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segunda-feira, 24 de outubro de 2016

Efeitos da eliminação de corpos de água

Casal espera ser resgatado em cima de um contêiner de lixo devido à cheia causada pelas inundações que submergiram Chennai, no Estado de Tamil Nadu, na Índia, em dezembro de 2015. Foto: R Samuel/IPS
Casal espera ser resgatado em cima de um contêiner de lixo devido à cheia causada pelas inundações que submergiram Chennai, no Estado de Tamil Nadu, na Índia, em dezembro de 2015. Foto: R Samuel/IPS
Por Jency Samuel, da IPS – 

Chennai, Índia, 24/10/2016 – “A chuva foi nossa infelicidade e nossa salvação”, disse Kanniappan, ao recordar a primeira semana de dezembro de 2015, quando esta cidade, capital do Estado indiano de Tamil Nadu, ficou debaixo de água. “Os vizinhos amáveis nos deixaram ficar no andar de cima de sua casa quando a água subiu. A chuva também era nossa única fonte de água potável”, contou.
Por sua vez, Kalavathy não conhece os vínculos entre os eventos climáticos extremos e o aquecimento global. Só o que tem claro é que, naquele dezembro, sua casa ficou debaixo de aproximadamente 4,5 metros de água. E agora, após trabalhar no período noturno, tem de acordar às quatro da manhã para bombear água, fornecida pelas autoridades em determinados momentos.
A vida de Kalavathu e seus vizinhos, que agora vivem atrás de um muro com mais de quatro metros de altura na área aplanada do rio Adyar, parece girar em torno da água, seja por ser muita ou pouca. Chennai se converteu, literalmente, em uma ilha em dezembro de 2015. O aeroporto local ficou inundado e os trens e voos tiveram que ser cancelados, deixando a cidade isolada do resto da Índia por alguns dias.
As inundações deixaram mais de 500 mortos, e as perdas econômicas foram estimadas em cerca de US$ 7,4 bilhões, quantia que se repetiu, aproximadamente, nas outras cidades indianas que também ficaram submersas.
O problema das inundações foi um dos grandes temas debatidos na Terceira Conferência das Nações Unidas sobre Habitação e Desenvolvimento Sustentável (Hatibat III), realizada entre os dias 17 e 20 deste mês, em Quito, capital do Equador. O governo da Índia divulgou um rascunho com indicadores sobre como deveriam ser as “cidades”.
As chuvas incessantes também causaram inundações em Chennai no mês de novembro. “A média das precipitações em novembro é de 407,4 milímetros (mm), mas em 2015 caíram 1.218,6 mm. Em dezembro a média gira em torno de 191 mm, mas no ano passado chegou a 542 mm, rompendo uma marca de cem anos”, informou G. P. Sharma, da Skymet Weather Services Pvt. Ltd.
O que acontece nessa cidade foi atribuído ao fenômeno El Niño, mas numerosos cientistas concordam em afirmar que com a mudança climática aumentarão os eventos climáticos extremos.
“Haverá mais chuvas em menos dias, como ocorreu em Chennai em 2015, na Caxemira em 2014, e em Uttarakhand em 2013”, apontou Sushmita Sengupta, vice-diretora de Programa do Centro para a Ciência e o Ambiente (CSE), com sede em Nova Délhi, o que coincide com o Quinto Informe de Avaliação do Grupo Intergovernamental de Especialistas Sobre a Mudança Climática (IPCC), em relação ao aumento da intensidade das chuvas na Índia.
As inundações são o desastre mais recorrente, segundo o Instituto Nacional de Gestão de Desastres da Índia, e afetam um grande número de pessoas e vastas áreas. O Ministério do Interior identificou 23 dos 35 Estados indianos como propensos a inundações. Só depois das inundações de Mumbai, em 2005, que a Autoridade Nacional de Gestão de Desastres distinguiu as inundações urbanas das fluviais, pois têm diferentes causas e requerem estratégias de controle distintas.
O governo de Chennai não estava preparado para enfrentar a situação, apesar dos alertas do Departamento de Meteorologia. Nos casos do Estado de Jammu, ao norte, e da Caxemira não havia um sistema de prognóstico de inundações, nem um departamento exclusivo para a gestão de desastres quando ocorreu a inundação em 2014.As causas de cada inundação e as consequências são diferentes para cada cidade e região, mas o denominador comum é o extremamente mau planejamento urbano.
Em 2015, um informe do Instituto de Assentamentos Humanos, com sede em Bengaluru, dizia que só havia cinco cidades indianas com mais de um milhão de habitantes. Em 2011, eram 53, e, além disso, aumentou a superfície construída, estradas foram asfaltadas e diminuíram os espaços abertos.Porém, outra análise do Instituto revela que aumentam as áreas construídas de forma desproporcional em comparação com o crescimento da população.
Entre 2000 e 2010, a população de Kolkata aumentou cerca de 7%, mas sua área construída cresceu 48%. E, em Bengaluru a área construída duplicou em comparação com o número de habitantes no mesmo período, o que reflete o grande desenvolvimento da infraestrutura comercial. Os espaços abertos, que foram substituídos por estruturas de concreto, eram principalmente massas de água que atuavam como esponjas e absorviam a chuva.
O aumento populacional também significou mais desperdícios e as massas de água das cidades se converteram em depósito do lixo municipal, como ocorreu em Pallikaranai, uma área pantanosa de Chennai. Também se transformaram em recipientes de esgoto, como o rio Bharalu, que atravessa a cidade de Gauhati, no Estado indiano de Assam. “Os urbanistas valorizam a terra, não a água”, lamentou Sengupta.
Um mapa de Chennai de 1909 mostra um lago com 6,4 quilômetros de comprimento no centro da cidade. T. K. Ramkumar, membro do Comitê de Especialistas sobre Pallikaranai, disse à IPS que, na década de 1970, o governo aterrou lagos na cidade e os parcelou.
A invasão de massas de água é um problema comum nesse país. As estatísticas revelam que quanto mais massa de água uma cidade perde mais inundações sofre. “Dos 262 lagos de Bengaluru nos anos 1960, apenas 10 têm água, e 65 dos 137 que existiam em Ahmedabad agora são áreas construídas”, disse Chandra Bhushan, diretora-geral adjunta do CSE.
Após as inundações de Chennai, a Junta Parlamentar Permanente cobrou medidas rígidas contra a invasão de massas de água, e pediu ao governo de Tamil Nadu que limpasse os canais e os leitos dos rios para que estes fluíssem, que melhorasse as redes de saneamento e criasse índices de vulnerabilidade com mapas. Essas medidas podem ser aplicadas a qualquer cidade indiana na mesma situação.
O governo indiano destinou US$ 164 milhões à recuperação de 63 massas de água dentro do Programa de Conservação de Mangues e Lagos. Mas os dados revelam que é preciso acelerar os esforços.
Entretanto, no rascunho do Indicador de Padrões de Cidades Inteligentes não existe nenhum para medir a preparação nem a resiliência das cidades diante dos desastres climáticos.
No tocante a Chennai, “a capacidade de retenção de Pallikaranai deve ser melhorada com métodos adequados depois da realização de estudos hidrológicos e hidrogeológicos”, destacou a especialista Indumathi M. Nambi, do Instituto de Tecnologia.
A recuperação dos corpos de água e as medidas de mitigação de inundações devem ser específicas para cada situação, considerando a extensão e as condições topográficas das áreas de captação, as drenagens existentes e propostas das águas pluviais, o status das terraplenagens e a permeabilidade do solo, entre outras variáveis. Com essas medidas mais vontade política, os especialistas acreditam que será possível conseguir a segurança dos habitantes e a resiliência das cidades. Envolverde/IPS

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