Paralelo ao evento das Nações Unidas, evento reúne organizações civis de 50 países em debate sobre desenvolvimento sustentável. Crítica principal é que Rio+20 busca resposta no mercado, se afastando dos cidadãos.
A Cúpula dos Povos é quase um movimento de protesto contra a Rio+20. A conferência alternativa, que começa nesta sexta-feira (15/06) e deve reunir cerca de 30 mil pessoas no Rio de Janeiro, adverte: a crise ambiental não será resolvida nas bolsas de valores, com a transformação da natureza em bens que possam ser vendidos como commodities.
O conceito de economia verde das Nações Unidas se rendeu demais ao apelo do mercado e as corporações estão assumindo as rédeas, dizem os idealizadores do evento paralelo. “As grandes empresas estão aproveitando o momento de crise e procurando saídas meramente econômicas para uma questão que é muito mais complexa do que a economia”, acusa Pedro Ivo Batista, da organização da Cúpula dos Povos.
A Câmara Internacional do Comércio, que vai reunir empresas como Volkswagen, Vale e Alcoa num debate sobre o tema no âmbito da Rio+20, reagiu à acusação. A entidade vai lançar na ocasião um guia contendo dez princípios para nortear empresas a fazerem a transição para o modelo “verde”.
Mas não se trata de uma imposição ao resto da sociedade vindo do setor privado. “Acreditamos que a economia verde só pode ser alcançada em parceria com outros setores: governo e sociedade civil”, ponderou à DW Brasil Carlos Busquets, subdiretor para política e negócios da Câmara.
As organizações civis que participam do encontro, formadas por movimentos de mais de 50 países, defendem que a saída para crise ambiental inclui obrigatoriamente o respeito aos direitos dos povos tradicionais, o que eles chamam de justiça sócio-ambiental.
Transformar a natureza em uma mercadoria seria desobrigar os países desenvolvidos de reduzirem suas emissões de gases-estufa e de mudarem seu padrão de comportamento – baseado no alto consumo e com elevado desperdício.
Separados pela ideologia
Sediadas na mesma cidade e programadas para a mesma época, Rio+20 e Cúpula dos Povos não têm um espaço comum de discussão. Existem ainda contrastes: enquanto a disputa pelos quartos de hotéis com preços inflacionados foi penosa para os participantes da conferência da ONU, os que farão parte da discussão na Cúpula dos Povos ficarão alojados em duas escolas públicas, nos camarotes da passarela de desfiles carnavalescos apelidada Sambódromo e em barracas no campus de uma universidade.
Organizações indígenas, quilombolas, associações de advogados e psicólogos, comitês de favelas, além de opositores da energia nuclear, fazem parte do debate do evento alternativo. Eles criticam que a economia verde da ONU, na verdade, está buscando uma nova versão do capitalismo, ou seja, uma maneira de aumentar os índices de produção, explorando e mercantilizando os recursos naturais do planeta.
A lista de soluções proposta pela Cúpula dos Povos inclui a prática da economia solidária – um modelo baseado no cooperativismo para a produção de bens e serviços –, mais espaço para tecnologias sociais, como a construção de cisternas e projetos de manejo florestal sustentáveis e fortalecimento dos movimentos sociais.
“Trata-se de uma coalizão muito ampla. São grupos grandes de movimentos sindicais, de trabalhadores do campo, de grande variedade de organizações não-governamentais e de grupos de cidadanias existentes”: assim Dawid Bartelt, da Fundação Henrich Böll, sediada no Rio de Janeiro, comenta o impacto do evento alternativo.
Falta de liderança e baixa expectativa
Não convidada para integrar o debate na Rio+20, a Cúpula dos Povos vai produzir recomendações aos chefes de Estado presentes no evento da ONU. Sobre os resultados da conferência principal, o evento paralelo tem baixas expectativas. Segundo Pedro Ivo Batista, a Rio+20 é pelo menos uma oportunidade para as Nações Unidas criarem uma governança de desenvolvimento sustentável mais forte.
“Boa parte do problema ambiental se deve a não implementação das promessas assumidas pelos países em conferências. A ONU não tem sequer como causar um constrangimento ético aos países que não cumprem as implementações que eles mesmos acordaram”, aponta.
Críticas também não faltam ao anfitrião. O Brasil perdeu o protagonismo na discussão ambiental. As grandes hidrelétricas na Amazônia, a facilitação da liberação de projetos de mineração em terras indígenas, a política nuclear dúbia e o retrocesso nas leis ambientais tiraram o brilho do país, acreditam os organizadores da Cúpula dos Povos.
Descrédito maior vai para as nações ricas. “Esses países continuam muito defensivos, muito recuados, com medo da crise econômica. E justamente eles, que têm maior responsabilidade [como grandes poluidores históricos] deveriam ser os primeiros a propor mudanças reais e a assumir posições”, diz Batista, numa crítica aos Estados Unidos, ao Canadá e à certa reticência europeia.
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FONTE : Nádia Pontes. Revisão: Augusto Valente. DW. EcoDebate, 18/06/2012
O conceito de economia verde das Nações Unidas se rendeu demais ao apelo do mercado e as corporações estão assumindo as rédeas, dizem os idealizadores do evento paralelo. “As grandes empresas estão aproveitando o momento de crise e procurando saídas meramente econômicas para uma questão que é muito mais complexa do que a economia”, acusa Pedro Ivo Batista, da organização da Cúpula dos Povos.
A Câmara Internacional do Comércio, que vai reunir empresas como Volkswagen, Vale e Alcoa num debate sobre o tema no âmbito da Rio+20, reagiu à acusação. A entidade vai lançar na ocasião um guia contendo dez princípios para nortear empresas a fazerem a transição para o modelo “verde”.
Mas não se trata de uma imposição ao resto da sociedade vindo do setor privado. “Acreditamos que a economia verde só pode ser alcançada em parceria com outros setores: governo e sociedade civil”, ponderou à DW Brasil Carlos Busquets, subdiretor para política e negócios da Câmara.
As organizações civis que participam do encontro, formadas por movimentos de mais de 50 países, defendem que a saída para crise ambiental inclui obrigatoriamente o respeito aos direitos dos povos tradicionais, o que eles chamam de justiça sócio-ambiental.
Transformar a natureza em uma mercadoria seria desobrigar os países desenvolvidos de reduzirem suas emissões de gases-estufa e de mudarem seu padrão de comportamento – baseado no alto consumo e com elevado desperdício.
Sediadas na mesma cidade e programadas para a mesma época, Rio+20 e Cúpula dos Povos não têm um espaço comum de discussão. Existem ainda contrastes: enquanto a disputa pelos quartos de hotéis com preços inflacionados foi penosa para os participantes da conferência da ONU, os que farão parte da discussão na Cúpula dos Povos ficarão alojados em duas escolas públicas, nos camarotes da passarela de desfiles carnavalescos apelidada Sambódromo e em barracas no campus de uma universidade.
Organizações indígenas, quilombolas, associações de advogados e psicólogos, comitês de favelas, além de opositores da energia nuclear, fazem parte do debate do evento alternativo. Eles criticam que a economia verde da ONU, na verdade, está buscando uma nova versão do capitalismo, ou seja, uma maneira de aumentar os índices de produção, explorando e mercantilizando os recursos naturais do planeta.
A lista de soluções proposta pela Cúpula dos Povos inclui a prática da economia solidária – um modelo baseado no cooperativismo para a produção de bens e serviços –, mais espaço para tecnologias sociais, como a construção de cisternas e projetos de manejo florestal sustentáveis e fortalecimento dos movimentos sociais.
“Trata-se de uma coalizão muito ampla. São grupos grandes de movimentos sindicais, de trabalhadores do campo, de grande variedade de organizações não-governamentais e de grupos de cidadanias existentes”: assim Dawid Bartelt, da Fundação Henrich Böll, sediada no Rio de Janeiro, comenta o impacto do evento alternativo.
Falta de liderança e baixa expectativa
Não convidada para integrar o debate na Rio+20, a Cúpula dos Povos vai produzir recomendações aos chefes de Estado presentes no evento da ONU. Sobre os resultados da conferência principal, o evento paralelo tem baixas expectativas. Segundo Pedro Ivo Batista, a Rio+20 é pelo menos uma oportunidade para as Nações Unidas criarem uma governança de desenvolvimento sustentável mais forte.
“Boa parte do problema ambiental se deve a não implementação das promessas assumidas pelos países em conferências. A ONU não tem sequer como causar um constrangimento ético aos países que não cumprem as implementações que eles mesmos acordaram”, aponta.
Críticas também não faltam ao anfitrião. O Brasil perdeu o protagonismo na discussão ambiental. As grandes hidrelétricas na Amazônia, a facilitação da liberação de projetos de mineração em terras indígenas, a política nuclear dúbia e o retrocesso nas leis ambientais tiraram o brilho do país, acreditam os organizadores da Cúpula dos Povos.
Descrédito maior vai para as nações ricas. “Esses países continuam muito defensivos, muito recuados, com medo da crise econômica. E justamente eles, que têm maior responsabilidade [como grandes poluidores históricos] deveriam ser os primeiros a propor mudanças reais e a assumir posições”, diz Batista, numa crítica aos Estados Unidos, ao Canadá e à certa reticência europeia.
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FONTE : Nádia Pontes. Revisão: Augusto Valente. DW. EcoDebate, 18/06/2012
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