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terça-feira, 29 de novembro de 2011

Quem quer dividir os impactos do crime ambiental da Chevron, no Rio de Janeiro? artigo de Debora Rodrigues Barbosa e Frank Gundim Silva

Hoje, os principais meios de comunicação, a sociedade, acadêmicos, pesquisadores e políticos estão discutindo a grande polêmica de distribuição dos royalties oriundos da atividade petrolífera.A distribuição das participações governamentais decorrentes da exploração, desenvolvimento e produção do petróleo e do gás natural está prevista na Lei n° 9.478, de 6 de agosto de 1997. Esta lei especifica que todos os concessionários que extraem petróleo em território nacional devem recolher 10% de imposto sobre o valor bruto da produção – os chamados royalties do petróleo.
Esses recursos são destinados às regiões produtoras (Estados e Municípios), como também, à União, com intuito dos beneficiados se apropriarem de parte dos ganhos da exploração de petróleo e, em contrapartida, serve também que essa receita subsidie a melhoria das condições socioeconômicas – ambientais para as futuras gerações e as mesmas sejam compensadas pela ausência do recurso natural explorado.
A legislação estabelece as empresas do setor petrolífero paguem diferentes participações governamentais (bônus de assinatura, royalties, participação especial e pagamento pela ocupação ou retenção de área) às áreas com exploração de petróleo. Mas definitivamente, o que encontrou na pauta, de até mesmo nas “rodas de bar” é quem deve ficar com o montante dos royalties.
De acordo com a própria Agência Nacional do Petróleo (ANP) abe ao Tesouro Nacional redistribuir parte desse capital aos Estados e Municípios pela exploração deste produto em seus territórios.
Há quase um ano, a Câmara dos Deputados votou a proposta de Pedro Simon (PMDB-RS) que fazia redistribuição dos royalties de petróleo. Segundo a idéia do senador, toda a parte dos produtores deveria ser rateada de acordo com os critérios dos fundos de participação. Somente o estado e o município do Rio de Janeiro perderiam por ano R$ 7 bilhões.
Certamente que todos os municípios precisam receber percentuais da quantia total produzida por essa importante riqueza nacional. É fundamental que se discuta uma maneira justa de se trabalhar a questão. Mas também, existem críticos que defendem a seguinte tese: da mesma forma que o projeto propõe a redistribuição dos valores repassados dos royalties para todos os entes da federação, da mesma forma deveria ser feito a qualquer atividade econômica que gera riqueza no país, como a exploração de minérios de ferro.
O grande problema é que os Estados produtores são aqueles que mais sofrem os resultados dos malefícios da atividade petrolífera. Os impactos são de ordem econômica, social e ambiental. Atualmente, Macaé e Rio das Ostras são dois exemplos do crescimento desordenado em volta da exploração do dito “ouro negro” e sua população tem sofrido com as mazelas da expansão das favelas, das enchentes, da violência e das inúmeras demandas sociais.
E há outros problemas que até agora ninguém se apresentou para dividir: os passivos ambientais. A atividade petrolífera na costa está sempre associada aos riscos de acidentes e derramamentos de óleo que podem resultar em impactos ambientais sobre ecossistemas marinhos e terrestres. Não devemos nos esquecer dos prejuízos às atividades pesqueiras e turísticas, bem como a possiblidade de pressão sobre o ambiente natural e sobre outros recursos naturais.
E agora mais uma! A Chevron pode ser multada em mais de cinquenta milhões de reais por causa de vazamento de óleo em fissuras geológicas submarinas (podendo chegar a cem milhões). O petróleo derramado já está em contato direito com uma porção rica em biodiversidade, como algas, plantas e micro-organismos que são base da cadeia alimentar marinha.
Cinquenta milhões pagará por esse impacto ambiental? E quem quer dividir esse pesado fardo ambiental? Todos querem os bônus advindos do petróleo, mas os ônus: deixa para as áreas produtoras resolverem… Os resultados da atividade petrolífera nas costas atlânticas causam prejuízos que vão além dos impactos econômicos. A qualidade de vida dos brasileiros poderá ser comprometida! Mas, ninguém quer dividir esse prejuízo!

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Debora Rodrigues Barbosa e Frank Gundim Silva
Professores de Geografia da Universidade Gama Filho

EcoDebate, 29/11/2011

O Enfraquecimento das frentes frias, artigo de Roberto Naime

O sul do Brasil sempre teve a sensação de calor e abafamento atenuadas pela presença de frentes frias, de origem polar ou geradas no sul da Argentina. Estas frentes frias ao atingirem o sul do país ao se deslocarem em direção ao Equador encontram massas de umidade na atmosfera e se transformam em chuvas. Este fenômeno em geral atenua muito a sensação de calor.
As frentes frias continuam existindo, mas tem tido comportamento bastante alterado. As frentes frias não sofreram alterações de intensidade, mas tem sofrido muita dissipação em direção ao oceano Atlântico ou passado mais rapidamente que antes e não tem gerado as mesmas precipitações pluviométricas que traziam atenuação à sensação de calor e abafamento.
Muitas destas frentes frias passam rapidamente pelo sul do Brasil, mas estacionam e provocam maiores precipitações na região sudeste. Sabemos que isto tem relação com a inconsistência dos padrões climáticos, mas ainda não são conhecidos exatamente todos os fatores intervenientes e o modo com que ocorrem as ações.
Uma das hipóteses encontradas em trabalhos científicos na área, considera a hipótese de que por outro motivo desconhecido, ventos originados no oceano Pacífico estejam atingindo estas frentes frias e levando as mesmas para dissipação no oceano Atlântico ou transportando estas massas de ar frio mais rápido para o sudeste do Brasil onde são responsáveis pela maior precipitação pluviométrica principalmente nos meses quentes.
A hipótese do aquecimento gradual da terra estimulado pelo chamado efeito estufa que consiste na formação de uma camada de gases na atmosfera que não permite a saída das radiações eletromagnéticas de elevado comprimento de onda e baixa freqüência não pode ser responsabilizado por diferenças na sensação de calor e abafamento que sentimos, pois é um fenômeno recente e ainda não foi responsável por alterações em médias de temperatura que fosse superiores a 1 ou 2 graus nos últimos 50 anos.
Mas o aquecimento gradual da terra quando combinado com fatores naturais gera uma inconsistência nos padrões climatológicos cujas conseqüências não podem ainda ser bem determinadas. O certo é que não tem havido repetição previsível dos cenários históricos mensurados pela climatologia.
A sensação gerada pelo aquecimento global e suas inconstâncias climáticas tem sido responsável por madrugadas mais quentes no sul do Brasil e aquecimento mais rápido durante as manhãs. No mais ainda não existem estudos sistemáticos para relacionar a sensação de calor e aquecimento com as inconsistências climáticas geradas por alterações nos processos intempéricos geradas pela acumulação de gases de efeito estufa ou fenômenos geológicos naturais.
Regiões do globo terrestre de clima mais ameno tendem a sentir mais as alterações provocadas pelas inconsistências climáticas porque o regime mais equilibrado é mais sensível e mais vulnerável às alterações quando estas ocorrem. O clima mais equilibrado é mais sensível às alterações que ocorrem.
As observações das temperaturas mínimas e máximas dos meses mais quentes no sul do Brasil tem encontrado variações da ordem de 1 ou 2 graus acima nas médias em no máximo 20% das observações anuais nos últimos 20 anos. E nas temperaturas médias dos dias, a oscilação positiva em geral é inferior a 0,5 grau.
Por tudo isto que se diz que o calor pode ser muito forte, as inconsistências climáticas muito relevantes, mas quer seja aquecimento global, quer seja resfriamento natural como alguns defendem ou mesmo conseqüência das acumulações de gases de efeito estufa na atmosfera, o certo é que as alterações nas médias de temperaturas registradas nos termômetros ainda não são suficientes para diagnosticar inequivocamente as alterações.
Aparentemente um eventual controle pluviométrico pode ser mais revelador que o controle de temperaturas médias. Existem regiões que são sujeitas a maiores precipitações pluviométricas de forma inequívoca e outras que sofrem períodos ainda que cíclicos de seca. Existem municípios ou regiões com precipitações pluviométricas pouco acima do normal e municípios ou regiões com chuvas ou pouco abaixo do normal.
Sobre as precipitações pluviométricas as interpretações ainda são mais discutíveis e sujeitas a dissenso entre os especialistas em climatologia ou demais técnicos de áreas vinculadas. O “El Niño” ou “La Niña” tem grandes influências nesta equação também e em vez de simplificarem as interpretações, tornam ainda mais intrincados e complexos os diagnósticos.
O derretimento de geleiras também parece um fato inequívoco, mas também é sujeito a um grande e complicado conjunto de interpretações, que vão desde o aquecimento em si, até fatores de tamponamento relacionados com as quantidades de dióxido de carbono, que podem estar relacionados com poluição antrópica ou emissão de gases por vulcões em processos geológicos ou naturais.
As inconsistências nos padrões climáticos são muito grandes e ainda incompreensíveis mesmo. Existem hipóteses para explicar um fenômeno aqui ou uma ação diferente ali, mas ainda não há compreensão holística da fenomenologia.

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Dr. Roberto Naime, colunista do EcoDebate, é Doutor em Geologia Ambiental. Integrante do corpo Docente do Mestrado e Doutorado em Qualidade Ambiental da Universidade Feevale.
EcoDebate, 29/11/2011.

segunda-feira, 28 de novembro de 2011

Que fazer com o clima no patrimônio histórico? artigo de Washington Novaes

Nesta semana, está se realizando em Sintra, Portugal, promovido pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), o Congresso Mundial da Organização das Cidades Patrimônio Mundial – no qual está presente o autor destas linhas. O tema central é o dos problemas que as cidades históricas vêm sofrendo com as mudanças climáticas no mundo – e como enfrentá-los.Nas últimas semanas, por exemplo, a maior parte da cidade de Bangcoc, na Tailândia, teve quase toda a sua área ocupada pela água de chuvas e inundações. E ali se encontra um patrimônio histórico e artístico muito valioso, a começar pelo Templo do Buda de Esmeralda – trata-se, de fato, de um conjunto de templos que formam uma espiral que termina no monumento central, um templo com paredes forradas de pedras preciosas, piso de fios de prata e, ao centro, um Buda de metro e meio de altura, na verdade, uma peça inteiriça de jade. Também está ameaçado o Templo do Buda de Ouro, outra peça enorme, toda em metal precioso. Ou o Palácio Real, uma joia arquitetônica – entre outras peças.
Não é preciso aqui insistir em informações sobre mudanças do clima e suas consequências, já expostas em vários artigos neste espaço. Basta relembrar que os “desastres climáticos” têm aumentado de ano para ano e o Brasil já é um dos países com mais eventos dessa natureza e vítimas. Ou a informação de que as emissões de poluentes que se concentram na atmosfera e intensificam mudanças aumentaram 6% em 2010 e chegaram a mais de 30 bilhões de toneladas anuais (cientistas dizem que, se passarem de 32 bilhões de toneladas, não será possível conter o aumento da temperatura da Terra em 2 graus Celsius – limite além do qual as mudanças serão muito mais fortes do que já são).
Nosso país não escapa ao problema em muitas de suas cidades históricas, comprometendo patrimônios seculares, como é o caso de São Luís do Paraitinga (SP), ou da cidade de Goiás, antiga capital do Estado, ou das cidades serranas do Rio de Janeiro, para citar apenas algumas, onde está boa parte do patrimônio do Brasil colônia ou do Brasil Império. Em todas elas, chuvas intensas extravasaram de rios assoreados por causa do desmatamento em suas bordas e da erosão – além de terem suas margens, planícies naturais de inundação, tomadas por ocupações humanas de alto risco. Mas não é só: o próprio volume e o peso de chuvas torrenciais sobre construções antigas e frágeis são uma grave questão. Ou a impermeabilização de solos urbanos e a formação de correntes de água para lugares que deveriam ser preservados.
Obviamente, o primeiro caminho é recompor o leito dos rios, desassoreá-los, para que possam suportar maior volume de água sem atingir as construções históricas. Isso exigirá também recompor a vegetação em suas margens, para que chegue menos água aos rios. Construir muretas de proteção onde for possível e necessário. Impedir a impermeabilização do solo ao redor dos monumentos.
Mas os problemas não terminam aí. Como reforçar construções antigas – muitas de adobe ou taipa – sem desvirtuá-las com a presença de outros materiais? Como fazer isso sem comprometer a temperatura ambiente, a aeração? Como pode o poder público trabalhar em patrimônios particulares e ali aplicar recursos? Como enfrentar a divisão de áreas entre muitos herdeiros, alguns deles desejosos de negociar a sua parte? Mais complicado ainda, como fazer em lugares (como cidades do barroco mineiro) onde o patrimônio histórico está ao ar livre? Prover coberturas, se isso pode desvirtuar a visão e a paisagem? Providenciar réplicas, moldes em cera, para o caso de os eventos os danificarem gravemente?
Há situações em que até providências de socorro podem ser muito complicadas – e não apenas no caso de chuvas. Numa cidade histórica goiana, Pirenópolis, por exemplo, que é do século 18, um acúmulo de problemas levou a um incêndio numa igreja de construção única, ornamentação também singular, que começou pela nave central. Bombeiros e especialistas do patrimônio histórico chegaram, juntos, quando o fogo já tomava bancos e altares. Bombeiros queriam não apenas combater o problema na nave central, mas resfriar as paredes, para que não fossem atingidas – mas os jatos de água poderiam comprometer não apenas a pintura histórica, como ameaçar a própria construção, muito frágil. Foi difícil um acordo – mas se preservou o patrimônio. Na cidade de Goiás, pouco tempo depois de reconhecida como patrimônio da humanidade, uma enchente nas cabeceiras do Rio Vermelho – desmatadas – chegou ao centro histórico e atingiu até a casa de Cora Coralina. Exatamente porque as recomendações sobre o que se deveria fazer na bacia não foram seguidas.
Outro problema está na formação de pessoas com conhecimentos para os trabalhos necessários, na prevenção a na reparação. Que saibam escolher os materiais – tintas, cal, telhas, vidros, entre outros – adequados. O Instituto Federal de Goiás tem cursos técnicos profissionalizantes que formam pessoas capazes de reproduzir elementos construtivos adequados. O Ministério da Cultura já tem restauradores capacitados.
Há um lugar importante que cabe à comunicação. Não apenas tratando adequadamente da questão do clima, mas alertando previamente para situações de risco, seja para os monumentos históricos, seja para as pessoas – como a ocupação de topos de morros, encostas, áreas de inundação natural, desmatamentos que podem comprometer os cursos d’água e provocar situações indesejáveis.
Há muito a ser feito. Importante é ter consciência dos problemas. Agir com rapidez nos momentos críticos. Dotar de pessoas e recursos os órgãos capazes de cuidar do patrimônio histórico – que é da humanidade e, aqui, da sociedade brasileira. E, principalmente, atuar preventivamente, minimizar a possibilidade de danos.

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FONTE : Washington Novaes, jornalista. Artigo originalmente publicado em O Estado de S.Paulo. EcoDebate, 28/11/2011.

Países desenvolvidos começaram a recuperar florestas no século 18, diz pesquisador da USP

Pesquisador da USP afirma que nas nações desenvolvidas não há dicotomia entre preservação e desenvolvimento e que discussão do Código Florestal brasileiro está equivocadaPesquisador do Instituto de Pesquisas Econômicas da Universidade de São Paulo (IPE- USP), Thiago Fonseca Morello é autor do paper Desmatamento e Desenvolvimento: O Que o Brasil Tem a Aprender com a História dos Países Desenvolvidos? Nele, mostra que os países hoje considerados desenvolvidos iniciaram a recuperação de áreas florestadas entre os séculos 18 e 20. Morello afirma que a discussão sobre o Código Florestal brasileiro está equivocada porque não há dicotomia entre desenvolvimento e conservação. Ele falou ao Estado. Entrevista de Karina Ninni, em O Estado de S. Paulo.
1- O que é transição florestal e como esse conceito pode jogar uma luz sobre as discussões acerca do aparente dilema entre desenvolvimento e conservação de recursos?
Transição Florestal é um conceito da geografia e diz respeito ao aumento de “agregados florestais”, ou seja, de áreas de floresta, genericamente falando. Embora seja um conceito que nos serve de parâmetro para entender a recuperação de áreas de floresta no mundo, tem suas limitações, pois os agregados florestais não representam a biodiversidade de uma região, ou país. Ou seja: o conceito permite saber se as áreas de floresta em determinado local aumentaram ou diminuíram, mas não se a cobertura vegetal recuperada tem a mesma riqueza ou biodiversidade daquela que se perdeu.
2 – O que se pode deduzir analisando dados sobre a transição florestal em países desenvolvidos?
As florestas sempre foram fruto da interação com o homem. Essa interação pode ser positiva ou negativa, como bem cedo perceberam os países desenvolvidos, porque acabaram usando as florestas intensivamente, sobretudo na época do capitalismo mercantil e na chamada primeira revolução industrial. Um caso emblemático é a Inglaterra, onde a revolução aconteceu em primeiro lugar. No século 15 eles já estavam preocupados com a perda de florestas. Passaram pela chamada Crise da Madeira ainda no século 17, quando os preços subiram muito. A revolução industrial só aconteceu lá porque eles conseguiram dar um salto tecnológico no sentido de se tornarem auto-suficientes no suprimento de matéria-prima, o que incluía a madeira. A indústria do aço dependia do carvão vegetal. Até que desenvolvessem tecnologia suficiente para usar o carvão mineral, passou-se um século. Eles não tinham um modelo eficaz de gestão florestal e, ao mesmo tempo em que buscavam novas tecnologias, começaram a construir um modelo para gerir racionalmente seus recursos florestais. Em praticamente todos os países desenvolvidos houve queda na produção de madeira. A própria Inglaterra importou da Suíça por muito tempo. Os países hoje chamados de desenvolvidos tiveram de lidar muito cedo com a questão florestal. E fizeram isso.
3 – Quem foram os primeiros?
A França, que começou seu reflorestamento em 1830. A Escócia, em 1730, e a Grã Bretanha, em meados do século 19, e pelos EUA, em 1920.
4 – Quer dizer que o discurso de que esses países se desenvolveram à custa do desmatamento não é correto?
Isso só vale para a chamada primeira revolução industrial – intensiva em uso de recursos – e para o período imediatamente anterior a ela, de capitalismo mercantil. Ou seja: para o período de transição entre o capitalismo mercantil e o industrial. A segunda revolução industrial já estava baseada em ciência e em seu uso prático – a descoberta de novas tecnologias. O Brasil, é bom lembrar, se industrializou em uma fase posterior, em que a tecnologia já era a sustentação da produção industrial.
5 – Mas, mesmo assim, usamos intensivamente nossos recursos, não?
Sim, usamos. Porque, apesar de nossa indústria ter sido montada sobre a premissa do uso de modernas tecnologias, no campo e na floresta não aconteceu o mesmo. Isso é uma característica dos países subdesenvolvidos: a tensão entre a produção não intensiva em uso de recursos e aquela que os utiliza em larga escala.
6 – E como isso influencia discussões como a do Código Florestal, por exemplo?
Resulta que nós temos uma visão equivocada do que foi a história desses países, no tocante a sua autonomia econômica. Ela não teve necessariamente como condição a supressão das florestas. Quando se fala em desenvolvimento, o que vem na cabeça das pessoas é o que foi feito no século 20. Quando o assunto é agricultura também. Agora, quando se fala em floresta, as pessoas lembram da época medieval. Temos de conectar as duas coisas: desenvolvimento e conservação. Mas, para isso, o referencial tem de ser o mesmo. Portanto, se considerarmos a silvicultura do século 20, ao invés de nos voltarmos para a idade média e o início da revolução industrial, não há dilema entre produção e conservação. É isso que tinha de estar em pauta no Código Florestal. Precisamos otimizar o uso dos recursos. O que temos de resolver no Brasil é a baixa produtividade, tanto da agricultura e da pecuária quanto da silvicultura de espécies nativas.
7 – Além do uso indiscriminado de madeira e outros recursos, algo mais movem a transição florestal na Europa?
Há diferenças de país para país. Na suíça, por exemplo, foram deslizamentos de terra que levaram a adoção de uma política florestal.

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EcoDebate, 28/11/2011

domingo, 27 de novembro de 2011

79% dos brasileiros não querem novas usinas nucleares

A rejeição da opinião pública global ao uso de energia atômica aumentou após o acidente com a usina nuclear de Fukushima, no Japão, segundo indica pesquisa encomendada pela BBC.
Na média geral entre os 12 países que já têm usinas nucleares ativas – Brasil incluído –, 69% dos entrevistados rejeitam a construção de novas usinas, enquanto 22% defendem novas estações. No Brasil, 79% dos entrevistados dizem se opor à construção de novas usinas.
Esses 79% incluem pessoas que acham que o Brasil deve usar as usinas nucleares que já tem, mas não construir estações novas (44%), e pessoas que acham que, como a energia atômica é perigosa, todas as usinas nucleares operantes devem ser fechadas o mais rápido possível.
Apenas 16% dos entrevistados brasileiros acham que a energia nuclear é relativamente segura e uma importante fonte de eletricidade e que, portanto, novas usinas devem ser construídas.
A pesquisa, em 23 países, indica que após o acidente de Fukushima, em março, aumentou a oposição à energia nuclear, tanto em países que a promovem ativamente, como Rússia e França, como em países que ainda planejam a construção de usinas.
Em comparação com resultados de 2005, o levantamento “sugere que houve um elevado aumento na oposição à energia nuclear” em parte dos países, enquanto cresce a defesa da economia de energia e o uso de fontes renováveis em vez da energia nuclear.
Rejeição e apoio
As maiores rejeições à ampliação do uso da energia atômica são observadas na França, no Japão, no Brasil, na Alemanha, no México e na Rússia.
Em contrapartida, em países como China, Estados Unidos e Grã-Bretanha, ainda é representativa a quantidade de pessoas que consideram a energia nuclear segura – 42%, 39% e 37%, respectivamente.
“A falta de impacto que o desastre nuclear de Fukushima teve na opinião pública nos EUA e na Grã-Bretanha é digna de nota e contrasta com a crescente oposição às usinas nucleares novas na maioria dos países que acompanhamos desde 2005″, declarou o presidente da empresa de pesquisas GlobeScan, Doug Miller.
“O maior impacto foi observado na Alemanha, onde a nova política do governo (de Angela) Merkel, de fechar todas as estações de energia nuclear, é apoiada por 52% dos entrevistados”, disse.
A visão alemã reflete a opinião pública do resto da Europa, continente em que “a maioria dos países pesquisados tem uma visão negativa com relação ao uso de energia atômica para gerar eletricidade”.
Realizado pela GlobeScan a pedido da BBC, o levantamento ouviu 23,2 mil pessoas em 23 países (12 deles já operando usinas nucleares), entre junho e setembro. A margem de erro é de 3,1 a 4,4 pontos percentuais.
Este foi o primeiro ano em que o Brasil participou da pesquisa.

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quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Mudança climática já elevou a temperatura média em 1ºC nos últimos 50 anos

A mudança climática começa a tomar corpo: o aumento de cerca de um ºC na temperatura média nos últimos 50 anos pode ser atribuído com uma certeza de 90% a 100% à atividade humana que acarreta o aquecimento global, segundo os especialistas em mudança climática da ONU. É o que revela o informe apresentado em Uganda, e que retrata a incidência do aumento de dióxido de carbono (CO2) na atmosfera. Os cientistas estão há vários anos advertindo sobre os efeitos, mas o documento estima, pela primeira vez, com várias porcentagens de probabilidade, o impacto do aquecimento global que está tornando os fenômenos climáticos cada vez mais extremos. Reportagem de Ferran Balsells, El País.
“Pode-se afirmar com um alto grau de certeza que as temperaturas máximas e mínimas crescem devido ao aumento dos gases de efeito estufa”, advertiu Qin Dahe, um dos responsáveis pelo informe. O IPCC prevê, além disso, que a mudança climática aumentará a força das tempestades e intensificará o efeito das secas e de outros fenômenos naturais como tornados ou inundações. A temperatura média global aumentará entre um e três º C em meados do século e de dois a cinco graus no final do século.
“É um aviso sério que coincide com os informes da Agência Internacional de Energia”, afirmou Dahe. A agência fixou que os países dispõem de cinco anos para conter a mudança climática a dois graus Celsius, limite a partir do qual o IPCC considera que o aumento da temperatura provocará danos irreversíveis.
O informe do IPCC conclui que o aquecimento disparará provavelmente a frequência e a intensidade das ondas de calor e das secas, especialmente na área mediterrânea, na qual se encontra a Espanha. “Os governos devem começar a se adaptar para enfrentar estes fenômenos climáticos muito mais extremos”, recomenda o IPCC. Os cientistas calculam que esta nova situação gerará perdas de bilhões de euros e afetará setores econômicos como o turismo e a agricultura.
“É um informe especialmente relevante devido à vulnerabilidade da Espanha ao aumento das temperaturas e do nível do mar”, admitiu o Ministério do Meio Ambiente espanhol depois de conhecer as conclusões do documento. “Devemos realizar ações urgentes a favor do clima”, corroborou a comissária da UE da Ação pelo Clima, Connie Hedegaard. A organização ambientalista Greenpeace, por sua vez, pediu aos governos que assumam compromissos para reduzir os efeitos do aquecimento global.

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Tradução: Eloise De Vylder Reportagem de El País, no UOL Notícias.
EcoDebate, 242/11/2011

O Impacto Ambiental produzido pelas Necrópoles, artigo de Mario Rodrigo Romero

Até depois do desencarne o ser humano continua poluindo. Os tecidos do corpo humano são destruídos por microorganismos, resultando em alguns gases, líquidos e sais. Os gases liberados como: sulfeto de Hidrogênio, metano, Amônia, Dióxido de Carbono e hidrogênio, produzem um odor forte e desagradável juntamente com uma pequena porcentagem de mercaptana um composto orgânico que contém sulfeto de Hidrogênio ligado a um carbono saturado. Esta decomposição pode durar meses ou anos dependendo da ação ambiental.
A composição do corpo de um homem adulto para Macedo (2004), é de 70Kg e libera 45 litros de necrochorume e o de mulher é entre um quarto e dois terços com relação ao do homem. No processo de decomposição ou putrefação, ocorre a formação do necrochorume, que em sua formação possui aproximadamente 60% de água, 30% de sais minerais e 10% de substâncias orgânicas. É um líquido viscoso, de cor castanho-acinzentado, com odor fétido e com um alto grau de patogenicidade.
As substâncias orgânicas presentes no Necrochorume produzem duas aminas: a Putrescina NH2(CH2)4NH2 e a Cadaverina NH2(CH2)5NH2, conhecidas como alcalóides cadavéricos; são altamente tóxicas e estão presentes nos restos da decomposição da matéria viva e juntamente com compostos de enxofre, são responsáveis pelo fedor de carne podre.
O Necrochorume em meio natural, e em determinadas condições geológicas, atinge o lençol freático, com suas cargas químicas e microbiológicas, desencadeando a contaminação. No caso do desencarne partir de doenças infecto-contagiosas, estarão presentes organismos patogênicos, transmissores de doenças como a Febre Tifóide, paratifóide, hepatite infecciosa, entre outras.
Ainda podemos realizar uma breve análise com relação a radioatividade presente em pessoas submetidas a quimioterapia e radioterapia e as que em vida, receberam marca-passos cardiológicos. Essas substâncias radioativas percorrem um raio de 200m além das sepulturas e se movem facilmente na presença d’água. A cremação para este tipo é imprescindível, desde que as cinzas sejam dispostas como lixo atômico. Sabemos que a cremação ainda possui restrições em nossa cultura, devido aos fatores religiosos, culturais, sociais e financeiros.
Para amenizar este impacto, é necessário que o órgão fiscalizador faça a execução das leis previamente existentes.

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FONTE : Mario Rodrigo Romero é químico e especialista em Gestão Ambiental e Energias Alternativas. Artigo socializado pelo Jornal da Ciência / SBPC, JC e-mail 4990. EcoDebate, 24/11/2011.

terça-feira, 22 de novembro de 2011

Belo Monte e depredadores ameaçam tartarugas amazônicas

Algumas autoridades, ex-pescadores e ambientalistas asseguram a reprodução das tartarugas amazônicas no Baixo Xingu. Mas agora enfrentam o problema da hidrelétrica de Belo Monte, que represará o rio 40 quilômetros acima.

Baixo Xingu, Brasil, 21 de novembro de 2011 (Terramérica).- Luiz Cardoso da Costa se horrorizou ao ver o peixe-boi amazônico, grande e dócil, sangrando por causa da facada, mas engolindo capim avidamente, com se comer evitasse a morte. Não era esperada uma agonia tão dramática. E, por causa dela, renunciou definitivamente à caça desta espécie (Trichechus inunguis).

Luiz escolhera a faca buscando o coração, pois lhe parecia muito cruel o método usual, de enfiar varetas nas narinas para asfixiar este mamífero aquático que chega a pesar meia tonelada de carne, gordura e couro, muito valorizados no mercado ilegal. Contudo, ele deixou de ser “o grande predador” que admite ter sido quando assistiu o embarque de “aproximadamente 800 tartarugas” com destino a Manaus, metrópole da Amazônia e capital do Estado do Amazonas.

Naquela ocasião, há 13 anos, vendeu “apenas umas 20”, mas aquela quantidade concentrada de quelônios mortos o abalou. Sua conversão foi radical. Hoje ele é a alma da proteção ambiental do Tabuleiro do Embaubal, um conjunto de mais de cem ilhas no trecho final do Rio Xingu, na Amazônia oriental, cujas praias são a principal área remanescente para a reprodução das tartarugas amazônicas.

Milhares de fêmeas se juntam aqui em setembro e outubro, especialmente na praia de Juncal, para cavar na areia, jogando-a para o ar, pôr seus ovos, tapar o ninho e voltar para o rio. O espetáculo da desova, com areias que saltam e multidões de grandes quelônios, algum dia atrairá muitos turistas, espera Saloma Mendes de Oliveira, secretária de Meio Ambiente do município Senador José Porfírio, em cujo território fica o Tabuleiro. Será uma fonte de recursos e de adesão popular à defesa da natureza local, afirma.

Atualmente, a aglomeração de tartarugas as torna vulneráveis aos caçadores, que insistem em aproveitar os bons preços da sua carne e dos seus ovos, embora retirá-los da natureza seja um crime ambiental punido com pesadas multas e, em alguns casos, até com prisão. Por isso, no “verão”, como os amazônicos chamam o período de estiagem entre junho e novembro, procura-se intensificar o controle das praias. Desde setembro, Luiz conta com 20 colegas para vigiá-las.

São pessoas contratadas pela empresa ambiental Biota, resultado de um acordo entre a prefeitura de José Porfírio e o Consórcio Norte Energia, empresa que ganhou a concessão da hidrelétrica de Belo Monte e tem a responsabilidade de vigiar e mitigar os impactos que causarem as duas represas que vai construir. São controvertidos os efeitos que terá o maior projeto energético da Amazônia, cuja potência total de 11.233 megawatts se limitará a 40% de geração efetiva, em média, devido à forte variação do caudal do Rio Xingu.

A Norte Energia “não nos explicou nada”, disse Luiz. Seu medo é que baixe o nível das águas, fazendo com que as ilhas do Embaubal tenham “invernos mais secos”, o que deixaria “sem água os igapós” (áreas de floresta inundáveis durante a cheia), onde os quelônios se alimentam de frutas. Como consequência, haverá animais “mais fracos e menos ovos”.

Esta hipótese é pouco provável, afirmou Juarez Pezzuti da Silva, biólogo da Universidade Federal do Pará, que coordena estudos sobre répteis no Xingu. O caudal do Baixo Xingu, trecho de 220 quilômetros entre Belo Monte, onde termina o forte declive do rio, e a desembocadura é determinado pelo Rio Amazonas, que recebe suas águas e as de toda sua bacia de mais de mil rios, acrescentou.

O Amazonas, imensamente mais caudaloso do que seu afluente, funciona como uma barreira ao deságue. Por isso, as águas do Xingu somente baixarão mais que o normal se o mesmo ocorrer no Rio Amazonas. Além disso, os dois cursos sofrem a influência das marés do Oceano Atlântico, apesar da distância em que se encontram, superior a 400 quilômetros.

Exatamente isto é o que preocupa Saloma Oliveira, que as águas menos velozes do Baixo Xingu “se tornem mais ácidas” pelo acúmulo maior de matéria orgânica apodrecida, “afetando espécies mais sensíveis e reduzindo a biodiversidade local”. A Norte Energia nega tal impacto, mas parte de bases pouco sérias, segundo a secretária. A empresa reconhece somente uma “influência indireta” de Belo Monte em áreas que não serão inundadas, mas sofrerão graves danos, como a Volta Grande, trecho fluvial rochoso de cem quilômetros que terá parte de seu fluxo desviada para alimentar à represa de Belo Monte, explica a companhia.

A represa reterá sedimentos que são importantes para manter as praias do Embaubal, cuja altura é indispensável para o sucesso reprodutivo das tartarugas e de outros quelônios, alertou Juarez. As maiores perdas de ovos se devem a cheias do rio antes dos nascimentos, em razão de chuvas fortes e antecipadas na bacia, os “repiquetes”. Porém, esses são inimigos incertos e incontroláveis para guardiões como Luiz, cuja responsabilidade é evitar a depredação humana e natural da fauna do Tabuleiro do Embaubal.

O camponês Manoel Nader viu pela primeira vez a desova das tartarugas no Tabuleiro ao integrar-se ao grupo de guardiões. “Foi uma grande emoção, nunca tive essa oportunidade”, apesar de ter vivido quase todos os meus 48 anos no município, contou. Nader confessa, como vários colegas, ter “pescado” algumas para consumo próprio, apesar da proibição. “É o costume de todos”, justifica, mas agora assume a missão de protegê-las. Além disso, “prefiro carne de vaca”, acrescenta.

O grande problema não são os pescadores locais, conhecidos e desarmados, que consomem poucos animais e são suscetíveis ao diálogo, afirma Luiz. A ameaça são os comerciantes “de fora”, que abastecem grandes cidades, como Manaus e Belém (PA). Para reprimi-los falta força policial, ressalta. Os guardiões do Embaubal são civis, empregados da Biota ou da prefeitura, como ele, sem status de policiais. O Instituto Brasileiro do Meio Ambiente (Ibama), que tem essa autoridade, transferiu suas funções no arquipélago para uma fundação privada que abandonou a tarefa há dois anos e meio.

Luiz foi, então, um defensor solitário do Embaubal, muitas vezes sem combustível nem barcos para percorrer as ilhas, e outras vezes testemunha impotente da captura de grande quantidade de tartarugas. Dez de seus 47 anos dedicou à missão. Vive na “base”, uma grande casa de madeira com um posto de observação que permite vigiar à luz do dia a praia de Juncal, que fica a 600 metros. Visita pouco sua família, mulher e seis filhos que vivem na cidade. Ganha pouco e já recebeu várias ameaças de morte, mas sente-se gratificado.

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FONTE  : MARIO OSAVA,  correspondente da IPS.

Expedição SOS PAPAQUARAS (Florianópolis)

No dia 19 de novembro de 2011, o SOS CANASVIEIRAS, juntamente com as associações de pescadores locais, realizou uma expedição no rio Papaquaras, Florianópolis-SC. Foi batizada carinhosamente de SOS PAPAQUARAS. Uma proposta de José Luiz Sardá que, de imediato, foi aceita pelo grupo. Os rios do norte da Ilha da Magia carecem de especial atenção. Estão poluídos, fétidos, sem qualquer proteção... recebem toda espécie de dejetos; como se suas águas não fossem vitais.

Sardá também providenciou o empréstimo das embarcações. Os jornalistas da RIC Record nos acompanharam e, no mesmo dia, levaram ao ar as imagens e depoimentos dos participantes. O jornal A Notícia do Dia também publicou material referente ao evento. Agostinho Nicolini, do jornal Floripa Norte da Ilha, também nos acompanhou e falará a respeito na próxima edição.

Alguns órgãos oficiais foram convidados; mas ninguém apareceu.

O dia ensolarado – que nos surpreendeu com algumas pancadas de chuva - permitiu capturar imagens de um rio que sobrevive de teimoso. Vimos construções e restos de material de construção destruindo suas margens, canos derramando esgoto em suas águas mansas e escuras, garrafas de bebida, cadeiras, botas, isopor boiando em seu leito... o forte de cheiro de esgoto, em alguns trechos, era insuportável.

Os pescadores – que cresceram em contato direto com rio - lembraram que, antigamente:

- pescavam robalos de até 8 quilos por ali. (Hoje, só pesca ali quem não sabe que as águas estão poluídas. E os poucos robalos que sobrevivem pesam, em média, 2 quilos);

- pegavam siri da casca azul em abundância. (Hoje, esse bichinho desapareceu);

- tomavam banho naquelas águas, que eram mais profundas e, obviamene, limpas;

- havia areia branca em alguns trechos da beira do rio. Era uma prainha pra diversão nas tardes de domingo...

A proposta inicial de percorrermos 1.500 metros do Papaquara restou inviabilizada. O excesso de vegetação no leito do rio impediu a passagem dos barcos. Vegetação que só cresce em virtude da poluição ali existente, concluiu Sebastião dos Santos, atual presidente do CONSEG Canasvieiras. Não podemos ir muito além da ponte Xavier, no Canto do Lami; uns 800 metros, mais ou menos.

Ou seja: constatamos também que o rio não é mais navegável.

A manhã de sábado foi produtiva. Verdadeira aula de educação socioambiental ao ar livre. Com pessoas apaixonadas pela Mãe Natureza. Apesar da indignação com o tratamento dispensado ao rio, o clima de festa e descontração pairava no ar.

As imagens que capturamos serão divulgadas para alertar a comunidade sobre a necessidade de defender e preservar o Papaquaras e todos os rios do norte da Ilha. Por enquanto, estão disponíveis no facebook do Soscanasvieiras.

Agradecemos aos pescadores que tornaram possível a nossa saída de barcos. E não podemos esquecer o seu pedido de fazermos uma visita ao rio Ratones, que também está experimentando os mesmos problemas...

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FONTE : Ana Echevenguá - advogada ambientalista - OAB/SC 17.413
Instituto Eco&Ação - www.ecoeacao.com.br
(48) 91343713 (vivo)
(48) 96459621 (tim)
Florianópolis - SC.

segunda-feira, 21 de novembro de 2011

Começou a era do mundo finito, artigo de Washington Novaes

[O Estado de S.Paulo] A perplexidade é geral, depois da queda do sétimo governo na Europa (Islândia, Reino Unido, Irlanda, Portugal, Eslováquia, Grécia e Itália) e já com a Espanha na alça de mira, com uma dívida pública insustentável e uma taxa de desemprego de 21,5% (48% entre os jovens). E tudo acontece simultaneamente com a crise política que se alastra nos países árabes e a expansão do movimento “Ocupem o mundo”, dos jovens norte-americanos que protestam sentados nas ruas, diante da casa dos poderosos. Para onde vamos?

“Quem não estiver confuso está mal informado”, já diagnosticou o ex-ministro Delfim Netto (Conjuntura Econômica – FGV, setembro de 2011). De fato, quando Brasil, Índia e China se dizem dispostos a ajudar – via Fundo Monetário Internacional (FMI) – a Europa a sair da crise, chega-se a um ponto inconcebível há menos de uma década. Pois ao mesmo tempo se torna claro que “a Europa se prepara para uma década perdida” (Agência Estado, 16/10) e se chega ao “fim do sonho americano” (Celso Ming, Estado, 19/10).

“Vai sair um mundo diferente”, prevê Delfim. A seu ver, “a crise que está aí resulta de governos incompetentes, míopes, e de uma disfunção do sistema financeiro, que em vez de servir ao setor real acaba servindo-se dele. Os derivativos podem estimular uma melhoria de funcionamento do sistema, mas também podem tornar-se armas de destruição em massa, porque os bancos centrais – na verdade, os governos – não conseguiram entender aonde eles deveriam nos levar”. Certamente é uma visão que tem que ver com números pouco citados, de um giro financeiro de US$ 600 trilhões anuais, para um produto bruto mundial de US$ 62 trilhões por ano, dez vezes menos. Isto é, especulação cada vez mais afastada do real, das coisas concretas.

Agora, parece inescapável. A Comissão Europeia prevê recessão para o continente em 2012, que, segundo o FMI, é um alerta para todos os países desenvolvidos (Folha de S.Paulo, 12/11). Mesmo no Brasil a Confederação Nacional da Indústria revê sua previsão para o crescimento do PIB interno, de 3,8% para 3,4% este ano (Agência Estado, 12/11). E até a China parece retrair seu ritmo, enquanto os Estados Unidos chegam a um déficit anual do governo de US$ 1,299 trilhão, quase tanto quanto todo o PIB anual brasileiro. Mas quase todos os países continuam a recusar o que os relatórios do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) vêm propondo desde o início da década de 1990: uma taxa de 0,5% sobre as transações cambiais e financeiras no mundo – para conter a especulação e ajudar a diminuir a pobreza -, uma ideia que surgiu do economista James Tobin.

Estranho que pareça, num quadro como esse pouco se discute na área econômica o que já é óbvio no diagnóstico de organismo da ONU e outros: a questão do impasse na área dos recursos naturais e sua tendência ao agravamento. Mais uma vez, o ex-ministro Delfim Netto, que em outras épocas parecia fechado à questão: “Estamos caminhando para instituições em que a cooperação, o altruísmo e as preocupações com o meio ambiente são maiores, enquanto a restrição ao crescimento é um pouco mais aguda, porque pela primeira vez se tem consciência de que não cabem na Terra 10 bilhões de pessoas com renda per capita de US$ 20 mil”. Ou seja, o consumo atual já é insustentável e será cada vez mais com o crescimento inevitável da população. Os diagnósticos da ONU já nos mostram consumindo mais de 30% além da capacidade de reposição da biosfera terrestre; se tivermos de aumentar a produção de alimentos em 70% nas próximas décadas para atender à população crescente e à redução da pobreza, agravaremos a situação, pois a “pegada ecológica” (área necessária para atender às necessidades de um ser humano) também já está mais de 30% além da disponibilidade – e seu crescimento significará mais degradação do solo, mais desertificação, mais crise da água, mais perda da biodiversidade, etc., etc. Sem falar em agravamento das mudanças climáticas. Mas como se fará se 1,44 bilhão de pessoas no mundo ainda não dispõem de energia elétrica e em sua maior parte terão de ser abastecidas com mais queima de carvão e petróleo, principalmente na China e na Índia, como adverte a Agência Internacional de Energia? E como tirar do âmbito da fome crônica quase 1 bilhão de pessoas?

Outros padrões de consumo terão de ser observados. Nossos modos de viver terão de ser repensados. Até porque em muitos setores a crise aguda já bate à porta. Como observa o professor Maurício Waldman, pós-doutorando em Geografia pelo Instituto de Geociências da Unicamp, a situação já é insustentável em muitos setores. No século 20 a população multiplicou-se por 4; o consumo de carvão, por 6; o de cobre, por 25; o de metais em geral chegou, em 2008, a 1,4 bilhão de toneladas, o dobro dos anos 70, sete vezes mais que em 1950; o consumo de alumínio passou de 2 milhões de toneladas em 1950 para 40 milhões em 2008; o de plásticos multiplicou-se por 18 em 34 anos. Como já se comentou neste espaço em outros artigos, a disponibilidade de muitos dos metais usados nas tecnologias mais abrangentes de hoje (telefones, computadores, etc.) está gravemente ameaçada. Por tudo isso, lembra o professor Waldman a frase do filósofo Paulo Valéry: “Começa a era do mundo finito”.

E como começa, ainda uma vez é preciso insistir: o Brasil tem de pensar uma estratégia fundada nessas visões, já que tem posição privilegiada no mundo em matéria de território, água, biodiversidade, possibilidade de plantios, matriz energética limpa e renovável – tudo o que é fator escasso no mundo e já foi dito e repetido neste espaço. A essa estratégia – em substituição à ideia de crescimento econômico puro e simples, desatento ao quadro mais amplo – é que se poderá chamar de uma verdadeira modernidade. Não precisamos esperar que a crise de recursos e consumo insustentáveis nos atinja mais a fundo.

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FONTE Washington Novaes, jornalista. Artigo originalmente publicado em O Estado de S.Paulo. EcoDebate, 21/11/2011.

Brasil não tem um plano eficaz para conter vazamento de petróleo no mar, diz especialista da Coppe

O Brasil não tem, atualmente, um plano eficaz de contenção de vazamento de petróleo em alto-mar, como o que aconteceu há dez dias no Campo de Frade, na Bacia de Campos, explorado pela norte-americana Chevron, disse, no dia 18/11, o professor Segen Estefen, diretor de Tecnologia e Inovação da Coordenação dos Programas de Pós-Graduação em Engenharia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (Coppe). O professor propôs que o governo aproveite o pessoal especializado e os recursos tecnológicos da Coppe para desenvolver um plano de contenção de vazamento.

“Uma questão que nós temos discutido internamente na universidade, é que temos recursos humanos, laboratórios de ponta, e a Coppe tem toda a disposição para contribuir com o governo e as agências reguladoras em termos de se criar uma comissão independente que possa planejar os passos para a construção de uma estrutura técnica forte que eventualmente deve ser na própria Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis [ANP], que de certa maneira enfrente com maior segurança esse tipo de acidente”, disse.

Para o professor, um vazamento de petróleo não é algo fora do comum e pode acontecer. O fundamental, segundo ele, é que o país esteja preparado para lidar com esse tipo de problema. “Isso não é nada fora do comum, e nós temos que ter eficiência técnica para podermos enfrentar essas situações, tanto do ponto de vista do acompanhamento da dispersão dessas manchas de óleo na superfície e, eu acho mais importante, que nós possamos sempre, e de forma rápida, diagnosticar o que está acontecendo no fundo do mar, e termos procedimentos desenvolvidos para enfrentarmos essas questões”.

Ao comentar os danos causados pelo vazamento de petróleo ao meio ambiente da região atingida pelo óleo, Estefen disse que o fato dele ter ocorrido longe da costa não deverá causar um grande impacto ao ambiente marinho. “No caso específico desse vazamento, como ele é em alto-mar e está se espalhando para longe da costa, vai existir uma dispersão natural, e se ele for descontinuado, a tendência é que não tenhamos nada muito sério dentro do volume até agora vazado”.

A preocupação do professor, no entanto, é com a continuidade do vazamento e com o volume de óleo que está escapando pela fenda do poço. “O grande problema é que persistindo esse vazamento, a gente sabe que parte desse óleo acaba se precipitando para o solo marinho, e isso vai trazendo consequências, mas a consequência é proporcional ao volume vazado e ao local onde se dá esse vazamento. Por exemplo, um acidente dessa ordem na Baía de Guanabara, o mesmo volume seria muito mais crítico. Mas isso a ciência ainda tem muita dificuldade em quantificar esse dano”.

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FONTE : Reportagem de Douglas Corrêa, da Agência Brasil, publicada pelo EcoDebate, 21/11/2011.

Chevron ainda não sabe a quantidade de óleo que vazou do Campo de Frade

O presidente da subsidiária brasileira da companhia Chevron, George Buck, disse, em 18/11, que a empresa ainda não tem uma estimativa sobre a quantidade de óleo que escapou do Campo de Frade, na Bacia de Campos, 11 dias depois da detecção do vazamento.

Buck explicou que a perfuração atingiu o campo de petróleo no dia 7 e que no dia seguinte a Chevron foi avisada pela Petrobras sobre uma mancha de óleo no mar, na área de sua plataforma. Ele disse que ainda vai levar alguns dias para as equipes da companhia determinarem o volume do petróleo que vazou, pois isso depende de cálculos apurados.

O presidente da operação brasileira da Chevron declarou que no dia 8 colocou as equipes de emergência de sobreaviso e que ainda “não havia evidências de que a mancha [vazamento] vinha do Campo de Frade”. Buck também explicou a causa provável do acidente.

“A pressão em um dos reservatórios de óleo foi subestimada, mais alta do que nós esperávamos. Nossa previsão da pressão do reservatório, usando um modelo numérico complexo, é que pode não ter sido correta”. Ele negou, porém, que tenha havido falha técnica. “O equipamento funcionou perfeitamente. A equipe que estava na sonda também respondeu perfeitamente”, completou.

O presidente da subsidiária brasileira disse ainda que a companhia assume a total responsabilidade pelo acidente na Bacia de Campos. “A Chevron se responsabiliza por isso. Nós somos o operador da concessão de Frade e assumimos a responsabilidade pelo que aconteceu, mas estamos trabalhando duro para resolver e entender o problema.”

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FONTE : Reportagem de Vladimir Platonow, da Agência Brasil, publicada pelo EcoDebate, 21/11/2011.

Vazamento de petróleo na Bacia de Campos: Sujaram o mar e mataram a informação, artigo de Fernando Marcelo Tavares

Qual o real tamanho do problema no caso do vazamento no campo de Frade? A mancha de óleo pode chegar ao litoral? Como é essa fissura de 300 metros, por onde vaza o óleo? Mil ou 3.700 barris por dia? O vazamento diminuiu ou aumentou?

Como se nota, nesta história do vazamento do campo de Frade há mais desinformação do que informação. Foram constantes as divergências entre os dados divulgados pela Chevron, ANP, IBAMA e agências de notícias governamentais, desde o primeiro comunicado no dia 9 de novembro. A empresa chegou a divulgar nota informando que o vazamento estava reduzido a um “gotejamento ocasiona”l. A história estava sendo tão mal contada que Polícia Federal acusou a empresa de mentir e abriu inquérito para apurar danos e responsabilidades.

As dúvidas e desconfianças a cada comunicado divulgado cresceram e começam a tomar forma de indignação, e preocupam, porque revela um comportamento furtivo e de poucas palavras da empresa, próprio de quem está sob pressão e se prepara para uma guerra judicial.

Preocupa, ainda mais as projeções divulgadas pela Ong Sky Thrut, especializada em análise de imagens de satélite, de 15 mil barris já vazados, com uma vazão diária de 3.770 barris; a revelação de que a fissura provocada pela perfuração é na verdade uma fenda gigante de 300 metros ou mais; e a conseqüente dificuldade em vedar uma abertura destas dimensões no subsolo oceânico, a 1200 metros de profundidade.

E aí, é inevitável que nos assombre o fantasma de Macondo, o terrível vazamento no Golfo do México protagonizado pela BP em 2010, trazendo séria reflexão sobre os riscos da exploração intensiva em águas profundas. E nos faz lembrar do péssimo histórico da Chevron em Angola e na Amazônia Equatoriana.

Pensando positivamente, podemos afirmar que mesmo que este vazamento cesse agora, e não produza maiores impactos ambientais, já contribuiu para a implementação de parâmetros mais rigorosos para a concessão de licenças ambientais para novas atividades do gênero em especial no pré-sal. Pelo menos é o que se espera. Abrolhos agradeceria muito, já que está autorizada a exploração a 50 km daquele santuário ecológico.

Por não ter previsto a possibilidade de vazamentos oriundos de exsudação (migração do óleo de um lugar para o outro no subsolo oceânico) através de fissuras provocadas pelo processo de perfuração, o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) do Campo de Frade deveria ser revisto e aperfeiçoado, ficando sob suspensão a licença de operação concedida. O Ibama deveria, ainda, depois de aperfeiçoar seus parâmetros revisar todos os empreendimentos exploratórios licenciados nas bacias de Campos, Santos e Espírito Santo.

Ah! E dar uma melhorada na comunicação, ponto fraco de todos os envolvidos neste lamentável episódio. Sujaram o mar e mataram a informação!

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FONTE : Fernando Marcelo Tavares – pre-sal.info. EcoDebate, 21/11/2011.

Vazou petróleo na bacia de Campos. E qual é a surpresa? Por Henrique Cortez

A prospecção/produção de petróleo enfrenta o seu primeiro grande vazamento de petróleo na bacia de Campos, mas e daí? Qual a surpresa?

Quem imaginava que vazamentos de petróleo não ocorrem com razoável frequência?

É estranha a aparente reação de surpresa das autoridades, políticos e da própria sociedade, porque este risco sempre foi real e discutido em incontáveis reportagens e artigos.

Reportagens e artigos que, inclusive, já alertavam que se os riscos na exploração de petróleo em águas profundas já eram grandes, quando da exploração do pré-sal elas seriam ainda maiores

Aqui, no EcoDebate, por exemplo, o Prof. Roberto Naime , em 03/11/2011, com muita propriedade abordou o assunto no artigo Aspectos ambientais da exploração do pré-sal.

O tema também foi discutido em O risco do petróleo em águas profundas, artigo de Norman Gall, Vazamento de petróleo na era da sustentabilidade, artigo de Lucas Copelli e Lições para o Pré-sal, artigo de Fernando Marcelo Tavares.

São questionamentos claros e objetivos, que expunham os riscos da exploração e do quanto eles seriam maiores quando da efetiva exploração do pré-sal.

A indústria petrolífera é suja por definição e seus impactos ambientais, pela prospecção/exploração ou pelos “acidentes” são conhecidos e documentados à exaustão.

Surpresa, portanto, não há. Hipocrisia com certeza, mas surpresa não.

O vazamento da petroleira Chevron, do campo de Frade, na Bacia de Campos (RJ) seguiu o roteiro de trapalhadas e desinformação que sempre se segue aos vazamentos de óleo.

Durante dias pouco se sabia e, mesmo assim, com informações nada isentas emitidas pela assessoria da Chevron. Na ANP, no Ibama e no MMA apenas notas que, de de fato, nada informavam. E hoje, 21/11, a desinformação continua repleta de contradições.

O muro de silêncio começou a ruir com a entrada em cena do secretário estadual do Ambiente do Rio de Janeiro, Carlos Minc.

Minc, em declarações à ABr, foi excepcionalmente direto: “A mancha é muito grande. Está borbulhando e continua saindo óleo da fissura. Nós vimos três baleias jubarte a 300 metros, o que significa que a biodiversidade já está afetada. Se a empresa sonegou informação, e tudo indica que sonegou, ela tem que ser ainda mais rigorosamente punida. Por ter poluído, por ter afetado a biodiversidade e por ter sonegado a informação.”

Minc considerou que houve erro em um estudo geológico anterior, ao não prever a possibilidade de uma falha no subsolo. “Isso é muito grave. Pois significa que deveria ter sido previsto antes e poderia inclusive evitar esse tipo de acidente.”

O secretário também classificou o acidente como um alerta para toda a exploração do pré-sal que está começando no país. “Este não foi um acidente gravíssimo, mas foi um festival de erros. Serve para nós como um alerta vermelho. Este é um [poço], o pré-sal vai ter mil. Então temos que tirar lições disso.”

A falha ou, se preferirem, a omissão no EIA, foi analisada por Fernando Marcelo Tavares, em Estudo ambiental do Campo de Frade não previu vazamento ‘natural’ .

E ainda existem desenvolvimentistas (a qualquer custo) que reclamam quando questionamos a crescente fragilização técnica dos processos de licenciamento ambiental, tal como fizemos no editorial Fazendo de conta que os licenciamentos ambientais são de verdade.

Neste editorial discutimos que: Este governo não consegue compreender que o processo de licenciamento ambiental é “ligeiramente” diferente da concessão de um mero alvará e por isto não suporta a ideia de que as licenças não sejam concedidas automaticamente, como se fossem meros detalhes burocráticos.

Se dependesse do voluntarismo governamental teríamos ampla e irrestrita concessão de licenças ambientais, para quaisquer atividades, sem qualquer consideração para com as questões socioambientais.

Diversos membros do primeiro círculo do poder já afirmaram que a grande fase do desenvolvimento do Brasil se deu durante os governos militares, coincidentemente uma época em que as preocupações sociais e ambientais das grandes obras simplesmente inexistiam.

Mas voltando ao vazamento atual, embora não seja da mesma dimensão do desastre ambiental na plataforma da BP no Golfo do México, poderá ter os mesmos efeitos, talvez um pouco atenuados [Desastre ambiental no Golfo do México: Derramamento de óleo pode originar nova zona morta na região e Desastre ambiental no Golfo do México: Além do vazamento de petróleo, a tragédia de um golfo enfermo].

E, do vazamento na bacia de Campos, ressurge a questão do pré-sal. Até agora o que mais se discutiu foram os royalties e não os riscos e/ou a avaliação se realmente deveríamos explorar o pré-sal.

Os políticos, como sempre, sonham com os eventuais recursos do pré-sal como recursos a serem apropriados, ‘livremente’ usados como se fossem receitas não orçamentárias. Não são.

Royalties do petróleo visam compensar/indenizar a ação exploradora, a degradação do meio ambiente e financiar investimentos nos estados/municípios impactados pela atividade. E, com o vazamento na bacia de Campos, ficou mais evidente para quem quiser ver que os royalties do petróleo não são receitas não tributárias, decorrentes da exploração do bem público.

Elas devem, além de financiar infraestrutura, gerar recursos para formação de fundos, exatamente para enfrentar os custos de um desastre socioambiental.

Outra coisa que ficou evidente é que, até agora, nosso país não possui um plano de reação aos vazamentos de petróleo em águas profundas e muitos menos saberá como reagir quando os vazamentos ocorrerem no pré-sal.

Aliás, nem mesmo contamos com efetiva tecnologia para explorar o pré-sal, quanto mais para conter os acidentes que, certamente, ocorrerão.

Mas, como sempre, os alertas serão inúteis porque serão solenemente ignorados. No desenvolvimentismo produtivista os riscos sempre são subestimados/ignorados porque não existe nada mais importante que o $$.

E, como sempre, alguns ganharão muito agora e todos perderão muito no futuro.

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FONTE : Henrique Cortez, coordenador editorial do Portal EcoDebate

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

INDIGNAÇÃO CONTRA A USINA DE BELO MONTE !!!


Indignação contra Belo Monte. Acesse o site http://www.movimentogotadagua.com.br/assinatura e assine a petição, ajude assim a fazer com que o interesse do povo e não dos políticos seja respeitado. "Uma gota move o oceano!"

Amazônia vive situação drástica nos aspectos sociais, ambientais e econômicos, diz estudo

Estudo inédito realizado nos países amazônicos mostra que a região está longe de alcançar os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio estabelecidos pela ONU.

Apesar de alguns avanços nas últimas décadas, ainda são drásticas as condições sociais, econômicas e ambientais nos países que fazem parte da Amazônia:Brasil, Bolívia, Colômbia, Equador, Guiana Francesa, Guiana Inglesa, Peru, Suriname e Venezuela. A conclusão é do estudo A Amazônia e os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) lançado nesta quarta-feira à noite em Belém durante o evento Cenários e Perspectivas da Pan-Amazônia, realizado pelo Fórum Amazônia Sustentável e Articulação Regional da Amazônia (ARA). Os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM), estabelecidos pela ONU em 2000, foram avaliados por um grupo de instituições ligados à ARA, que assina o trabalho.

De acordo com o estudo, cerca da metade da população que vive nesses países encontra-se abaixo da linha da pobreza, apesar dos vastos recursos naturais. A situação é mais crítica no na Bolívia (60%), Equador (59%), Peru e Guiana Inglesa (54%), Venezuela (52%) e Suriname (51%).

Os dados mostram que as taxas de desemprego na região diminuíram. Mas essa realidade esconde graves problemas como a informalidade, o trabalho infantil e o trabalho forçado. Durante a última década, somente na Amazônia brasileira, mais de 15 mil pessoas foram libertadas de condições análogas à escravidão. Geralmente são homens analfabetos entre 25 e 40 anos, recrutados para extração ilegal de madeira, a produção de carvão e a pecuária.

Mortalidade infantil

Apesar de uma redução significativa, a mortalidade infantil na Amazônia é bem maior do que a media nacional dos países. Na Bolívia, a mortalidade infantil está acima das regiões mais pobres do mundo são 73 casos por mil nascidos vivos, e no Peru 38 casos por mil. A menor taxa está na Guiana Francesa com dez casos por mil. A Venezuela foi o único país que conseguiu diminuir as taxas de mortalidade em dois terços em relação a 1990, conforme define a meta da ONU. Porém, entre a população indígena venezuelana, a mortalidade infantil é dez vezes maior que a média interna do país.

Em alguns países, a desnutrição atinge um quarto da população infantil. A vulnerabilidade é maior para os povos indígenas. As maiores taxas encontram-se no Peru (24%) e na Bolívia (21%). Índices abaixo de 20% estão o Equador e a Venezuela. Os países com o menor percentual são a Colômbia (5%) e o Brasil (2%).

O estudo mostra que o analfabetismo na Amazônia está acima do limite internacionalmente considerado como crítico, que é de 5%, definido pela UNESCO. Na Amazônia brasileira, é mais do que o dobro (11%) e na Amazônia boliviana é 17%. Nos outros países da pan-amazônia, a situação está um pouco melhor, mas sempre acima dessa média, com 8% na Amazônia peruana, 6,5% na Amazônia equatoriana e 6% na Amazônia venezuelana.

A taxa de matrícula aumentou e a maioria dos países apresenta índices acima dos 90%, exceto a Guiana Francesa com 88%. Peru e Guiana apresentam as maiores taxas, com 96% e 98%, respectivamente.

Uma grande porcentagem de mulheres da Amazônia sofre algum tipo de maltrato, assim como uma taxa de analfabetismo superior à média da população, revela o estudo da ARA. Além disso, elas possuem escassas oportunidades econômicas e políticas. Conforme o estudo, esses problemas se acentuam quando se trata de mulheres indígenas e afrodescendentes.

Em relação à saúde, o estudo denuncia que na Amazônia, o acesso a um sistema de qualidade é limitado em comparação com a situação particular dos países. Os países amazônicos têm entre 0,5 e 1,5 médico para cada mil habitantes. Essa vulnerabilidade é acentuada pelo desmatamento, as altas taxas de crescimento demográfico e urbanização descontrolada sem saneamento básico, abrindo caminho a todo tipo de doenças, consequência das execráveis condições de vida.

A propagação do vírus da AIDS aumentou nos últimos anos na região amazônica. Por outro lado, isso mostra uma maior cobertura dos dispositivos de diagnostico utilizados, porém, ainda insuficientes devido à dificuldade de diagnósticos, sobretudo em áreas rurais.

A tuberculose é uma doença que está em baixa no mundo inteiro. Porém, a incidência dessa doença nos países amazônicos como o Peru e a Bolívia é a mais elevada do mundo. Os autores também apontam que na Amazônia, algo entre 400 mil e 600 mil pessoas contraem malária a cada ano. Uma das causas para o aumento do número de casos é a derrubada das florestas. Mesmo assim a mortalidade provocada por essa doença caiu em mais de 50% na região.

Desmatamento


Apesar do avanço em relação aos acordos alcançados pelos países, como a assinatura de convenções como a da biodiversidade (CDB/ONU), o estabelecimento de áreas protegidas – inclusive territórios indígenas –, e a criação de alguns marcos legais importantes, o estudo indica a necessidade de ações mais concretas para além das fronteiras nacionais, ou seja, políticas públicas para reduzir a perda de recursos naturais e biodiversidade.

Desmatamento, degradação e outras pressões, no entanto, ainda ameaçam a floresta amazônica. Nem todos os países têm sistemas de monitoramento florestal. Apesar de estar conseguindo diminuir as taxas de desmatamento, no âmbito regional, o Brasil ainda responde por cerca de 72% das taxas anuais de desmate, seguido pela Venezuela (12,5%), Peru (6,5%) e Colômbia (4,7%). Expansão da fronteira agrícola, obras de infraestrutura, assentamentos humanos e apropriação de terras públicas são as principais causas da perda de cobertura florestal.

Embora a região possua as maiores reservas de água doce do planeta, boa parte da população amazônica não dispõe de água própria para o consumo. A Bolívia é o país com menos acesso a esse direito fundamental.

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FONTE : colaboração de Jaime Gesisky, para o EcoDebate, 18/11/2011.

Código Florestal: Especialistas alertam para risco de escassez de água

Engana-se quem acredita que o novo texto do Código Florestal trará benefícios aos grandes produtores agrícolas em detrimento do meio ambiente e do restante da sociedade. O prejuízo será geral e irrestrito, caso o texto em tramitação nas comissões do Senado mantenha alguns vícios que adquiriu desde o relatório original, votado na Câmara.

Essa é a opinião de cientistas. O conjunto das opiniões mostra que, se aparentemente, o setor rural ganha, a curto prazo, com o aumento da área disponível e do desmatamento, sofrerá, no futuro, como toda a sociedade, os efeitos da ação predatória.

A primeira consequência será a escassez de água. A redução da vegetação nas margens dos rios e a falta de proteção às nascentes irão provocar a redução da oferta do produto. Nascentes vão secar, rios menores sofrerão rápido processo de erosão e os maiores, que recebem água dos pequenos, ficarão assoreados. “Vai faltar água para a própria agricultura”, afirma José Galizia Tundisi, presidente do Instituto Internacional de Ecologia (IIE). Segundo ele, a agricultura responde por 70% da água consumida no Brasil.

Tundisi diz que o texto do novo Código erra ao fixar medidas para as florestas ripárias – contíguas aos cursos d”água. “Isso varia conforme o rio, a região, o bioma. Essa questão tem de ser decidida em função do tamanho do rio e da área de inundação. É antilógico e anticientífico fixar uma barreira de cinco ou dez metros.” Segundo ele, o custo é também econômico. A degradação da área de mananciais não só reduz a possibilidade de captação, mas também aumenta o custo do tratamento de água.

Como o texto ainda pode ser alterado, os cientistas não projetaram ainda quais serão os impactos, mas preveem várias consequências, tidas como inevitáveis. Ocorrerão mais desmatamentos, assoreamentos de rios, inundações de cidades, mais emissão de CO2, deslizamentos de encostas, redução de produtividade depois de alguns anos de uso da terra, entre outros, destaca José Antônio Aleixo da Silva, secretário da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) e coordenador do grupo de trabalho da entidade na análise do Código Florestal.

O texto estimula o plantio em áreas alagadas, “o que é um erro muito grave”, diz Tundisi. O País tem 600 mil quilômetros quadrados dessas áreas, com papel importantíssimo no controle de enchentes, nos ciclos hídricos, na reciclagem de nutrientes e na manutenção da biodiversidade aquática e terrestre. Estimula o plantio em várzeas, um erro muito grave. Da forma como o novo Código está sendo concebido, parece que a vegetação não tem papel ativo no ciclo hidrológico e, por isso, pode-se desmatar. Mas a vegetação é fundamental. Ela evapotranspira e 30% da água da atmosfera vêm da vegetação.

Para o biólogo Jean Paul Metzger, pesquisador da Universidade de São Paulo, a comunidade científica entende que o Código pode prever algumas exceções, sobretudo no caso de alguns produtos e da agricultura familiar. “Arroz em várzea, pecuária no Pantanal, café, maracujá, maçã, uva que precisam de encostas ou áreas de topo de morro, tudo isso precisa de um tratamento especial”, defende.

“Muitos desses produtos são de baixo impacto, por serem perenes, ou explorados de forma extensiva como a pecuária no Pantanal. Mas isso representa uma porcentagem muito baixa da agropecuária brasileira, menos de 10%”. O que ele não concorda é anistiar o desmatamento de áreas de proteção, principalmente para culturas de exportação.

Metzger demonstra especial preocupação com o fim da proteção às áreas de várzea e o impacto que isso pode ter no controle de enchentes. Para ele, liberar o desmatamento de áreas alagadas ou em encostas apenas para justificar exceções é um equívoco grave. “Não tem cabimento a gente pegar a exceção para justificar uma mudança completa. Além disso, estimula a ocupação de áreas de risco”, explica. O biólogo lembra que nas inundações que destruíram a região serrana do Rio de Janeiro no começo deste ano, 80% dos prejuízos materiais ocorreram numa faixa de 30 metros ao longo dos rios, faixa que, em muitos casos, estava irregularmente ocupada.

As principais mudanças defendidas pela comunidade científica no texto da lei incluem acabar com a divisão entre áreas de preservação permanentes e transitórias. O transitório é o passivo ambiental, a área degradada, que, se não for considerada permanente e não estiver sujeita a recuperação, pode representar uma perda definitiva da cobertura vegetal. Outro aspecto importante é a defesa dos manguezais, excluídos das áreas de preservação permanente (APPs).

Essas e outras advertências da comunidade científica foram oferecidas aos congressistas pela SBPC no livro “O Código Florestal e a ciência. Contribuições para o diálogo”. O livro, elaborado durante um ano, aponta os pontos que precisariam ser modificados e os argumentos científicos para embasar a questão. Segundo Aleixo, a obra causou “grande impacto” entre congressistas, mas nas votações tem prevalecido a força da bancada ruralista, principal interessada na manutenção do texto como está.

Os documentos mostram que o argumento de que vai faltar área para alimentação não tem validade, diz Metzger. Segundo ele, a área ocupada pela produção de alimentos destinados ao mercado interno está estável nos últimos anos. O que cresce é a produção de commodities exportáveis. “Então o Código, do jeito que está, vai favorecer um grupo reduzido de agricultores, que não precisam necessariamente desse tipo de estímulo”.

O texto enviado pela SBPC procura argumentar que não existe o dilema entre conservar/preservar o ambiente e produzir alimentos. Argumentam que, com um aumento marginal da produtividade da pecuária brasileira, muitas áreas de pasto poderiam ser liberadas para plantios agrícolas, dispensado a derrubada de florestas para esse fim. A entidade também defende o fim da anistia para os desmatamentos ocorridos nas APPs até 2008, a restauração de toda área desmatada à beira dos cursos d”água, a manutenção dos manguezais, salgados e apicuns como áreas de preservação permanente e a compensação da Reserva Legal o mais próximo possível da área desmatada, entre outros aspectos.

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FONTE : Matéria do Valor Econômico, socializada pelo Jornal da Ciência / SBPC, JC e-mail 4386.

EcoDebate, 18/11/2011

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Marina Silva diz que texto do Código Florestal aprovado na última semana está péssimo

A ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva disse ontem (16) que o texto do novo Código Florestal, aprovado na última semana, nas comissões de Agricultura e de Ciência e Tecnologia do Senado, “está péssimo”. A votação dos destaques ao texto ainda está pendente, mas, segundo Marina, o relator do código nas duas comissões, Luiz Henrique (PMDB-SC), não incorporou ao texto medidas que garantam a manutenção de áreas de preservação permanente (APPs) e reserva legal nas propriedades rurais.

“Até agora, o relatório está péssimo. O governo vai ter que bancar o que eles prometeram para a sociedade, de que não haveria emendas na CCJ [Comissão de Constituição e Justiça, por onde o texto passou antes] porque o Luiz Henrique iria acatar as emendas dos senadores e da sociedade. Como ele não acatou, agora espero que o governo trabalhe para que essas emendas estejam no relatório do senador Jorge Viana [que relatará a matéria na Comissão de Meio Ambiente]”, disse Marina depois de participar de debate no encontro anual do Fórum Amazônia Sustentável.

Na Comissão de Meio Ambiente, o senador Jorge Viana (PT-AC), tenta buscar consenso sobre as questões mais polêmicas, como a redução das APPs e a possibilidade de anistia para quem desmatou ilegalmente. Depois de passar pela comissão, o novo código seguirá para votação no plenário do Senado e, em seguida, voltará à Câmara dos Deputados caso sofra alterações.

Na avaliação de Marina, “é mais prudente” tentar melhorar o texto ainda no Congresso do que depender do veto presidencial. “Se dermos sustentação política para a mudança agora, com certeza, podemos fazer a diferença”, disse a ex-ministra, que convocou a sociedade a se manifestar contra as mudanças na lei florestal.

Marina, que foi ministra do Meio Ambiente nos governos do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva por quase seis anos, disse que a tentativa de flexibilizar o Código Florestal é o estopim de uma série de retrocessos na área ambiental. “Já mudaram regras de unidades de conservação, já tiraram competência do Ibama [Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis] em fiscalizar desmatamento e, agora, se quer tirar o último bastião da defesa das florestas do Brasil, que é o código. É uma agenda de retrocessos”, avaliou.

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FONTE : Reportagem de Luana Lourenço (a repórter viajou a convite do Fórum Amazônia Sustentável), da Agência Brasil, publicada pelo EcoDebate, 17/11/2011.

Recuperação de mata ciliar é desafio para novo Código Florestal

Vencer as divergências quanto às regras para recuperação de Área de Preservação Permanente (APP) nas margens de rios será um dos maiores desafios da Comissão de Meio Ambiente (CMA), última a votar o projeto de reforma do Código Florestal (PLC 30/11) antes do Plenário. As regras para recompor matas ciliares e as demais modificações que o relator, senador Jorge Viana (PT-AC), submeterá à comissão nesta quinta-feira (17) devem resultar de acordo entre os senadores, mas também precisarão do aval dos deputados.

Como o projeto voltará à Câmara, para análise das mudanças feitas pelo Senado, diversos senadores têm manifestado preocupação em negociar antecipadamente com os deputados as alterações no texto. Na opinião do senador Waldemir Moka (PMDB-MS), um dos que têm trabalhado na interlocução com a Câmara, o Senado deverá aprovar assegurar a continuidade de atividades consolidadas em APPs e proteger agricultores que tenham propriedades de até quatro módulos fiscais.

O senador Acir Gurgacz (PDT-RO) apresentou emenda nesse sentido, admitindo a manutenção, em APPs, de infraestrutura associada “ao desenvolvimento de atividades agrossilvopastoris, de turismo rural e ecoturismo, edificadas até 22 de julho de 2008″. O senador sugere ainda que, para propriedades com até quatro módulos fiscais, a exigência de recomposição da mata ciliar, somada à área de reserva legal, não ultrapasse 20% da área total do imóvel.

- Precisamos de um texto que leve em consideração esse tipo de exceção – disse Moka, ao afirmar que não apenas os deputados, mas também o governo federal está sendo ouvido na elaboração do substitutivo.

Para propriedades com mais de quatro módulos fiscais, Acir Gurgacz propõe que seja obrigatória a recomposição de faixas de vegetação “até a metade da largura mínima estabelecida para APPs”. Isso representa uma exigência de 15 metros de mata ciliar para rios até dez metros de largura; 25 metros para rios de 10 a 50 metros; 50 metros de mata para rios de 50 a 200 metros de largura; e 100 metros de mata ciliar para rios acima dessa largura.

Apicuns e salgados

Ainda de acordo com Moka, há resistência da Câmara quanto às modificações das regras para apicuns e salgados, que são parte dos manguezais onde existe expressiva produção de camarão e extração de sal, especialmente no Nordeste.

O projeto aprovado na Câmara não se refere a manguezais, mas exclui apicuns e salgados das normas de proteção permanente. De acordo com o relatório aprovado nas comissões de Agricultura (CRA) e de Ciência e Tecnologia (CCT), de autoria Luiz Henrique da Silveira (PMDB-SC), as atividades consolidadas em apicuns e salgados poderão ser regularizadas.

Luiz Henrique, no entanto, considerou todas as formações de mangues preservadas ou exploradas depois desse ano como um sistema único, submetido às regras de APPs. Esse entendimento, conforme explicou Moka, não agradou aos deputados e poderá ser revisto.

Emendas na CMA

A secretaria da CMA informou ter recebido, até a manhã desta quarta-feira (16), 40 emendas ao projeto, apresentadas por Rodrigo Rollemberg (PSB-DF), presidente da CMA; Romero Jucá (PMDB-RR); Aloysio Nunes (PSDB-SP); Acir Gurgacz; Eduardo Braga (PMDB-AM); e Flexa Ribeiro (PSDB-PA).

Outras sugestões são esperadas no decorrer do dia e poderão ser consideradas por Jorge Viana, que apresentará seu relatório na quinta, a partir das 10h. Rodrigo Rollemberg prevê que será concedida vista coletiva , o que transfere a votação da matéria na CMA para a próxima semana.

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FONTE : Matéria de Iara Guimarães Altafin / Agência Senado, publicada pelo EcoDebate, 17/11/2011.

‘Mudanças no Código Florestal condenam rios à extinção’, afirma Mario Mantovani

Nos últimos meses, a discussão sobre o Código Florestal colocou em pauta um dos recursos mais indispensáveis e fundamentais do mundo para a sobrevivência do ser humano: a água. No entanto, a aprovação de um novo texto para o Código Florestal pode levá-la a escassez e desencadear uma crise ecológica, econômica e política no país.

Segundo Mario Mantovani, diretor de Políticas Públicas da Fundação SOS Mata Atlântica, a proposta de reduzir as Áreas de Preservação Permanente (APPs) de 30 para 15 metros, prevista no novo Código Florestal, é muito perigosa. Uma vez que ela diminui ou até mesmo acaba de vez com a mata ciliar, vegetação que cresce às margens dos rios.

De acordo com informações divulgadas no site dos Comitês de Bacias Hidrográficas (www.rededasaguas.org.br), a mata ciliar cumpre um papel muito importante na natureza.

Ela protege as margens dos rios, lagos e nascentes contra assoreamento – obstrução de rios por sedimentos, geralmente, de areias ou outros detritos – e evita a contaminação da água por venenos – agrotóxicos. Portanto, “a proteção da mata ciliar é uma questão vital para a sociedade”, afirmou Mantovani.

Mais de 70% da malha hídrica do Brasil é constituída por rios de até 10 metros de profundidade, segundo Mantovani. Com a proposta do novo Código Florestal para as APPs, as profundidades desses rios serão comprometidas e, consequentemente, os rios podem desaparecer.

“O que nós estamos prestes a presenciar é um atestado de morte para a natureza e para os rios, com a proposta dos ruralistas”, alertou o diretor de Políticas Públicas da SOS Mata Atlântica.

Mario Mantovani explicou que a mata ciliar também funciona como uma espécie de “corredor de biodiversidade, um corredor de vida às margens dos rios”. Esses corredores garantem a circulação de sementes e conservam a fauna brasileira.

“Então, a proposta dos ruralistas é acabar com a água e com as vidas, inclusive aquelas que ainda estão transitando pelas margens dos rios e que poderiam enriquecer as florestas, além de proteger essa nossa biodiversidade fantástica. Aliás, não chamaria nem de biodiversidade, chamaria de Megadiversidade. Nós temos a maior biodiversidade do planeta”, disse Mantovani.

Isso, do ponto de vista da redução das APPs. Mas o texto aprovado na última terça-feira (8/11), em duas comissões no Senado, prevê ainda a exclusão dos mangues da categoria de APPs. Em outras palavras, o novo Código Florestal objetiva acabar com os mangues brasileiros. O que afetaria, diretamente, pescadores e famílias que vivem da venda de crustáceos e moluscos.

“Os mangues representam o berço da vida. É ali que a vida no mar começa. Se não tiver mangue não tem vida no mar. Então, nós temos que evitar que isso tipo de coisa, sem limite, nos nossos rios e nos nossos mangues,” desabafou Mario Mantovani.

Politicamente, o novo Código Florestal vai afetar até a imagem do Brasil na Rio+20, a ser realizada no próximo ano no Rio de Janeiro. Com base no diagnóstico feito pelo dirigente da SOS Mata Atlântica, o Brasil perderá a sua condição de líder para assumir o papel de mais um país na lista de contravenção contra o planeta terra.

Sobretudo, o Brasil “perderia toda a sua moral para qualquer tipo de debate sobre clima
e biodiversidade,” alertou.

O novo Código Florestal, apresentado pelo senador Luiz Henrique da Silveira (PMDB-SC), também prevê, na seção APP, o plantio de árvores produtoras de frutos ou outros produtos em áreas de APP e informa que novas supressões poderão ser feitas para implantar lavouras, como soja, cana.

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FONTE : Vanessa Ramos, da Página do MST, publicada pelo EcoDebate, 17/11/2011.

A RIO+20 depende da COP-17

Será realizada no Rio de Janeiro, no início de junho de 2012, uma conferência internacional da Organização das Nações Unidas para marcar o 20º aniversário da Rio-92. Duas décadas se passaram desde a realização dessa Conferência sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, que é considerada a mais importante até hoje sobre o tema e à qual compareceram mais de cem chefes de Estado.

A Rio-92 ocorreu num momento em que o movimento ambientalista mundial estava em ascensão, o que favoreceu os resultados alcançados – os mais importantes dos quais foram a Convenção do Clima e a Convenção de Biodiversidade. Outros resultados foram a Declaração de Princípios sobre Florestas, a Declaração do Rio de Janeiro e a Agenda 21, que, apesar de meramente retóricos, fizeram avançar a agenda ambiental em muitos países.

A Convenção do Clima foi ratificada e seguida pela adoção do Protocolo de Kyoto, em 1997, que deu “dentes à Convenção”, fixando reduções mandatórias de emissões de gases que provocam o aquecimento da Terra apenas para os países industrializados. Os Estados Unidos, contudo, não ratificaram o Protocolo de Kyoto (que só entrou em vigor em 2005), o que reduziu muito sua eficácia. A Convenção da Biodiversidade só teve o seu primeiro protocolo adotado em Nagoya, em 2010, e ainda não entrou em vigor. As perspectivas atuais, portanto, não são as melhores.

A própria Organização das Nações Unidas, ao convocar a Rio+20, limitou seu escopo: ela terá apenas três dias de duração (de 4 a 6 de junho). A Conferência do Rio, em 1992, teve duração de 15 dias, o que deu tempo para ampla mobilização das organizações sociais e até para os negociadores dos países que vieram ao Rio.

Antes da Rio+20, haverá em Durban, na África do Sul, em dezembro, a Conferência das Partes da Convenção do Clima, quando essa discussão poderia avançar. Em preparação, houve uma reunião dos ministros do Meio Ambiente dos países do Basic (Brasil, África do Sul, Índia e China) em Minas Gerais, em 26 e 27 de agosto, que se limitou a repetir velhos chavões adotados desde 1992. Ou seja: de que cabe aos países industrializados reduzir suas emissões e pagar aos países em desenvolvimento – que são isentos da obrigação de reduzir suas emissões – para que se adaptem às mudanças climáticas.

A impressão que se tem, lendo o comunicado final da reunião de ministros, é que eles não se deram conta ainda de que a Conferência de Copenhague já mudou a arquitetura de implementação da Convenção do Clima e abriu caminho para o abandono de compromissos multilaterais e a adoção de metas nacionais voluntárias. Para persuadir os países industrializados a fazer mais, isto é, reforçar e estender o Protocolo de Kyoto, os países do Basic precisariam fazer mais do que fazem hoje, uma vez que suas emissões já são maiores do que as deles.

Hoje, a China é o maior emissor de gases de efeito estufa do mundo e os países não industrializados já são responsáveis por mais da metade delas. Dentro de dez anos, provavelmente, as emissões desse grupo de países atingirão 70% do total, invertendo a situação que existia 20 anos atrás.

A forma Basic de fazê-lo é iniciar uma negociação séria com os atuais signatários do Protocolo de Kyoto, para sua inclusão na lista dos países que aceitam metas quantitativas; ou seja, adotar um processo de graduação. No Protocolo de Kyoto, China, Índia, Brasil e África do Sul são tratados exatamente como países pequenos que contribuem muito pouco para as emissões. Não é realista insistir nessa ilusão.

Em particular no caso do Brasil, não é sem tempo que o Itamaraty decida como e onde quer ficar. Por um lado, o país aspira ser um dos grandes no cenário mundial e conseguir lugar de membro permanente no Conselho de Segurança das Nações Unidas, com as responsabilidades que isso implica. Por outro, alinha-se com países que não têm realmente como enfrentar o problema das mudanças climáticas e são dependentes de doações dos países ricos para tal. Esse é, no fundo, um comportamento bipolar, que na prática só favoreceu até agora a China, que, protegida pelo Protocolo de Kyoto, se tornou o maior emissor mundial.

Sem novas propostas criativas, a Conferência de Durban vai fracassar, comprometendo o sucesso da Rio+20 em 2012.

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FONTE : José Goldemberg é professor da USP, ex-presidente da SBPC e ex-ministro do Meio Ambiente. Publicado originalmente no site da revista Eco21.

Sociedade civil deve assumir as rédeas da Rio+20

Se os ativistas criarem seu próprio plano de ação para salvar a Terra, os governos não vão precisar negociar regras comuns para nações e comunidades desiguais em riqueza e capacidade técnica.

Nações Unidas, 14 de novembro de 2011 (Terramérica).- A menos que a sociedade civil organizada lance seu próprio plano de ação na Cúpula da Terra, a Rio+20, que acontecerá em 2012 no Rio de Janeiro, a conferência será pouco mais que um luxuoso debate. Isto porque os delegados governamentais não abordarão o problema de reorientar a economia mundial, tarefa que a Organização das Nações Unidas (ONU) considera essencial para enfrentar a crescente crise de sustentabilidade ambiental.

O informe, que no começo deste ano foi apresentado pelo secretário-geral, Ban Ki-moon, ao comitê organizador da Conferência das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento Sustentável (Rio+20), diz que, para tornar sustentáveis os modelos de consumo e produção, as políticas públicas devem ir “muito além” de corrigir os preços.

Entretanto, Ban não disse quais medidas específicas são necessárias. De fato, em nenhuma parte da enorme quantidade de documentos que a ONU produziu desde que convocou a primeira Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente Humano, em junho de 1972, em Estocolmo, é possível encontrar uma única análise sobre esse tema.

A Agenda 21, o volumoso plano de ação adotado na Cúpula da Terra de 1992 no Rio de Janeiro, tampouco aborda o assunto, e a Comissão sobre o Desenvolvimento Sustentável, que vigiou sua implantação por duas décadas, não o considerou. O Estudo Econômico e Social Mundial que a ONU publicou este ano estima em US$ 72 trilhões o custo de fazer verde a economia mundial, sem detalhar como.

Estas lacunas refletem uma inquestionável realidade política contemporânea: o poder das corporações, que dominam a economia verde e que estabeleceram os atuais modelos de produção e consumo com o objetivo de maximizar seus ganhos e opor-se aos acordos que tentarem restringir seus efeitos sociais e ambientais negativos.

Entre as décadas de 1970 e 1980, a ONU tentou sem sucesso negociar um código de conduta para as corporações transnacionais. Na década posterior, tentou um enfoque mais brando, convidando-as a se integrarem ao Pacto Mundial para o cumprimento voluntário de uma série de padrões ambientais e de direitos humanos. Menos de cinco mil das 60 mil corporações com lucros anuais superiores a US$ 1 bilhão uniram-se ao Pacto Mundial. E mesmo este minúsculo número mascara seu verdadeiro impacto, já que inclui empresas pequenas e médias, muitas de países em desenvolvimento.

Durante este prolongado ponto morto, os problemas ambientais adquiriram proporções de catástrofe. A contaminação e a perda de habitat levam espécies à extinção a um ritmo que não se via desde o desaparecimento dos dinossauros. Na última década, condições meteorológicas extremas, que os cientistas associam com o aquecimento global, causaram desastres naturais sem precedentes em todo o mundo.

A menos que se freie o aquecimento global, os cientistas projetam mudanças significativas em chuvas e secas, com importantes consequências para a produtividade agrícola. Se nada for feito para evitar o aquecimento do planeta, o mundo poderá ter uma era de guerras pela terra que destruiriam todo sinal de legalidade e ordem internacional.

Apesar destas perspectivas aterradoras, poucos governos estão dispostos a enfrentar os interesses corporativos. Neste cenário, a sociedade civil organizada é a que pode elaborar uma estratégia de saída segura. Conhece a natureza e o alcance dos problemas ambientais, e a internet lhe deu uma capacidade sem precedentes para criar redes mundiais.

Se o ativismo combinar esses elementos com a capacidade local para a ação efetiva –o mais simples seria aliar-se a pequenas e médias empresas–, poderia criar um mecanismo poderoso e flexível, capaz de traçar o mapa dos problemas ambientais, controlar seu desenvolvimento e fazer-lhes frente, promovendo ao mesmo tempo atividades econômicas amigáveis com a natureza nos âmbitos regional e local. Assim, se moveria gradualmente a economia mundial dos enormes intercâmbios internacionais, que desperdiçam gigantescas quantidades de energia e recursos naturais, para modelos de atividade regional e sub-regional muito mais eficientes.

Semelhante mudança teria impactos mínimos na criação de riqueza e postos de trabalho. De fato, como as empresas médias e pequenas são muito mais intensivas em mão de obra do que os monstros que hoje controlam a economia mundial, veríamos uma ascensão do emprego, da demanda e de um crescimento socialmente justo. Os governos não precisariam negociar regras comuns para nações e comunidades terrivelmente desiguais em riqueza e capacidade técnica.

Se as decisões e as medidas ficassem completamente nas mãos de autoridades nacionais e locais, a rede mundial se converteria em um poderoso mecanismo de solidariedade internacional, transferência de tecnologia e apoio financeiro, coordenando ações onde fosse necessário e divulgando as melhores práticas. Precisamos ir à Rio+20 preparados para acordar um manifesto que recolha estes princípios e um plano de ação detalhado com o rascunho a seguir.

Plano de ação

No contexto dos objetivos e valores já expressos, os ativistas presentes na conferência Rio+20 acordam:

1. Rede – Os ativistas criarão uma rede eletrônica mundial organizada em uma estrutura de acesso simples (local, nacional, regional, mundial) para facilitar a informação compartilhada, o debate interativo e a ação concertada;

2. Organização – Os ativistas trabalharão com empresários que estiverem à frente de empresas pequenas e médias para criar organizações comunitárias para a ação cooperativa. Estas organizações serão as unidades básicas da rede mundial e terão dois objetivos principais: proteger o meio ambiente e acelerar o crescimento econômico nos planos local, sub-regional e regional;

3. Inspeção e controle – A rede compartilhará os melhores conhecimentos disponíveis nas agências nacionais e internacionais, e o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente desempenhará um papel de coordenação. Os ativistas iniciarão uma pesquisa ambiental mundial alimentada com contribuições comunitárias, criando um sistema de controle permanente para dar informes de situação em tempo real às autoridades nacionais, regionais e mundiais;

4. Análise – Com base na informação coletada, um grupo especialista governamental que trabalhará com a rede criará um plano técnico de medidas preventivas e corretivas para todos os problemas ambientais mundiais. O plano será implantado mediante a ação comunitária, onde for possível, e os governos e agências internacionais darão capacidade financeira e técnica;

5. Educação e mobilização – As organizações comunitárias e suas redes se dedicarão a educar e mobilizar apoio popular para a ação ambiental

Estes passos deveriam criar um aparato mundial capaz de fiscalizar os danos causados pela ação humana e de assumir sua remedição. Esse processo deveria reorientar toda a gama de atividades econômicas para modelos amigáveis com o meio ambiente, e criar e sustentar o apoio da opinião pública para uma ação permanente.

* Bhaskar Menon tem quatro décadas de experiência na cobertura da Organização das Nações Unidas e edita www.UNdiplomatictimes.com.

LINKS

Ambientalistas reclamam sistema multilateral poderoso


ONGs brasileiras criticam indefinição de proposta para a Rio+20


“Rio+20 deve dar um impulso sustentado”


Sociedade civil, a nova superpotência – Cobertura especial da IPS, em espanhol


Ambiente – Cobertura especial da IPS, em espanhol


Metas do Milênio – Cobertura especial da IPS, em espanhol

Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, em inglês

Stakeholder Forum, em inglês

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FONTE :Bhaskar Menon tem quatro décadas de experiência na cobertura da Organização das Nações Unidas e edita www.UNdiplomatictimes.com. Artigo produzido para o Terramérica, projeto de comunicação dos Programas das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) e para o Desenvolvimento (Pnud), realizado pela Inter Press Service (IPS) e distribuído pela Agência Envolverde.

quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Dívida ambiental dos países desenvolvidos: quem vai pagar a conta? entrevista com Eloi Laurent

Enquanto a dívida financeira dos Estados ocupa as manchetes dos jornais, outra dívida, mais discreta, mas não menos importante, busca um lugar para si entre as grandes questões internacionais: trata-se da dívida ambiental, conceito segundo o qual a industrialização dos países desenvolvidos e os danos ambientais por ela causados os tornariam devedores em relação a países em desenvolvimento. Uma dívida que poderia, portanto, aumentar ainda mais a dependência financeira do Norte em relação ao Sul.

Eloi Laurent, economista no Observatório Francês das Conjunturas Econômicas (OFCE) e professor do instituto Sciences Po, fala sobre as questões desse conceito, a duas semanas da abertura da cúpula de Durban sobre o clima, e às vésperas de um colóquio sobre esse mesmo tema na região de Île-de-France na segunda-feira (14), organizado pelo Sciences Po e pelo Instituto do Desenvolvimento Sustentável e das Relações Internacionais (Iddri).

Le Monde: Como o sr. define a dívida ambiental?
Eloi Laurent: Há inúmeras definições possíveis, então é preciso escolher. Uma definição genérica baseia-se na constatação da distribuição desigual dos custos econômicos e humanos das crises ambientais entre países que não contribuíram igualmente para elas. A ideia central é que esses custos são, no processo de desenvolvimento econômico, deslocados dos países ricos, que não querem assumir sua responsabilidade, para países pobres, que não podem assumir suas consequências.

Todavia, o conceito de dívida ambiental, apresentado nos fóruns internacionais há cerca de trinta anos, sofre por ter sido concebido inicialmente como uma contramedida à dívida financeira dos países latino-americanos. Nos anos 1980, esses países disseram: Tudo bem, nós devemos dólares aos países ricos, mas estes nos devem pelo buraco da camada de ozônio.

Quem é realmente credor de quem? Foi o pecado original do conceito de dívida ambiental, o que a afundou logo de início e a tornou hoje ainda mais frágil, considerando a grande reviravolta do endividamento mundial ao qual estamos assistindo.

O que ela representa exatamente para os países desenvolvidos?
Laurent: No sentido estrito, ela representa o reconhecimento de uma responsabilidade em relação aos países mais pobres. Quando levamos socorro ao Haiti porque esse país dispõe de capacidades institucionais muito frágeis diante das catástrofes que ele precisa enfrentar com frequência, nós quitamos uma espécie de dívida ambiental.

De maneira mais precisa, mas também mais duvidosa, podemos ver essa responsabilidade de uma forma mais retrospectiva, por exemplo, em matéria de mudança climática; falamos então de “responsabilidade histórica”. Mas o conceito, que implica a ideia de compensação, se torna muito delicado de se manejar. A Convenção das Nações Unidas sobre a mudança climática não reconhece essa “responsabilidade histórica” dos países ricos, mas menciona uma “responsabilidade comum, mas diferenciada”.

Para mim, esse é o verdadeiro sentido da dívida ambiental: não o reconhecimento da culpa de um em relação ao outro, mas de um erro coletivo em nossa estratégia de desenvolvimento, de uma corresponsabilidade diferenciada e de uma solidariedade em comum à qual cada país deve se associar de acordo com suas necessidades e capacidades. Vista por esse ângulo, é imensa a responsabilidade dos Estados Unidos, que há dez anos bloqueia as negociações climáticas.

Como definir a dívida ambiental ao longo do tempo, sendo que se trata de um conceito móvel, que deve evoluir?
Laurent: Vemos muito bem em que ponto a China mudou a configuração das coisas, no tempo e no espaço: ela emitiu quatro vezes menos gases de efeito estufa que os Estados Unidos desde a revolução industrial, se tomarmos como referência o início dos anos 2000; mas até 2050, se ela continuar com sua trajetória, ela terá emitido tanto quanto os EUA.

Ao mesmo tempo, uma equipe de Stanford mostrou que os fluxos de dióxido de carbono da China para os Estados Unidos atingem quase 350 milhões de toneladas, devido às importações americanas em energia, bens e serviços, ou seja, quase o mesmo tanto que as emissões associadas à produção na França. Como então se calcula a dívida ambiental dos Estados Unidos em relação à China?

O que não quer dizer que os princípios que fundamentam o conceito de dívida ambiental devam ser abandonados: as questões de Justiça estão no cerne de todos os debates ecológicos e há desigualdades ambientais consideráveis entre as nações e dentro das nações, é preciso medi-las para combatê-las. Mas isso só será feito mantendo-se uma distância de qualquer discurso simplista, pois a Justiça, especialmente entre as nações, é uma arte incrivelmente difícil.

Então que soma representa essa dívida, e como ela é calculada?
Laurent: Em um artigo publicado em 2008 pela revista “PNAS”, que até hoje é o exercício mais completo já feito sobre o conceito de dívida ecológica, Thara Srinivasan e seus coautores se esforçaram para avaliar, no período de 1961-2000, a distribuição dos custos ambientais, distinguindo três tipos de países de acordo com seu nível de desenvolvimento. O cálculo, certamente discutível, mostra que os países pobres arcam com a mesma participação “bruta” dos custos ambientais globais que os países ricos (20%), ao passo que os países de renda intermediária arcam com 60% dos custos.

Mas, uma vez que esses custos são ponderados por seu peso real, levando em conta o nível de desenvolvimento dos países que os assumem (o que pode se chamar de “custo líquido”), a distribuição muda: 45% para os países pobres, 52% para os países intermediários e somente 3% para os países ricos. Além do mais, mais da metade desses custos ambientais para os países pobres provêm da atividade dos países de outra categoria.

Também se pode olhar pela perspectiva inversa, a da distribuição desigual dos benefícios ambientais no mundo. Um estudo de 2009 mostrou que um europeu consome 43 kg de recursos naturais por dia, um americano consome 88 kg e um australiano, 100 kg; contra 34 kg para um sul-americano, 14 kg para um asiático e 10 kg para um africano.

De que maneira podemos aplicar esse conceito? Deve-se dar a ele uma dimensão jurídica internacional?
Laurent: Como bem mostrou o economista Olivier Godard, o conceito de dívida ambiental é muito problemático do ponto de vista jurídico, e portanto muito pouco operacional no contexto das negociações internacionais, ou até contraproducente. É preciso saber se queremos estar certos moralmente, mas errados ecologicamente.

A ideia só foi debatida seriamente em 1997, quando foi redigido o Protocolo de Kyoto após uma proposta do Brasil, e ela foi descartada. Até onde sei, desde então, nenhum país articulou de maneira clara uma proposta juridicamente fundamentada e orçada, e submetida às outras partes. Os exercícios de modelização que foram encomendados pela ONU para avaliar a responsabilidade das nações na mudança climática levam a conclusões empíricas moderadas, pois deixam espaço para as considerações normativas.

Não seria esse conceito negativo demais, podendo alarmar os países que já estão sofrendo com a crise econômica e pouco predispostos a avançar nas negociações climáticas?
Laurent: Há de fato um tremendo choque com o debate sobre as dívidas financeiras. Como ele coloca em jogo as noções de sustentabilidade e de justiça intra e intergeracionais no esforço de pagamento, ele deve nos permitir avançar no reconhecimento de nossa dívida ambiental comum, entendida como aquela que todos nós devemos uns aos outros. Talvez seja desagradável ouvir isso, mas hoje somos todos devedores ambientais, mesmo que nossa capacidade de pagamento varie em proporções consideráveis.

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FONTE : Eloi Laurent é autor de “Social-écologie” (Ed. Flammarion, 2011) e coordenou o “Economie du Développement Soutenable” (acesso livre). Tradução: Lana Lim. Entrevista do Le Monde, no UOL Notícias. EcoDebate, 16/11/2011.