Por Caroline Ligório, especial para Envolverde –
O evento de comemoração dos dez anos do Programa Brasileiro GHG Protocol, conduzido por pesquisadores do Centro de Estudos em Sustentabilidade (FGVces) da Fundação Getulio Vargas (FGV), celebrou o sucesso do programa, mostrou como os inventários de emissão de gases de efeito estufa (GEE) foram trabalhados pelas empresas membros e abordou projeções para um cenário futuro.
As empresas Alcoa, Anglo American, Banco do Brasil, Bradesco, Braskem (que incorporou o membro fundador Quattor), BRF, Companhia Energética do Estado de São Paulo (CESP), Companhia Paranaense de Energia (COPEL), EDP, Furnas, Ford, Grupo Boticário, Itaú, Natura, Polícia Federal, Santander, Suzano e Whirlpool foram homenageadas por comporem o grupo inicial do projeto em 2008. Atualmente, 140 empresas fazem parte do programa.
Surgido da intenção de instituir a cultura de inventário de emissões, o GHG Protocol investiu em ferramentas e desenvolvimento de sistemas para munir as empresas para a mensuração das emissões de carbono ao longo da cadeia produtiva. Em 10 anos de atividade, mais de 2.100 inventários com informações completas estão disponíveis para consulta pública, foram feitas mais de 40 oficinas e grupos de trabalho, mais de 60 sessões de treinamento e são mais de 1600 profissionais treinados.
Esse trabalho só foi possível pelo trabalho conjunto das empresas. Para que o Brasil cumpra o compromisso assumido com o Acordo de Paris esse trabalho coletivo deve ser perpetuado e envolver diversos setores. Guarany Osorio, coordenador do programa de política e economia ambiental do FGVces, destaca a importância desse envolvimento. “O governo não resolverá nada sozinho, e sim o setor empresarial, as ONGs, a academia”.
O relato voluntário das emissões não só trouxe mais transparência, mas também meios para melhorar a gestão e preparar as empresas para saberem se posicionar e influenciar caso o governo federal adote futuramente uma precificação de carbono. O modelo de qualificação do inventário (ouro, prata, bronze) informa o stakeholder o quanto o relatório está completo.
A Braskem, uma das empresas vanguardistas do programa, iniciou a publicação do inventário em 2008. Em 2009, por meio do manifesto “É preciso amadurecer para ser verde” assumiu o compromisso de realizar e publicar anualmente o inventário de gás de efeito estufa. Em 2011, incluiu no inventário de emissões todas as categorias de escopo 3 com verificação em 100% das operações. Em 2013, iniciou um processo de engajamento da cadeia de fornecedores para elaboração de inventário e estabelecimento de metas de evolução.
Em 2015, passou a utilizar a precificação interna do carbono como uma decisão de novos investimentos. Em 2016, a área de logística iniciou a gestão das emissões de terceiros através de indicadores. A Braskem, desde 2008, reduziu 21% das emissões de gases de efeito estufa, evitou a emissão de 4.5 milhões de toneladas de GEE, o que equivale a um plantio de cerca de 30 milhões de árvores. Investiu cerca de 600 milhões em desenvolvimento de produtos químicos produzidos a partir de matéria-prima de fonte renovável e tem a capacidade de capturar mais de 600 mil toneladas de CO2 da atmosfera por ano.
No caso do Itaú Unibanco, integrante do programa desde 2008, o inventário permitiu a empresa ser comparável, conversas sobre esse tema entre outras empresas e aprendizado ao atribuir e projetar metas. O banco tem consciência de que o impacto se traduz em crédito, em investimento e viabilidade de negócio e tem cada vez menos tempo para colocar em prática.
“Hoje o preço interno de carbono não é mais uma discussão de ser, tem muito uma discussão de quando, de qual o tamanho desse preço. O que vimos de mais relevante nesse aprendizado foi o quanto hoje ele se torna algo que pode ser discutido com outras áreas mais ligadas ao tema econômico, que em 2008 parecia ser uma meta inatingível.” Segundo Denise Hills, superintendente de sustentabilidade e negócios inclusivos do Itaú-Unibanco, para que a metodologia seja uma política, um senso comum é preciso um trabalho comunitário.
Nesse sentido, o banco em conjunto com 24 bancos ao redor do mundo desenvolve estudos sobre o impacto das mudanças do clima e do carbono no custo de capital para precificar, divulgar informações sobre exercícios dessa simulação de impacto no custo de capital dos bancos. Denise Hills acredita que diante das condições e metodologia de fazer inventário, o desafio é incorporar como um padrão de gestão. “Nos próximos 10 anos, os processos tendem a ser mais fáceis do ponto de vista de conhecimento e vão ser mais difíceis do ponto de vista de articulação”.
Para Guido Penido, pesquisador do FGVces, a cultura de mensuração de emissão de carbono gera aprendizado para as empresas e representa uma vantagem futura para o governo. “Quando vier uma regulação, essas empresas estarão em vantagem em relação às outras e o governo terá vantagem dado que a transição da regulação será mais suave, terá menos erros nos primeiros ciclos da implementação da política”.
A importância dos inventários estende-se para as políticas públicas, contribuindo, por exemplo, para avaliação de políticas públicas. A eficiência e eficácia de uma política pública cujo objetivo é a redução de emissões de gases de efeito estufa não pode ser avaliada caso não haja uma mensuração confiável das emissões. Além disso, contribui para o controle ambiental, aprimoramento das informações da comunicação nacional, avaliação socioambiental e para precificação de carbono.
Mario Monzoni, coordenador geral do FGVces, é cauteloso nas previsões futuras. “Não vejo a regulação chegar tão cedo. Para isso avançar, tem que entrar em uma agenda política, tem que estar sendo demandado com uma agenda nos níveis mais altos de tomada de decisão em Brasília”. Para Monzoni, a agenda de sustentabilidade não vai ser uma agenda prioritária para o futuro presente do país que será eleito no final do ano.
Porém, por outro lado, destaca o papel importante do setor empresarial, o qual percebeu a importância de sua atuação e atua com força para gerar uma mensagem eficiente. Isso é fundamental para se manter no mercado, principalmente para as empresas que estão conectadas com mercados globais, pois há regulação no exterior. As que não exportam receberão demandas de seus clientes por um produto com menos intensidade em carbono. (#Envolverde)
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