Sozinhas ações empresariais pelo desenvolvimento sustentável são importantes. Se alinhadas a políticas públicas e traçadas de forma a potencializá-las, podem ser transformadoras.
Vigora no Brasil desde 2010 a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS). A robustez e grandes avanços do texto são reconhecidos por especialistas, com destaque para a responsabilidade compartilhada, que inclui na equação da logística reversa a responsabilização dos fabricantes pelos resíduos que seus produtos deixam no planeta. Deveria ser o norte de empresas ao desenvolver e lançar um produto no País. Deveria ser sigla tão citada em um evento sobre sustentabilidade empresarial quanto o usual ‘DNA’ da organização. Não foi. A PNRS não ganhou nenhuma menção ao longo do evento de lançamento do Guia sustentabilidade para RH – 10 Desafios, assinado por Ricardo Voltolini, CEO da consultoria Ideia Sustentável.
A Política não foi citada nem ao menos no relato de Marcia Bertolini, Head de Recursos Humanos da Nespresso. Ela contou aos presentes sobre os esforços da empresa em ampliar suas taxas de reciclagem das capsulas de alumínios, que hoje beira os 25% em uma média mundial. Marcia falou sobre o treinamento de novos colaboradores, que inclui um dia na central de reciclagem de capsulas que a organização mantém em Barueri, da capacitação dos multiplicadores, que são funcionários nos pontos de venda que tem a missão de sensibilizar os consumidores na devolução das capsulas para reciclem nos pontos de coleta, da entrega e coleta de capsulas realizadas com carros elétricos e bicicletas nas cidades de São Paulo e Rio de Janeiro, e até do engajamento dos colaboradores em campanhas internas para que reciclem suas próprias capsulas. Mas a conexão com a legislação nacional estruturante do tema não veio.
Questionada sobre o assunto, Marcia ressaltou que a mensagem da empresa é adaptada para cada público interno e que “a empresa segue as legislações e se esforça para aumentar seus números”.
Também não foram lembradas no encontro outras legislações, como o Plano Nacional de Mudanças Climáticas (PNMC), ou ainda os ODSs (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) estabelecidos pela ONU (Organização das Nações Unidas) como uma agenda positiva válida até 2030, que os países signatários, incluindo o Brasil, devem seguir. A omissão poderia se justificar pelo recorte temático do encontro, que tinha o objetivo de contar as experiências das empresas no envolvimento do departamento de recursos humanos na disseminação da cultura da sustentabilidade nas estruturas de cada organização. Porém, não seria destes homens e mulheres que cuidam de gente dentro das empresas o papel de conectá-los às regras que envolvem segundo setor e poder público na mitigação de impactos ambientais e criação de modelos de desenvolvimentos sustentável?
Ficaram nas entrelinhas. Foi possível ver o PNMC no relato de Claudia Politanski, VP de Recursos Humanos do Itaú Unibanco. Ela falou dos esforços do banco em adaptar a relação com os colaboradores, olhando jornada, entendendo pontos altos e baixos da convivência com a empresa, aplicando códigos de vestimenta mais liberais, valorizando a diversidade e reforçando o compromisso público do banco, por meio de programas como o Bike Itaú, que coloca as bicicletas laranjas à disposição da população em grandes centros urbanos como São Paulo, impactando positivamente aspectos como a mobilidade e o clima das cidades.
Estava lá também na história da Duratex, que para provocar em seus colaboradores a sensação de pertencimento em relação às mudanças climáticas incorporou em seus treinamentos de sustentabilidade, realizados nas suas mais de 20 unidades por todo o Brasil, um momento de fotos. “São imagens que remetem a escassez, mudanças climáticas e outros temas, mas que estão mais próximas da realidade daquelas pessoas. As pessoas olham a foto e falam sobre. Então a gente faz o link com os grandes temas mundiais da sustentabilidade”, explica Luciana Alvarez, gerente de sustentabilidade corporativa da Duratex.
Ela contou sobre um caso interessante, ocorrido em 2015, em um treinamento na cidade de Queimados (RJ). “Era uma foto de enchente e era a rua onde o colaborador morava. Ele contou como foi o dia e nós falamos de mudança climática. Isso gera pensamento sistêmico. Muda a atitude da pessoa na sua casa, no seu bairro”.
E como não ver um punhado de ODSs e na história da Ambev? Renato Biava, diretor de Gente e Gestão Ambev, contou que o incentivo ao voluntariado já era uma prática antiga da organização, mas que recentemente foi revista para potencializar resultados. “Entendemos que o voluntariado causava efeito positivo na sociedade mas que não era perene. Para mudar isso lançamos o programa VOA, onde a gente compartilha nossas ferramentas de gestão com ONGs. É uma consultoria de gestão que ajuda essas organizações a ampliar resultado. Até o nosso CEO é voluntário e dá aulas. São mais de mil colaboradores causando impacto positivo exponencial em cadeia. Isso melhora engajamento do time, que fica com mais orgulho da companhia”, avalia.
Sem muito esforço, era possível relacionar cada uma dos relatos dos líderes que estiveram no palco do evento às legislações e compromissos nacionais na pauta da sustentabilidade. Talvez o link claro não venha por um senso comum (e real) de que o conhecimento sobre o tema é ainda escasso e elitizado e que, especialmente quando a mensagem vai para públicos diversos, é preciso adaptá-la.
O Guia sustentabilidade para RH – 10 Desafios pode ajudar estas organizações a transporem seus muros na construção destas mensagens, expandindo o olhar de seus colaboradores para a sustentabilidade, conectando-os de forma mais efetiva ao que já existe sobre o tema, permeando vida pessoal e profissional e cruzando portas de uma empresa a outra. Isso inclui um olhar para políticas públicas e falar abertamente sobre elas. O conteúdo da publicação é uma ótima base para este avanço. (Plataforma liderança Sustentável/#Envolverde)
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