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sexta-feira, 31 de janeiro de 2020

Os Desmatadores: os 25 maiores destruidores da Amazônia

por Alceu Castilho e Leonardo Fuhrmann para o De Olho nos Ruralistas, em parceria com o The Intercept – 
Bilionários, políticos, paulistas, estrangeiros, reincidentes contumazes: aqui estão os 25 maiores destruidores da Amazônia
O PIOR INIMIGO DO MEIO AMBIENTE É A POBREZA, sentenciou o ministro da Economia, Paulo Guedes, durante uma apresentação no Fórum Econômico Mundial em janeiro. “As pessoas destroem o ambiente porque precisam comer”, ele disse, em Davos, na Suíça. É mentira – e a gente pode provar com números. Durante meses, nos debruçamos sobre 284.235 multas por desmatamento nos últimos 25 anos. E descobrimos que os maiores destruidores do meio ambiente – principalmente da Amazônia – não são os pobres. São algumas das pessoas mais ricas e poderosas do Brasil.
Os 25 maiores desmatadores somaram mais de R$ 50 milhões em multas entre 1995 e 2019. No total, suas centenas de autuações chegam a R$ 3,58 bilhões, praticamente o orçamento do Ministério do Meio Ambiente inteiro para 2020. Corrigido, o valor chegaria a R$ 6,3 bilhões. Sozinhos, os campeões da destruição são responsáveis por quase 10% do total de multas aplicadas por devastação de flora desde 1995 – R$ 34,8 bilhões.
A imensa maioria deles jamais pagou suas multas e acumula outras dívidas com o poder público. Os valores, que são proporcionais à área desmatada, mostram que quem destrói a floresta não são as pessoas pobres, como defende Paulo Guedes, e que o desmatamento não é ‘cultural’, como diz Bolsonaro. A destruição é movida a dinheiro – muito dinheiro – e uma boa dose de impunidade.

DEVO, NÃO PAGO, VOLTO A DESMATAR

Olevantamento, feito a partir das autuações por crimes contra a flora – há outros tipos de multas no Ibama –, abrange dois grandes grupos: as pessoas físicas e jurídicas que participaram de desmatamentos e aquelas que se beneficiaram diretamente de produto vindo de área desmatada, como na compra de madeira sem certificação de origem. A enorme base de dados foi analisada a partir dos infratores que tiveram multas acima de R$ 1 milhão. Somando os valores, chegamos aos maiores multados dos últimos 25 anos.
Na lista, chama a atenção a repetição de nomes. Dos 25 campeões de infrações por desmatamento do país, só um – Agropecuária Vitória Régia – recebeu uma única multa. Os outros 24 foram reincidentes. Uma das empresas que aparecem no ranking, a Cosipar, levou multas em nada menos do que 16 anos diferentes. O valor chega a R$ 156,9 milhões – destes, R$ 155 milhões ainda não foram pagos.

GRILEIROS, BILIONÁRIOS E CONDENADOS

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Ilustração: Amanda Miranda/The Intercept Brasil
No ranking, o campeão das multas é o Incra, o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária, órgão federal responsável pelo assentamento de camponeses. Mas isso não significa que os assentados tenham sido os responsáveis pelo desmatamento: muitos locais onde foram aplicadas as multas já não são, de fato, assentamentos. Eles são focos de grilagem de terras como São Félix do Xingu, no sul do Pará: das 15 multas milionárias recebidas pelo Incra em 2012, 12 foram aplicadas no município, capital da pecuária em terras do governo federal. Como a terra não tem um dono oficial, a culpa recai sobre o órgão federal que detém sua posse.
Em segundo lugar no ranking está a Agropecuária Santa Bárbara Xinguara, empresa dos fundos de investimentos geridos pelo banco Opportunity, de Daniel Dantas. A empresa, comandada pelo ex-cunhado de Dantas, Carlos Rodenburg, acumula multas de mais de R$ 325 milhões.
Em 2009, a AgroSB, como é conhecida, declarava ser dona de mais de 500 mil hectares de terra, onde eram criadas mais de 500 mil cabeças de gado. À justiça, a empresa disse que não cometia desmatamento, mas que adquiriu áreas já degradadas. O argumento foi rejeitado, e a empresa voltou a ser autuada, em valores milionários, em 2010, 2011 e 2017. Não foi o único problema: em 2012, pessoas em condições análogas à escravidão foram resgatadas na fazenda.
Atualmente, a agropecuária tem dez áreas embargadas pelo Ibama para recuperação da vegetação, em Santana do Araguaia, no Pará, e São Félix do Xingu. A maior delas tem mais de 2,3 mil hectares, um território do tamanho de metade da Floresta da Tijuca, na Amazônia. Em nota ao Intercept, a AgroSB atribui diversas multas à uma “perseguição direcionada à companhia” entre 2008 e 2010. Segundo a empresa, essas multas, em sua maioria, “vêm sendo cancelados pela Justiça e pelo órgão ambiental em razão da falta de fundamentos fáticos ou jurídicos”. Segundo AgroSB, o valor das multas canceladas chega a R$ 20 milhões.
Daniel Dantas também tem mais um nome ligado a ele na lista: o fazendeiro Tarley Helvecio Alves, que ocupa a 18ª posição. Alves foi administrador da fazenda Caracol, de propriedade de Verônica Dantas, irmã e sócia de Daniel no banco Opportunity. Com três áreas embargadas em Cumaru do Norte, também no Pará, as multas dele chegam a R$ 70 milhões.
Antonio José Junqueira Vilela Filho, o terceiro da lista, é conhecido no Intercept. Em 2017, contamos como o pecuarista e sua família, frequentadores de colunas sociais em São Paulo, foram denunciados pelo Ministério Público Federal por grilagem de terras e exploração de trabalho escravo na região de Altamira, no Pará.

ENTRE MULTAS E VOTOS

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Ilustração: Amanda Miranda/The Intercept Brasil
Oranking mostra que as multas não são suficientes para frear os crimes ambientais. Preso em 2014 pela Operação Castanheira, realizada pelo Ministério Público Federal e pela Polícia Federal, o fazendeiro Giovany Marcelino Pascoal foi condenado por desmatamento em 2018. Não adiantou: ele voltou a ser multado pelo Ibama em 2019. Pascoal, o segundo maior reincidente da lista, atua na região de Novo Progresso, onde foi organizado em agosto passado o Dia do Fogo, ação de desmatadores em defesa do governo Bolsonaro. Desde 2010, ele aparece oito vezes nas listas daqueles com multas anuais acima de R$ 1 milhão. Ao Intercept, Pascoal disse por telefone que está recorrendo e que algumas multas não são responsabilidade dele, mas não especificou quais.
Outro nome da lista é velho conhecido no rol dos reincidentes em desmatamento na Amazônia. O fazendeiro Laudelino Delio Fernandes Neto, dono da Agropecuária Vitória Régia (a nona no ranking), chegou a ser acusado de ter facilitado a fuga de Vitalmiro Bastos de Moura, o Bida, apontado como mandante do assassinato da missionária católica Dorothy Stang em Anapu, no Pará, em 2005. Ele ainda foi denunciado pelo Ministério Público Federal por desvios de mais de R$ 7 milhões da Sudam, a Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia.
Vice-prefeito de Anapu, eleito em 2008, e candidato a prefeito no município em 2012, Delio Fernandes declarou ao Tribunal Superior Eleitoral possuir R$ 10,2 milhões em bens, sendo R$ 9 milhões relativos a 9 mil hectares em Anapu e Senador José Porfírio. Seu irmão, Silvério Albano Fernandes, foi vice-prefeito de Altamira e teve seu nome especulado para assumir a chefia do Incra na região no governo Bolsonaro, para o qual fez campanha.
Delio Fernandes não é o único político da lista. Entre os 25 maiores desmatadores, há o ex-deputado federal Antonio Dourado Cavalcanti. Deputado entre as décadas de 1950 e 1970, ele era líder do grupo do qual fazia parte a Destilaria Gameleira, com sede em Mato Grosso. A usina condenada por manter mais de mil escravos – o maior resgate de trabalhadores em condições análogas à escravidão dos últimos anos – também está no ranking. Com R$ 69 milhões em multas, ela ocupa a 19ª posição.
Na lista de políticos, o ranking também tem José de Castro Aguiar Filho, atual prefeito de Flora Rica, no oeste paulista, pelo MDB. Suas multas milionárias em São José do Xingu, no Mato Grosso, não o impediram de ganhar as eleições na pequena cidade com quase 80% dos votos válidos.

SIDERÚRGICAS DESTROEM MAIS DO QUE MADEIREIRAS

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Ilustração: Amanda Miranda/The Intercept Brasil
Entre os 25 maiores destruidores, 13 são empresas. Onze delas têm capital aberto, listadas na Bovespa. Se engana quem pensa que madeireiras e carvoarias são as vilãs: as empresas que mais desmatam são, em sua maioria, ligadas à siderurgia e à agropecuária.
Siderúrgicas são listadas porque se beneficiam diretamente da retirada de madeira para o uso do carvão. Para elas, apesar das multas – que geralmente não são pagas –, sai mais barato comprar madeira oriunda de áreas protegidas do que respeitar os devidos ritos legais de proteção ambiental. A Siderúrgica Norte Brasil S/A e a Sidepar ocupam, respectivamente, a terceira e a quarta posições no ranking, e, juntas, acumulam mais de R$ 500 milhões em multas.
O setor agropecuário é representado não apenas pela pecuária, mas também por causa da produção de soja em larga escala. Também é comum que o mesmo empresário tenha uma madeireira e uma empresa de grãos, ou crie gado e, ao mesmo tempo, tenha uma companhia de outro setor – de bancos a empreiteiras.
Duas das empresas listadas têm capital internacional. Uma é a Ibérica, uma sociedade entre empresários bascos. A outra é a Gethal Amazonas Madeiras Compensadas, controlada pelo milionário sueco Johan Eliasch e que tem uma empresa uruguaia entre seus sócios.
A Gethal é a única do setor de madeiras na lista dos 25 – contrariando o senso comum sobre o desmatamento na Amazônia. Assim como só há uma do setor de carvão, matéria-prima das siderúrgicas, a Líder. A constante alteração de nomes e CNPJs das empresas dos dois setores, com sócios em comum, diminui a reincidência em multas ao longo dos anos.

MAIORES DESTRUIDORES, MAIORES CALOTEIROS

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Ilustração: Amanda Miranda/The Intercept Brasil
Aatual legislação ambiental brasileira, que determina as multas, só foi consolidada no fim dos anos 1990. Na década anterior, só há dez autuações por crimes contra a flora nos registros do Ibama. E os valores eram irrisórios: em 1996, por exemplo, foram aplicadas 22 multas de R$ 0,01. O cenário começou a mudar em 1998, com a lei 9.605, de crimes ambientais, que estipulou regras e valores maiores em multas para destruidores da floresta.
Os números mostram que, ao longo das duas décadas de aplicação da lei, ela afetou principalmente grandes desmatadores. De um total de R$ 34 bilhões em multas por destruição de flora entre 1995 e 2000, R$ 25 bilhões (73,5%) foram aplicados a 4,6 mil pessoas físicas e jurídicas que, em pelo menos um ano do período analisado, tiveram infrações somadas acima de R$ 1 milhão.
As sanções, no entanto, não significam que a punição resolve o problema. O Intercept já mostrou que, do total de R$ 75 billhões em multas ambientais já aplicadas desde os anos 1980, só 3,3% foram efetivamente pagos (e o governo tem tomado medidas para receber ainda menos). O valor poderia sustentar o Ministério do Meio Ambiente inteiro por 21 anos.
Os pequenos infratores – que o governo insiste em culpar pela destruição do meio ambiente – são os que mais pagam multas. Já os maiores, responsáveis pela destruição das partes mais extensas da floresta, deixam os processos prescreverem e continuam desmatando.
O Intercept tentou entrar em contato com os 25 listados por meio do número de telefone listado na Receita Federal. Os dois números da Destilaria Gameleira não funcionam. A página cadastral da empresa de Jeovah Lago Silva, Minuano Sementes, não dispõe de meio de contato. Carlos Alberto Mafra Terra foi contatado por telefone e e-mail, sem sucesso. A Líder Ind e Com de Carvão Vegetal LTDA EPP foi contatada por meio de um e-mail no diretório da Receita Federal, mas a mensagem retornou. Paulo Diniz Cabral da Silva foi contatado por e-mail e WhatsApp, mas não houve resposta. Os telefones de José de Castro Aguiar Filho e Tarley Helvecio Alves, listados na Receita Federal, não funcionam.
Veja a lista completa dos 25 desmatadores mais multados entre 1995 e 2020:
1º – Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária – R$ 421 mi
2º – Agropecuária Santa Bárbara – R$ 323 mi
3º – Antonio Jose Junqueira Vilela Filho – R$ 280 mi
4º – Siderúrgica Norte Brasil S/A – R$ 272 mi
5º – Sidepar Siderúrgica do Pará S.A. – R$ 258 mi
6º – Gethal-Amazonas S.A. Indústria de Madeira Compensada – R$ 231 mi
7º – Gusa Nordeste S.A. – R$ 202 mi
8º – Agropecuária Vitória Régia S/A – R$ 170 mi
9º – Companhia Siderúrgica do Pará – COSIPAR – R$ 157 mi
10º – José Alves de Oliveira – R$ 105 mi
11º – José Carlos Ramos Rodrigues – R$ 101 mi
12º – Fernando Luiz Quagliato – R$ 100 mi
13º – Gilmar Texeira – R$ 99 mi
14º – Hamex Comércio de Produtos Alimentícios Ltda – R$ 94 mi
15º – USIMAR – Usina Siderúrgica de Marabá S/A – R$ 88 mi
16º – Siderurgica Iberica S/A – R$ 87 mi
17º – Giovany Marcelino Pascoal – R$ 86 mi
18º – Tarley Helvecio Alves – R$ 70 mi
19º – Destilaria Gameleira Sociedade Anônima – R$ 69 mi
20º – Carlos Alberto Mafra Terra – R$ 66 mi
21º – Jose de Castro Aguiar Filho – R$ 61,8 mi
22º – Lider Ind. e Com. de Carvão Vegetal Ltda EPP – R$ 61,5 mi
23º – Paulo Diniz Cabral da Silva – R$ 61,1 mi
24º – Siderúrgica Alterosa S/A – R$ 60 mi
25º – Jeovah Lago da Silva – R$ 58 mi
(#Envolverde)

Saúde ambiental: coronavírus reflete um desequilíbrio ecossistêmico



Por Sucena Shkrada Resk* – 
Maior parte dos registros de casos, até agora, se concentra na China e em outros países asiáticos
A Organização Mundial da Saúde (OMS) emitiu um alerta mundial sobre a propagação do coronavírus (2019-nCoV) e instituiu um comitê de emergência com renomados cientistas mundiais, desde o dia 22 de janeiro, para avaliar se o surto se tornará uma emergência de saúde pública de interesse internacional. Esta decisão foi confirmada no dia 30 de janeiro. Já há registros oficiais de mais de 7711 casos confirmados e 12167 suspeitos na China. Dos casos confirmados, 1370 são graves e 170 pessoas morreram. Há outras centenas de notificações até agora na Coreia do Sul, Japão, Tailândia,Taiwan, Singapura, Vietnã e Arábia Saudita mas existe a estimativa de que este número esteja crescendo exponencialmente. Os EUA registraram seu primeiro caso, na cidade de Seattle. No Brasil, nove casos suspeitos estão sendo acompanhados. Este surto caracteriza um desequilíbrio ecossistêmico, que demonstra que a saúde ambiental está sendo colapsada pelo ser humano, ao longo dos anos.
Pelo mundo, estão sendo analisados casos suspeitos. Aqui no Brasil, em Belo Horizonte, uma paciente que havia retornado da China, há poucos dias, está sob monitoramento da Secretaria de Estado de Saúde, desde o dia 21. O Ministério da Saúde, de acordo com anúncio feito à imprensa, avalia que o conjunto de sintomas e o local de origem descartam a possibilidade de ela estar com o coronavírus. Entretanto, os exames para confirmar ou descartar a doença serão analisados pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), no Rio de Janeiro. Monitoramentos também estão sendo executados na Austrália, nas Filipinas, em Hong Kong e no México.
Esta doença ainda pouco estudada ocasiona desde resfriados à pneumonia e insuficiência renal e pode ser transmitida também entre humanos, no caso de algumas cepas. Nos casos de contatos dos infectados, o protocolo de saúde define pelo menos 14 dias de observação. É aí que se concentra a preocupação das autoridades sanitárias, tanto que este tipo de aviso de “emergência” só havia sido emitido em anos anteriores, quando ocorreram epidemias de febre ebola, gripe suína H1N1 e zika vírus.
Os principais sintomas são dificuldade de respiração, falta de ar, febre e tosse. Entre 2002 e 2003, houve o registro da Síndrome Respiratória Aguda Grave (Sars) ocasionada também por um tipo de coronavírus, que havia atingido principalmente a China, resultando em cerca de 800 mortes. A sua origem primária, segundo cientistas, foi do gato-de-algália, parente do guaxinim. Outra doença que surgiu foi a Síndrome Respiratória do Oriente Médio (MERS-CoV), que passou de dromedários para humanos.
Segundo pesquisadores, há diferentes cepas do coronavírus e anteriormente as mais conhecidas eram relacionadas à infecção provenientes de animais, como camelos/dromedários e morcegos. Este tipo que atinge humanos exige maior aprofundamento de pesquisa.
Uma das linhas de hipóteses da propagação do surto atual é que a causa esteja concentrada em um mercado de frutos do mar em Wuhan, cidade chinesa a 900 km de Xangai, na qual houve as primeiras notificações a partir de dezembro do ano passado. Por lá, também são comercializados outros tipos de animais. O local, que é considerado o epicentro de transmissão ativa da doença, foi isolado em quarentena pelas autoridades chinesas e seus habitantes também começaram a utilizar máscaras. Os espaços públicos e coletivos foram fechados preventivamente. A segunda cidade isolada é de Huanggang, a 65 km.
Em vários aeroportos e portos do mundo, incluindo os do Brasil, já têm a recomendação de prevenção, segundo protocolos mundiais.
Diante dos riscos de contágios, a OMS acentua a necessidade da realização de lavagem frequente das mãos, principalmente após o contato com pessoas doentes ou com o meio ambiente, como também evitar o contato próximo a animais selvagens e animais doentes em criações e fazendas. Outras medidas preventivas são cobrir a boca e o nariz ao tossir e espirrar e cozinhar bem alimentos como carne e ovos.
Este é mais um desafio de saúde pública mundial, que revela nas últimas décadas, o aumento de surtos, epidemias e pandemias mundiais, que sinalizam um descompasso na saúde ambiental no planeta. E retoma uma discussão importante: precaução e prevenção como premissas básicas em qualquer modelo de governança local, regional e global.
Seguem algumas dicas de sites para consulta sobre o tema coronavírus:
– OMS;
– Ministério da Saúde;
– Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo;
*Atualização em 30/01/2020
*Sucena Shkrada Resk – jornalista, formada há 28 anos, pela PUC-SP, com especializações lato sensu em Meio Ambiente e Sociedade e em Política Internacional, pela FESPSP, e autora do Blog Cidadãos do Mundo – jornalista Sucena Shkrada Resk (https://www.cidadaosdomundo.webnode.com), desde 2007, voltado às áreas de cidadania, socioambientalismo e sustentabilidade.

Cadeia da carne bovina recebeu mais de 123 bilhões de reais de dinheiro público e gera forte impacto ambiental


pecuária na Amazônia

Estudo do Escolhas mostra que, com média anual, 12,3 bi, o valor representa 79% da arrecadação de impostos na cadeia, resultado que aponta a necessidade de discutir a sustentabilidade econômica dos aportes dos Governos Estaduais e Federal
Por Salete Cangussu
A presença dos subsídios no quilo de carne bovina que chegou à mesa do consumidor brasileiro, entre os anos de 2008 e 2017, totalizou a cifra de R$ 123 bilhões de reais nestes dez anos. O percentual dos subsídios por ano, R$ 12,3 bilhões, corresponde a 79% do que foi arrecadado em impostos na cadeia da carne bovina nesse período, R$ 15,1 bilhões. A cadeia produtiva também deixa marcas ambientais: a pegada de carbono é 143 kgCO2e na Amazônia Legal e de 183 kgCO2e nos estados de Tocantins, Maranhão, Piauí e Bahia, nos quais está a região do Matopiba, o que demonstra o impacto do desmatamento, enquanto a média nacional é de 78 quilos de CO2e. A pegada hídrica é de 64 litros de água em cada quilo de carne bovina.
Estes são os principais resultados do estudo “Do pasto ao prato: subsídios e pegada ambiental da carne bovina”, idealizado pelo Instituto Escolhas, que traz à tona o montante de subsídios concedidos para a carne bovina pelos Governos Estaduais e Federal. Para conhecer a pegada ambiental da carne bovina foram analisadas as emissões de gases de efeito estufa, de acordo com a região, o tipo de pastagem e o sistema de manejo, e avaliado o consumo de recursos hídricos em todo país e por tipo de manejo. O trabalho foi lançado nesta quinta (30/01), no seminário de mesmo nome, realizado em parceria com o jornal Folha de S.Paulo.
Ao apresentar, de forma inédita, os impactos econômicos e ambientais na trajetória do produto em todo o Brasil, do nascimento do bezerro até a mesa do consumidor, o estudo permite uma leitura conjunta dos resultados, que provoca algumas reflexões. Como, por exemplo, se o montante de dinheiro público destinado ao setor é aplicado de forma eficiente, se estimula o aumento da produtividade do setor e se os subsídios concedidos influenciam no aumento dos impactos ambientais, como o desmatamento, ou de que forma podem auxiliar na mitigação desses impactos.
O diretor executivo do Instituto Escolhas*, Sergio Leitão, destaca a necessidade de discutir a sustentabilidade do setor. “Os resultados do estudo mostram que o país tem que discutir seriamente a viabilidade de continuar mantendo uma parcela dos produtores brasileiros, que possivelmente se mantem ativos por serem subsidiados pelos governos estaduais e Federal e que não teriam condições de competir em condições normais de mercado em razão da sua ineficiência”.
Com a análise conjunta dos impactos econômicos e ambientais, é necessário avaliar o apoio e aportes dos recursos de forma irrestrita, informa o diretor do Escolhas. Ele ressalta que “diante de tantos recursos para a pecuária, o Governo deveria estabelecer condicionantes ao acesso aos recursos públicos que passem por boas práticas e compromissos para uma produção mais sustentável, que pode levar ao fim do desmatamento no Brasil”
O debate realizado durante o lançamento do estudo na sede do Jornal Folha de S.Paulo contou com a participação do economista Bernard Appy e da senadora Kátia Abreu. Ambos, sob a mediação de Sergio Leitão, analisaram em profundidade os números apresentados pelo trabalho.
Sobre a questão dos subsídios, a senadora do Tocantins lembrou que se trata de uma questão de política pública burilada desde os anos 1970. “As desonerações do setor agropecuário foi uma decisão política lá atrás. Todos os países fazem isso. No caso do Brasil, como mostrou o estudo, estamos até aquém daquilo que a OMC determina. Será que todos os outros países, que subsidiam o setor até mais que o Brasil, estão todos errados?”
Para Appy, diretor do Centro de Cidadania Fiscal, a contribuição do estudo em relação aos cálculos da pegada de carbono do setor da carne é bastante significativa. “Os dados da parte ambiental são muito úteis para o balizamento de futuras políticas públicas. Eles mostram que aumentar a produtividade do setor, por meio do chamado pasto bem manejado, por exemplo, é muito importante”.

Impactos econômicos – Percentual de subsídios ultrapassou os 100% da arrecadação em dois anos

O percentual de subsídios por ano ultrapassou os 100% da arrecadação nos anos de 2015 e 2016, ou seja, no total foram concedidos mais subsídios do que impostos arrecadados na cadeia da carne bovina que somam R$ 15,1 bilhões, média anual na década analisada. As renúncias fiscais dos governos estaduais e Federal totalizam R$ 7,9 bilhões anuais no período de 2008 a 2017 e o aporte do Governo Federal, em forma de subsídios creditícios, subsídios de preços, e anistias concedidos à cadeia no período mencionado, totalizaram anualmente o valor médio de R$ 4,4 bilhões.

Impactos ambientais – Pegada ambiental na Amazônia e Matopiba com números altos mostram impacto do desmatamento

Os resultados da pegada de carbono na Amazônia Legal, de 145 kg C02e refletem o impacto da derrubada de florestas e incorpora as emissões do rebanho e as emissões das áreas desmatadas convertida em pastos nestas regiões no período de 2008 a 2017. Nos estados do Matopiba, a pegada de 183 kg C02e revela o impacto das emissões com a ocupação de áreas do bioma Cerrado, com transformação da vegetação nativa em áreas de pasto. A pegada no restante do país, nas quais não ocorre taxas de desmatamento em grandes proporções, a pegada é de 23 kg C02e. No Brasil, a pegada de carbono média de 78 quilos de CO2e em cada quilo de carne bovina abrange todas as regiões do país. Os números representam as emissões e as remoções em pastos, além de estimadas as emissões ao longo da cadeia logística até o consumidor, as emissões do processamento da carne, os diferentes tipos de pastos e manejos: pastagem extensiva (degradada, estável e bem manejada); sistemas integrados (integração lavoura-pecuária e integração lavoura-pecuária-floresta); e confinamento.
Cada quilo de carne bovina ainda contém 64 litros de água, que representam a pegada hídrica, definida como a quantidade de água doce utilizada de forma direta e indireta por um consumidor ou produto. No cálculo, foram considerados os sistemas produtivos mais representativos associando com dados sobre capacidade e disponibilidade hídricas nas diferentes regiões produtoras.
* O Instituto Escolhas é uma associação civil sem fins econômicos, fundada em agosto de 2015, para qualificar o debate sobre sustentabilidade por meio da tradução numérica dos impactos econômicos, sociais e ambientais das decisões públicas e privadas.

in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 30/01/2020
Cadeia da carne bovina recebeu mais de 123 bilhões de reais de dinheiro público e gera forte impacto ambiental, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 31/01/2020, https://www.ecodebate.com.br/2020/01/31/cadeia-da-carne-bovina-recebeu-mais-de-123-bilhoes-de-reais-de-dinheiro-publico-e-gera-forte-impacto-ambiental/.

Os custos climáticos serão menores se o aquecimento global for limitado a 2 graus Celsius


mudanças climáticas
Indicadores das Mudanças Climáticas

“Para garantir o bem-estar econômico de todas as pessoas nestes tempos de aquecimento global, precisamos equilibrar os custos dos danos causados pelas mudanças climáticas e os de mitigação das mudanças climáticas. Agora nossa equipe encontrou o que devemos buscar”, diz Anders Levermann, do Instituto Potsdam para o Climate Impact Research (PIK) e o LDEO da Columbia University, em Nova York, chefe da equipe que conduz o estudo.
“Fizemos muitos testes minuciosos com nossos computadores. E ficamos surpresos ao descobrir que a limitação do aumento da temperatura global a 2 ° C, conforme acordado no processo científico, mas altamente político, que leva ao Acordo de Paris de 2015, realmente surge. economicamente ideal “.
Potsdam Institute for Climate Impact Research (PIK)*

Em busca do crescimento econômico

Políticas climáticas, como por exemplo a substituição de usinas a carvão por moinhos de vento e energia solar, ou a introdução de preços de CO2, têm alguns custos econômicos. O mesmo vale para danos climáticos. O corte das emissões de gases de efeito estufa reduz claramente os danos, mas até agora as perdas observadas na produção econômica, induzidas pela temperatura, não foram realmente consideradas nos cálculos de caminhos políticos economicamente ideais.
Os pesquisadores agora fizeram exatamente isso. Eles alimentaram pesquisas atualizadas sobre danos econômicos causados pelos efeitos das mudanças climáticas em um dos sistemas de simulação computacional mais renomados, o modelo Dynamic Integrated Climate-Economy, desenvolvido pelo Prêmio Nobel de Economia, William Nordhaus, e usado no passado por Conselho de política dos EUA. A simulação por computador é treinada para buscar o crescimento econômico.
“É notável a robustez razoável do limite de temperatura de mais ou menos 2 ° C, destacando-se em quase todas as curvas de custo que produzimos”, diz Sven Willner, também do PIK e autor do estudo. Os pesquisadores testaram várias incertezas em seu estudo. Por exemplo, eles responderam pela preferência das pessoas pelo consumo hoje, em vez do consumo amanhã versus a noção de que as gerações futuras não deveriam ter menos meios de consumo. O resultado de que o limite de 2 ° C é economicamente mais econômico também foi verdadeiro para toda a gama de possíveis sensibilidades climáticas, portanto, a quantidade de aquecimento resultante de uma duplicação de CO2 na atmosfera.

“O mundo está ficando sem desculpas por não fazer nada”

“Como já aumentamos a temperatura do planeta em mais de um grau, 2 ° C requer ação global rápida e fundamental”, diz Levermann. “Nossa análise é baseada na relação observada entre temperatura e crescimento econômico, mas pode haver outros efeitos que ainda não podemos prever”. Mudanças na resposta das sociedades ao estresse climático – especialmente um surto violento de conflitos de combustão lenta – ou o cruzamento de pontos críticos para elementos críticos do sistema Terra podem mudar a análise de custo-benefício para ações ainda mais urgentes.
“O mundo está ficando sem desculpas para justificar sentar e não fazer nada – todos aqueles que têm dito que a estabilização do clima seria boa, mas é muito cara, podem ver agora que o aquecimento global é realmente não mitigado e muito caro”, conclui Levermann . “Os negócios como de costume claramente não são mais uma opção econômica viável. Nós descarbonizamos nossas economias ou deixamos o aquecimento global aumentar os custos para empresas e sociedades em todo o mundo”.
Referência:
Nicole Glanemann, Sven N. Willner, Anders Levermann (2020): Paris Climate Agreement passes the cost-benefit text. Nature Communications. [DOI 10.1038/s41467-019-13961-1]

* Tradução e edição de Henrique Cortez, EcoDebate.
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 28/01/2020
Os custos climáticos serão menores se o aquecimento global for limitado a 2 graus Celsius, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 31/01/2020, https://www.ecodebate.com.br/2020/01/31/os-custos-climaticos-serao-menores-se-o-aquecimento-global-for-limitado-a-2-graus-celsius/.

Emergência Climática: Crianças devem suportar na saúde os efeitos negativos da mudança climática

Onda de calor na Europa, junho de 2019

Os efeitos sombrios que a mudança climática terá sobre os resultados da saúde pediátrica foram o foco de um artigo do “Viewpoint”, publicado no Journal of Clinical Investigation, por Susan E. Pacheco, MD, especialista no Centro de Ciências da Saúde da Universidade do Texas em Houston ( UTHealth )
Por Wendi Hawthorne * **
Pacheco, professora associada de pediatria da McGovern Medical School da UTHealth, juntamente com professores da Johns Hopkins Medicine e da George Washington University, escreveu uma série de artigos que detalham como o aumento da temperatura devido às mudanças climáticas afetará negativamente a saúde da humanidade. No artigo de autoria de Pacheco, ela mostra os efeitos surpreendentes que a crise tem na saúde das crianças antes mesmo de elas nascerem.
Pacheco aponta para uma pesquisa publicada pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas , que destaca várias maneiras pelas quais os seres humanos experimentam efeitos adversos à saúde decorrentes das mudanças climáticas, como aumento da mortalidade e morbidade devido a ondas de calor e incêndios, aumento do risco de doenças transmitidas por alimentos e pela água e desnutrição devido à escassez de alimentos.
Essas experiências negativas trazem consigo traumas psicológicos e problemas de saúde mental que podem afetar as crianças e seus cuidadores. Pacheco escreveu que, depois do furacão Maria em 2017, muitos adultos em Porto Rico experimentaram transtorno de estresse pós-traumático, depressão e ansiedade por semanas e meses sem acesso a itens como água potável, eletricidade e cuidados médicos básicos.
“Alguns não foram capazes de atender às demandas físicas e emocionais que esse desastre impôs a seus filhos”, escreveu Pacheco.
Os efeitos negativos à saúde infligidos pela crise climática podem começar enquanto a criança ainda está no útero, devido ao estresse materno, má nutrição, exposição à poluição do ar e exposição a eventos climáticos extremos causados pelas mudanças climáticas. Estudos de mulheres que sofreram grandes eventos de inundação durante a gravidez relataram uma associação com resultados como parto prematuro e baixo peso ao nascer. Pacheco escreveu que as mulheres grávidas expostas às mudanças climáticas sofrem de estresse, doenças respiratórias, má nutrição, aumento de infecções, doenças associadas ao calor e pobreza.
“Continuaremos a ver um aumento nas condições associadas ao calor em crianças, como asma, doença de Lyme, bem como um aumento nos defeitos cardíacos congênitos “, disse Pacheco.
Pacheco escreveu que o quadro pintado por pesquisas sobre mudanças climáticas é assustador e agora não é hora de indiferença. Na conclusão do artigo, ela escreveu que todos na comunidade médica devem refletir em nível pessoal sobre o que pode ser feito com o conhecimento que têm sobre as mudanças climáticas e seus efeitos negativos à saúde.
Referência:
Catastrophic effects of climate change on children’s health start before birth
Susan E. Pacheco
Published January 13, 2020
J Clin Invest. 2020. https://doi.org/10.1172/JCI135005.

* Com informações da University of Texas, Health Science Center at Houston (UTHealth)
** Tradução e edição de Henrique Cortez, EcoDebate.
in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 28/01/2020
Emergência Climática: Crianças devem suportar na saúde os efeitos negativos da mudança climática, in EcoDebate, ISSN 2446-9394, 31/01/2020, https://www.ecodebate.com.br/2020/01/31/emergencia-climatica-criancas-devem-suportar-na-saude-os-efeitos-negativos-da-mudanca-climatica/.

quinta-feira, 30 de janeiro de 2020

Nova espécie de peixe elétrico descoberto na Amazônia dá o maior choque entre os animais

Da Redação – Inpa e Fapesp – Fotos: Raphäel Covain, Leonardo Sousa e Douglas Bastos – 
Por quase dois séculos e meio acreditou-se existir apenas uma espécie de poraquê, Electrophorus electricus, mas uma nova pesquisa revelou que há pelo menos três espécies distintas na Amazônia. Como novidade, uma das duas novas espécies, Electrophorus voltai, emite a maior descarga elétrica do reino animal, chegando a 860 volts e superando o recorde anterior de 650 volts do E. electricus. O estudo foi publicado na revista Nature Communicationscontou com contribuição de pesquisadores do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa/MCTIC).
Os peixes elétricos integram um grupo de 256 espécies que produzem naturalmente a eletricidade e a utilizam para se comunicar, orientar-se durante a locomoção e para detectar presas e predadores. Conhecido por ser o único desses peixes com potencial de produzir altas descargas elétricas para defesa e caça, o poraquê pode alcançar mais de dois metros de comprimento e 20 quilos. É típico da região amazônica e foi considerado por muito tempo como uma única espécie, amplamente distribuída por diversos tipos de ambientes aquáticos.
1B Carlos David de Santana Electrophorus electricus Wonotobo 9 Picture by R. Covain 1
“Por ser um peixe muito característico, ninguém nunca havia prestado atenção para verificar se de fato era uma única espécie, ou se haviam outras envolvidas”, conta o pesquisador do Inpa especialista em peixes amazônicos, Jansen Zuanon.
A definição das espécies foi feita a partir de um grande conjunto de dados incluindo DNA, morfologia externa, detalhes do esqueleto e distribuição geográfica dos animais, que resultaram na identificação de três linhagens principais que se diferenciaram nos períodos Mioceno e Plioceno (entre 3 e 7 milhões de anos atrás).
O primeiro autor do artigo é o brasileiro Carlos David Santana, pesquisador associado do Museu Nacional de História Natural do Instituto Smithsonian (EUA). Do Inpa, além de Jansen, também assinam o trabalho o técnico Renildo de Oliveira e o estudante de doutorado Douglas Bastos.
Para Bastos, estudos como esses são importantes para mostrar que se conhece muito pouco sobre a diversidade e biologia de peixes amazônicos. Ele lembra que mesmo uma espécie tão comum e fácil identificação, como o poraquê, ficou 250 anos “escondida”. Os poraquês que estão no Bosque da Ciência, área de visitação pública do Inpa, e à vista de todo mundo, por exemplo, pertencem à espécie nova E. varii.
“Isso é um sinal que temos muito trabalho pela frente, tanto na descoberta de novas espécies de peixes elétricos, como no entendimento de aspectos biológicos e comportamentais dos peixes elétricos”, disse Bastos, que é engenheiro de pesca, com doutorado em andamento sobre a História Natural do Poraquê, no Programa de Pós-Graduação em Biologia de Água Doce e Pesca Interior do Inpa.
Electrophorus voltai
Presente em rios que geralmente drenam o escudo brasileiro (nos estados do Pará, Amazonas e Amapá), essa espécie de poraquê habita uma região caracterizada por altitude acima dos 300 metros, cercada de córregos, cachoeiras e rios com substratos rochosos de águas claras e bem oxigenadas.
Electrophorus voltai produz a maior descarga elétrica conhecida entre os animais, com 860 volts. Por viver em sistemas aquáticos com pouca quantidade de sais dissolvidos e baixa condutividade elétrica, os pesquisadores supõem que essa forte descarga seja uma adaptação para conseguir atordoar suas presas nesse tipo de ambiente.
O nome da espécie é uma homenagem ao físico italiano Alessandro Volta, que inventou a bateria elétrica em 1799, baseando seu design no poraquê.

Electrophorus varii
Diferentemente da espécie anterior, Electophorus varii ocorre em grande parte das terras baixas, tanto nas várzeas de grandes rios de águas barrentas quanto em igarapés de terra firme da Bacia Amazônica. Esta espécie recebeu o nome do zoólogo Richard P. Vari, pesquisador do Smithsonian e parceiro de trabalho de pesquisadores do Inpa, que faleceu em 2016. Electrophorus varii é a espécie com a descarga elétrica mais fraca entre as três espécies de poraquês, variando de 151 a 572 volts.
3B Carlos David de Santana Electrophorus varii Rio Negro 1 Picture by D. Bastos
Electrophorus electricus
Descrito em 1766 pelo naturalista sueco Carl Linnaeus, o poraquê Electrophorus electricus habita rios e riachos da porção norte da Amazônia, numa região conhecida como Escudo das Guianas, abrangendo três estados brasileiros (Amapá, Amazonas e Roraima) e Guiana, Guiana Francesa e Suriname.
Alta descarga
Em uma entrevista para a Agência Fapesp, o pesquisador do National Museumof Natural History da Smithsonian Institution, Carlos David de Santana, explica que a descarga é de alta tensão, mas a amperagem é baixa, aproximadamente um ampere, não sendo necessariamente perigosa a humanos se comparada ao choque de uma tomada elétrica com 20 amperes. “O choque atordoa a vítima. É suficientemente forte para ajudar os peixes a capturar presas ou assustar um predador”, disse Santana.
Os poraquês emitem corrente em pulsos, esgotando a sua energia após algumas descargas e levando algum tempo para recarregar. Antes do artigo publicado, achava-se que a espécie tinha hábitos solitários, mas foi verificado que em caso de ameaça eles podem se juntar em grupos caso se sintam ameaçados ou queiram capturar presas.
O poraquê sempre foi muito popular na comunidade científica, justamente pela sua capacidade de gerar energia elétrica. “O conceito de eletricidade surgiu em função desses organismos e o poraquê teve um papel histórico muito importante para descoberta de eletricidade”, conta Zuanon. O estudo da capacidade do poraquê de gerar energia elétrica inspirou o físico italiano Alessandro Volta a desenvolver a primeira bateria elétrica (pilha), e as descobertas feitas a partir dos estudos da fisiologia desse peixe resultaram na descoberta de uma fonte de uma substância chamada acetilcolinesterase, que tem sido usada para tratar doenças neurodegenerativas.
Novidade na classificação de espécies
As descobertas de novas espécies no mundo científico partem da análise de características físicas (morfologia), genéticas e ecológicas. Nunca antes havia sido usado como principal critério na classificação de espécies a voltagem. “Usamos a tensão como o principal critério de diferenciação. Isso nunca antes foi feito antes para identificar uma nova espécie”, disse Menezes em entrevista para a Agência Fapesp.