t24 TERRAMÉRICA   A América Latina tem antídoto verde à mão
Ede Jorge Ijjasz-Vásquez, especialista em hidrologia e diretor do Departamento de Desenvolvimento Sustentável do Banco Mundial para a América Latina e o Caribe. Foto: Patricia da Camara/Cortesia Banco Mundial
O crescimento verde e inclusivo é um caminho para o desenvolvimento sustentável em médio prazo, afirma nesta entrevista o especialista Ede Jorge Ijjasz-Vázquez.
Rio de Janeiro, Brasil, 18 de junho de 2012 (Terramérica).- Os recursos naturais da próspera América Latina poderiam esgotar significativamente em menos de uma geração. Se a isso somarmos que é a região com maior desigualdade de renda entre ricos e pobres, o cenário parece catastrófico. Porém, a advertência, feita pelo Banco Mundial, não tende ao drama. Em um informe publicado para a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável, a Rio+20, a entidade diz que para evitar o colapso é preciso adaptar uma gama de políticas ambientais e sociais, produtivas e de planejamento urbano.
“Muitas das respostas estão nas próprias experiências da região”, afirma o documento Crescimento Verde e Inclusivo na América Latina e no Caribe, preparado pelo Departamento de Desenvolvimento Sustentável do Banco Mundial para a região. Existem “poderosos antídotos”, frequentemente de cunho local, para os males do modelo regional de crescimento, acrescenta. A ênfase está em “soluções práticas” que podem ser adotadas no ciclo curto das decisões de governos e empresas, declarou ao Terramérica o diretor do departamento, Ede Jorge Ijjasz-Vásquez.
Os sistemas de ônibus rápido, a geração elétrica limpa, a agricultura sustentável e o pagamento por serviços ambientais estão entre esses antídotos. “Quando se fala de desenvolvimento sustentável, em geral a reação é: ‘Ah, é para dentro de dez ou 20 anos’”, apontou o colombiano Ijjasz-Vázquez, que se definiu como “um dos poucos especialistas em hidrologia do Banco Mundial”.
Terramérica: Que diferença há entre o desenvolvimento sustentável e o “crescimento verde inclusivo” proposto neste estudo?
Ede Jorge Ijaasz-Vásquez: Tem a ver com a reação às palavras. Ao falar de desenvolvimento sustentável, em geral a reação é: “Ah, é para dentro de dez ou 20 anos”. Na América Latina temos uma década de crescimento bastante acelerado, e as decisões de países e indivíduos nessas situações têm um impacto imediato e de longo prazo. Quando um país cresce 4%, 5%, 6% ou 7% ao ano, a forma como se constrói a infraestrutura e se maneja os recursos hídricos, ou como crescem as cidades, tem um impacto imediato e para as gerações futuras. Se ao se construir uma estrada se cometer um erro, ela não pode ser reconstruída. As estradas durarão 15 ou 20 anos. As estações de geração elétrica duram 30, 35, 40 anos. Então, a ideia do crescimento verde inclusivo é incorporar nas decisões de hoje, relativas a esse crescimento rápido e necessário, as dimensões ambientais e sociais. É um caminho para o desenvolvimento sustentável de médio prazo.
Terramérica: Crescimento é produto interno bruto. Em uma região que cresce pela enorme demanda externa de matéria-prima, até onde se pode expandir o PIB e ser verde e inclusivo?
EJIV: Os padrões de produção e consumo, sobretudo nos países desenvolvidos, seguem trajetórias ineficientes e contaminantes. No planeta não há recursos suficientes para isso. Contudo, aprendeu-se com as economias desenvolvidas que políticas e decisões de indivíduos e famílias têm um enorme impacto. Os níveis de vida de Estados Unidos, Europa ou Japão são altíssimos, mas o consumo de energia elétrica no Japão é bem menor que nos Estados Unidos, porque os japoneses decidiram que a eficiência energética é muito importante. Em muitos Estados dos Estados Unidos, o consumo pessoal de água chega a 400, 500 litros por dia, enquanto na Europa é de 100 a 120 litros, e não se pode dizer que o europeu passe mais sede do que o norte-americano. Os países em desenvolvimento precisam avançar, isso não se questiona, mas há maneiras e trajetórias diferentes de avanço. É preciso desenvolver um setor agrícola limpo, eficiente e mais resistente aos desastres naturais. É muito mais produtivo e exige menos terreno.
Terramérica: Um debate na Rio+20 é a necessidade de se buscar indicadores melhores do que o PIB para medir os progressos nacionais.
EIJV: Levamos à Rio+20 um programa de contabilização de recursos naturais que expande a definição do PIB. Temos um par de programas-piloto na Colômbia e na Costa Rica. Vários países trabalham com isso, com diferentes metodologias do Brasil ao México, e procuramos montar uma plataforma de intercâmbio, idealmente com 50 países e 50 empresas privadas grandes, para testar e expandir essa definição de PIB. Muitos estudos indicam que os países perdem entre 3% e 9% do PIB em impactos ambientais.
Terramérica: A América Latina tem 81% de sua população em cidades, diz o estudo…
EJIV: A urbanização em si mesma não é ruim. Parte do crescimento econômico está muito vinculado à eficiência que se obtém com as aglomerações urbanas, e essa eficiência representa maior crescimento do setor agrícola para alimentar as cidades. O problema é como se organizam as cidades: se são dispersas, se não são densas, tampouco são eficientes. As cidades intermediárias, de um milhão de habitantes ou menos, são as que mais crescem, e nelas ainda podem ser resolvidos muitos problemas, com políticas de uso compacto do solo e do transporte, combinadas de forma que o crescimento se concentre em torno dos corredores de transporte público mais importantes. Outra variável valiosa é a capacidade de resistir aos desastres naturais.
Terramérica: O setor elétrico regional gera as menores emissões de dióxido de carbono do mundo, pela participação da eletricidade. Contudo, se prevê que essas emissões duplicarão até 2030, e as do Brasil aumentarão quase oito vezes. Por que?
EJIV: Tem a ver com os planos, mas também com decisões que estão sendo tomadas pela urgência em aumentar a geração elétrica. Muitos projetos hidrelétricos levam tempo e às vezes, por falta de planejamento, causam conflito social. Há países que estão aumentando a porção de combustíveis fósseis em sua matriz energética. Há um grande potencial hidrelétrico, mas o desafio é construí-lo desde o princípio olhando as variáveis ambientais e sociais de maneira muito mais eficiente e estruturada.
Terramérica: Sobre recursos naturais e serviços rurais, fala-se da produção agropecuária e sua relação com o desmatamento, mas nada de mineração e hidrocarbonos.
EJIV: Foi um dos comentários. Esperamos melhorar o informe na segunda versão. Parte do que queremos fazer na Rio+20 é dialogar com a sociedade civil, as empresas e governos, e garantirmos que esta não seja a última palavra, mas parte de um aprendizado. Procuraremos recolher algumas experiências com mineração que são mais positivas. Há grande diversidade de políticas. Algumas são muito acertadas do ponto de vista ambiental e social, e há empresas que as levam muito a sério. Esse é um dos capítulos que esperamos trabalhar na segunda edição, após a Rio+20.

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FONTE : * A autora é correspondente da IPS.