilhões de anos. Tudo é alimentado pela Energia de Fundo e pelas quatro interações que sempre atuam conjuntamente: a gravitacional, a eletromagnética e a nuclear fraca e forte. A vida e a consciência são emergências desse processo.
Nós humanos, representamos a parte consciente e inteligente do universo, da Via-Láctea e da própria Terra, com a missão, não de dominá-la mas de cuidar dela para manter as condições físico-químicas-ecológicas que nos permitem levar avante a nossa vida e a civilização que tão custosamente construímos.
Ora, estas condições estão sendo minadas pelo atual processo produtivista e consumista. Já não se trata de salvar o sistema econômico, nem nosso bem estar, mas a vida humana e a civilização. Se não moderarmos nossa voracidade e não entrarmos em sinergia com a natureza dificilmente sairemos da atual situação. Ou substituímos estas premissas equivocadas por melhores e mais adequadas ou corremos o risco de nos autodestruirmos. A consciência do risco é explicitamente denunciaa na Carta da Terra, já sua primeira página, mas ela não é ainda coletiva.
Para sermos realistas cabe reconhecer um dado do processo evolucionário que nos perturba: junto com grande harmonia, coexiste também extrema violência A Terra mesma no seu percurso de 4,5 bilhões de anos, passou por várias devastações. Em algumas delas perdeu quase 90% de seu capital biótico. Mas a vida sempre se manteve e se refez com renovado vigor. O universo sempre conseguiu transformar o caos destrutivo em caos criativo. Do caos criou o cosmos (formas mais altas e elegantes de seres e de organismos vivos).
A última grande dizimação, um verdadeiro Armagedon ambiental, ocorreu há 67 milhões de anos, quando no Caribe, próximo a Yucatán no México, caiu um meteoro de quase 10 km de extensão. Produziu um tsunami com ondas do tamanho de altos edifícios. Ocasionou um tremor que afetou todo o planeta, ativando a maioria dos vulcões. Uma imensa nuvem de poeira e de gases foi ejetada ao céu, alterando, por dezenas de anos, todo o clima da Terra. Os dinossauros que por mais de cem milhões de anos reinavam, soberanos, por sobre toda a Terra, desapareceram totalmente.
Chegava ao fim a Era Mesozóica, dos répteis e começava a Era Cenozóica, dos mamíferos. Em seguida, como que se vingando, a Terra produziu uma floração de vida como nunca antes na evolução. Nossos ancestrais biológicos, do tamanho de um coelhinho, surgiram por esta época. Somos do gênero dos mamíferos . Evoluímos até chegarmos ao homo sapiens.
Mas eis que nos últimos trezentos anos o homo sapiens que se mostrou também demens (hoje somos sapiens-demens) montou uma investida poderosíssima sobre todas as comunidades ecossistêmicas do planeta. Explorou-as sistematicamente e canalizou grande parte do produto terrestre bruto para os sistemas humanos de consumo e bem-estar. O preço que temos pago equivale a uma dizimação semelhante àquelas de outrora.
O biólogo E. Wilson fala que a “humanidade é a primeira espécie na história da vida na Terra a se tornar numa força geofísica” destruidora. A taxa de extinção de espécies produzidas pela atividade humana, segundo ele, é cinquenta vezes maior do que aquela anterior à intervenção humana. Com a atual aceleração, dentro de pouco – continua Wilson – podemos alcançar a cifra de mil até dez mil vezes mais espécies exterminadas pelo voraz processo consumista. Em 1992 ele estimava a perda dentre 27.000 e 100.00 espécies por ano. O caos climático atual é um dos efeitos desta guerra humana contra Gaia sem nenhuma chance de ganhá-la.
O prêmio Nobel de Química de 1995, o holandês Paul J. Crutzen, aterrorizado pela magnitude do atual ecocídio, afirmou que inauguramos uma nova era geológica: a do antropoceno. Por esta palavra quis denunciar as grandes dizimações perpetradas pela irracionalidade do ser humano(em grego ántropos). Somos os principais causadores da erosão física, química e biológica da Terra.
Assim terminou tristemente a aventura de 66 milhões de anos de história da Era Cenozóica. Começa o tempo da obscuridade.
Para onde nos conduz o antropoceno? À base do baixo nível de consciência atual dos riscos que corremos, ninguém tem condições de prever qualquer saída salvadora. A nós cabe refletir seriamente, denunciar e gritar por todos os meios disponíveis, poisa nossa própria geração poderá conhecer as conseqüências funestas da irracionalidade de nossa forma de habitar o planeta, de produzir, de consumir e de esbanjar seus bens e serviços cada vez mais escassos.
Os Indignados na Europa e os “Ocuppiers” nos EUA já mostram uma nova consciência político-ecológica pois, entre tantas outras coisas, cobram tamém uma governança global do planeta Terra para fazer frente aos perigos coletivos que pesam sobre a vida e a humanidade.
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FONTE : Leonardo Boff, Filósofo/Teólogo, é autor do livro “Cuidar da Terra-proteger a vida:como evitar o fim do mundo”, Record, Rio de Janeiro 2010.
Artigo originalmente publicado no blogue pessoal de Leonardo Boff, @LeonardoBoff
EcoDebate, 17/02/2012
As crises clássicas conhecidas, como por exemplo a de 1929, afetaram profundamente todas as sociedades. A crise atual é mais radical, pois está atacando o nosso modus essendi: as bases da vida e de nossa civilização. Antes, dava-se por descontado que a Terra estava aí, intacta e com recursos inesgotáveis. Agora não podemos mais contar com a Terra sã e abundante em bens e serviços. Ela é finita, degradada e com febre, não suportando mais um projeto infinito de progresso/crescimento como o busca obstinadamente o governo brasileiro mediante o PAC.
A presente crise desnuda a enganosa compreensão dominante sobre a história, a natureza e a Terra. Ela colocava o ser humano fora e acima da natureza com a excepcionalidade de sua missão, a de submetê-la e dominá-la. Perdemos a noção, comum a todos os povos originários, de que pertencemos à natureza e de que somos sua parte e parcela. Hoje diríamos, somos parte do sistema solar, de nossa galáxia que, por sua vez, é parte do universo. Todos surgimos ao longo de um imenso processo evolucionário que já dura 13,7 bilhões de anos. Tudo é alimentado pela Energia de Fundo e pelas quatro interações que sempre atuam conjuntamente: a gravitacional, a eletromagnética e a nuclear fraca e forte. A vida e a consciência são emergências desse processo.
Nós humanos, representamos a parte consciente e inteligente do universo, da Via-Láctea e da própria Terra, com a missão, não de dominá-la mas de cuidar dela para manter as condições físico-químicas-ecológicas que nos permitem levar avante a nossa vida e a civilização que tão custosamente construímos.
Ora, estas condições estão sendo minadas pelo atual processo produtivista e consumista. Já não se trata de salvar o sistema econômico, nem nosso bem estar, mas a vida humana e a civilização. Se não moderarmos nossa voracidade e não entrarmos em sinergia com a natureza dificilmente sairemos da atual situação. Ou substituímos estas premissas equivocadas por melhores e mais adequadas ou corremos o risco de nos autodestruirmos. A consciência do risco é explicitamente denunciaa na Carta da Terra, já sua primeira página, mas ela não é ainda coletiva.
Para sermos realistas cabe reconhecer um dado do processo evolucionário que nos perturba: junto com grande harmonia, coexiste também extrema violência A Terra mesma no seu percurso de 4,5 bilhões de anos, passou por várias devastações. Em algumas delas perdeu quase 90% de seu capital biótico. Mas a vida sempre se manteve e se refez com renovado vigor. O universo sempre conseguiu transformar o caos destrutivo em caos criativo. Do caos criou o cosmos (formas mais altas e elegantes de seres e de organismos vivos).
A última grande dizimação, um verdadeiro Armagedon ambiental, ocorreu há 67 milhões de anos, quando no Caribe, próximo a Yucatán no México, caiu um meteoro de quase 10 km de extensão. Produziu um tsunami com ondas do tamanho de altos edifícios. Ocasionou um tremor que afetou todo o planeta, ativando a maioria dos vulcões. Uma imensa nuvem de poeira e de gases foi ejetada ao céu, alterando, por dezenas de anos, todo o clima da Terra. Os dinossauros que por mais de cem milhões de anos reinavam, soberanos, por sobre toda a Terra, desapareceram totalmente.
Chegava ao fim a Era Mesozóica, dos répteis e começava a Era Cenozóica, dos mamíferos. Em seguida, como que se vingando, a Terra produziu uma floração de vida como nunca antes na evolução. Nossos ancestrais biológicos, do tamanho de um coelhinho, surgiram por esta época. Somos do gênero dos mamíferos . Evoluímos até chegarmos ao homo sapiens.
Mas eis que nos últimos trezentos anos o homo sapiens que se mostrou também demens (hoje somos sapiens-demens) montou uma investida poderosíssima sobre todas as comunidades ecossistêmicas do planeta. Explorou-as sistematicamente e canalizou grande parte do produto terrestre bruto para os sistemas humanos de consumo e bem-estar. O preço que temos pago equivale a uma dizimação semelhante àquelas de outrora.
O biólogo E. Wilson fala que a “humanidade é a primeira espécie na história da vida na Terra a se tornar numa força geofísica” destruidora. A taxa de extinção de espécies produzidas pela atividade humana, segundo ele, é cinquenta vezes maior do que aquela anterior à intervenção humana. Com a atual aceleração, dentro de pouco – continua Wilson – podemos alcançar a cifra de mil até dez mil vezes mais espécies exterminadas pelo voraz processo consumista. Em 1992 ele estimava a perda dentre 27.000 e 100.00 espécies por ano. O caos climático atual é um dos efeitos desta guerra humana contra Gaia sem nenhuma chance de ganhá-la.
O prêmio Nobel de Química de 1995, o holandês Paul J. Crutzen, aterrorizado pela magnitude do atual ecocídio, afirmou que inauguramos uma nova era geológica: a do antropoceno. Por esta palavra quis denunciar as grandes dizimações perpetradas pela irracionalidade do ser humano(em grego ántropos). Somos os principais causadores da erosão física, química e biológica da Terra.
Assim terminou tristemente a aventura de 66 milhões de anos de história da Era Cenozóica. Começa o tempo da obscuridade.
Para onde nos conduz o antropoceno? À base do baixo nível de consciência atual dos riscos que corremos, ninguém tem condições de prever qualquer saída salvadora. A nós cabe refletir seriamente, denunciar e gritar por todos os meios disponíveis, poisa nossa própria geração poderá conhecer as conseqüências funestas da irracionalidade de nossa forma de habitar o planeta, de produzir, de consumir e de esbanjar seus bens e serviços cada vez mais escassos.
Os Indignados na Europa e os “Ocuppiers” nos EUA já mostram uma nova consciência político-ecológica pois, entre tantas outras coisas, cobram tamém uma governança global do planeta Terra para fazer frente aos perigos coletivos que pesam sobre a vida e a humanidade.
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FONTE : Leonardo Boff, Filósofo/Teólogo, é autor do livro “Cuidar da Terra-proteger a vida:como evitar o fim do mundo”, Record, Rio de Janeiro 2010.
Artigo originalmente publicado no blogue pessoal de Leonardo Boff, @LeonardoBoff
EcoDebate, 17/02/2012
quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012
Aquecimento pode aumentar frequência da ‘tempestade do século’, diz estudo
Por causa do aquecimento global, a “tempestade do século” corre o risco de se tornar mais frequente, reduzindo sua ocorrência para décadas e até mesmo anos, segundo uma simulação feita na região de Nova York por cientistas americanos, divulgada nesta terça-feira. Matéria da AFP.
Quando a tempestade tropical Irene varreu a costa leste dos Estados Unidos e do Caribe, em agosto passado, deixando dezenas de mortos e causando inundações maciças, muitos especialistas a qualificaram de “tempestade do século”, um evento meteorológico tão violento e tão raro que só ocorre, em média, a cada cem anos.
Mas climatologistas do Instituto de Tecnologia de Massaschussetts (MIT, na sigla em inglês) e da Universidade de Princeton avaliaram que o aquecimento global vai aumentar fortemente a frequência de catástrofes naturais como esta, que poderão ocorrer a cada três ou vinte anos, segundo seus cálculos.
Estes cientistas combinaram quatro modelos climáticos para fazer uma simulação informática de tempestades recentes (de 1981 a 2000) e suas projeções no futuro (de 2081 a 2100) em um raio de 200 km no entorno de Nova York, criando um total de 45.000 tempestades virtuais.
Aquela que corresponde atualmente à tempestade do século provoca uma elevação do nível das águas de dois metros, em média, em Nova York. Até 2100, um evento como estes ocorreria a cada três ou vinte anos, segundo os resultados, publicados na revista científica britânica Nature Climate Change.
A cada 500 anos, em média, a região vive um episódio ainda mais intenso que provoca uma elevação de três metros no nível das águas. Até o fim do século XXI, esta frequência diminuiria para 25 a 240 anos, afirmaram.
Tanto em um caso quanto no outro, o mar inundaria facilmente os diques de Manhattan, que atualmente medem 1,5 metro, destacaram os estudiosos.
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FONTE : matéria da AFP, no Yahoo Notícias.
EcoDebate, 16/02/2012
Quando a tempestade tropical Irene varreu a costa leste dos Estados Unidos e do Caribe, em agosto passado, deixando dezenas de mortos e causando inundações maciças, muitos especialistas a qualificaram de “tempestade do século”, um evento meteorológico tão violento e tão raro que só ocorre, em média, a cada cem anos.
Mas climatologistas do Instituto de Tecnologia de Massaschussetts (MIT, na sigla em inglês) e da Universidade de Princeton avaliaram que o aquecimento global vai aumentar fortemente a frequência de catástrofes naturais como esta, que poderão ocorrer a cada três ou vinte anos, segundo seus cálculos.
Estes cientistas combinaram quatro modelos climáticos para fazer uma simulação informática de tempestades recentes (de 1981 a 2000) e suas projeções no futuro (de 2081 a 2100) em um raio de 200 km no entorno de Nova York, criando um total de 45.000 tempestades virtuais.
Aquela que corresponde atualmente à tempestade do século provoca uma elevação do nível das águas de dois metros, em média, em Nova York. Até 2100, um evento como estes ocorreria a cada três ou vinte anos, segundo os resultados, publicados na revista científica britânica Nature Climate Change.
A cada 500 anos, em média, a região vive um episódio ainda mais intenso que provoca uma elevação de três metros no nível das águas. Até o fim do século XXI, esta frequência diminuiria para 25 a 240 anos, afirmaram.
Tanto em um caso quanto no outro, o mar inundaria facilmente os diques de Manhattan, que atualmente medem 1,5 metro, destacaram os estudiosos.
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FONTE : matéria da AFP, no Yahoo Notícias.
EcoDebate, 16/02/2012
Europeus perdem 8,6 meses de expectativa de vida devido aos altos níveis de poluição no ar, diz OMS
Os desequilíbrios ambientais estão causando sérios problemas para a saúde dos europeus. Um a cada cinco mortos na Europa falecem por conta de doenças associadas ao meio ambiente. Na média, cada cidadão do Velho Continente perde 8,6 meses de expectativa de vida devido aos altos níveis de poluição do ar.
Esses dados alarmantes fazem parte do novo relatório “Desigualdades Ambientais e de Saúde da Europa” do Centro Europeu para o Meio Ambiente e Saúde da Organização Mundial da Saúde (OMS).
Um dos casos mais recentes ocorreu na última onda de frio que afetou a Europa no começo de fevereiro desse ano. Mais de 300 pessoas morreram na Ucrânia, Polônia, França e Itália devido às baixas temperaturas em todo o continente.
A porcentagem de mortes por doença devido a causas ambientais varia de acordo com o país, região do país e grupo social. Entre as variações do grupos sociais estão sexo, idade, renda, ocupação, emprego e educação. “Precisamos de ações preventivas hoje, para que as próximas gerações tenham um mundo saudável amanhã”, afirmou o Ministro da Saúde alemão, Daniel Bahr
Cerca de 80 milhões de cidadãos europeus vivem na pobreza de acordo com o relatório. As principais deficiências apontadas são as péssimas condições de moradia, que matam cem mil pessoas por ano no continente, a falta de aquecedores (indisponível para 16 milhões de europeus) e a carência de saneamento básico adequado.
Os 14 indicadores utilizados no estudo foram: abastecimento de água inadequado; falta de vasos sanitário com descarga; falta de uma banheira ou chuveiro; superlotação; umidade em casa; incapacidade de manter a casa adequadamente quente; acidentes de trabalho; acidentes no trânsito; intoxicações fatais; quedas fatais; exposição a ruídos em casa; falta de acesso a áreas verdes de lazer; exposição à fumaça em casa; e exposição à fumaça no trabalho.
EcoDebate, 16/02/2012
quarta-feira, 15 de fevereiro de 2012
Para onde irão os Indignados e os ‘Occupiers’? artigo de Leonardo Boff
Uma das mesas de debates importante no Forum Social Temático em Porto Alegre, da qual me coube participar, foi escutar os testemunhos vivos dos Indignados da Espanha, de Londres, do Egito e dos USA. O que me deixou muito impressionado foi a seriedade dos discursos, longe do viés anárquico dos anos 60 do século passado com suas muitas “parolle”. O tema central era “democracia já”. Revindicava-se uma outra democracia, bem diferente desta a que estamos acostumados, que é mais farsa do que realidade. Querem uma democracia que se constrói a partir da rua e das praças, o lugar do poder originário. Uma democracia que vem de baixo, articulada organicamente com o povo, transparente em seus procedimentos e não mais corroída pela corrupção. Esta democracia, de saida, se caracteriza por vincular justiça social com justiça ecológica.
Curiosamente, os indignados, os “occupiers” e os da Primavera Árabe não se remeteram ao clássico discurso das esquerdas, nem sequer aos sonhos das várias edições do Forum Social Mundial. Encontramo-nos num outro tempo e surgiu uma nova sensibilidade. Postula-se outro modo de ser cidadão, incluindo poderosamente as mulheres antes feitas invisíveis, cidadãos com direitos, com participação, com relações horizontais e transversais facilitadas pelas redes sociais, pelo celular, pelo twitter e pelos facebooks. Temos a ver com uma verdadeira revolução. Antes as relações se organizavam de forma vertical, de cima para baixo. Agora é de forma horizontal, para os lados, na imediatez da comunicação à velocidade da luz. Este modo representa o tempo novo que estamos vivendo, da informação, da descoberta do valor da subjetividade, não aquela da modernidade, encapsulada em si mesma, mas da subjetividade relacional, da emergência de uma consciência de espécie que se descobre dentro da mesma e única Casa Comum, Casa, em chamas ou ruindo pela excessiva pilhagem praticada pelo nosso sistema de produção e consumo.
Essa sensibilidade não tolera mais os métodos do sistema de superar a crise econômica e derivadas, sanando os bancos com o dinheiro dos cidadãos, impondo severa austeridade fiscal, a desmontagem da seguridade social, o achatamento dos salários, o corte dos investimentos no pressuposto ilusório de que desta forma se reconquista a confiança dos mercados e se reanima a economia. Tal concepção é feita dogma e ai se ouve o estúpido bordão:“TINA: there is no alternative”, não há alternativa. Os sacrílegos sumos sacerdotes da trindade nada santa do FMI, da União Européia e do Banco Central Europeu deram um golpe financeiro na Grécia e na Itália e puseram lá seus acólitos como gestores da crise, sem passar pelo rito democrático. Tudo é visto e decidido pela ótica exclusiva do econômico, rebaixando o social e o sofrimento coletivo desnecessário, o desespero das famílias e a indignação dos jovens por não conseguirem trabalho. Tudo pode desembocar numa crise com consequências dramáticas.
Paul Krugmann, prêmio Nobel de economia, passou uns dias na Islândia para estudar a forma como esse pequeno pais ártico saiu de sua crise avassaladora. Seguiram o caminho correto que outros deveriam também ter seguido: deixaram os bancos quebrar, puseram na cadeia os banqueiros e especuladores que praticaram falcatruas, reescreveram a constituição, garantiram a seguridade social para evitar uma derrocada generalizada e conseguiram criar empregos. Consequência: o pais saiu do atoleiro e é um dos que mais cresce nos paises nórticos. O caminho islandês foi silenciado pela midia mundial de temor de que servisse de exemplo para os demais países. E a assim a carruagem, com medidas equivocadas mas coerentes com o sistema, corre célere rumo a um precipício.
Contra esse curso previsível se opõem os indignados. Querem um outro mundo mais amigo da vida e respeitoso da natureza. Talvez a Islândia servirá de inspiração. Para onde irão? Quem sabe? Seguramente não na direção dos modelos do passado, já exauridos. Irão na direção daquilo que falava Paulo Freire “do inédito viável” que nascerá desse novo imaginário. Ele se expressa, sem violência, dentro de um espírito democrático-participativo, com muito diálogo e trocas enriquecedoras. De todas as formas o mundo nunca será como antes, muito menos como os capitalistas gostariam que ficasse.
**********************
FONTE : * Leonardo Boff, Teólogo/Filósofo é Autor do livro Sustentabilidade: o que é e o que não é, recém lançado pela Editora Vozes, Petropolis 2012.
Artigo originalmente publicado por Leonardo Boff em seu blogue pessoal.
EcoDebate, 15/02/2012
Curiosamente, os indignados, os “occupiers” e os da Primavera Árabe não se remeteram ao clássico discurso das esquerdas, nem sequer aos sonhos das várias edições do Forum Social Mundial. Encontramo-nos num outro tempo e surgiu uma nova sensibilidade. Postula-se outro modo de ser cidadão, incluindo poderosamente as mulheres antes feitas invisíveis, cidadãos com direitos, com participação, com relações horizontais e transversais facilitadas pelas redes sociais, pelo celular, pelo twitter e pelos facebooks. Temos a ver com uma verdadeira revolução. Antes as relações se organizavam de forma vertical, de cima para baixo. Agora é de forma horizontal, para os lados, na imediatez da comunicação à velocidade da luz. Este modo representa o tempo novo que estamos vivendo, da informação, da descoberta do valor da subjetividade, não aquela da modernidade, encapsulada em si mesma, mas da subjetividade relacional, da emergência de uma consciência de espécie que se descobre dentro da mesma e única Casa Comum, Casa, em chamas ou ruindo pela excessiva pilhagem praticada pelo nosso sistema de produção e consumo.
Essa sensibilidade não tolera mais os métodos do sistema de superar a crise econômica e derivadas, sanando os bancos com o dinheiro dos cidadãos, impondo severa austeridade fiscal, a desmontagem da seguridade social, o achatamento dos salários, o corte dos investimentos no pressuposto ilusório de que desta forma se reconquista a confiança dos mercados e se reanima a economia. Tal concepção é feita dogma e ai se ouve o estúpido bordão:“TINA: there is no alternative”, não há alternativa. Os sacrílegos sumos sacerdotes da trindade nada santa do FMI, da União Européia e do Banco Central Europeu deram um golpe financeiro na Grécia e na Itália e puseram lá seus acólitos como gestores da crise, sem passar pelo rito democrático. Tudo é visto e decidido pela ótica exclusiva do econômico, rebaixando o social e o sofrimento coletivo desnecessário, o desespero das famílias e a indignação dos jovens por não conseguirem trabalho. Tudo pode desembocar numa crise com consequências dramáticas.
Paul Krugmann, prêmio Nobel de economia, passou uns dias na Islândia para estudar a forma como esse pequeno pais ártico saiu de sua crise avassaladora. Seguiram o caminho correto que outros deveriam também ter seguido: deixaram os bancos quebrar, puseram na cadeia os banqueiros e especuladores que praticaram falcatruas, reescreveram a constituição, garantiram a seguridade social para evitar uma derrocada generalizada e conseguiram criar empregos. Consequência: o pais saiu do atoleiro e é um dos que mais cresce nos paises nórticos. O caminho islandês foi silenciado pela midia mundial de temor de que servisse de exemplo para os demais países. E a assim a carruagem, com medidas equivocadas mas coerentes com o sistema, corre célere rumo a um precipício.
Contra esse curso previsível se opõem os indignados. Querem um outro mundo mais amigo da vida e respeitoso da natureza. Talvez a Islândia servirá de inspiração. Para onde irão? Quem sabe? Seguramente não na direção dos modelos do passado, já exauridos. Irão na direção daquilo que falava Paulo Freire “do inédito viável” que nascerá desse novo imaginário. Ele se expressa, sem violência, dentro de um espírito democrático-participativo, com muito diálogo e trocas enriquecedoras. De todas as formas o mundo nunca será como antes, muito menos como os capitalistas gostariam que ficasse.
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FONTE : * Leonardo Boff, Teólogo/Filósofo é Autor do livro Sustentabilidade: o que é e o que não é, recém lançado pela Editora Vozes, Petropolis 2012.
Artigo originalmente publicado por Leonardo Boff em seu blogue pessoal.
EcoDebate, 15/02/2012
O novo paradigma ecológico do Brasil: são as raposas que estão cuidando do galinheiro. Entrevista com Luiz Jacques Saldanha
“Toda vez que deixarmos de consumir um produto feito com material artificial que depois jogaremos fora, estaremos praticando um ato de humanidade e de preservação da vida futura, saudável e natural”, defende o ambientalista.
Confira a entrevista.
A prefeitura de São Paulo promulgou em 2011 uma lei que proíbe sacolas plásticas na cidade a partir deste ano. A questão tem levantado polêmicos debates em torno desta mudança, que envolve supermercados, consumidores, ambientalistas e a indústria plástica. Para refletir sobre alguns aspectos deste tema, a IHU On-Line entrevistou por e-mail o ambientalista Luiz Jacques Saldanha, que defende a necessidade de se propagar informação e conhecimento sobre os males provocados pelas moléculas presentes nas sacolas plásticas à saúde humana e animal. Para ele, “ou os espaços que têm o compromisso de compartilhar o conhecimento, verdadeiramente ‘conheçam’ e compartilhem esta outra forma de estar no mundo, ou estaremos vivendo uma grande pantomima e um grande faz-de-conta, extremamente tristes e melancólicos. Outros caminhos serão paliativos e superficiais, porque não estarão fundamentados numa mudança de paradigma, mas sim de pequenos hábitos, manhas e fricotes da pequena burguesia”. E continua: “não é a cidadania, os centros de pesquisa, os centros universitários, os fóruns sociais, as ONGs ambientalistas, as donas de casa e as mães que estão na vanguarda desta transformação. São os negociantes”. E Jacques afirma que no Rio Grande do Sul não há muita consciência ambiental em relação ao uso das sacolas plásticas e da produção de lixo: “o estado hoje vive só da falsa fama de ser ‘ecologicamente correto’”.
Luiz Jacques Saldanha (foto), ambientalista, é engenheiro agrônomo e bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Qual sua opinião sobre a proibição paulistana (e em outras cidades também) de supermercados distribuírem sacolas plásticas para que os clientes transportem as compras?
Luiz Jacques Saldanha - Sem dúvida que, mesmo atrasada em relação a outros países muito menos “letrados” do que nós, como Bangaladesh e países mais pobres africanos, esta decisão é importantíssima no atual estágio que o Brasil se encontra. Principalmente ao ser o anfitrião da reunião da ONU, a Rio+20, em junho próximo.
IHU On-Line – Didaticamente falando, em que sentido as sacolinhas plásticas mais impactam o meio ambiente?
Luiz Jacques Saldanha – Acabo de traduzir e colocar no site que mantenho, uma entrevista com uma cientista e pesquisadora inglesa muito oportuna. Ela mostra que todas as substâncias artificiais, como as que formam a resina plástica, os plastificantes e os aditivos que compõem o produto final “sacolinha plástica”, ao entrar no ambiente, desprendem-se do produto que negligentemente pegamos no supermercado e, através da cadeia alimentar, chegam aos nossos organismos, principalmente ao da mãe grávida. Por absoluta incapacidade e impossibilidade, a mãe gestante não tem condições de impedir, como também não a placenta que envolve o feto, que estas moléculas entrem em contato direto e íntimo com o processo fisiológico do serzinho em gestação e formação. E estas substâncias, importantíssimo salientar, não naturais, ficam circulando no pequeno organismo.
IHU On-Line – E o que estas moléculas, parte da sacolinha, podem causar ao feto?
Luiz Jacques Saldanha - Devemos ter em mente que cada instante, cada segundo, cada passo e cada momento no processo de desenvolvimento de um feto é único, definitivo e derradeiro. Ou seja, o que se passar fisiologicamente em quaisquer destes momentos não terá, nunca mais, no atual estágio de nossa sociedade, chance de reversão, mudança ou alteração. Assim, o que se constata cientificamente hoje é que estas substâncias, além de estarem feminizando os machos e agredindo a saúde hormonal futura das fêmeas – vale destacar que os humanos estão inclusos -, também estão alterando a capacidade normal dos fetos de construírem suas células de gorduras nas quantidades que precisarão naturalmente quando forem crianças ou adultos. Estas substâncias artificiais estão fazendo com que haja uma proliferação fisiológica, sem controle natural, no processo de desenvolvimento dos fetos. Assim, ao nascerem, levam para seus estágios de criança e adulto a possibilidade de serem, contrariamente ao que seriam se não fossem contaminados, obesos e diabéticos. E isto já desde tenra idade. Então, toda vez que deixarmos de consumir um produto feito com material artificial que depois jogaremos fora, estaremos praticando um ato de humanidade e de preservação da vida futura, saudável e natural. E as sacolas plásticas fornecidas no comércio são o primeiro e definitivo passo para chegarmos, o quanto antes, nas embalagens que envolvem os produtos comestíveis.
IHU On-Line – Quais os caminhos para banir a cultura das sacolinhas plásticas em nossas sociedades?
Luiz Jacques Saldanha – Acho que, em primeiro lugar, estes temas devem ser do conhecimento de todos. Não só do conhecimento, mas da compreensão de cada cidadão planetário. As pessoas precisam saber o que são estas moléculas que hoje inundam o planeta a tal ponto de existir mais de um lixão no mar, onde as pequenas partículas destas sacolas, embalagens, redes de pescar e outros produtos sintéticos, estão “plastificando” o zoo e o fito plâncton, contaminando, assim, toda a cadeia alimentar desde sua origem mais básica. Hoje não temos mais nem o direito de pensar em nosso conforto imediato, hipócrita e presunçoso que pode, de forma imediata, comprometer o futuro da vida como a conhecemos. Penso que todos os colégios e universidades, destacando as que têm por base uma visão religiosa de amor à vida, terrena e espiritual, deverão conhecer e agir em seus seios, de forma que estes temas sejam o grande evangelho de demonstração da prática de amor ao próximo e ao futuro. Não há outro jeito. Ou os espaços que têm o compromisso de compartilhar o conhecimento, verdadeiramente “conheçam” e compartilhem esta outra forma de estar no mundo, ou estaremos vivendo uma grande pantomima e um grande faz-de-conta, extremamente tristes e melancólicos. Outros caminhos serão paliativos e superficiais, porque não estarão fundamentados numa mudança de paradigma, mas sim de pequenos hábitos, manhas e fricotes da pequena burguesia.
IHU On-Line – Qual o papel dos supermercados nesse sentido?
Luiz Jacques Saldanha – Este é o lado triste desta comédia. Não é a cidadania, os centros de pesquisa, os centros universitários, os fóruns sociais, as ONGs ambientalistas, as donas de casa e as mães que estão na vanguarda desta transformação. São os negociantes. São aqueles que vivem da compra e venda e da oferta e procura que se mobilizaram para cumprir uma decisão local. Onde está o governo federal que deveria ser o primeiro, juntamente com os governos estaduais, principalmente os que se apresentam como vanguardas políticas e sociais, buscando um novo patamar para se apresentar na tal Rio+20? Parece que o “papel” de ecologistas e progressistas ficou mesmo para o setor que simplesmente não teria este compromisso de agente de transformação social. Enfim, este é o novo paradigma ecológico que vivemos no Brasil: são as raposas que estão cuidando do galinheiro.
IHU On-Line – Muitas pessoas utilizam as sacolinhas plásticas nas lixeiras domésticas. Há diferença entre elas e os sacos de lixo? Estes são mais biodegradáveis?
Luiz Jacques Saldanha - É fundamental termos bem claro que não existe resina plástica disponível em grande escala que seja “biodegradável”. Para ser “bio” esta resina deveria ser “viva” e as resinas plásticas que temos à disposição não são vivas. São mortas e por isso suas moléculas são persistentes e bioacumulativas. Ou seja, ficam iguais no tempo e não são digeridas pelos organismos vivos. Por isso são “não-naturais”. Inclusive estas que dizem ser oxibiodegradáveis não são degradadas a nível molecular, somente são mecanicamente desestruturadas em seus polímeros, mas não nos seus monômeros.
IHU On-Line – Como essa questão aparece aqui no Rio Grande do Sul? O povo gaúcho é consciente em relação ao uso das sacolas plásticas?
Luiz Jacques Saldanha – Acho que se fosse, não ia ser São Paulo, aquela “babilônia”, que iria “puxar a ponta”. Depois da questão dos transgênicos, no início deste século, considerando que foi pelo Rio Grande do Sul que se instalaram no Brasil, fica claro que o estado hoje vive só da falsa fama de ser “ecologicamente correto”.
IHU On-Line – Como esse debate sobre as sacolinhas plásticas pode nos ajudar a refletir sobre o destino do lixo em nossas cidades?
Luiz Jacques Saldanha – Numa entrevista anterior para o Instituto Humanitas já defendia a ideia de que não existe lixo. O que existe são materiais que estão passando por nossas mãos e que devem voltar, normal e naturalmente, para o ciclo da vida, muito além do ciclo do consumo. Eu e muitos amigos chegamos a pensar em formar um grupo para pedir isenção da taxa do lixo porque nós não produzimos lixo. Tudo é recolocado no ciclo da vida, até a matéria orgânica que, no meu apartamento, vira composto. Mas isso é outra história.
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FONTE : (Ecodebate, 15/02/2012) publicado pela IHU On-line, parceiro estratégico do EcoDebate na socialização da informação.
[IHU On-line é publicada pelo Instituto Humanitas Unisinos - IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]
Confira a entrevista.
A prefeitura de São Paulo promulgou em 2011 uma lei que proíbe sacolas plásticas na cidade a partir deste ano. A questão tem levantado polêmicos debates em torno desta mudança, que envolve supermercados, consumidores, ambientalistas e a indústria plástica. Para refletir sobre alguns aspectos deste tema, a IHU On-Line entrevistou por e-mail o ambientalista Luiz Jacques Saldanha, que defende a necessidade de se propagar informação e conhecimento sobre os males provocados pelas moléculas presentes nas sacolas plásticas à saúde humana e animal. Para ele, “ou os espaços que têm o compromisso de compartilhar o conhecimento, verdadeiramente ‘conheçam’ e compartilhem esta outra forma de estar no mundo, ou estaremos vivendo uma grande pantomima e um grande faz-de-conta, extremamente tristes e melancólicos. Outros caminhos serão paliativos e superficiais, porque não estarão fundamentados numa mudança de paradigma, mas sim de pequenos hábitos, manhas e fricotes da pequena burguesia”. E continua: “não é a cidadania, os centros de pesquisa, os centros universitários, os fóruns sociais, as ONGs ambientalistas, as donas de casa e as mães que estão na vanguarda desta transformação. São os negociantes”. E Jacques afirma que no Rio Grande do Sul não há muita consciência ambiental em relação ao uso das sacolas plásticas e da produção de lixo: “o estado hoje vive só da falsa fama de ser ‘ecologicamente correto’”.
Luiz Jacques Saldanha (foto), ambientalista, é engenheiro agrônomo e bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – Qual sua opinião sobre a proibição paulistana (e em outras cidades também) de supermercados distribuírem sacolas plásticas para que os clientes transportem as compras?
Luiz Jacques Saldanha - Sem dúvida que, mesmo atrasada em relação a outros países muito menos “letrados” do que nós, como Bangaladesh e países mais pobres africanos, esta decisão é importantíssima no atual estágio que o Brasil se encontra. Principalmente ao ser o anfitrião da reunião da ONU, a Rio+20, em junho próximo.
IHU On-Line – Didaticamente falando, em que sentido as sacolinhas plásticas mais impactam o meio ambiente?
Luiz Jacques Saldanha – Acabo de traduzir e colocar no site que mantenho, uma entrevista com uma cientista e pesquisadora inglesa muito oportuna. Ela mostra que todas as substâncias artificiais, como as que formam a resina plástica, os plastificantes e os aditivos que compõem o produto final “sacolinha plástica”, ao entrar no ambiente, desprendem-se do produto que negligentemente pegamos no supermercado e, através da cadeia alimentar, chegam aos nossos organismos, principalmente ao da mãe grávida. Por absoluta incapacidade e impossibilidade, a mãe gestante não tem condições de impedir, como também não a placenta que envolve o feto, que estas moléculas entrem em contato direto e íntimo com o processo fisiológico do serzinho em gestação e formação. E estas substâncias, importantíssimo salientar, não naturais, ficam circulando no pequeno organismo.
IHU On-Line – E o que estas moléculas, parte da sacolinha, podem causar ao feto?
Luiz Jacques Saldanha - Devemos ter em mente que cada instante, cada segundo, cada passo e cada momento no processo de desenvolvimento de um feto é único, definitivo e derradeiro. Ou seja, o que se passar fisiologicamente em quaisquer destes momentos não terá, nunca mais, no atual estágio de nossa sociedade, chance de reversão, mudança ou alteração. Assim, o que se constata cientificamente hoje é que estas substâncias, além de estarem feminizando os machos e agredindo a saúde hormonal futura das fêmeas – vale destacar que os humanos estão inclusos -, também estão alterando a capacidade normal dos fetos de construírem suas células de gorduras nas quantidades que precisarão naturalmente quando forem crianças ou adultos. Estas substâncias artificiais estão fazendo com que haja uma proliferação fisiológica, sem controle natural, no processo de desenvolvimento dos fetos. Assim, ao nascerem, levam para seus estágios de criança e adulto a possibilidade de serem, contrariamente ao que seriam se não fossem contaminados, obesos e diabéticos. E isto já desde tenra idade. Então, toda vez que deixarmos de consumir um produto feito com material artificial que depois jogaremos fora, estaremos praticando um ato de humanidade e de preservação da vida futura, saudável e natural. E as sacolas plásticas fornecidas no comércio são o primeiro e definitivo passo para chegarmos, o quanto antes, nas embalagens que envolvem os produtos comestíveis.
IHU On-Line – Quais os caminhos para banir a cultura das sacolinhas plásticas em nossas sociedades?
Luiz Jacques Saldanha – Acho que, em primeiro lugar, estes temas devem ser do conhecimento de todos. Não só do conhecimento, mas da compreensão de cada cidadão planetário. As pessoas precisam saber o que são estas moléculas que hoje inundam o planeta a tal ponto de existir mais de um lixão no mar, onde as pequenas partículas destas sacolas, embalagens, redes de pescar e outros produtos sintéticos, estão “plastificando” o zoo e o fito plâncton, contaminando, assim, toda a cadeia alimentar desde sua origem mais básica. Hoje não temos mais nem o direito de pensar em nosso conforto imediato, hipócrita e presunçoso que pode, de forma imediata, comprometer o futuro da vida como a conhecemos. Penso que todos os colégios e universidades, destacando as que têm por base uma visão religiosa de amor à vida, terrena e espiritual, deverão conhecer e agir em seus seios, de forma que estes temas sejam o grande evangelho de demonstração da prática de amor ao próximo e ao futuro. Não há outro jeito. Ou os espaços que têm o compromisso de compartilhar o conhecimento, verdadeiramente “conheçam” e compartilhem esta outra forma de estar no mundo, ou estaremos vivendo uma grande pantomima e um grande faz-de-conta, extremamente tristes e melancólicos. Outros caminhos serão paliativos e superficiais, porque não estarão fundamentados numa mudança de paradigma, mas sim de pequenos hábitos, manhas e fricotes da pequena burguesia.
IHU On-Line – Qual o papel dos supermercados nesse sentido?
Luiz Jacques Saldanha – Este é o lado triste desta comédia. Não é a cidadania, os centros de pesquisa, os centros universitários, os fóruns sociais, as ONGs ambientalistas, as donas de casa e as mães que estão na vanguarda desta transformação. São os negociantes. São aqueles que vivem da compra e venda e da oferta e procura que se mobilizaram para cumprir uma decisão local. Onde está o governo federal que deveria ser o primeiro, juntamente com os governos estaduais, principalmente os que se apresentam como vanguardas políticas e sociais, buscando um novo patamar para se apresentar na tal Rio+20? Parece que o “papel” de ecologistas e progressistas ficou mesmo para o setor que simplesmente não teria este compromisso de agente de transformação social. Enfim, este é o novo paradigma ecológico que vivemos no Brasil: são as raposas que estão cuidando do galinheiro.
IHU On-Line – Muitas pessoas utilizam as sacolinhas plásticas nas lixeiras domésticas. Há diferença entre elas e os sacos de lixo? Estes são mais biodegradáveis?
Luiz Jacques Saldanha - É fundamental termos bem claro que não existe resina plástica disponível em grande escala que seja “biodegradável”. Para ser “bio” esta resina deveria ser “viva” e as resinas plásticas que temos à disposição não são vivas. São mortas e por isso suas moléculas são persistentes e bioacumulativas. Ou seja, ficam iguais no tempo e não são digeridas pelos organismos vivos. Por isso são “não-naturais”. Inclusive estas que dizem ser oxibiodegradáveis não são degradadas a nível molecular, somente são mecanicamente desestruturadas em seus polímeros, mas não nos seus monômeros.
IHU On-Line – Como essa questão aparece aqui no Rio Grande do Sul? O povo gaúcho é consciente em relação ao uso das sacolas plásticas?
Luiz Jacques Saldanha – Acho que se fosse, não ia ser São Paulo, aquela “babilônia”, que iria “puxar a ponta”. Depois da questão dos transgênicos, no início deste século, considerando que foi pelo Rio Grande do Sul que se instalaram no Brasil, fica claro que o estado hoje vive só da falsa fama de ser “ecologicamente correto”.
IHU On-Line – Como esse debate sobre as sacolinhas plásticas pode nos ajudar a refletir sobre o destino do lixo em nossas cidades?
Luiz Jacques Saldanha – Numa entrevista anterior para o Instituto Humanitas já defendia a ideia de que não existe lixo. O que existe são materiais que estão passando por nossas mãos e que devem voltar, normal e naturalmente, para o ciclo da vida, muito além do ciclo do consumo. Eu e muitos amigos chegamos a pensar em formar um grupo para pedir isenção da taxa do lixo porque nós não produzimos lixo. Tudo é recolocado no ciclo da vida, até a matéria orgânica que, no meu apartamento, vira composto. Mas isso é outra história.
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FONTE : (Ecodebate, 15/02/2012) publicado pela IHU On-line, parceiro estratégico do EcoDebate na socialização da informação.
[IHU On-line é publicada pelo Instituto Humanitas Unisinos - IHU, da Universidade do Vale do Rio dos Sinos – Unisinos, em São Leopoldo, RS.]
terça-feira, 14 de fevereiro de 2012
O fim da floresta representa o desaparecimento das espécies, com consequências devastadoras
Valor da biodiversidade – O desaparecimento da floresta é também o desaparecimento das espécies. Isso tem consequências devastadoras – inclusive para a economia.
A borboleta Rainha Alexandra, da Nova Guiné, é a maior do planeta
Aqui, a maior borboleta do mundo, a Rainha Alexandra, de 28 centímetros de envergadura, bate suas asas. Mais adiante, pousa uma ave-do-paraíso, que com sua plumagem colorida e exuberante é o pássaro símbolo da Nova Guiné. Na árvore seguinte, você pode encontrar um canguru-de-manto-dourado ou, no chão, um sapo “Pinóquio”. A biodiversidade da Nova Guiné é incomparável – mas está ameaçada.
Ave-do-paraíso: não apenas bela
Ainda existem florestas intocadas, por enquanto a ilha ainda é pouco povoada, mas a população de Papua Nova Guiné está crescendo. E com isso cresce também a pressão sobre a mata e sobre os animais. A floresta é desmatada para dar lugar a lavouras e plantações, para o uso da terra e para o corte seletivo de madeiras nobres. Muitas espécies animais da Nova Guiné já estão ameaçadas, por pertencerem exclusivamente a zonas muito restritas. Se o seu habitat desaparece, elas não têm para onde ir e, na pior das hipóteses, morrem.
Mais de 100 espécies por dia
Projetos com as populações indígenas, que separam as áreas de manejo das áreas de proteção permanente, ajudam a estabelecer zonas de retiro. Tais medidas são urgentemente necessárias: dois milhões de espécies da fauna e da flora estão atualmente catalogados pela ciência. Segundo estimativas da ONU, cerca de 130 espécies desaparecem por dia no mundo.
“Isso corresponde a um ritmo cem a mil vezes mais rápido do que o processo evolutivo natural”, diz Andrea Cederquist, especialista em biodiversidade da organização ambiental Greenpeace. A variedade genética da vida sobre a Terra está diminuindo. Quantas espécies desaparecem por dia na Nova Guiné, ninguém sabe dizer. E ninguém sabe também quais serão as consequências. “O aquecimento global e a perda da biodiversidade estão conectados, e isso leva a uma reação em cadeia que não podemos avaliar”, diz Cederquist.
E se elas desaparecessem?
A ciência é unânime: as repercussões do aquecimento global e da perda da biodiversidade são absolutamente imprevisíveis. Não é apenas uma questão de saber se nas montanhas da Nova Guiné há uma espécie a menos de ave-do-paraíso, mas quais são as relações vitais entre os organismos – e em que velocidade o sistema todo pode entrar em colapso pela falta de um elemento essencial ao ciclo da vida.
O pesquisador de formigas Bert Hölldobler fez uma experiência: se devido a uma epidemia as formigas morressem, haveria uma catástrofe ambiental devastadora. A maioria das florestas iria morrer. Primeiro as plantas, depois os herbívoros. A perda da biodiversidade aceleraria de forma vertiginosa, levando a um colapso de todo o ecossistema terrestre.
Com os recifes o cenário é semelhante. Se os corais morrerem por causa do aumento da temperatura da água, todo o ecossistema entra em colapso rapidamente. “Disso todo mundo sabe, mas não se toma nenhuma atitude”, diz a especialista Cederquist.
Custos gigantescos
Proteção e uso da floresta para os nativos
Talvez haja um aumento de esforços para proteger a biodiversidade quando as perdas econômicas causadas pela degradação ambiental passarem a chamar mais atenção. O montante atual já é de 2 a 4,5 bilhões de dólares por ano, como comprovou o estudo “A economia dos ecossistemas e da biodiversidade” em julho de 2010. O estudo foi feito em parceria entre o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente e a consultora PricewaterhouseCoopers.
Comprovou-se, por exemplo, o desempenho econômico dos insetos: só com a polinização das plantas, eles têm uma contribuição de até 190 bilhões de dólares por ano na produção agrícola.
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FONTE : Oliver Samson (autor)
Revisão: Roselaine Wandscheer
Matéria da Agência Deutsche Welle, DW, publicada pelo EcoDebate, 14/02/2012
A borboleta Rainha Alexandra, da Nova Guiné, é a maior do planeta
Aqui, a maior borboleta do mundo, a Rainha Alexandra, de 28 centímetros de envergadura, bate suas asas. Mais adiante, pousa uma ave-do-paraíso, que com sua plumagem colorida e exuberante é o pássaro símbolo da Nova Guiné. Na árvore seguinte, você pode encontrar um canguru-de-manto-dourado ou, no chão, um sapo “Pinóquio”. A biodiversidade da Nova Guiné é incomparável – mas está ameaçada.
Ave-do-paraíso: não apenas bela
Ainda existem florestas intocadas, por enquanto a ilha ainda é pouco povoada, mas a população de Papua Nova Guiné está crescendo. E com isso cresce também a pressão sobre a mata e sobre os animais. A floresta é desmatada para dar lugar a lavouras e plantações, para o uso da terra e para o corte seletivo de madeiras nobres. Muitas espécies animais da Nova Guiné já estão ameaçadas, por pertencerem exclusivamente a zonas muito restritas. Se o seu habitat desaparece, elas não têm para onde ir e, na pior das hipóteses, morrem.
Mais de 100 espécies por dia
Projetos com as populações indígenas, que separam as áreas de manejo das áreas de proteção permanente, ajudam a estabelecer zonas de retiro. Tais medidas são urgentemente necessárias: dois milhões de espécies da fauna e da flora estão atualmente catalogados pela ciência. Segundo estimativas da ONU, cerca de 130 espécies desaparecem por dia no mundo.
“Isso corresponde a um ritmo cem a mil vezes mais rápido do que o processo evolutivo natural”, diz Andrea Cederquist, especialista em biodiversidade da organização ambiental Greenpeace. A variedade genética da vida sobre a Terra está diminuindo. Quantas espécies desaparecem por dia na Nova Guiné, ninguém sabe dizer. E ninguém sabe também quais serão as consequências. “O aquecimento global e a perda da biodiversidade estão conectados, e isso leva a uma reação em cadeia que não podemos avaliar”, diz Cederquist.
E se elas desaparecessem?
A ciência é unânime: as repercussões do aquecimento global e da perda da biodiversidade são absolutamente imprevisíveis. Não é apenas uma questão de saber se nas montanhas da Nova Guiné há uma espécie a menos de ave-do-paraíso, mas quais são as relações vitais entre os organismos – e em que velocidade o sistema todo pode entrar em colapso pela falta de um elemento essencial ao ciclo da vida.
O pesquisador de formigas Bert Hölldobler fez uma experiência: se devido a uma epidemia as formigas morressem, haveria uma catástrofe ambiental devastadora. A maioria das florestas iria morrer. Primeiro as plantas, depois os herbívoros. A perda da biodiversidade aceleraria de forma vertiginosa, levando a um colapso de todo o ecossistema terrestre.
Com os recifes o cenário é semelhante. Se os corais morrerem por causa do aumento da temperatura da água, todo o ecossistema entra em colapso rapidamente. “Disso todo mundo sabe, mas não se toma nenhuma atitude”, diz a especialista Cederquist.
Custos gigantescos
Proteção e uso da floresta para os nativos
Talvez haja um aumento de esforços para proteger a biodiversidade quando as perdas econômicas causadas pela degradação ambiental passarem a chamar mais atenção. O montante atual já é de 2 a 4,5 bilhões de dólares por ano, como comprovou o estudo “A economia dos ecossistemas e da biodiversidade” em julho de 2010. O estudo foi feito em parceria entre o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente e a consultora PricewaterhouseCoopers.
Comprovou-se, por exemplo, o desempenho econômico dos insetos: só com a polinização das plantas, eles têm uma contribuição de até 190 bilhões de dólares por ano na produção agrícola.
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FONTE : Oliver Samson (autor)
Revisão: Roselaine Wandscheer
Matéria da Agência Deutsche Welle, DW, publicada pelo EcoDebate, 14/02/2012
Redução de áreas protegidas na Amazônia é inconstitucional, diz MPF
Redução de áreas protegidas na Amazônia é inconstitucional, diz MPF. Pareceres do ICMBio corroboram avaliação
Ministério Público Federal entra com Ação Direta de Inconstitucionalidade no STF contra Medida Provisória que diminui unidades de conservação para construção de hidrelétricas no Pará, Rondônia e Amazonas.
Na última semana, a Procuradoria Geral da República anunciou que impetrou, junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), com pedido de liminar, contra a Medida Provisória (MP) nº 558/2012, editada em janeiro pela presidente Dilma Rousseff. A MP excluiu 86.288 hectares de sete Unidades de Conservação (UCs) federais na Amazônia para abrigar canteiros e reservatórios de quatro grandes barragens: duas em fase de construção no Rio Madeira e duas previstas no Rio Tapajós no Pará.
No Estado do Pará, a MP desafetou um total de 75.630 hectares de cinco unidades de conservação para abrir os reservatórios de duas grandes hidrelétricas propostas pelo setor elétrico do governo no PAC, as usinas São Luiz do Tapajós e Jatobá. Foram desafetadas áreas do Parque Nacional (PARNA) da Amazônia (18.700 hectares) Florestas Nacionais (FLONAs) de Itaituba I (7.705 ha) Itaituba II (28.453 ha) e Crepori (856 ha), da Área de Proteção Ambiental (APA) do Tapajós (19.916 ha).
Nos estados de Rondônia e Amazonas, foram excluídos 8.470 hectares do Parque Nacional Mapinguari para abrir caminho para os reservatórios das usinas de Santo Antônio e Jirau no rio Madeira, e 2.188 hectares do hectares do PARNA Campos Amazônicos para abrigar o reservatório da hidrelétrica de Tabajara no rio Machado, um dos principais tributário do Madeira.
De acordo com o procuradorr geral do MPF, Roberto Gurgel, todas as unidades de conservação alteradas são de extrema relevância para a preservação do Bioma Amazônia e que a norma questionada está repleta de inconstitucionalidades. Uma delas é o desrespeito à exigência de lei em sentido formal para a alteração e supressão de parques, florestas e áreas de proteção ambiental.
Como explica o coordenador da ONG International Rivers no Brasil, Brent Millikan, a gravidade é maior porque não houve a prévia realização de estudos técnicos e debate público sobre as usinas quanto e seus impactos sociais e ambientais, e alternativas: “O artigo 225 da Constituição Federal estabelece que a alteração e a supressão de áreas protegidas são permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção. Assim, causa estranheza autoridades do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) concordarem com a exclusão de áreas de UCs para abrigar os reservatórios de hidrelétricos, sem mencionar esse preceito legal. Alem disso, as usinas de São Luiz do Tapajós, Jatobá e Tabajara sequer possuem estudos de viabilidade econômica” completou Millikan.
Pareceres contrários
Segundo o documento que embasa e justifica a Medida Provisória nº 558/2012, foi o ICMBio que propôs a diminuição das UCs. “O ICMBio, a partir de estudos realizados pela Eletrobrás e pela Eletronorte, encaminhou a proposta de redefinição dos polígonos do Parque Nacional da Amazônia, das Florestas Nacionais de Itaituba I, II e do Crepori e da Área de Proteção Ambiental Tapajós”, diz o documento.
Durante o ano de 2011, no entanto, gerentes locais do ICMBio responsáveis pelas UCs na região do Tapajós apresentaram uma série de pareceres técnicos contrários tanto à desafetação das unidades de conservação quanto à instalação de sete hidrelétricas propostas pela Eletronorte para a bacia do Tapajós (além de São Luiz do Tapajós e Jatobá, estão na lista as usinas de Chacorão, no Tapajós, e Cachoeira do Caí, Jamanxim, Cachoeira dos Patos e Jardim de Ouro, no rio Jamanxim).
Entre os problemas apontados pelos técnicos, destacaram-se inexistência de estudos ambientais sobre espécies ameaçadas de extinção; graves prejuízos para atividades econômicas como a pesca e o eco-turismo no PARNA da Amazônia; interferência no projeto de adequação da Transamazônica; inviabilização de projetos sociais e de desenvolvimento para as populações locais; inexistência de projetos de mitigação para as comunidades afetadas; destruição de sítios arqueológicos; inexistência de estudos sobre impactos ambientais e sociais; inexistência de estudos de viabilidade econômica; e, principalmente, desrespeito à legislação ambiental vigente. Os pareceres técnicos não receberam retorno da direção central do ICMBio em Brasília.
Segundo Raione Lima, da coordenação regional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) em Itaituba (PA), é preciso um debate aprofundado sobre as hidrelétricas propostas pelo setor elétrico na bacia do Tapajós: “O propósito de desafetação de parte das unidades de conservação no Tapajós vem favorecer ao grande capital, principalmente aos interesses dos defensores das usinas hidrelétricas, que em seu bojo incluem as empreiteiras, grandes empresas de mineração, agronegócio, madeireiros e a classe dominante local que na concretização destes projetos enxergam os novos garimpos do século 21. Junto com a importância da conservação da biodiversidade da Amazônia, existe a necessidade de valorização de seus povos, ribeirinhos, pescadores e os parentes indígenas; todo esse conjunto que deve ser reconhecido, com respeito à dignidade da pessoa humana e aos direitos humanos acima de qualquer interesse econômico”, completou.
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FONTE : Colaboração do Movimento Xingu Vivo para Sempre para o EcoDebate, 14/02/2012
Ministério Público Federal entra com Ação Direta de Inconstitucionalidade no STF contra Medida Provisória que diminui unidades de conservação para construção de hidrelétricas no Pará, Rondônia e Amazonas.
Na última semana, a Procuradoria Geral da República anunciou que impetrou, junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI), com pedido de liminar, contra a Medida Provisória (MP) nº 558/2012, editada em janeiro pela presidente Dilma Rousseff. A MP excluiu 86.288 hectares de sete Unidades de Conservação (UCs) federais na Amazônia para abrigar canteiros e reservatórios de quatro grandes barragens: duas em fase de construção no Rio Madeira e duas previstas no Rio Tapajós no Pará.
No Estado do Pará, a MP desafetou um total de 75.630 hectares de cinco unidades de conservação para abrir os reservatórios de duas grandes hidrelétricas propostas pelo setor elétrico do governo no PAC, as usinas São Luiz do Tapajós e Jatobá. Foram desafetadas áreas do Parque Nacional (PARNA) da Amazônia (18.700 hectares) Florestas Nacionais (FLONAs) de Itaituba I (7.705 ha) Itaituba II (28.453 ha) e Crepori (856 ha), da Área de Proteção Ambiental (APA) do Tapajós (19.916 ha).
Nos estados de Rondônia e Amazonas, foram excluídos 8.470 hectares do Parque Nacional Mapinguari para abrir caminho para os reservatórios das usinas de Santo Antônio e Jirau no rio Madeira, e 2.188 hectares do hectares do PARNA Campos Amazônicos para abrigar o reservatório da hidrelétrica de Tabajara no rio Machado, um dos principais tributário do Madeira.
De acordo com o procuradorr geral do MPF, Roberto Gurgel, todas as unidades de conservação alteradas são de extrema relevância para a preservação do Bioma Amazônia e que a norma questionada está repleta de inconstitucionalidades. Uma delas é o desrespeito à exigência de lei em sentido formal para a alteração e supressão de parques, florestas e áreas de proteção ambiental.
Como explica o coordenador da ONG International Rivers no Brasil, Brent Millikan, a gravidade é maior porque não houve a prévia realização de estudos técnicos e debate público sobre as usinas quanto e seus impactos sociais e ambientais, e alternativas: “O artigo 225 da Constituição Federal estabelece que a alteração e a supressão de áreas protegidas são permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a integridade dos atributos que justifiquem sua proteção. Assim, causa estranheza autoridades do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) concordarem com a exclusão de áreas de UCs para abrigar os reservatórios de hidrelétricos, sem mencionar esse preceito legal. Alem disso, as usinas de São Luiz do Tapajós, Jatobá e Tabajara sequer possuem estudos de viabilidade econômica” completou Millikan.
Pareceres contrários
Segundo o documento que embasa e justifica a Medida Provisória nº 558/2012, foi o ICMBio que propôs a diminuição das UCs. “O ICMBio, a partir de estudos realizados pela Eletrobrás e pela Eletronorte, encaminhou a proposta de redefinição dos polígonos do Parque Nacional da Amazônia, das Florestas Nacionais de Itaituba I, II e do Crepori e da Área de Proteção Ambiental Tapajós”, diz o documento.
Durante o ano de 2011, no entanto, gerentes locais do ICMBio responsáveis pelas UCs na região do Tapajós apresentaram uma série de pareceres técnicos contrários tanto à desafetação das unidades de conservação quanto à instalação de sete hidrelétricas propostas pela Eletronorte para a bacia do Tapajós (além de São Luiz do Tapajós e Jatobá, estão na lista as usinas de Chacorão, no Tapajós, e Cachoeira do Caí, Jamanxim, Cachoeira dos Patos e Jardim de Ouro, no rio Jamanxim).
Entre os problemas apontados pelos técnicos, destacaram-se inexistência de estudos ambientais sobre espécies ameaçadas de extinção; graves prejuízos para atividades econômicas como a pesca e o eco-turismo no PARNA da Amazônia; interferência no projeto de adequação da Transamazônica; inviabilização de projetos sociais e de desenvolvimento para as populações locais; inexistência de projetos de mitigação para as comunidades afetadas; destruição de sítios arqueológicos; inexistência de estudos sobre impactos ambientais e sociais; inexistência de estudos de viabilidade econômica; e, principalmente, desrespeito à legislação ambiental vigente. Os pareceres técnicos não receberam retorno da direção central do ICMBio em Brasília.
Segundo Raione Lima, da coordenação regional do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) em Itaituba (PA), é preciso um debate aprofundado sobre as hidrelétricas propostas pelo setor elétrico na bacia do Tapajós: “O propósito de desafetação de parte das unidades de conservação no Tapajós vem favorecer ao grande capital, principalmente aos interesses dos defensores das usinas hidrelétricas, que em seu bojo incluem as empreiteiras, grandes empresas de mineração, agronegócio, madeireiros e a classe dominante local que na concretização destes projetos enxergam os novos garimpos do século 21. Junto com a importância da conservação da biodiversidade da Amazônia, existe a necessidade de valorização de seus povos, ribeirinhos, pescadores e os parentes indígenas; todo esse conjunto que deve ser reconhecido, com respeito à dignidade da pessoa humana e aos direitos humanos acima de qualquer interesse econômico”, completou.
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FONTE : Colaboração do Movimento Xingu Vivo para Sempre para o EcoDebate, 14/02/2012
sexta-feira, 10 de fevereiro de 2012
Especialistas discutem como alimentar população mundial de 9 bilhões em 2050
Estímulo aos pequenos produtores e combate ao desperdício foram temas tratados em evento em Genebra
O mundo será habitado em 2050 por cerca de 9 bilhões de pessoas, que dependerão de um aumento entre 60 e 90% na produção de alimentos, com seu correspondente impacto no meio ambiente, ou da racionalização de sua produção e consumo.
Este foi o eixo do debate organizado nesta quarta-feira em Genebra pela revista “The Economist”, com a participação de políticos, empresários e especialistas, para apresentar propostas e soluções perante a perspectiva de ter que alimentar 9 bilhões de pessoas dentro de 40 anos. Matéria da Efe.
A potencialização dos pequenos produtores, especialmente nos países pobres e em desenvolvimento, a melhora da cadeia de distribuição de alimentos e a luta contra o enorme desperdício de comida foram os assuntos discutidos durante o seminário.
O diretor-geral da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), José Graziano da Silva, abriu a jornada lembrando que três quartos dos 925 milhões de pessoas que passam fome no mundo vivem em áreas rurais de países pobres e em desenvolvimento, e apostou por melhorar sua capacidade de produção e acesso aos alimentos para reverter esta situação.
Graziano lembrou que hoje em dia a comida à disposição de cada pessoa é 40% superior que em 1945, apesar de a população ter aumentado desde então em 4,5 bilhões de pessoas, algo que não se traduziu em uma divisão equitativa.
“A evidência de nosso fracasso coletivo é que quase 1 bilhão de pessoas estão desnutridas e que mais de 1 bilhão sofrem de sobrepeso ou obesidade”, destacou.
De acordo com Graziano, o acesso aos alimentos no âmbito local tem dificuldades para ser melhorado. “Corremos o risco de ter um mundo em 2050 com suficiente comida para todos, mas ainda com milhões de pessoas desnutridas. Muito parecido com o de hoje”, disse.
“Inclusive se ampliarmos nossa produção agrícola em 60% (nos próximos 40 anos), a porcentagem de desnutrição nos países em desenvolvimento estará em torno de 4% em 2050, ou seja, haverá 300 milhões de pessoas alimentadas de forma insuficiente”, explicou.
O diretor-geral da FAO chamou a atenção também sobre o desperdício de comida, já que atualmente são desperdiçados ou esbanjados um terço dos alimentos produzidos, cerca de 1,3 bilhões de toneladas por ano, principalmente no mundo desenvolvido.
“Se reduzíssemos o esbanjamento e a perda de alimentos em torno de 25%, teríamos comida adicional para 500 milhões de pessoas ao ano sem ter que produzir mais”, explicou.
Paul Bulcke, executivo-chefe do gigante alimentício Nestlé, advertiu que além de levar em conta que dentro de 40 anos a população terá aumentado em 2,3 bilhões de pessoas, “estaremos em um mundo mais rico, que vai comer de forma diferente”.
Na sua opinião, neste contexto a produção de alimentos terá que ser incrementada entre 70 e 80%, e inclusive poderia ter que chegar a 90%, levando em conta que “nos últimos anos o crescimento do rendimento de produção por hectare foi muito mais lento que o crescimento populacional”.
Bulcke, que dirige uma multinacional que emprega direta e indiretamente 25 milhões de pessoas no negócio da alimentação, destacou também a importância sociopolítica do setor, com uma crescente volatilidade dos preços que gerou em datas recentes rebeliões civis e quedas de Governos.
Ele criticou o protecionismo na produção agrícola, fazendo referência aos “bilhões de dólares investidos pelos países ricos para proteger seus produtores, provocando uma grave distorção do mercado internacional”.
Bulcke alertou também sobre o impacto dos biocombustíveis no aumento dos preços e sobre um risco associado, o da falta de água, para atender às necessidades futuras: “vamos ficar sem água muito mais rápido que sem petróleo”.
O diretor-geral da Organização Mundial o Comércio (OMC), Pascal Lamy, falou sobre a distorção apresentada pelo mercado, com uma excessiva concentração da produção, alguns países produzindo mais de 75% de produtos como o arroz e a soja.
Lamy apontou a África “como a peça que falta no quebra-cabeças alimentício mundial” e como a solução potencial às necessidades de comida no mundo nas próximas décadas, já que se trata do continente com maior quantidade de terra cultiváveis e com menor produção.
O exemplo é o Brasil: “o milagre brasileiro poderia ser reproduzido. Em menos de 30 anos, este país deixou de importar alimentos para ser um dos maiores celeiros do mundo. Nesse mesmo período, a África passou de um exportador a um importador”, disse.
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FONTE : Matéria da Efe, no Estadao.com.br (EcoDebate, 09/02/2012).
O mundo será habitado em 2050 por cerca de 9 bilhões de pessoas, que dependerão de um aumento entre 60 e 90% na produção de alimentos, com seu correspondente impacto no meio ambiente, ou da racionalização de sua produção e consumo.
Este foi o eixo do debate organizado nesta quarta-feira em Genebra pela revista “The Economist”, com a participação de políticos, empresários e especialistas, para apresentar propostas e soluções perante a perspectiva de ter que alimentar 9 bilhões de pessoas dentro de 40 anos. Matéria da Efe.
A potencialização dos pequenos produtores, especialmente nos países pobres e em desenvolvimento, a melhora da cadeia de distribuição de alimentos e a luta contra o enorme desperdício de comida foram os assuntos discutidos durante o seminário.
O diretor-geral da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO), José Graziano da Silva, abriu a jornada lembrando que três quartos dos 925 milhões de pessoas que passam fome no mundo vivem em áreas rurais de países pobres e em desenvolvimento, e apostou por melhorar sua capacidade de produção e acesso aos alimentos para reverter esta situação.
Graziano lembrou que hoje em dia a comida à disposição de cada pessoa é 40% superior que em 1945, apesar de a população ter aumentado desde então em 4,5 bilhões de pessoas, algo que não se traduziu em uma divisão equitativa.
“A evidência de nosso fracasso coletivo é que quase 1 bilhão de pessoas estão desnutridas e que mais de 1 bilhão sofrem de sobrepeso ou obesidade”, destacou.
De acordo com Graziano, o acesso aos alimentos no âmbito local tem dificuldades para ser melhorado. “Corremos o risco de ter um mundo em 2050 com suficiente comida para todos, mas ainda com milhões de pessoas desnutridas. Muito parecido com o de hoje”, disse.
“Inclusive se ampliarmos nossa produção agrícola em 60% (nos próximos 40 anos), a porcentagem de desnutrição nos países em desenvolvimento estará em torno de 4% em 2050, ou seja, haverá 300 milhões de pessoas alimentadas de forma insuficiente”, explicou.
O diretor-geral da FAO chamou a atenção também sobre o desperdício de comida, já que atualmente são desperdiçados ou esbanjados um terço dos alimentos produzidos, cerca de 1,3 bilhões de toneladas por ano, principalmente no mundo desenvolvido.
“Se reduzíssemos o esbanjamento e a perda de alimentos em torno de 25%, teríamos comida adicional para 500 milhões de pessoas ao ano sem ter que produzir mais”, explicou.
Paul Bulcke, executivo-chefe do gigante alimentício Nestlé, advertiu que além de levar em conta que dentro de 40 anos a população terá aumentado em 2,3 bilhões de pessoas, “estaremos em um mundo mais rico, que vai comer de forma diferente”.
Na sua opinião, neste contexto a produção de alimentos terá que ser incrementada entre 70 e 80%, e inclusive poderia ter que chegar a 90%, levando em conta que “nos últimos anos o crescimento do rendimento de produção por hectare foi muito mais lento que o crescimento populacional”.
Bulcke, que dirige uma multinacional que emprega direta e indiretamente 25 milhões de pessoas no negócio da alimentação, destacou também a importância sociopolítica do setor, com uma crescente volatilidade dos preços que gerou em datas recentes rebeliões civis e quedas de Governos.
Ele criticou o protecionismo na produção agrícola, fazendo referência aos “bilhões de dólares investidos pelos países ricos para proteger seus produtores, provocando uma grave distorção do mercado internacional”.
Bulcke alertou também sobre o impacto dos biocombustíveis no aumento dos preços e sobre um risco associado, o da falta de água, para atender às necessidades futuras: “vamos ficar sem água muito mais rápido que sem petróleo”.
O diretor-geral da Organização Mundial o Comércio (OMC), Pascal Lamy, falou sobre a distorção apresentada pelo mercado, com uma excessiva concentração da produção, alguns países produzindo mais de 75% de produtos como o arroz e a soja.
Lamy apontou a África “como a peça que falta no quebra-cabeças alimentício mundial” e como a solução potencial às necessidades de comida no mundo nas próximas décadas, já que se trata do continente com maior quantidade de terra cultiváveis e com menor produção.
O exemplo é o Brasil: “o milagre brasileiro poderia ser reproduzido. Em menos de 30 anos, este país deixou de importar alimentos para ser um dos maiores celeiros do mundo. Nesse mesmo período, a África passou de um exportador a um importador”, disse.
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FONTE : Matéria da Efe, no Estadao.com.br (EcoDebate, 09/02/2012).
Planeta perdeu em 8 anos o equivalente a 4.100 km3 de massa de gelo
Aquecimento global é responsável, afirma artigo publicado na ‘Science’.
Em oito anos, o planeta perdeu o equivalente a 4.100 km³ de gelo — provenientes das calotas, das geleiras, da Groenlândia e da Antártida — devido ao derretimento, afirma pesquisa que será publicada nesta quinta-feira (9) na edição online da revista “Science”. O dado equivale a 1,2 centímetro de elevação nos mares. Do Globo Natureza, no G1.
Na prática, essa massa derretida é suficiente para encobrir completamente os Estados Unidos em 1,5 metro de água. O volume corresponde a 82 mil vezes a quantidade de água existente no Lago Paranoá, em Brasília – que tem 0,05 km³.
De acordo com o estudo realizado pela Universidade Columbia, com dados disponibilizados pelo programa Grace (satélites de observação da Terra operados em parceria da Nasa com a Alemanha), de janeiro de 2003 a dezembro de 2010 foram derretidas anualmente 150 bilhões de toneladas de gelo – sem incluir Groelândia e Antártida. Nestas duas regiões, a perda anual de gelo equivale a 385 bilhões de toneladas/ano.
“A Terra está perdendo uma incrível quantidade de gelo para os oceanos anualmente e esses novos resultados nos ajudarão a entender questões importantes sobre a elevação do mar e respostas das regiões frias do planeta às mudanças climáticas globais”, disse John Wahr, pesquisador da Universidade Columbia, em comunicado enviado pela instituição.
Aquecimento global
Os cientistas participantes da pesquisa concordam que as atividades humanas, como o envio de grandes quantidades de gases de efeito estufa à atmosfera, estão aquecendo o planeta, fenômeno que é ocorre de forma mais acentuada nas áreas frias.
Porém, um dado inesperado aponta que, apesar da quantidade surpreendente de gelo derretido, o número é inferior ao apontado em estudos anteriores.
Os satélites do Grace constataram, por exemplo, que o degelo nas altas montanhas da Ásia, como o Himalaia, foi inferior à previsão de 50 bilhões de toneladas de massa de gelo por ano (o número constatado é de quatro bilhões de toneladas ao ano).
Preocupação
Os cientistas querem agora encontrar um padrão para entender melhor o processo de aumento do nível do mar.
“Uma grande questão é entender como a ascensão dos oceanos vão ser modificada neste século”, disse Tad Pfeffer, também participante da pesquisa.
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FONTE : EcoDebate, 09/02/2012
Em oito anos, o planeta perdeu o equivalente a 4.100 km³ de gelo — provenientes das calotas, das geleiras, da Groenlândia e da Antártida — devido ao derretimento, afirma pesquisa que será publicada nesta quinta-feira (9) na edição online da revista “Science”. O dado equivale a 1,2 centímetro de elevação nos mares. Do Globo Natureza, no G1.
Na prática, essa massa derretida é suficiente para encobrir completamente os Estados Unidos em 1,5 metro de água. O volume corresponde a 82 mil vezes a quantidade de água existente no Lago Paranoá, em Brasília – que tem 0,05 km³.
De acordo com o estudo realizado pela Universidade Columbia, com dados disponibilizados pelo programa Grace (satélites de observação da Terra operados em parceria da Nasa com a Alemanha), de janeiro de 2003 a dezembro de 2010 foram derretidas anualmente 150 bilhões de toneladas de gelo – sem incluir Groelândia e Antártida. Nestas duas regiões, a perda anual de gelo equivale a 385 bilhões de toneladas/ano.
“A Terra está perdendo uma incrível quantidade de gelo para os oceanos anualmente e esses novos resultados nos ajudarão a entender questões importantes sobre a elevação do mar e respostas das regiões frias do planeta às mudanças climáticas globais”, disse John Wahr, pesquisador da Universidade Columbia, em comunicado enviado pela instituição.
Aquecimento global
Os cientistas participantes da pesquisa concordam que as atividades humanas, como o envio de grandes quantidades de gases de efeito estufa à atmosfera, estão aquecendo o planeta, fenômeno que é ocorre de forma mais acentuada nas áreas frias.
Porém, um dado inesperado aponta que, apesar da quantidade surpreendente de gelo derretido, o número é inferior ao apontado em estudos anteriores.
Os satélites do Grace constataram, por exemplo, que o degelo nas altas montanhas da Ásia, como o Himalaia, foi inferior à previsão de 50 bilhões de toneladas de massa de gelo por ano (o número constatado é de quatro bilhões de toneladas ao ano).
Preocupação
Os cientistas querem agora encontrar um padrão para entender melhor o processo de aumento do nível do mar.
“Uma grande questão é entender como a ascensão dos oceanos vão ser modificada neste século”, disse Tad Pfeffer, também participante da pesquisa.
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FONTE : EcoDebate, 09/02/2012
Quanto falta para o colapso? artigo de Fernando Reinach
Sistemas vivos passam por transições abruptas. A morte é a mais conhecida. Em um momento estamos vivos, no seguinte, mortos. Mas existem inúmeros exemplos de pontos de transição abruptos. Qual o momento em que a devastação de uma floresta a condena ao desaparecimento? Qual o número mínimo de baleias necessário para a sobrevivência da espécie? Determinar o ponto exato em que essas transições ocorrem e quão longe estamos delas é um problema ainda não resolvido.
Isso é difícil de fazer porque todos os sistemas vivos possuem mecanismos de autorregulação. Imagine que um animal coma cada vez menos; intuitivamente, sabemos que chega um momento em que ele morre. Mas determinar esse momento é difícil porque, à medida que ele come menos, ele também se movimenta menos, diminui seu metabolismo e passa a necessitar de menos alimento. Processos semelhantes tornam difícil prever o tamanho mínimo de uma população de baleias ou o abuso que uma floresta aguenta antes de desaparecer.
Por volta de 1980, foi proposta uma teoria que permite medir a distância entre o estado presente e o ponto de colapso de um sistema biológico. A ideia é que o tempo que um sistema vivo leva para se recuperar de um trauma aumenta à medida que o sistema se aproxima do ponto de colapso. Se você abre uma clareira em uma floresta virgem, ela se fecha rapidamente. À medida que a floresta se aproxima do ponto de colapso, a teoria prevê que o tempo necessário para a clareira fechar aumenta. Você tira o alimento de um animal. Se ele estiver saudável, ao ser alimentado, a recuperação é rápida. Mas, se ele estiver se aproximando do ponto de colapso, o tempo de recuperação aumenta. O mesmo princípio se aplicaria a uma população de baleias ou a um paciente na UTI.
Na prática. O problema é que essa teoria nunca havia sido testada. Agora, um grupo de cientistas demonstrou que ela funciona na prática.
O experimento foi feito com microalgas. Esses seres unicelulares necessitam de luz para fazer fotossíntese e produzir seu alimento, mas luz em excesso os mata. Para evitar o excesso de luz, eles crescem todos juntos – assim, um faz sombra para o outro. Regulando a distância entre eles (sua densidade no oceano), regula-se a quantidade de luz que recebem. Os cientistas colocaram essas algas em um recipiente de vidro em condições ideais: muitas algas por litro e uma quantidade de luz fixa.
Estabelecida a condição ótima, os cientistas adicionaram mais líquido ao recipiente, mantendo a mesma quantidade de luz incidente. Inicialmente, as algas, com menos vizinhos para diminuir a incidência de luz, diminuem sua taxa de crescimento, mas rapidamente se dividem de modo a otimizar novamente o sombreamento.
Os cientistas mediram o tempo que o sistema leva para se recuperar. Mas, antes que ele estivesse totalmente recuperado, adicionaram mais líquido, forçando as algas a se adaptar ao novo ambiente. As algas novamente se recuperaram. Ao longo de 30 dias, os cientistas foram aumentando o estresse e a cada vez as algas se recuperavam.
Mas o tempo de recuperação foi ficando mais longo. Até um momento em que eles adicionaram um pouco mais de líquido e o sistema colapsou: todas as algas morreram. Haviam atingido o ponto de transição abrupta.
Após medir a velocidade de recuperação em função do estresse aplicado no sistema, os cientistas demonstraram que é possível prever quão distante o sistema está do colapso medindo seu tempo de recuperação. Estes resultados demonstram que a teoria proposta em 1980 é verdadeira.
Nos próximos anos, é provável que diversos grupos, usando diversos sistemas biológicos, tentem demonstrar que medir a variação do tempo de recuperação permite prever quão distante um sistema vivo está do colapso.
Se essa teoria for confirmada, teremos uma arma poderosa. Estudos de impacto ambiental finalmente terão um embasamento científico mais sólido e programas de recuperação ambiental poderão ter seus resultados medidos de forma objetiva.
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FONTE : Fernando Reinach é biólogo / Mais informações: ‘Ecovery Rates Reflect Distance To a Tipping Point In a Living System. Nature’, Vol. 481, Pág. 357, 2012
Artigo originalmente publicado em O Estado de S.Paulo. EcoDebate, 10/02/2012
Isso é difícil de fazer porque todos os sistemas vivos possuem mecanismos de autorregulação. Imagine que um animal coma cada vez menos; intuitivamente, sabemos que chega um momento em que ele morre. Mas determinar esse momento é difícil porque, à medida que ele come menos, ele também se movimenta menos, diminui seu metabolismo e passa a necessitar de menos alimento. Processos semelhantes tornam difícil prever o tamanho mínimo de uma população de baleias ou o abuso que uma floresta aguenta antes de desaparecer.
Por volta de 1980, foi proposta uma teoria que permite medir a distância entre o estado presente e o ponto de colapso de um sistema biológico. A ideia é que o tempo que um sistema vivo leva para se recuperar de um trauma aumenta à medida que o sistema se aproxima do ponto de colapso. Se você abre uma clareira em uma floresta virgem, ela se fecha rapidamente. À medida que a floresta se aproxima do ponto de colapso, a teoria prevê que o tempo necessário para a clareira fechar aumenta. Você tira o alimento de um animal. Se ele estiver saudável, ao ser alimentado, a recuperação é rápida. Mas, se ele estiver se aproximando do ponto de colapso, o tempo de recuperação aumenta. O mesmo princípio se aplicaria a uma população de baleias ou a um paciente na UTI.
Na prática. O problema é que essa teoria nunca havia sido testada. Agora, um grupo de cientistas demonstrou que ela funciona na prática.
O experimento foi feito com microalgas. Esses seres unicelulares necessitam de luz para fazer fotossíntese e produzir seu alimento, mas luz em excesso os mata. Para evitar o excesso de luz, eles crescem todos juntos – assim, um faz sombra para o outro. Regulando a distância entre eles (sua densidade no oceano), regula-se a quantidade de luz que recebem. Os cientistas colocaram essas algas em um recipiente de vidro em condições ideais: muitas algas por litro e uma quantidade de luz fixa.
Estabelecida a condição ótima, os cientistas adicionaram mais líquido ao recipiente, mantendo a mesma quantidade de luz incidente. Inicialmente, as algas, com menos vizinhos para diminuir a incidência de luz, diminuem sua taxa de crescimento, mas rapidamente se dividem de modo a otimizar novamente o sombreamento.
Os cientistas mediram o tempo que o sistema leva para se recuperar. Mas, antes que ele estivesse totalmente recuperado, adicionaram mais líquido, forçando as algas a se adaptar ao novo ambiente. As algas novamente se recuperaram. Ao longo de 30 dias, os cientistas foram aumentando o estresse e a cada vez as algas se recuperavam.
Mas o tempo de recuperação foi ficando mais longo. Até um momento em que eles adicionaram um pouco mais de líquido e o sistema colapsou: todas as algas morreram. Haviam atingido o ponto de transição abrupta.
Após medir a velocidade de recuperação em função do estresse aplicado no sistema, os cientistas demonstraram que é possível prever quão distante o sistema está do colapso medindo seu tempo de recuperação. Estes resultados demonstram que a teoria proposta em 1980 é verdadeira.
Nos próximos anos, é provável que diversos grupos, usando diversos sistemas biológicos, tentem demonstrar que medir a variação do tempo de recuperação permite prever quão distante um sistema vivo está do colapso.
Se essa teoria for confirmada, teremos uma arma poderosa. Estudos de impacto ambiental finalmente terão um embasamento científico mais sólido e programas de recuperação ambiental poderão ter seus resultados medidos de forma objetiva.
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FONTE : Fernando Reinach é biólogo / Mais informações: ‘Ecovery Rates Reflect Distance To a Tipping Point In a Living System. Nature’, Vol. 481, Pág. 357, 2012
Artigo originalmente publicado em O Estado de S.Paulo. EcoDebate, 10/02/2012
Metrópoles desgovernadas, artigo de Erminia Maricato
RESUMO
Apesar de sua importância econômica, política, social, demográfica, cultural, territorial e ambiental, há, nas metrópoles brasileiras, uma significativa falta de governo, evidenciada pelas incipientes iniciativas de cooperação administrativa intermunicipal e federativa. Este artigo aborda as mudanças estruturais – no processo de urbanização/ metropolização – devidas à reestruturação produtiva do capitalismo global, e, na escala nacional, trata da mudança no marco institucional – jurídico/político – que passou de concentrador e centralizador, durante o regime militar, para descentralizador e esvaziado, após a Constituição de 1988. O recuo verificado nas políticas sociais durante os anos 1980 e 1990, notadamente em transporte, habitação e saneamento, além do desmonte dos organismos metropolitanos, conduziu nossas metrópoles a um destino de banalização das tragédias urbanas. Em que pese sua urgência, a questão metropolitana não sensibiliza nenhuma força política ou instituição que lhe atribua lugar de destaque na agenda nacional.
Palavras-chave: Regiões metropolitanas, Metrópoles, Questão metropolitana, Colaboração governamental, Desgoverno.
ABSTRACT
Despite its economic, political, social, demographic, cultural, territorial and environmental importance, there is a significant lack of government in the brazilian metropolises, evidenced by the incipient initiatives of intermunicipal and federative administrative cooperation. This article analyses the structural changes – in the process of urbanization/metropolization – due to the productive restructuring of global capitalism, and, in a national scale, analyses the change in the institutional mark – legal/political – which passed from concentrator and centralizer, during the Military Regimen, to decentralized and emptied, after 1988 Constitution. The downturn verified in social policies during the years 1980 and 1990, notably in transport, housing and sanitation, besides the dismantling of the metropolitan agencies, has led our cities to the trivialization of urban tragedies. Despite its urgency, the metropolitan issue does not sensitize any political force or institution which assigns it a prominent place on the national agenda.
Keywords: Metropolitan areas, Metropolises, Metropolitan issue, Government collaboration, Misrule.
Introdução
O gigantismo que marca as metrópoles dos países capitalistas não desenvolvidos inspirou teorias que, ao tentarem explicar as especificidades desse processo, lançaram mão de conceitos como “inchamento”, “macrocefalia”, “desequilíbrio”, utilizando, como é mais comum na produção acadêmica, a comparação com a situação apresentada pela rede de cidades dos países capitalistas centrais. Nos anos 1970, uma coletânea de textos organizada por Manuel Castells – que levava o título de Imperialismo y urbanización en America Latina – reunia autores latino-americanos, além do organizador, espanhol, para pensar as características desse processo de urbanização. Esse esforço seguia o caminho aberto pela Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), que buscava pensar as condições do subdesenvolvimento no subcontinente e as formas de superá-las.1 Uma das questões centrais do livro se refere à diferença entre a importância do setor industrial e do setor “serviços” nas metrópoles dos dois conjuntos de países, centrais e latino-americanos. Segundo alguns dos intérpretes, nas metrópoles da América Latina, o setor “serviço” absorvia (ou nele se depositava) uma força de trabalho muito maior, sendo, por isso, caracterizado de inchado e relacionado às atividades marginais ou atrasadas, desvinculadas do núcleo hegemônico que, nesse período, passava a ser liderado por capitais internacionais produtores de bens de consumo durável (cf. Arantes, 2009).
Contrapondo-se a uma visão dualista e esquemática desse processo de urbanização concentrado, um bem-sucedido esforço intelectual, do qual participaram inúmeros pesquisadores brasileiros, logrou avançar na explicação que contemplasse a totalidade do processo social, econômico, político e cultural, como uma unidade contraditória, que seria produto de um processo “desigual e combinado”, ou do “desenvolvimento moderno do atraso” ou ainda da “modernização conservadora”. Baseados nos principais intérpretes da sociedade brasileira – Caio Prado, Sergio Buarque de Holanda, Raimundo Faoro, Celso Furtado, Francisco de Oliveira, Roberto Schwarz, Florestan Fernandes, entre outros -, urbanistas, geógrafos, sociólogos, advogados, engenheiros, engajados na transformação do ambiente construído, incorporaram o território a essa abordagem, analisando a produção da cidade e, em especial, a funcionalidade da cidade informal, ilegal ou periférica para o processo de acumulação de capital nos países não hegemônicos. A questão da renda imobiliária, que é central nos processos gerais de urbanização capitalista, ganha aspectos particulares e uma centralidade absoluta no universo periférico (Maricato, 2011). O patrimonialismo, a privatização da esfera pública, o clientelismo e a política do favor, além da herança escravocrata, do desprestígio do trabalho e da incorporação de avanços sem o abandono das formas atrasadas, ainda estão na base da metrópole brasileira que passa por transformações significativas – a partir das mudanças que levaram o país a se tornar um player de importância internacional -, mas sem modificar suas características de desigualdade profunda, como veremos adiante.
A tarefa de elaborar uma teoria da urbanização na periferia do capitalismo está longe de apresentar resultado satisfatório, e a prova disso são os indefectíveis e onipresentes modelos de projetos urbanísticos e arquitetônicos buscados no exterior por qualquer governante de plantão ou pela mídia local, fortemente submetidos ao mimetismo cultural. Mas é preciso reconhecer que a academia fez avanços contra a corrente e que a formação do pensamento crítico sobre a cidade periférica acumulou uma certa produção intelectual vinculada a um engajamento na busca por alternativas de políticas públicas.2
A aceleração e a concentração da urbanização em algumas grandes aglomerações, que não se restringiram à América Latina, eram um fenômeno mundial que se aprofundaria nas décadas seguintes. Dentre as 49 maiores cidades do mundo em 1890, 42 estavam no chamado Primeiro Mundo, enquanto sete estavam no Terceiro Mundo. Dentre as 50 maiores cidades do mundo no ano 2000, 11 estavam no Primeiro Mundo e as demais, no mundo não desenvolvido ou emergente. Essa tendência se acentua, especialmente com a urbanização tardia de países da Ásia e da África, notadamente China e Índia. Em 2025 estima-se que a Ásia poderá ter de 10 a 11 cidades com mais de 20 milhões de habitantes (Davis, 2006).
Ainda que a pobreza medida por indicadores nacionais diminua com a urbanização, de um modo geral, o número absoluto de moradores de favelas cresce mais do que o crescimento da população urbana (Un-Habitat, 2010). A concentração de pobres em gigantescas favelas – que contam com domicílios congestionados e insalubres, sem água potável, sem esgotos, sem coleta de lixo -, com baixa taxa de emprego, com elevados índices de violência, apresenta um aspecto qualitativo que a difere da dispersa pobreza rural. São verdadeiras bombas socioecológicas. Em 2005 havia pelo menos 13 favelas com mais de um milhão de habitantes em cidades do mundo não desenvolvido (ibidem).
O contraponto à urbanização da pobreza – periferização ou favelização – está na chamada urbanização dispersa (urban sprawl), responsável pela formação dos característicos subúrbios americanos, que podem ser vistos também nas cidades dos países da periferia do capitalismo, dividindo o entorno das cidades regiões com a ocupação irregular de baixa renda. O impacto da globalização nas cidades de todo o mundo – em decorrência da “nova pobreza” e, por que não, da nova riqueza – foi responsável por algumas mudanças no caráter da segregação com a ocorrência das gated communities, guetos, cidadelas, condomínios fechados (Marcuse, 1997; Matos, 2004; Ribeiro, 2004; Cáceres & Sabatini, 2004; Cobos & López, 2007; Reis Filho & Tanaka, 2007).
Com a reestruturação produtiva do capitalismo, que tem início nos anos 1970, há mudanças nos processos de produção do ambiente construído (Harvey, 1992; Benko & Lipietz, 1992; Diniz, 1993; Cano, 1995; Brandão, 2007; Moura, 2010). Metropolização expandida, fragmentação, dispersão, cidades regiões, corredores urbanos, urbanização do arquipélago, espaços “pós-urbanos” são conceitos que tentam definir a ampliação da ocupação urbana no território (Un-Habitat, 2010; Ribeiro, 2004; Veltz, 1996). Alguns estudos buscam evidenciar um novo papel para as metrópoles no mundo globalizado, dominado pela financeirização e pelas novas tecnologias de informação e comunicação: cidades globais, metápoles, cidades informacionais (Sassen, 1998; Ascher, 1995; Castells, 1999). Há mudanças nas relações intraurbanas, especialmente nas articulações do mercado imobiliário com a esfera financeira, fenômeno mais característico dos países centrais, que serviu para detonar a crise mundial de 2008 (Harvey, 2005).
Essas teorias que, seguindo tradição histórica de subordinação cultural, influem na produção acadêmica sobre as cidades na periferia do capitalismo não resistem à observação empírica e exigem maior precaução em sua aplicação. A urbanização da humanidade, prevista por Henri Lefèbvre em seu livro A revolução urbana, lançado em 1970, não admite mais ver o urbano como um “lugar relativamente limitado e distinto”, pois, diante das circunstâncias, trata-se de uma “condição planetária generalizada”, que está a exigir uma revisão teórica (apud Brenner, 2010, p.26). No entanto, embora haja evidências de mudanças nas cidades e metrópoles da periferia do capitalismo, também não se pode dizer que elas são estruturais ou profundas, ainda que o capitalismo global e brasileiro apresente mudanças significativas (Ferreira, 2007; Moura, 2010; Holanda, 2010). Novas estratégias de localização e logística, atividades industriais inovadoras, ampliação dos serviços relacionados à comunicação, finanças e educação, arranjos urbanos regionais ligados à produção e exportação de commodities são algumas das características que favorecem as “regiões ganhadoras” no conceito de Benko & Lipietz (1992). As mudanças – que Diniz (2001) chamou de “desconcentração concentrada” – não evitaram o aprofundamento da concentração e o crescimento das desigualdades e disparidades regionais.
As transformações capitalistas, que se combinaram às décadas orientadas pelo pensamento neoliberal (no Brasil, em 1980, 1990 e 2000) tiveram forte impacto sobre as cidades. A desregulamentação – do que já não era muito regulamentado, como o mercado imobiliário -, o desemprego, a competitividade, a guerra fiscal, o abandono de políticas sociais, como o transporte coletivo, as privatizações de serviços públicos, o planejamento estratégico, o marketing urbano, entre outros, se combinaram a uma tradição histórica de falta de controle sobre o uso do solo e de segregação territorial e urbana. A desigualdade continua a reinar soberana embasada num padrão ambíguo de aplicação das leis relativas à propriedade fundiária – em que pese o novo arcabouço legal federal – e de investimentos, ambos profundamente regressivos nos seus aspectos sociais e orientados por interesses do capital de incorporação, no caso dos edifícios, e do capital de construção pesada, no caso da infraestrutura urbana, cuja prioridade absoluta é a matriz rodoviarista e mais exatamente o automóvel.
A violência nas metrópoles se consolida no período aludido de forma inédita, evidenciada pelo aumento da taxa de homicídios, que mostra tendência a reversão – ainda que cercada de controvérsia – apenas no final da primeira década do século XXI. Tragédias causadas por enchentes e desmoronamentos se banalizam e tornam-se mais frequentes a cada ano (Saldiva et al., 2010). A ocupação irregular de beira de córregos, encostas instáveis desmatadas, mangues, dunas, áreas de proteção de mananciais testemunha o abandono de uma grande parcela da população ao seu próprio engenho e recursos precários.
O Brasil tinha, em 2010, cerca de 14 metrópoles com mais de um milhão de habitantes, e São Paulo tinha mais de 19 milhões e Rio de Janeiro, mais de 11 milhões. E ainda, 80% dos brasileiros, moradores de favelas, estão nas metrópoles, segundo o IBGE (2000). A coleta e a destinação de resíduos sólidos mostram-se pífias se levarmos em conta o cenário de poluição das águas e dos terrenos. O serviço de coleta de esgoto deixa muito a desejar no país – atende 52,2% dos municípios e 33,5% dos domicílios, segundo o IBGE (2000) – e algumas das epidemias já erradicadas voltaram a se consolidar (Saldiva et al., 2010). O padrão de investimentos em obras metropolitanas mostra a falta de integração entre as ações de cada município que compõem as metrópoles, e alguns governos estaduais apresentam apenas planos metropolitanos setoriais e, mesmo assim, raramente são implementados. Não é raro a orientação urbanística de um município prejudicar os demais. Macrodrenagem, coleta e distribuição de água tratada, transporte de cargas e passageiros, coleta e tratamento de esgoto, habitação, uso e ocupação do solo são temas que exigem um tratamento integrado na metrópole. Apesar desse quadro, a questão metropolitana está numa espécie de “limbo” no Brasil. Não há integração administrativa e, o que é pior, parece que ninguém se interessa pelo assunto.
Regiões Metropolitanas: da centralização autoritária do regime militar à descentralização liberal da constituição federal de 1988
Existe praticamente um consenso entre estudiosos, técnicos e profissionais, sobre a precariedade do quadro legal de Regiões Metropolitanas (RM) no Brasil, que advém da diversidade de critérios – convencionados em cada Estado da federação, após a Constituição Federal de 1988 – para a definição dessas regiões. Se durante o período ditatorial essa definição foi feita de forma autoritária por imposição de lei federal (Lei Complementar n.14), que seguiu a Constituição de 1967, com a Constituição de 1988 a prerrogativa passa para o âmbito das diversas Constituições Estaduais. As 35 Regiões Metropolitanas definidas legalmente em 2010, às quais se somam três Regiões Integradas de Desenvolvimento Econômico (Rides) que abrangem mais de um Estado, constituem um conjunto heterogêneo dentro do qual figuram aglomerações urbanas com importância demográfica, econômica, social e política bastante diferenciada.
A Constituição de 1988 seguiu orientação democrática e descentralizadora – afirmando a autonomia municipal, especialmente em relação ao desenvolvimento urbano – como resposta para o descontentamento que gerou a forma autoritária de impor as RM, adotadas pelo regime militar. Mas o fato é que nenhuma das duas formas nos conduziu a resultados satisfatórios, embora essa dificuldade se localize mais na esfera da política ou das relações de poder que propriamente na falta de aperfeiçoamento do aparato legal. Durante os anos 1970, o governo federal definiu nove RM, cuja gestão ficou a cargo de um Conselho Deliberativo, formado majoritariamente por representantes indicados pelos governos federal e estadual (cujos governadores eram indicados pelo governo federal). Os prefeitos que faziam parte das RM podiam eleger, para compor esse Conselho, apenas um representante ou compor o Conselho Consultivo, também instituído pela mesma lei. Essa iniciativa, apesar de antidemocrática, formou alguns dos mais importantes organismos de planejamento metropolitano devido, em grande parte, à existência de fundos destinados a obras de habitação e infraestrutura urbana (Klink, 2009).
Vamos lembrar como o Estado brasileiro tratou a questão metropolitana durante o regime autoritário até para entender por que ela foi tão minimizada na Constituição de 1988 e no Estatuto da Cidade de 2001.
O II Plano Nacional de Desenvolvimento (PND) de 1974 instituiu a criação do Serviço Federal de Habitação e Urbanismo, gestor do Fundo de Financiamento ao Planejamento. Esses organismos foram sucedidos pela Comissão de Política Urbana e Regiões Metropolitanas, administradora do Fundo de Desenvolvimento Urbano e do Fundo de Transporte Urbano, mais tarde transferido para a Empresa Brasileira de Transporte Urbano. Os metrôs de São Paulo e Rio de Janeiro, por exemplo, tiveram origem nesse período. O Planejamento Urbano ganhou muito prestígio e os Planos Diretores se multiplicaram, fomentados por incentivos do governo federal, assim como se multiplicaram estudos sobre a rede urbana brasileira e sobre a necessidade do papel forte do governo federal na orientação do processo de urbanização, como mostra trabalho pioneiro do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea, 1974) sobre a Política Nacional de Desenvolvimento Urbano.3
Apesar da produção significativa de Planos Nacionais, Metropolitanos e Municipais, bem como do arcabouço institucional criado pelo governo ditatorial, o destino das cidades pouco se alterou. Ainda assim, a atuação do Estado nesse período mostrou-se mais efetiva do que nas décadas seguintes, marcadas pela desregulamentação das políticas públicas e pelo recuo nos investimentos públicos. O Sistema Financeiro da Habitação (SFH) e seu gestor, o Banco Nacional da Habitação (BNH), foram, na verdade, os organismos que mais impactaram o crescimento e o padrão de urbanização brasileira, disseminando o apartamento de classe média, fortalecendo os negócios de incorporação imobiliária e a indústria da construção. Com a habitação social localizada fora do tecido urbano, de um modo geral, o BNH e seu sistema financeiro não só contribuíram para segregar as camadas sociais de menor renda, como impediram o mercado de terras urbanas, potencializado pelos recursos do financiamento residencial oriundos da poupança privada (Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo – SBPE) e da poupança compulsória (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS), de operar de forma sustentável. Como órgão central de investimento habitacional e urbano, o BNH, em geral, não seguia o planejamento urbano financiado pelo próprio governo federal.
Mas é preciso reconhecer que o saneamento, a habitação e o transporte urbano nunca recuperaram o patamar de investimento dos anos 1970 até a data em que este texto é escrito. A Política Nacional de Saneamento foi orientada pelo Plano Nacional do Saneamento (Planasa) e sustentada pelo Sistema Financeiro do Saneamento (SFS), cuja principal fonte era o FGTS. O regime militar conduziu a concentração dos serviços de água e esgotos nas empresas estaduais, induzindo a formação de empresas públicas fortes e enfraquecendo a autonomia municipal. Empréstimos federais foram usados de forma até coercitiva para quebrar a resistência de municípios à entrega da concessão dos serviços para as empresas estaduais (Maricato, 1984). A extensão da rede de água tratada nas periferias metropolitanas promovida pelo Planasa logrou acelerar a tendência de queda da mortalidade infantil, mostrando que em parcelas das políticas públicas algum planejamento foi elaborado e aplicado – ainda que de forma autoritária -, o que não é comum na história do Brasil urbano. Faziam parte do SFH e do SFS os agentes da política habitacional, as Companhias Habitacionais (Cohab) e as empresas ou autarquias, agentes responsáveis pela implementação da política de saneamento. O papel desses agentes era definido centralmente pelo governo federal. Portanto, tratava-se de uma estrutura concentrada e centralizada, que operava segundo regras definidas pelo governo federal. Até mesmo o desenho de conjuntos habitacionais era repetido em diferentes regiões do país, independentemente do clima e da cultura local (Maricato, 1984).
Em que pese a concentração da renda promovida pelo governo ditatorial, as periferias metropolitanas continuavam a constituir um espaço de oportunidades de assentamento para as massas que migravam para as cidades, já que o significativo crescimento econômico assegurava oportunidades de trabalho formal ou informal. Durante mais de quatro décadas de industrialização tardia – de 1940 a 1980 -, o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro cresceu mais de 7% ao ano. Ao mesmo tempo, o país viveu altas taxas de urbanização, concentrada especialmente nas metrópoles, que asseguraram oferta abundante de força de trabalho barata. À industrialização com baixos salários correspondeu a urbanização dos baixos salários: autoconstrução da casa, ocupação irregular da terra, extensão horizontal de bairros sem urbanização cuja ocupação era viabilizada pelo precário transporte sobre rodas, indispensável para transportar a força de trabalho.
No início dos anos 1980, os investimentos em obras de habitação e saneamento, bem como em obras de infraestrutura urbana, tiveram uma queda abrupta em razão da crise fiscal. As políticas públicas de transporte, saneamento e habitação seguiram um rumo errático a partir de então. No governo Collor, as empresas de saneamento entraram em declínio por falta de recursos financeiros e, mais tarde (por ocasião do acordo do governo federal com Fundo Monetário Internacional (FMI) em 1998), foram orientadas para a privatização.4 A Resolução n. 2.521 do Conselho Monetário Nacional subordinou os empréstimos do FGTS para a área do saneamento à orientação do Ministério da Fazenda. Empréstimos seriam feitos apenas com a contrapartida da privatização dos serviços. Uma tentativa de constituir um marco regulatório para o setor foi a Lei Federal n.199, acordada pelas entidades envolvidas com o assunto, mas vetada na íntegra pelo presidente da República Fernando Henrique Cardoso (FHC), em 1997. A “queda de braço” que opunha interesses pró e contra a privatização do setor do saneamento impediu que se aprovasse um novo marco regulatório – o que aconteceu finalmente em 2007 – e essa área tão fundamental para a saúde, para o meio ambiente, para a economia, ficou indefinida por mais de duas décadas.
No início de 2003, apenas seis dentre as 27 companhias estaduais de saneamento não estavam falidas ou extintas: SP, PR, DF, MG, ES e CE. O mesmo destino tiveram as Cohab, que foram orientadas para extinção durante o governo de FHC. A política dos transportes urbanos seguiu a mesma via-crúcis com o agravante de que não foram retomados os investimentos na mesma medida que no saneamento e na habitação, com a criação do Ministério das Cidades em 2003. O governo Collor extinguiu a Empresa Brasileira de Transportes Urbanos (EBTU), esvaziando as ações federais sobre o assunto. Outros organismos com a mesma atribuição foram criados e esvaziados enquanto o setor entrava em crise, evidenciada pelo aumento da proporção da renda familiar destinada ao transporte nas cidades brasileiras e pela queda no número de usuários nos veículos coletivos.5
Apesar de apresentar uma das maiores taxas de urbanização do mundo – 84% em 2005, segundo o IBGE -, o Estado brasileiro praticamente ignorou a política urbana e metropolitana, desde o declínio do BNH na década de 1980 até a criação do Ministério das Cidades em 2003. Se com o BNH havia muita construção que não seguia qualquer planejamento urbano explícito, com o Ministério das Cidades não podemos dizer que essa orientação mudou e que a tragédia urbana brasileira esteja sendo enfrentada (Maricato, 2011).6
Regiões Metropolitanas e metrópoles em 2010: mudanças e permanências
A partir da Constituição Federal de 1988, os Estados passaram a definir, com seus próprios critérios, as RM e Rides. Em 2010, eram 38 aglomerações compostas por 444 municípios, envolvendo 21 Estados, além do DF. São elas: Belém (PA), Macapá (AP), Manaus (AM), Aracaju (SE), Agreste (AL), Cariri (CE), Fortaleza (CE), Grande São Luís (MA), João Pessoa (PB), Maceió (AL), Natal (RN), Recife (PE), Ride Petrolina /Juazeiro (BA/PE), Ride Teresina/Timon (PI/MA), Salvador (BA), Sudoeste Maranhense (MA), Baixada Santista (SP), Belo Horizonte (MG), Campinas (SP), Grande Vitória (ES), Rio de Janeiro (RJ), São Paulo (SP), Vale do Aço (MG), Carbonífera (SC), Chapecó (SC), Curitiba (PR), Florianópolis (SC), Foz do Rio Itajaí (SC), Lages (SC), Londrina (PR), Maringá (PR), Norte/nordeste Catarinense (SC), Porto Alegre (RS), Tubarão (SC), Vale do Itajaí (SC), Goiânia (GO), Ride DF (DF, GO e MG), Vale do Rio Cuiabá (MT). (Observatório das Metrópoles, 2010). Dificilmente uma política pública para as RM poderia ter uma formulação satisfatória se considerarmos a discrepância existente entre essas aglomerações definidas oficialmente a partir de critérios tão díspares.
Na busca de um conceito mais homogêneo que desse conta de fornecer um quadro mais coerente, o Observatório das Metrópoles (2004, 2010) elaborou, em 2004, um estudo, a pedido do Ministério das Cidades, com a finalidade de contribuir para a definição de uma política para as RM. Partindo de critérios relacionados à integração entre os municípios das RM, foram definidos 15 aglomerados considerados metrópoles por essa metodologia. São elas:
Algumas mudanças observadas no processo de urbanização no Brasil, a partir dos anos 1980, alimentam uma reflexão sobre as transformações que estariam ocorrendo nas metrópoles e seu papel na sociedade brasileira (Carvalho et al., 2010; Observatório das Metrópoles, 2010). São elas: a) as cidades de porte médio, cuja população está entre 100 mil e 500 mil, e as cidades com população acima dessa faixa passaram a crescer a taxas mais altas do que as metrópoles ou do que a média nacional; b) por sua vez, após séculos de concentração do crescimento urbano nas faixas litorâneas, nota-se também, nesse período, uma relativa reorientação do processo de migração/urbanização, e as mais altas taxas se apresentam nas cidades do Norte e do Centro-Oeste – o esvaziamento econômico e demográfico das metrópoles e até mesmo a possibilidade de um fenômeno de desmetropolização são mencionados -; c) algumas evidências apontam para a emigração nos núcleos metropolitanos em favor de municípios da própria periferia da metrópole; d) a Região Sudeste perde posição em relação ao Valor da Transformação Industrial (VTI) no país – de 80,7% em 1970, para 61,8% em 2005 – e isso impacta especialmente a principal metrópole paulista, cujo VTI cai de 43,5% em 1970 para 22,0% em 2005, enquanto todas as demais regiões do país são ganhadoras. O mesmo acontece com o emprego formal.7
Embora reconheça essas mudanças – algumas das quais se devem às transformações ocorridas no capitalismo brasileiro que impactam a maior parte do território, além das metrópoles -, o Observatório das Metrópoles reafirma a concentração do poder nos centros mencionados. A consideração da complexidade do conjunto da rede urbana brasileira – o que pode incluir as polarizações das metrópoles sobre as cidades médias – e dos Censos de 1991, 2000 e 2010 mostra que as 15 metrópoles citadas estão ampliando sua participação no total da população brasileira, embora algumas delas apresentem perda relativa de participação na população total, como é o caso de São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre e Recife (Observatório das Metrópoles, 2010). Em 2010, elas concentravam pouco mais de 69 milhões de pessoas, o que representava 36,2% da população total (em 1991, 34,9% e em 2000, 36,0%) e 56,5% da população urbana. E ainda, eram responsáveis por 50,3% do PIB brasileiro e 55% do valor da transformação industrial.
Algumas tentativas de cooperação administrativa nas metrópoles: um quadro incipiente
No bojo da luta social que se opôs ao regime de exceção e conquistou as instituições democráticas, construiu-se uma proposta para as cidades, reunida em uma agenda que ficou conhecida como Reforma Urbana. A promulgação do Estatuto da Cidade, Lei Federal n.10.257, talvez tenha sido o ponto alto das conquistas desse movimento social. Como já foi mencionado, as metrópoles não mereceram maior atenção ou detalhamento no texto constitucional e nem no Estatuto da Cidade, em razão da pesada herança centralizadora que impactava negativamente o debate. No entanto, as forças sociais mobilizadas durante esse ascenso da participação política, especialmente nos anos 1980 e 1990, buscaram abrir caminhos cooperativos nos cotidianos dos governos. Diversas ações que tiveram destaque nesse período assumiram a forma de consórcios – entidades que se organizaram voluntariamente para dar solução a problemas comuns, como a gestão de recursos hídricos, a destinação final de resíduos sólidos, o enfrentamento do desemprego e da evasão industrial, entre muitos temas.
Merece destaque o Consórcio da Região do Grande ABC, que, durante os anos 1990, reuniu sete prefeitos daquela região da metrópole paulista. O consórcio chegou a contar com uma estrutura administrativa relativamente complexa para lidar com temáticas específicas e gerais, e conseguiu, durante uma parte do tempo, incorporar os representantes das entidades sindicais, empresariais, lideranças sociais, além de representantes do governo do Estado (Rolnik & Somekh, 2004). O bem-sucedido Consórcio da Região do Grande ABC parecia não carecer de base legal e institucional, embora a falta de um desenho jurídico claro para esse tipo de colaboração fosse apontada como obstáculo para sua consolidação, e acabou inspirando a aprovação de uma Lei Federal, em 2005, a Lei dos Consórcios Públicos. Quando o debate das Parcerias Público-Privadas (PPP), oriundas do modelo neoliberal, ainda dominava a agenda nacional, foi elaborada por iniciativa da Secretaria de Assuntos Institucionais da Presidência da República, que reunia alguns dos antigos participantes de consórcios públicos, uma lei que logrou ser aprovada no Congresso Nacional com a finalidade de fornecer base jurídica para os consórcios públicos. Mas, a partir de meados de 2005, a agenda da Reforma Urbana e o ativismo político que a acompanhou começaram a perder importância política (Maricato, 2011), e as experiências dos consórcios, embora numerosas, não apresentaram muitos casos que extrapolassem as políticas setoriais (Spink et al., 2009).
Com relação à institucionalização de entidades administrativas metropolitanas, como na maior parte dos casos que são criadas e implementadas o são de cima para baixo, o quadro não é melhor; ao contrário. Após 30 anos da criação das RM, apenas sete apresentam a “existência de estruturas específicas, institucionalizadas e atuantes de gestão metropolitana que estão desenvolvendo algum tipo de políticas públicas” (ibidem, p.463). Em geral, o formato utilizado é o de criar os órgãos: Agência de Desenvolvimento, Fundo Metropolitano e Conselho de Desenvolvimento. As RM que fazem parte desse quadro são: Baixada Santista, Campinas, Recife, Belo Horizonte, Grande Vitória, João Pessoa, além de uma interrompida experiência em Natal. Nenhuma delas apresenta uma satisfatória experiência de integração administrativa, especialmente se considerarmos o tema central de controle sobre o uso e ocupação do solo que está relacionado aos grandes problemas vividos pelas metrópoles: sociais, ambientais, de saneamento, de transportes, de drenagem, de saúde e de segurança.
Governabilidade das metrópoles: a urgência social, econômica e ambiental e sua desimportância política
Christian Lefèvre (2009) chama atenção para o paradoxo constituído pela importância crescente das metrópoles no mundo todo e o seu esvaziamento como território da política, evidenciado pelo fracasso da criação das instituições metropolitanas. Portanto, não se trata de um fenômeno brasileiro, mas mundial, como revela o autor com exemplos de várias partes do mundo, notadamente dos países centrais do capitalismo. A rivalidade dos Estados Nacionais, com a possível importância de autoridades metropolitanas e o prestígio da democracia local ou das comunas são apontados pelo autor como fatores de deslegitimação das metrópoles.
No Brasil, a tradição municipalista de raízes coloniais, recuperada pela Constituição de 1988, reafirmada pelas políticas paroquiais e clientelistas exercidas pelos executivos e legislativos, reforça esse localismo que foi incentivado ainda durante os anos 1990, pelo Banco Mundial e congêneres (Vainer, 2000). Governos estaduais e federal preferem não romper com as políticas paroquiais: em vez da racionalização dos investimentos baseados em planejamento territorial, as negociações de apoio político orientam os recursos a determinados municípios e não a outros. Há programas que priorizam os investimentos em RM como é o caso do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), na área da habitação e do saneamento. Há programas estaduais na área do transporte metropolitano, mas eles permanecem setoriais e obedecem a investimentos esporádicos.
Ao complexo desenho federativo das competências relativas ao desenvolvimento urbano e metropolitano, que implicaria cooperações federal, estaduais e municipais, soma-se a inexistência de fontes perenes de investimento metropolitano. Aí está a impressionante condição dos transportes coletivos desprezados em razão da prioridade dada ao automóvel e às obras viárias (Maricato, 2011).
Outros fatores também contribuem para inviabilizar a cooperação administrativa nas metrópoles. A existência de polos com significativa disparidade econômica, política e cultural também funciona como obstáculo para essa integração, na medida em que municípios com maior arrecadação pouco se interessam pela redistribuição de parte de sua receita. Enfim, essa lista poderia ir longe para mostrar que, apesar da urgência, nenhuma força política que tenha presença importante na cena brasileira está interessada em mudar o rumo das metrópoles. A questão está no limbo.
Notas
1 Dentre os autores brasileiros que figuram no livro organizado por Manuel Castells estão Paul Singer, Fernando Henrique Cardoso, Lucio Kowarick, Cândido Ferreira de Camargo e Milton Santos. Dentre os estrangeiros que alimentaram a controversa está Aníbal Quijano, além do próprio Castells.
2 Ver a respeito o capítulo “Formação e impasse do pensamento crítico sobre a cidade periférica” em Maricato (2011). O texto chama a atenção para o avanço nos estudos e na prática de parcela das prefeituras municipais e também para seu impasse, a partir de meados dos anos 2000.
3 Esse estudo do Ipea, que propõe uma política pública sob o título Política Nacional de Desenvolvimento Urbano, faz parte de uma certa tradição de olhar a rede urbana brasileira. Ele foi sucedido pelo documento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano (CNDU), Evolução da Rede Urbana no Brasil 1970-1980 de 1985; pelo trabalho realizado por Ipea-Nesur/Unicamp-IBGE, Tendências e perspectivas da rede urbana do Brasil de 1999; pelo A nova geografia econômica do Brasil: uma proposta de regionalização com base nos polos econômicos e suas áreas de influência, Cedeplar/UFMG, 2000. Em 2004, o MCidades contratou vários estudos com a finalidade elaborar a Política Nacional de Desenvolvimento Urbano (PNDU) e a Política Nacional para Regiões Metropolitanas. Eles estão reunidos em MCidades, 2005 e MCidades/Fase/Observatório das Metrópoles, 2005 (versão digital). Outras edições parciais ou complementadas desse material foram feitas pelo Ministério das Cidades em 2008 (Cunha & Pedreira, 2008) e pelo Observatório das Metrópoles/CNPq (2009) – Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro (Org.) Hierarquização e identidade dos espaços urbanos. Rio de Janeiro: Letra Capital, 2009. Ver especialmente o primeiro e o segundo volumes organizados por Rosa Moura e outros e Jean Bitoun e outros. Com a saída de Olívio Dutra do MCidades, a elaboração dessas políticas nacionais – urbana e metropolitana – foi paralisada.
4 Sobre a determinação de centralização dos serviços de saneamento nas mãos de companhias estaduais, ver tese de doutoramento apresentada à FAUUSP (Maricato, 1984). Sobre a pressão governamental, nos anos 1990, para privatização, ver: “A crise do setor de saneamento no Brasil. Oficina de Informações”. Reportagem, edição especial, Osasco, ano 2, n.15, nov. 2000.
5 Ver a respeito pesquisa IBGE/CNTU para período 1995/2002.
6 Uma análise da política urbana institucionalizada pelo governo FHC pode ser encontrada em Maricato (2003). Para um balanço da política urbana e habitacional do período citado, ver Azevedo & Mares Guia (2007).
7 Conforme apresentação “Globalização e território: leitura a partir do Brasil” proferida pela Profa. Tânia Bacelar na Câmara Municipal de São Paulo, em maio 2008.
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Erminia Maricato é professora titular em Planejamento Urbano da USP, membro dos conselhos editoriais das revistas Justice spatiale/ Spatial Justice, Université de Nanterre; Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais (Anpur); Cadernos da Metrópole; Observatório das Metrópoles/Educ/Ippur UFRJ; Revista Urbe- PUCPR; e Key Speaker, do Social Architecture Fórum. Ankara, Turquia, 2010. @ – erminia@usp.br
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Apesar de sua importância econômica, política, social, demográfica, cultural, territorial e ambiental, há, nas metrópoles brasileiras, uma significativa falta de governo, evidenciada pelas incipientes iniciativas de cooperação administrativa intermunicipal e federativa. Este artigo aborda as mudanças estruturais – no processo de urbanização/ metropolização – devidas à reestruturação produtiva do capitalismo global, e, na escala nacional, trata da mudança no marco institucional – jurídico/político – que passou de concentrador e centralizador, durante o regime militar, para descentralizador e esvaziado, após a Constituição de 1988. O recuo verificado nas políticas sociais durante os anos 1980 e 1990, notadamente em transporte, habitação e saneamento, além do desmonte dos organismos metropolitanos, conduziu nossas metrópoles a um destino de banalização das tragédias urbanas. Em que pese sua urgência, a questão metropolitana não sensibiliza nenhuma força política ou instituição que lhe atribua lugar de destaque na agenda nacional.
Palavras-chave: Regiões metropolitanas, Metrópoles, Questão metropolitana, Colaboração governamental, Desgoverno.
ABSTRACT
Despite its economic, political, social, demographic, cultural, territorial and environmental importance, there is a significant lack of government in the brazilian metropolises, evidenced by the incipient initiatives of intermunicipal and federative administrative cooperation. This article analyses the structural changes – in the process of urbanization/metropolization – due to the productive restructuring of global capitalism, and, in a national scale, analyses the change in the institutional mark – legal/political – which passed from concentrator and centralizer, during the Military Regimen, to decentralized and emptied, after 1988 Constitution. The downturn verified in social policies during the years 1980 and 1990, notably in transport, housing and sanitation, besides the dismantling of the metropolitan agencies, has led our cities to the trivialization of urban tragedies. Despite its urgency, the metropolitan issue does not sensitize any political force or institution which assigns it a prominent place on the national agenda.
Keywords: Metropolitan areas, Metropolises, Metropolitan issue, Government collaboration, Misrule.
Introdução
O gigantismo que marca as metrópoles dos países capitalistas não desenvolvidos inspirou teorias que, ao tentarem explicar as especificidades desse processo, lançaram mão de conceitos como “inchamento”, “macrocefalia”, “desequilíbrio”, utilizando, como é mais comum na produção acadêmica, a comparação com a situação apresentada pela rede de cidades dos países capitalistas centrais. Nos anos 1970, uma coletânea de textos organizada por Manuel Castells – que levava o título de Imperialismo y urbanización en America Latina – reunia autores latino-americanos, além do organizador, espanhol, para pensar as características desse processo de urbanização. Esse esforço seguia o caminho aberto pela Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), que buscava pensar as condições do subdesenvolvimento no subcontinente e as formas de superá-las.1 Uma das questões centrais do livro se refere à diferença entre a importância do setor industrial e do setor “serviços” nas metrópoles dos dois conjuntos de países, centrais e latino-americanos. Segundo alguns dos intérpretes, nas metrópoles da América Latina, o setor “serviço” absorvia (ou nele se depositava) uma força de trabalho muito maior, sendo, por isso, caracterizado de inchado e relacionado às atividades marginais ou atrasadas, desvinculadas do núcleo hegemônico que, nesse período, passava a ser liderado por capitais internacionais produtores de bens de consumo durável (cf. Arantes, 2009).
Contrapondo-se a uma visão dualista e esquemática desse processo de urbanização concentrado, um bem-sucedido esforço intelectual, do qual participaram inúmeros pesquisadores brasileiros, logrou avançar na explicação que contemplasse a totalidade do processo social, econômico, político e cultural, como uma unidade contraditória, que seria produto de um processo “desigual e combinado”, ou do “desenvolvimento moderno do atraso” ou ainda da “modernização conservadora”. Baseados nos principais intérpretes da sociedade brasileira – Caio Prado, Sergio Buarque de Holanda, Raimundo Faoro, Celso Furtado, Francisco de Oliveira, Roberto Schwarz, Florestan Fernandes, entre outros -, urbanistas, geógrafos, sociólogos, advogados, engenheiros, engajados na transformação do ambiente construído, incorporaram o território a essa abordagem, analisando a produção da cidade e, em especial, a funcionalidade da cidade informal, ilegal ou periférica para o processo de acumulação de capital nos países não hegemônicos. A questão da renda imobiliária, que é central nos processos gerais de urbanização capitalista, ganha aspectos particulares e uma centralidade absoluta no universo periférico (Maricato, 2011). O patrimonialismo, a privatização da esfera pública, o clientelismo e a política do favor, além da herança escravocrata, do desprestígio do trabalho e da incorporação de avanços sem o abandono das formas atrasadas, ainda estão na base da metrópole brasileira que passa por transformações significativas – a partir das mudanças que levaram o país a se tornar um player de importância internacional -, mas sem modificar suas características de desigualdade profunda, como veremos adiante.
A tarefa de elaborar uma teoria da urbanização na periferia do capitalismo está longe de apresentar resultado satisfatório, e a prova disso são os indefectíveis e onipresentes modelos de projetos urbanísticos e arquitetônicos buscados no exterior por qualquer governante de plantão ou pela mídia local, fortemente submetidos ao mimetismo cultural. Mas é preciso reconhecer que a academia fez avanços contra a corrente e que a formação do pensamento crítico sobre a cidade periférica acumulou uma certa produção intelectual vinculada a um engajamento na busca por alternativas de políticas públicas.2
A aceleração e a concentração da urbanização em algumas grandes aglomerações, que não se restringiram à América Latina, eram um fenômeno mundial que se aprofundaria nas décadas seguintes. Dentre as 49 maiores cidades do mundo em 1890, 42 estavam no chamado Primeiro Mundo, enquanto sete estavam no Terceiro Mundo. Dentre as 50 maiores cidades do mundo no ano 2000, 11 estavam no Primeiro Mundo e as demais, no mundo não desenvolvido ou emergente. Essa tendência se acentua, especialmente com a urbanização tardia de países da Ásia e da África, notadamente China e Índia. Em 2025 estima-se que a Ásia poderá ter de 10 a 11 cidades com mais de 20 milhões de habitantes (Davis, 2006).
Ainda que a pobreza medida por indicadores nacionais diminua com a urbanização, de um modo geral, o número absoluto de moradores de favelas cresce mais do que o crescimento da população urbana (Un-Habitat, 2010). A concentração de pobres em gigantescas favelas – que contam com domicílios congestionados e insalubres, sem água potável, sem esgotos, sem coleta de lixo -, com baixa taxa de emprego, com elevados índices de violência, apresenta um aspecto qualitativo que a difere da dispersa pobreza rural. São verdadeiras bombas socioecológicas. Em 2005 havia pelo menos 13 favelas com mais de um milhão de habitantes em cidades do mundo não desenvolvido (ibidem).
O contraponto à urbanização da pobreza – periferização ou favelização – está na chamada urbanização dispersa (urban sprawl), responsável pela formação dos característicos subúrbios americanos, que podem ser vistos também nas cidades dos países da periferia do capitalismo, dividindo o entorno das cidades regiões com a ocupação irregular de baixa renda. O impacto da globalização nas cidades de todo o mundo – em decorrência da “nova pobreza” e, por que não, da nova riqueza – foi responsável por algumas mudanças no caráter da segregação com a ocorrência das gated communities, guetos, cidadelas, condomínios fechados (Marcuse, 1997; Matos, 2004; Ribeiro, 2004; Cáceres & Sabatini, 2004; Cobos & López, 2007; Reis Filho & Tanaka, 2007).
Com a reestruturação produtiva do capitalismo, que tem início nos anos 1970, há mudanças nos processos de produção do ambiente construído (Harvey, 1992; Benko & Lipietz, 1992; Diniz, 1993; Cano, 1995; Brandão, 2007; Moura, 2010). Metropolização expandida, fragmentação, dispersão, cidades regiões, corredores urbanos, urbanização do arquipélago, espaços “pós-urbanos” são conceitos que tentam definir a ampliação da ocupação urbana no território (Un-Habitat, 2010; Ribeiro, 2004; Veltz, 1996). Alguns estudos buscam evidenciar um novo papel para as metrópoles no mundo globalizado, dominado pela financeirização e pelas novas tecnologias de informação e comunicação: cidades globais, metápoles, cidades informacionais (Sassen, 1998; Ascher, 1995; Castells, 1999). Há mudanças nas relações intraurbanas, especialmente nas articulações do mercado imobiliário com a esfera financeira, fenômeno mais característico dos países centrais, que serviu para detonar a crise mundial de 2008 (Harvey, 2005).
Essas teorias que, seguindo tradição histórica de subordinação cultural, influem na produção acadêmica sobre as cidades na periferia do capitalismo não resistem à observação empírica e exigem maior precaução em sua aplicação. A urbanização da humanidade, prevista por Henri Lefèbvre em seu livro A revolução urbana, lançado em 1970, não admite mais ver o urbano como um “lugar relativamente limitado e distinto”, pois, diante das circunstâncias, trata-se de uma “condição planetária generalizada”, que está a exigir uma revisão teórica (apud Brenner, 2010, p.26). No entanto, embora haja evidências de mudanças nas cidades e metrópoles da periferia do capitalismo, também não se pode dizer que elas são estruturais ou profundas, ainda que o capitalismo global e brasileiro apresente mudanças significativas (Ferreira, 2007; Moura, 2010; Holanda, 2010). Novas estratégias de localização e logística, atividades industriais inovadoras, ampliação dos serviços relacionados à comunicação, finanças e educação, arranjos urbanos regionais ligados à produção e exportação de commodities são algumas das características que favorecem as “regiões ganhadoras” no conceito de Benko & Lipietz (1992). As mudanças – que Diniz (2001) chamou de “desconcentração concentrada” – não evitaram o aprofundamento da concentração e o crescimento das desigualdades e disparidades regionais.
As transformações capitalistas, que se combinaram às décadas orientadas pelo pensamento neoliberal (no Brasil, em 1980, 1990 e 2000) tiveram forte impacto sobre as cidades. A desregulamentação – do que já não era muito regulamentado, como o mercado imobiliário -, o desemprego, a competitividade, a guerra fiscal, o abandono de políticas sociais, como o transporte coletivo, as privatizações de serviços públicos, o planejamento estratégico, o marketing urbano, entre outros, se combinaram a uma tradição histórica de falta de controle sobre o uso do solo e de segregação territorial e urbana. A desigualdade continua a reinar soberana embasada num padrão ambíguo de aplicação das leis relativas à propriedade fundiária – em que pese o novo arcabouço legal federal – e de investimentos, ambos profundamente regressivos nos seus aspectos sociais e orientados por interesses do capital de incorporação, no caso dos edifícios, e do capital de construção pesada, no caso da infraestrutura urbana, cuja prioridade absoluta é a matriz rodoviarista e mais exatamente o automóvel.
A violência nas metrópoles se consolida no período aludido de forma inédita, evidenciada pelo aumento da taxa de homicídios, que mostra tendência a reversão – ainda que cercada de controvérsia – apenas no final da primeira década do século XXI. Tragédias causadas por enchentes e desmoronamentos se banalizam e tornam-se mais frequentes a cada ano (Saldiva et al., 2010). A ocupação irregular de beira de córregos, encostas instáveis desmatadas, mangues, dunas, áreas de proteção de mananciais testemunha o abandono de uma grande parcela da população ao seu próprio engenho e recursos precários.
O Brasil tinha, em 2010, cerca de 14 metrópoles com mais de um milhão de habitantes, e São Paulo tinha mais de 19 milhões e Rio de Janeiro, mais de 11 milhões. E ainda, 80% dos brasileiros, moradores de favelas, estão nas metrópoles, segundo o IBGE (2000). A coleta e a destinação de resíduos sólidos mostram-se pífias se levarmos em conta o cenário de poluição das águas e dos terrenos. O serviço de coleta de esgoto deixa muito a desejar no país – atende 52,2% dos municípios e 33,5% dos domicílios, segundo o IBGE (2000) – e algumas das epidemias já erradicadas voltaram a se consolidar (Saldiva et al., 2010). O padrão de investimentos em obras metropolitanas mostra a falta de integração entre as ações de cada município que compõem as metrópoles, e alguns governos estaduais apresentam apenas planos metropolitanos setoriais e, mesmo assim, raramente são implementados. Não é raro a orientação urbanística de um município prejudicar os demais. Macrodrenagem, coleta e distribuição de água tratada, transporte de cargas e passageiros, coleta e tratamento de esgoto, habitação, uso e ocupação do solo são temas que exigem um tratamento integrado na metrópole. Apesar desse quadro, a questão metropolitana está numa espécie de “limbo” no Brasil. Não há integração administrativa e, o que é pior, parece que ninguém se interessa pelo assunto.
Regiões Metropolitanas: da centralização autoritária do regime militar à descentralização liberal da constituição federal de 1988
Existe praticamente um consenso entre estudiosos, técnicos e profissionais, sobre a precariedade do quadro legal de Regiões Metropolitanas (RM) no Brasil, que advém da diversidade de critérios – convencionados em cada Estado da federação, após a Constituição Federal de 1988 – para a definição dessas regiões. Se durante o período ditatorial essa definição foi feita de forma autoritária por imposição de lei federal (Lei Complementar n.14), que seguiu a Constituição de 1967, com a Constituição de 1988 a prerrogativa passa para o âmbito das diversas Constituições Estaduais. As 35 Regiões Metropolitanas definidas legalmente em 2010, às quais se somam três Regiões Integradas de Desenvolvimento Econômico (Rides) que abrangem mais de um Estado, constituem um conjunto heterogêneo dentro do qual figuram aglomerações urbanas com importância demográfica, econômica, social e política bastante diferenciada.
A Constituição de 1988 seguiu orientação democrática e descentralizadora – afirmando a autonomia municipal, especialmente em relação ao desenvolvimento urbano – como resposta para o descontentamento que gerou a forma autoritária de impor as RM, adotadas pelo regime militar. Mas o fato é que nenhuma das duas formas nos conduziu a resultados satisfatórios, embora essa dificuldade se localize mais na esfera da política ou das relações de poder que propriamente na falta de aperfeiçoamento do aparato legal. Durante os anos 1970, o governo federal definiu nove RM, cuja gestão ficou a cargo de um Conselho Deliberativo, formado majoritariamente por representantes indicados pelos governos federal e estadual (cujos governadores eram indicados pelo governo federal). Os prefeitos que faziam parte das RM podiam eleger, para compor esse Conselho, apenas um representante ou compor o Conselho Consultivo, também instituído pela mesma lei. Essa iniciativa, apesar de antidemocrática, formou alguns dos mais importantes organismos de planejamento metropolitano devido, em grande parte, à existência de fundos destinados a obras de habitação e infraestrutura urbana (Klink, 2009).
Vamos lembrar como o Estado brasileiro tratou a questão metropolitana durante o regime autoritário até para entender por que ela foi tão minimizada na Constituição de 1988 e no Estatuto da Cidade de 2001.
O II Plano Nacional de Desenvolvimento (PND) de 1974 instituiu a criação do Serviço Federal de Habitação e Urbanismo, gestor do Fundo de Financiamento ao Planejamento. Esses organismos foram sucedidos pela Comissão de Política Urbana e Regiões Metropolitanas, administradora do Fundo de Desenvolvimento Urbano e do Fundo de Transporte Urbano, mais tarde transferido para a Empresa Brasileira de Transporte Urbano. Os metrôs de São Paulo e Rio de Janeiro, por exemplo, tiveram origem nesse período. O Planejamento Urbano ganhou muito prestígio e os Planos Diretores se multiplicaram, fomentados por incentivos do governo federal, assim como se multiplicaram estudos sobre a rede urbana brasileira e sobre a necessidade do papel forte do governo federal na orientação do processo de urbanização, como mostra trabalho pioneiro do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea, 1974) sobre a Política Nacional de Desenvolvimento Urbano.3
Apesar da produção significativa de Planos Nacionais, Metropolitanos e Municipais, bem como do arcabouço institucional criado pelo governo ditatorial, o destino das cidades pouco se alterou. Ainda assim, a atuação do Estado nesse período mostrou-se mais efetiva do que nas décadas seguintes, marcadas pela desregulamentação das políticas públicas e pelo recuo nos investimentos públicos. O Sistema Financeiro da Habitação (SFH) e seu gestor, o Banco Nacional da Habitação (BNH), foram, na verdade, os organismos que mais impactaram o crescimento e o padrão de urbanização brasileira, disseminando o apartamento de classe média, fortalecendo os negócios de incorporação imobiliária e a indústria da construção. Com a habitação social localizada fora do tecido urbano, de um modo geral, o BNH e seu sistema financeiro não só contribuíram para segregar as camadas sociais de menor renda, como impediram o mercado de terras urbanas, potencializado pelos recursos do financiamento residencial oriundos da poupança privada (Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo – SBPE) e da poupança compulsória (Fundo de Garantia por Tempo de Serviço – FGTS), de operar de forma sustentável. Como órgão central de investimento habitacional e urbano, o BNH, em geral, não seguia o planejamento urbano financiado pelo próprio governo federal.
Mas é preciso reconhecer que o saneamento, a habitação e o transporte urbano nunca recuperaram o patamar de investimento dos anos 1970 até a data em que este texto é escrito. A Política Nacional de Saneamento foi orientada pelo Plano Nacional do Saneamento (Planasa) e sustentada pelo Sistema Financeiro do Saneamento (SFS), cuja principal fonte era o FGTS. O regime militar conduziu a concentração dos serviços de água e esgotos nas empresas estaduais, induzindo a formação de empresas públicas fortes e enfraquecendo a autonomia municipal. Empréstimos federais foram usados de forma até coercitiva para quebrar a resistência de municípios à entrega da concessão dos serviços para as empresas estaduais (Maricato, 1984). A extensão da rede de água tratada nas periferias metropolitanas promovida pelo Planasa logrou acelerar a tendência de queda da mortalidade infantil, mostrando que em parcelas das políticas públicas algum planejamento foi elaborado e aplicado – ainda que de forma autoritária -, o que não é comum na história do Brasil urbano. Faziam parte do SFH e do SFS os agentes da política habitacional, as Companhias Habitacionais (Cohab) e as empresas ou autarquias, agentes responsáveis pela implementação da política de saneamento. O papel desses agentes era definido centralmente pelo governo federal. Portanto, tratava-se de uma estrutura concentrada e centralizada, que operava segundo regras definidas pelo governo federal. Até mesmo o desenho de conjuntos habitacionais era repetido em diferentes regiões do país, independentemente do clima e da cultura local (Maricato, 1984).
Em que pese a concentração da renda promovida pelo governo ditatorial, as periferias metropolitanas continuavam a constituir um espaço de oportunidades de assentamento para as massas que migravam para as cidades, já que o significativo crescimento econômico assegurava oportunidades de trabalho formal ou informal. Durante mais de quatro décadas de industrialização tardia – de 1940 a 1980 -, o Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro cresceu mais de 7% ao ano. Ao mesmo tempo, o país viveu altas taxas de urbanização, concentrada especialmente nas metrópoles, que asseguraram oferta abundante de força de trabalho barata. À industrialização com baixos salários correspondeu a urbanização dos baixos salários: autoconstrução da casa, ocupação irregular da terra, extensão horizontal de bairros sem urbanização cuja ocupação era viabilizada pelo precário transporte sobre rodas, indispensável para transportar a força de trabalho.
No início dos anos 1980, os investimentos em obras de habitação e saneamento, bem como em obras de infraestrutura urbana, tiveram uma queda abrupta em razão da crise fiscal. As políticas públicas de transporte, saneamento e habitação seguiram um rumo errático a partir de então. No governo Collor, as empresas de saneamento entraram em declínio por falta de recursos financeiros e, mais tarde (por ocasião do acordo do governo federal com Fundo Monetário Internacional (FMI) em 1998), foram orientadas para a privatização.4 A Resolução n. 2.521 do Conselho Monetário Nacional subordinou os empréstimos do FGTS para a área do saneamento à orientação do Ministério da Fazenda. Empréstimos seriam feitos apenas com a contrapartida da privatização dos serviços. Uma tentativa de constituir um marco regulatório para o setor foi a Lei Federal n.199, acordada pelas entidades envolvidas com o assunto, mas vetada na íntegra pelo presidente da República Fernando Henrique Cardoso (FHC), em 1997. A “queda de braço” que opunha interesses pró e contra a privatização do setor do saneamento impediu que se aprovasse um novo marco regulatório – o que aconteceu finalmente em 2007 – e essa área tão fundamental para a saúde, para o meio ambiente, para a economia, ficou indefinida por mais de duas décadas.
No início de 2003, apenas seis dentre as 27 companhias estaduais de saneamento não estavam falidas ou extintas: SP, PR, DF, MG, ES e CE. O mesmo destino tiveram as Cohab, que foram orientadas para extinção durante o governo de FHC. A política dos transportes urbanos seguiu a mesma via-crúcis com o agravante de que não foram retomados os investimentos na mesma medida que no saneamento e na habitação, com a criação do Ministério das Cidades em 2003. O governo Collor extinguiu a Empresa Brasileira de Transportes Urbanos (EBTU), esvaziando as ações federais sobre o assunto. Outros organismos com a mesma atribuição foram criados e esvaziados enquanto o setor entrava em crise, evidenciada pelo aumento da proporção da renda familiar destinada ao transporte nas cidades brasileiras e pela queda no número de usuários nos veículos coletivos.5
Apesar de apresentar uma das maiores taxas de urbanização do mundo – 84% em 2005, segundo o IBGE -, o Estado brasileiro praticamente ignorou a política urbana e metropolitana, desde o declínio do BNH na década de 1980 até a criação do Ministério das Cidades em 2003. Se com o BNH havia muita construção que não seguia qualquer planejamento urbano explícito, com o Ministério das Cidades não podemos dizer que essa orientação mudou e que a tragédia urbana brasileira esteja sendo enfrentada (Maricato, 2011).6
Regiões Metropolitanas e metrópoles em 2010: mudanças e permanências
A partir da Constituição Federal de 1988, os Estados passaram a definir, com seus próprios critérios, as RM e Rides. Em 2010, eram 38 aglomerações compostas por 444 municípios, envolvendo 21 Estados, além do DF. São elas: Belém (PA), Macapá (AP), Manaus (AM), Aracaju (SE), Agreste (AL), Cariri (CE), Fortaleza (CE), Grande São Luís (MA), João Pessoa (PB), Maceió (AL), Natal (RN), Recife (PE), Ride Petrolina /Juazeiro (BA/PE), Ride Teresina/Timon (PI/MA), Salvador (BA), Sudoeste Maranhense (MA), Baixada Santista (SP), Belo Horizonte (MG), Campinas (SP), Grande Vitória (ES), Rio de Janeiro (RJ), São Paulo (SP), Vale do Aço (MG), Carbonífera (SC), Chapecó (SC), Curitiba (PR), Florianópolis (SC), Foz do Rio Itajaí (SC), Lages (SC), Londrina (PR), Maringá (PR), Norte/nordeste Catarinense (SC), Porto Alegre (RS), Tubarão (SC), Vale do Itajaí (SC), Goiânia (GO), Ride DF (DF, GO e MG), Vale do Rio Cuiabá (MT). (Observatório das Metrópoles, 2010). Dificilmente uma política pública para as RM poderia ter uma formulação satisfatória se considerarmos a discrepância existente entre essas aglomerações definidas oficialmente a partir de critérios tão díspares.
Na busca de um conceito mais homogêneo que desse conta de fornecer um quadro mais coerente, o Observatório das Metrópoles (2004, 2010) elaborou, em 2004, um estudo, a pedido do Ministério das Cidades, com a finalidade de contribuir para a definição de uma política para as RM. Partindo de critérios relacionados à integração entre os municípios das RM, foram definidos 15 aglomerados considerados metrópoles por essa metodologia. São elas:
Algumas mudanças observadas no processo de urbanização no Brasil, a partir dos anos 1980, alimentam uma reflexão sobre as transformações que estariam ocorrendo nas metrópoles e seu papel na sociedade brasileira (Carvalho et al., 2010; Observatório das Metrópoles, 2010). São elas: a) as cidades de porte médio, cuja população está entre 100 mil e 500 mil, e as cidades com população acima dessa faixa passaram a crescer a taxas mais altas do que as metrópoles ou do que a média nacional; b) por sua vez, após séculos de concentração do crescimento urbano nas faixas litorâneas, nota-se também, nesse período, uma relativa reorientação do processo de migração/urbanização, e as mais altas taxas se apresentam nas cidades do Norte e do Centro-Oeste – o esvaziamento econômico e demográfico das metrópoles e até mesmo a possibilidade de um fenômeno de desmetropolização são mencionados -; c) algumas evidências apontam para a emigração nos núcleos metropolitanos em favor de municípios da própria periferia da metrópole; d) a Região Sudeste perde posição em relação ao Valor da Transformação Industrial (VTI) no país – de 80,7% em 1970, para 61,8% em 2005 – e isso impacta especialmente a principal metrópole paulista, cujo VTI cai de 43,5% em 1970 para 22,0% em 2005, enquanto todas as demais regiões do país são ganhadoras. O mesmo acontece com o emprego formal.7
Embora reconheça essas mudanças – algumas das quais se devem às transformações ocorridas no capitalismo brasileiro que impactam a maior parte do território, além das metrópoles -, o Observatório das Metrópoles reafirma a concentração do poder nos centros mencionados. A consideração da complexidade do conjunto da rede urbana brasileira – o que pode incluir as polarizações das metrópoles sobre as cidades médias – e dos Censos de 1991, 2000 e 2010 mostra que as 15 metrópoles citadas estão ampliando sua participação no total da população brasileira, embora algumas delas apresentem perda relativa de participação na população total, como é o caso de São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre e Recife (Observatório das Metrópoles, 2010). Em 2010, elas concentravam pouco mais de 69 milhões de pessoas, o que representava 36,2% da população total (em 1991, 34,9% e em 2000, 36,0%) e 56,5% da população urbana. E ainda, eram responsáveis por 50,3% do PIB brasileiro e 55% do valor da transformação industrial.
Algumas tentativas de cooperação administrativa nas metrópoles: um quadro incipiente
No bojo da luta social que se opôs ao regime de exceção e conquistou as instituições democráticas, construiu-se uma proposta para as cidades, reunida em uma agenda que ficou conhecida como Reforma Urbana. A promulgação do Estatuto da Cidade, Lei Federal n.10.257, talvez tenha sido o ponto alto das conquistas desse movimento social. Como já foi mencionado, as metrópoles não mereceram maior atenção ou detalhamento no texto constitucional e nem no Estatuto da Cidade, em razão da pesada herança centralizadora que impactava negativamente o debate. No entanto, as forças sociais mobilizadas durante esse ascenso da participação política, especialmente nos anos 1980 e 1990, buscaram abrir caminhos cooperativos nos cotidianos dos governos. Diversas ações que tiveram destaque nesse período assumiram a forma de consórcios – entidades que se organizaram voluntariamente para dar solução a problemas comuns, como a gestão de recursos hídricos, a destinação final de resíduos sólidos, o enfrentamento do desemprego e da evasão industrial, entre muitos temas.
Merece destaque o Consórcio da Região do Grande ABC, que, durante os anos 1990, reuniu sete prefeitos daquela região da metrópole paulista. O consórcio chegou a contar com uma estrutura administrativa relativamente complexa para lidar com temáticas específicas e gerais, e conseguiu, durante uma parte do tempo, incorporar os representantes das entidades sindicais, empresariais, lideranças sociais, além de representantes do governo do Estado (Rolnik & Somekh, 2004). O bem-sucedido Consórcio da Região do Grande ABC parecia não carecer de base legal e institucional, embora a falta de um desenho jurídico claro para esse tipo de colaboração fosse apontada como obstáculo para sua consolidação, e acabou inspirando a aprovação de uma Lei Federal, em 2005, a Lei dos Consórcios Públicos. Quando o debate das Parcerias Público-Privadas (PPP), oriundas do modelo neoliberal, ainda dominava a agenda nacional, foi elaborada por iniciativa da Secretaria de Assuntos Institucionais da Presidência da República, que reunia alguns dos antigos participantes de consórcios públicos, uma lei que logrou ser aprovada no Congresso Nacional com a finalidade de fornecer base jurídica para os consórcios públicos. Mas, a partir de meados de 2005, a agenda da Reforma Urbana e o ativismo político que a acompanhou começaram a perder importância política (Maricato, 2011), e as experiências dos consórcios, embora numerosas, não apresentaram muitos casos que extrapolassem as políticas setoriais (Spink et al., 2009).
Com relação à institucionalização de entidades administrativas metropolitanas, como na maior parte dos casos que são criadas e implementadas o são de cima para baixo, o quadro não é melhor; ao contrário. Após 30 anos da criação das RM, apenas sete apresentam a “existência de estruturas específicas, institucionalizadas e atuantes de gestão metropolitana que estão desenvolvendo algum tipo de políticas públicas” (ibidem, p.463). Em geral, o formato utilizado é o de criar os órgãos: Agência de Desenvolvimento, Fundo Metropolitano e Conselho de Desenvolvimento. As RM que fazem parte desse quadro são: Baixada Santista, Campinas, Recife, Belo Horizonte, Grande Vitória, João Pessoa, além de uma interrompida experiência em Natal. Nenhuma delas apresenta uma satisfatória experiência de integração administrativa, especialmente se considerarmos o tema central de controle sobre o uso e ocupação do solo que está relacionado aos grandes problemas vividos pelas metrópoles: sociais, ambientais, de saneamento, de transportes, de drenagem, de saúde e de segurança.
Governabilidade das metrópoles: a urgência social, econômica e ambiental e sua desimportância política
Christian Lefèvre (2009) chama atenção para o paradoxo constituído pela importância crescente das metrópoles no mundo todo e o seu esvaziamento como território da política, evidenciado pelo fracasso da criação das instituições metropolitanas. Portanto, não se trata de um fenômeno brasileiro, mas mundial, como revela o autor com exemplos de várias partes do mundo, notadamente dos países centrais do capitalismo. A rivalidade dos Estados Nacionais, com a possível importância de autoridades metropolitanas e o prestígio da democracia local ou das comunas são apontados pelo autor como fatores de deslegitimação das metrópoles.
No Brasil, a tradição municipalista de raízes coloniais, recuperada pela Constituição de 1988, reafirmada pelas políticas paroquiais e clientelistas exercidas pelos executivos e legislativos, reforça esse localismo que foi incentivado ainda durante os anos 1990, pelo Banco Mundial e congêneres (Vainer, 2000). Governos estaduais e federal preferem não romper com as políticas paroquiais: em vez da racionalização dos investimentos baseados em planejamento territorial, as negociações de apoio político orientam os recursos a determinados municípios e não a outros. Há programas que priorizam os investimentos em RM como é o caso do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), na área da habitação e do saneamento. Há programas estaduais na área do transporte metropolitano, mas eles permanecem setoriais e obedecem a investimentos esporádicos.
Ao complexo desenho federativo das competências relativas ao desenvolvimento urbano e metropolitano, que implicaria cooperações federal, estaduais e municipais, soma-se a inexistência de fontes perenes de investimento metropolitano. Aí está a impressionante condição dos transportes coletivos desprezados em razão da prioridade dada ao automóvel e às obras viárias (Maricato, 2011).
Outros fatores também contribuem para inviabilizar a cooperação administrativa nas metrópoles. A existência de polos com significativa disparidade econômica, política e cultural também funciona como obstáculo para essa integração, na medida em que municípios com maior arrecadação pouco se interessam pela redistribuição de parte de sua receita. Enfim, essa lista poderia ir longe para mostrar que, apesar da urgência, nenhuma força política que tenha presença importante na cena brasileira está interessada em mudar o rumo das metrópoles. A questão está no limbo.
Notas
1 Dentre os autores brasileiros que figuram no livro organizado por Manuel Castells estão Paul Singer, Fernando Henrique Cardoso, Lucio Kowarick, Cândido Ferreira de Camargo e Milton Santos. Dentre os estrangeiros que alimentaram a controversa está Aníbal Quijano, além do próprio Castells.
2 Ver a respeito o capítulo “Formação e impasse do pensamento crítico sobre a cidade periférica” em Maricato (2011). O texto chama a atenção para o avanço nos estudos e na prática de parcela das prefeituras municipais e também para seu impasse, a partir de meados dos anos 2000.
3 Esse estudo do Ipea, que propõe uma política pública sob o título Política Nacional de Desenvolvimento Urbano, faz parte de uma certa tradição de olhar a rede urbana brasileira. Ele foi sucedido pelo documento do Conselho Nacional de Desenvolvimento Urbano (CNDU), Evolução da Rede Urbana no Brasil 1970-1980 de 1985; pelo trabalho realizado por Ipea-Nesur/Unicamp-IBGE, Tendências e perspectivas da rede urbana do Brasil de 1999; pelo A nova geografia econômica do Brasil: uma proposta de regionalização com base nos polos econômicos e suas áreas de influência, Cedeplar/UFMG, 2000. Em 2004, o MCidades contratou vários estudos com a finalidade elaborar a Política Nacional de Desenvolvimento Urbano (PNDU) e a Política Nacional para Regiões Metropolitanas. Eles estão reunidos em MCidades, 2005 e MCidades/Fase/Observatório das Metrópoles, 2005 (versão digital). Outras edições parciais ou complementadas desse material foram feitas pelo Ministério das Cidades em 2008 (Cunha & Pedreira, 2008) e pelo Observatório das Metrópoles/CNPq (2009) – Luiz Cesar de Queiroz Ribeiro (Org.) Hierarquização e identidade dos espaços urbanos. Rio de Janeiro: Letra Capital, 2009. Ver especialmente o primeiro e o segundo volumes organizados por Rosa Moura e outros e Jean Bitoun e outros. Com a saída de Olívio Dutra do MCidades, a elaboração dessas políticas nacionais – urbana e metropolitana – foi paralisada.
4 Sobre a determinação de centralização dos serviços de saneamento nas mãos de companhias estaduais, ver tese de doutoramento apresentada à FAUUSP (Maricato, 1984). Sobre a pressão governamental, nos anos 1990, para privatização, ver: “A crise do setor de saneamento no Brasil. Oficina de Informações”. Reportagem, edição especial, Osasco, ano 2, n.15, nov. 2000.
5 Ver a respeito pesquisa IBGE/CNTU para período 1995/2002.
6 Uma análise da política urbana institucionalizada pelo governo FHC pode ser encontrada em Maricato (2003). Para um balanço da política urbana e habitacional do período citado, ver Azevedo & Mares Guia (2007).
7 Conforme apresentação “Globalização e território: leitura a partir do Brasil” proferida pela Profa. Tânia Bacelar na Câmara Municipal de São Paulo, em maio 2008.
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Erminia Maricato é professora titular em Planejamento Urbano da USP, membro dos conselhos editoriais das revistas Justice spatiale/ Spatial Justice, Université de Nanterre; Revista Brasileira de Estudos Urbanos e Regionais (Anpur); Cadernos da Metrópole; Observatório das Metrópoles/Educ/Ippur UFRJ; Revista Urbe- PUCPR; e Key Speaker, do Social Architecture Fórum. Ankara, Turquia, 2010. @ – erminia@usp.br
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- FONTE : Estudos Avançados
- versão impressa ISSN 0103-4014
- Estud. av. vol.25 no.71 São Paulo jan./abr. 2011
- http://dx.doi.org/10.1590/S0103-40142011000100002
- EcoDebate, 10/02/2012
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